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7.13.2009

O SISTEMA IMUNOLÓGICO

O SISTEMA IMUNOLÓGICO

A palavra imunologia é derivada do Latim immunis ou immunitas cujo significado é “isento de carga”, sendo que a carga pode referir-se a uma taxa monetária imposta ao cidadão, uma regra ou lei de restrição de direitos e liberdade, ou uma enfermidade. Indivíduos que não sucumbem a uma doença quando infectados são ditos imunes e o status de uma resistência específica a uma determinada doença é chamado de imunidade.
A imunologia é o ramo da biologia responsável pelo estudo das reações de
defesa que conferem resistência às doenças (Klein, 1990).

O sistema que defende o animal contra o ataque constante de
microorganismos é chamado de sistema imunológico (Tizard, 1995).
O sistema imunológico é fundamental para a sobrevivência do animal e, por isso, precisa atuar de forma eficiente. Existe uma grande quantidade de componentes e mecanismos distintos atuando no sistema imunológico. Alguns destes elementos são otimizados para defender contra um único invasor enquanto outros são direcionados contra uma grande variedade de agentes infecciosos.
Existe uma redundância considerável no sistema imunológico, de forma que vários
mecanismos de defesa sejam ativados contra um único invasor. Sob o ponto de vista tanto biológico quanto de engenharia, a presença de mecanismos de aprendizagem e memória são características fundamentais do sistema imunológico. Ele possui a capacidade de extrair

O Sistema Imunológico

A imunologia é uma ciência relativamente nova. Sua origem é atribuída à Edward Jenner,que descobriu, há aproximadamente 200 anos, em 1796, que a vacínia (ou cowpox), induzia proteção contra a varíola, uma doença freqüentemente fatal. Jenner batizou seu processo de vacinação, uma expressão ainda utilizada para descrever a inoculação de indivíduos sãos, com amostras atenuadas ou mortas de agentes causadores de doenças, objetivando a proteção futura contra a enfermidade (Janeway et al., 2000).
Quando Jenner introduziu a vacinação, ele nada sabia sobre os agentes infecciosos que
causam as doenças. No século XIX, Robert Koch provou que as doenças infecciosas eram
causadas por microorganismos patogênicos, cada qual responsável por uma determinada
enfermidade ou patologia. Atualmente, existem quatro grandes categorias de
microorganismos causadores de doença ou patógenos: os vírus, as bactérias, os fungos e os parasitas.
As descobertas de Koch e outros pesquisadores do século XIX possibilitaram o
desenvolvimento da imunologia, estendendo a vacinação para outras doenças. Por volta de 1880, Louis Pasteur projetou com sucesso uma vacina contra a cólera aviária e desenvolveu uma vacina anti-rábica também bem sucedida na inoculação de uma criança mordida por um cão raivoso. Tantos triunfos práticos resultaram na busca pelos mecanismos de proteção imunológica.
Pasteur, embora bem sucedido no desenvolvimento de vacinas, possuía muito pouco
conhecimento sobre os mecanismos envolvidos no processo de imunização. Ele sugeriu que organismos na vacina eram capazes de remover nutrientes essenciais do corpo e, assim,evitar o crescimento e proliferação dos agentes causadores de doença. Aproximadamente dez anos mais tarde, em 1890, Emil von Behring e Shibasaburo Kitasato demonstraram que
proteção induzida pelos processos de vacinação não se devia a remoção de nutrientes, mas estavam associadas ao surgimento de fatores de proteção no soro dos indivíduos vacinados.
Estas substâncias foram denominadas de anticorpos, as quais se ligavam especificamente e eram capazes de neutralizar os agentes infecciosos. Emil von Behring recebeu, em 19, o primeiro prêmio Nobel em medicina pelo seu trabalho sobre a produção de anticorpos
(Tizard, 1995).
Engenharia Imunológica
A primeira grande controvérsia em imunologia surgiu quando Elie Metchnikoff demonstrou em 1882, primeiro em animais invertebrados e depois nos mamíferos, que algumas células eram capazes de “comer” microorganismos. Estas células foram denominadas de fagócitos, e ele propôs que elas compunham o principal mecanismo de defesa contra estes microorganismos. Ele sugeriu que os anticorpos apresentavam pouca importância no sistema imunológico. O conflito quanto à relevância dos fagócitos e anticorpos foi resolvido em 1904 quando Almroth Wright e Joseph Denys demonstraram que os anticorpos eram capazes de se ligar a bactérias e promover a sua destruição pelos fagócitos (Tizard, 1995).
Ainda na última década do século XIX, Paul Ehrlich formulou uma teoria denominada de
teoria da cadeia lateral (side-chain theory). A principal premissa desta teoria era a de que a superfície dos glóbulos brancos ou leucócitos (células mediadoras do sistema imunológico) está coberta com diversas cadeias laterais, ou receptores, que formam ligações químicas com os antígenos encontrados (Cziko, 1995). De forma ampla, antígenos correspondem a moléculas capazes de serem reconhecidas pelo sistema imune (URL 1; Dreher, 1995; Timmis, 2000; Janeway et al., 2001). Dado qualquer antígeno, pelo menos um destes receptores seria capaz de reconhecer e se ligar a ele. A informação essencial para a produção de todos os anticorpos necessários seria providenciada pelos genes do animal.
Por esta razão, esta teoria também é conhecida como germinal (ou providencial), referindose ao conjunto total de genes (genoma) que é transmitido de um organismo ou par de organismos para seus descendentes. Ele também verificou um crescimento explosivo na produção de anticorpos após a exposição a um dado antígeno e desenvolveu uma técnica para estimar a quantidade de anticorpos no sangue. Em sua teoria, o contato com um dado antígeno seria responsável por selecionar e estimular uma célula a sintetizar aqueles receptores particulares, que seriam posteriormente secretados para a corrente sangüínea sob
a forma de anticorpos. Estas características de seleção e estimulação celulares também permitem a caracterização da teoria de Ehrlich como seletivista, uma vez que os antígenos seriam os responsáveis pela seleção de células pré-existentes cujos receptores apresentam uma alta afinidade ao estímulo antigênico (Silverstein, 1985). A afinidade corresponde a força de ligação entre moléculas como, por exemplo, um antígeno e um anticorpo. O prêmio Nobel de 1908 foi dividido por Ehrlich e Metchnikoff.
No período entre 1910 e 1930, experimentos desenvolvidos por Obermayer, Pick e
principalmente por Jules Bordet e Karl Landsteiner com haptenos artificiais (antígenos inexistentes na natureza, ou seja, artificialmente sintetizados), levaram ao abandono, por mais de meio século, da teoria seletivista de Ehrlich. Jules Bordet recebeu o prêmio Nobel em 1919 pelo descobrimento de um conjunto de proteínas que atuam juntas no ataque a formas extracelulares de agentes patogênicos. Este conjunto de proteínas foi denominado de sistema complemento, ou simplesmente complemento. Em 1930, Karl Landsteiner recebeu o prêmio Nobel pela identificação dos diferentes tipos sangüíneos, resultando no sucesso dos procedimentos de transfusão de sangue.
Entre 1914 e 1955 predominava o ponto de vista de que era inconcebível que qualquer
teoria seletivista sobre a formação de anticorpos estivesse correta (Piattelli-Palmarini, 1986). As propostas teóricas originadas no período de 1930 a 1950 foram principalmente de

O Sistema Imunológico

caráter sub-celular. As atenções se concentraram na biosíntese de moléculas de anticorpos produzidas pelas células. A conclusão foi de que o antígeno deveria trazer para a célula as informações referentes à estrutura complementar da molécula de anticorpo, introduzindo uma teoria chamada de instrucionista (template instruction theory). Os primeiros trabalhos conhecidos na linha instrucionista foram executados por Breinl e Haurowitz, e posteriormente desenvolvidos e defendidos pelo ganhador do prêmio Nobel Linus Paulin(Jerne, 1974a; Cziko, 1995). Pauling postulou que todos os anticorpos possuem a mesma seqüência de aminoácidos, mas que sua conformação tridimensional seria determinada durante a síntese por contato direto com o antígeno, que serviria como um padrão ou molde
(template).
As teorias seletivistas da formação de anticorpos foram reavivadas por Niels K. Jerne logo em seguida, nos anos 50. Jerne assumiu que uma população diversa de anticorpos naturais surge durante o desenvolvimento, mesmo na ausência de antígenos. O antígeno se combinaria através da seleção de anticorpos circulantes contendo estruturas complementares a este antígeno. A qualidade de uma resposta a um dado antígeno dependeria da concentração dos anticorpos circulantes e poderia ser melhorada pela exposição prévia ao antígeno.
Restou a McFarlane Burnet (e também a Talmage) assumir que cada célula produz e
expressa em sua superfície um único tipo de molécula de anticorpo, e que o evento seletivo é o estímulo dado pelo antígeno, sendo que aquelas células que produzem anticorpos complementares a ele irão se proliferar (expansão clonal) e secretar anticorpos. Nesta teoria da seleção (ou expansão) clonal, Burnet (1959) assumiu que a diversidade dos anticorpos era gerada por processos aleatórios, como mutação somática, durante o período pré-natal, de forma que logo após o nascimento, o animal teria um repertório fixo de anticorpos. Além disso, ele postulou a morte de qualquer célula portadora de anticorpos capazes de reconhecer antígenos próprios, denominadas células auto-reativas, durante este período de geração de diversidade (Bell & Perelson, 1978). Peter Medawar confirmou experimentalmente a teoria da seleção clonal proposta por Burnet. Estes estudos sobre como o organismo reage aos agentes externos e apresentam tolerância (ausência de reação)
às células do próprio organismo, resultaram em mais um prêmio Nobel na imunologia para Medawar e Burnet.
Em 1971, Jerne argumentou que a eliminação de células auto-reativas fornecia um
mecanismo poderoso de seleção negativa favorecendo a diversidade celular frente à
possibilidade de reconhecer antígenos muito parecidos com o próprio. Considerações sobre como os antígenos próprios, particularmente aqueles das moléculas de anticorpo,
denominados de idiotopos, poderiam afetar a geração de diversidade e a regulação das
respostas imunes, levaram Jerne a propor sua teoria da rede imunológica (Jerne, 1973,
1974a,b, 1984, 1985), que lhe rendeu um prêmio Nobel em 1984.
Mais recentemente, Susumo Tonegawa (1983) formalizou seu estudo sobre estrutura e
geração da diversidade das moléculas de anticorpo, propondo que no genoma de uma
célula germinal está contida, em múltiplos segmentos gênicos ao longo de um cromossomo, a informação genética para codificar uma molécula de anticorpo. Ele demonstrou como os anticorpos são gerados e como eles se combinam a uma grande variedade de moléculas.

Engenharia Imunológica
Dessa forma, ele contribuiu para resolver um importante dilema da imunologia: ‘Como,
partindo de um genoma finito, é possível sintetizar uma diversidade de receptores capaz de reconhecer uma variedade praticamente infinita de agentes patogênicos?’. Este trabalho garantiu mais um prêmio Nobel para a imunologia no ano de 1987.
Nos últimos anos, grande parte dos estudos em imunologia tem se concentrado nos
problemas da apoptose celular, apresentação de antígenos, citocinas, regulação e
maturação da resposta imune, memória imunológica, doenças auto-imunes, vacinas de
DNA e sinalização intra- e intercelular.
Dentre os principais desafios da imunologia para o século XXI, Abbas & Janeway (2000)
destacam o aumento da compreensão dos mecanismos de controle da resposta imune
adaptativa, de forma que seja possível convertê-la de um estado agressivo para um estado benigno em situações como resposta a alérgenos, antígenos próprios (doenças auto-imunes) e tecidos transplantados. Além disso, um aumento na eficácia das respostas a certos vírus como do HIV, malária, tuberculose e a alguns tumores também poderia ser alcançado através da manipulação da resposta imune adaptativa.

Por: Leandro Nunes de Castro

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