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2.13.2008

Bulas incentivam automedicação

Bulas incentivam automedicação, diz estudo

Folha de S.Paulo

As bulas dos remédios vendidos nas farmácias brasileiras são incompletas e incentivam a automedicação, aponta um estudo recém-concluído do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor). Isso, diz a entidade, pode comprometer seriamente a saúde das pessoas.

O antidepressivo Prozac (da Eli Lilly), por exemplo, traz o alerta de que pacientes jovens podem ter idéias e comportamentos suicidas durante o tratamento. E avisa: "Os médicos devem ser consultados imediatamente se os pacientes de todas as idades relatarem quaisquer pensamentos suicidas". O Cloridrato de Fluoxetina (da EMS), uma das versões genéricas do Prozac, simplesmente não diz nada sobre esse risco.

O Idec se debruçou sobre as letras miúdas que acompanham 19 remédios (antidepressivos, calmantes, antiinflamatórios, vasodilatadores, anti-reumáticos e drogas contra pressão alta e para baixar o colesterol) e constatou que há diferenças significativas entre as informações dos medicamentos de referência (originais) e seus genéricos ou similares.

A entidade também comparou as bulas nacionais com as americanas. Nos Estados Unidos, os antiinflamatórios avisam --com destaque-- do risco de morte por problemas cardiovasculares durante o tratamento. No Brasil, o Voltaren e o genérico Diclofenaco Sódico (ambos da Novartis) não trazem esse alerta.

A mesma diferença, na comparação com o produto americano, foi encontrada nas bulas do antiinflamatório Cataflam (da Novartis) e do genérico Diclofenaco Potássico (da Medley). Em 2004, o antiinflamatório Vioxx foi retirado do mercado no mundo inteiro após um estudo ter mostrado o aumento do risco de ataques cardíacos e acidentes vasculares cerebrais.

"Essas irregularidades violam o direito do consumidor à informação correta e completa. Podem representar um risco à saúde. Existe muita intoxicação por remédios", diz Karen Lagen, a responsável do Idec pela pesquisa.

Automedicação

Há casos em que, na avaliação do Idec, as bulas incentivam que os pacientes façam uso de remédios sem acompanhamento médico. No antidepressivo Zoloft (da Pfizer), por exemplo, lê-se o seguinte: "Se você não responder à dose de 50 mg, pode aumentar a dose".

O estudo apontou ainda que muitos medicamentos não trazem orientações caso o paciente se esqueça de tomar uma dose. Supondo que deve tomar três doses ao dia e acidentalmente pulou a segunda, ele deve dobrar a terceira dose? Ignorar o esquecimento e tomar a terceira normalmente? Tomar a segunda dose imediatamente, não importando a hora? Segundo o Idec, 11 dos 19 medicamentos não sanam essa dúvida.

Para o médico sanitarista José Ruben de Alcântara Bonfim, coordenador da Sobravime (Sociedade Brasileira de Vigilância de Medicamentos), uma origem das falhas é o fato de as bulas não serem atualizadas periodicamente. "Como os médicos no Brasil não são obrigados a notificar os efeitos adversos dos medicamentos -apenas a indústria [farmacêutica]-, muitas bulas estão incompletas, desatualizadas."

Os laboratórios fabricantes dizem que apenas seguem as determinações da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e que seus folhetos têm a aprovação da agência.

Para o Idec, a atuação da Anvisa está longe da ideal, pois permite que as bulas dos medicamentos de referência e as dos genéricos e similares sejam diferentes -embora o efeito no organismo deva ser, teoricamente, o mesmo. "A Anvisa deve ser mais rigorosa e melhorar a legislação", diz Karen Lagen.

A pesquisa do Idec chegou à Anvisa. A agência informou que as irregularidades apontadas serão investigadas.
"Se confirmadas, serão corrigidas e ensejarão medidas punitivas para os laboratórios infratores. O desrespeito às normas de registro de medicamentos constitui uma infração sanitária", disse Pedro Ivo Sebba Ramalho, da assessoria técnica da presidência da Anvisa.

As punições vão de uma advertência à apreensão dos produtos e à interdição das empresas. As multas podem chegar a R$ 1,5 milhão.

A agência informou ainda que está estudando fazer mudanças nas bulas para, "entre outros objetivos, viabilizar o direito à informação adequada e clara sobre produtos, em especial sobre os riscos".

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