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7.12.2010

ESPANHA CAMPEÃ DO MUNDO


INIESTA DECIDE A COPA DO MUNDO NA PRORROGAÇÃO


Espanha, campeã de muitos passes e gols escassos, bate Holanda e conquista a taça

Iniesta decide a Copa do Mundo: a quatro minutos do fim, o gol do título (Foto: AP)
No futebol, o gol não é só um detalhe, como diz a frase erroneamente atribuída ao técnico do tetra, Carlos Alberto Parreira. Para a nova campeã do mundo, no entanto, ele não é o principal objetivo do jogo, e sim a consequência de uma estratégia e um estilo que poucas equipes são capazes de praticar. Dona da Copa do Mundo pela primeira vez em sua história, a Espanha é a campeã da posse de bola e do controle da partida – parece fazer um jogo à parte, excluindo o adversário da disputa. E foi assim que a Fúria derrotou a Holanda neste domingo, no estádio Soccer City, em Johannesburgo, por 1 a 0, no finzinho da segunda etapa da prorrogação, com gol solitário de Iniesta. Os espanhóis chegaram ao título inédito marcando apenas oito gols no torneio inteiro, a pior marca em oitenta anos de história das Copas. Ainda assim, não formam uma seleção que joga feio ou desagrada quem gosta de futebol. Pelo contrário: a Fúria sabe o que faz com a bola e fica com ela o máximo de tempo possível. Pode não ter feito a melhor campanha, mas é a justa campeã.
A final deste domingo deixou claro que o jogo de paciência e toque de bola da Fúria não é significado de futebol feio, sem talento ou chato de se ver. Os espanhóis foram os donos do jogo durante 120 minutos, e só não marcaram antes por causa das circunstâncias da partida. A adversária nesta decisão, que carrega a fama de sempre montar equipes que apresentam futebol vistoso e de se admirar, se limitou aos contragolpes – e às faltas violentas, que renderam aos seus atletas nada menos que nove cartões amarelos no decorrer do duelo. Quando a partida se encaminhava para uma injusta disputa de pênaltis, Iniesta, um dos símbolos da maneira espanhola de jogar, apareceu para resolver o jogo. A Espanha torna-se o oitavo país a conquistar uma Copa, e logo em sua primeira final. É também o primeiro europeu a conquistar a taça fora de seu continente. Por fim, é a nova líder do ranking da Fifa, desbancando o Brasil. Atual campeã europeia e agora campeã do mundo, está no topo do futebol mundial.
A Espanha já começou o jogo assustando, com um golpe de cabeça perigoso de Ramos, aos 5 minutos, após falta batida por Xavi. Stekelenburg espalmou. A Holanda deu seu primeiro chute a gol aos 8, com Kuyt, aproveitando uma bobeada da zaga. Casillas segurou com facilidade. Mas a Fúria dominava o jogo, marcando a saída de bola holandesa e sufocando o adversário. O jovem Pedro, que fez apenas sua segunda partida como titular da Espanha, se entendia perfeitamente com Villa – sinal de que Vicente del Bosque já poderia ter colocado a revelação do Barcelona no time muito antes. Sergio Ramos, aos 11, e Villa, aos 12, deram novos sustos nos holandeses. Aos 18, Sneijder bateu falta e soltou uma bomba. Casillas encaixou de novo. Aos 21, Robben deu sua primeira arrancada e acendeu a equipe laranja, que começou a equilibrar as ações. O jogo era disputado com muito vigor – só na metade do primeiro tempo foram mostrados quatro cartões amarelos, dois para cada lado.
O que era rispidez se transformou em violência aos 27 minutos, quando o volante De Jong acertou uma patada em cheio no peito de Xabi Alonso. Levou só o amarelo. Não era só De Jong que perdia a paciência: a seleção espanhola controlava a partida no seu ritmo, com toques envolventes e precisos, sem pressa para resolver as jogadas. A Holanda, frustrada por não conseguir se impor, só conseguia chegar perto do gol espanhol em lances de bola parada – como num escanteio aos 37, jogada ensaiada que deixou Mathijsen na cara do gol. O zagueiro furou feio. No resto do tempo, o domínio todo espanhol, com controle do andamento do jogo e constante domínio da bola, principalmente nos pés da dupla Xavi e Xabi, escoltada pelo eficiente Busquets. Já nos acréscimos do primeiro tempo, a Holanda ainda arrumou uma rara chance de gol, em chute cruzado de Robben que Casillas jogou para escanteio. Os espanhóis terminavam a primeira etapa com 56% de posse de bola e 268 passes, com 75% de acerto (a Holanda deu 195 e acertou só 55%).
O primeiro lance de perigo do segundo tempo foi dos espanhóis, num desvio de cabeça de Puyol que o ataque da Fúria não soube aproveitar. A Holanda voltou a campo claramente instruída a manter a bola em seus pés por mais tempo. Mas é difícil superar a Espanha no jogo dela. E enquanto a Fúria trocava passes, a Holanda entrava duro – aos dez do segundo tempo, já tinham cinco amarelos. Aos 15, Pedro deixou o campo para a entrada de Jesus Navas. E dois minutos depois, a Holanda perdeu a chance mais incrível de toda a partida. Sneijder, em lançamento magistral, deixou Robben sozinho na cara do gol – e ele conseguiu perder, batendo em cima de Casillas. Mas foi só um acidente: a entrada de Navas deixou a Espanha ainda mais perigosa. Aos 24, em uma descida rápida de Navas, a bola sobrou para Villa na entrada da pequena área, e ele quase abriu o placar. Aos 31, numa linda tabela com Xavi, Villa deu trabalho mais uma vez. Stekelenburg mandou para escanteio, e na cobrança, Sergio Ramos subiu livre e testou pelo alto.
Nos minutos finais da partida, a Espanha avançou suas linhas, reforçou a pressão e costurou várias oportunidades. Passou por outra situação crítica quando, depois de um chutão da defesa, Robben se enfiou entre os zagueiros, ganhou na corrida da dupla Piqué e Puyol e invadiu a área. Quando preparava o chute, teve a bola roubada de seus pés por Casillas, numa saída corajosa. A cinco minutos do fim, Xabi Alonso deu lugar a Fabregas, outro craque em controlar a partida e trocar passes até abrir uma defesa dura de ser batida. E com ele em campo, a Fùria seguiu com maior domínio do jogo até o fim, mas sem conseguir marcar. Pela segunda vez consecutiva, a decisão da Copa ia para a prorrogação. No tempo extra, o ritmo da partida seguiu o mesmo, e a Espanha esteve muito perto de marcar aos 6 minutos, quando Fabregas foi lançado por Iniesta e, frente a frente com o goleiro, jogou fora uma chance de ouro. Aos 8, foi a vez de Iniesta ficar na cara do gol e perder a oportunidade. Vieram outras, com Navas e Fabregas.
Na virada da primeira para a segunda metade da prorrogação, o artilheiro Villa deu lugar a Fernando Torres, que começou esta Copa como titular mas perdeu a posição por causa de suas atuações decepcionantes. Aos 4 minutos da prorrogação, o zagueiro Heitinga fez falta em Iniesta na entrada da área e levou seu segundo amarelo. Com dez em campo, a Holanda tinha pouco mais de dez minutos para segurar o empate e tentar levar o título nos pênaltis. Não conseguiu. Aos 11 minutos da segunda etapa da prorrogação, num contragolpe, Fernando Torres lançou pata a área, a zaga rebateu e Fabregas pegou o rebote, lançando para Iniesta, sozinho, enfim abrir o placar, faltando apenas quatro minutos para o fim do jogo. Titulares e reservas da Espanha invadiram o gramado para dar início à festa, que promete seguir noite adentro – em Johannesburgo, em Barcelona e em Madri.

A primeira Copa do Mundo que não teve pelo menos uma das quatro seleções mais famosas do planeta na final (Brasil, Itália, Alemanha e Argentina) terminou com o surgimento de uma nova grande força – e com sinais preocupantes de decadência para duas outras. Também adiou mais uma vez uma revolução há muito esperada: a ascensão dos africanos ao grupo das grandes seleções. A seguir, quem mais ganhou e quem mais perdeu no primeiro Mundial disputado no continente africano:
SOBEM:
A Espanha, campeã mundial, não conseguiu apenas sua primeira taça. Foi também uma vencedora de Copa com estilo próprio, que conseguiu conquistar o Mundial jogando de uma forma muito diferente das adversárias – o que promete influenciar outros times, sinal de que é, de fato, candidata a potência da bola. Atual campeã europeia e mundial, subiu ao primeiro escalão do futebol.
A Holanda, vice, apesar da nova derrota em finais – sua terceira na história -, provou mais uma vez sua força. Isso apesar de não ter trazido à África do Sul uma geração especialmente talentosa (já tinha vindo à Copa com equipes muito melhores, mas se deparou com gigantes como o Brasil e a Alemanha no caminho). Falta, ainda, o salto final, com a conquista do primeiro troféu.
O Uruguai dificilmente repetirá o desempenho deste Mundial nas próximas competições, pois foi bem mais longe do que seu time permitia sonhar. Mas a campanha sensacional e o quarto lugar conquistado na África recolocaram o nome do país bicampeão no mapa da bola. Ainda valorizaram jogadores que não tinham o reconhecimento que mereciam, a começar pelo Bola de Ouro Forlán.
NA MESMA:
O Brasil repetiu a campanha de 2006, com uma derrota nas quartas-de-final. Não foi uma total surpresa, pela forma que o time vinha jogando até aquele momento. A seleção mais vencedora da história segue com o mesmo desafio: conseguir se organizar para aproveitar totalmente todos os talentos que tem à disposição. E a missão terá de ser cumprida em casa, dentro de quatro anos.
A Alemanha trouxe uma novidade à África: um estilo de jogo mais leve, criativo e bonito de se ver. Influência de uma preciosa safra de jovens craques, essa mudança no jeito de jogar não deu o resultado esperado: como em 2006, a seleção caiu na semi. Não levanta um título há vinte anos. Precisa desencantar para alcançar o patamar da Itália – e sonhar em chegar no do Brasil.
As seleções africanas seguem com a mesma fama. São cheias de talentos individuais, mas não conseguem formar seleções campeãs, nem mesmo quando têm uma inédita chance de jogar em casa. Seus craques já disputam os campeonatos mais importantes do mundo, mas faltam organização e estrutura nas próprias federações locais. Continuam sonhando em alcançar uma inédita semi numa Copa.
DESCEM:
A França foi o grande fiasco do Mundial. Chocou os torcedores e especialistas ao apresentar um futebol paupérrimo, sem rosto nem organização, apenas quatro anos depois de chegar à final da Copa. Para completar, deu vexame com as brigas entre técnico, jogadores e dirigentes. Começa a dar pistas de que o título de 1998 e o vice de 2006 foram só milagres do supercraque Zidane.
A Itália, assim como a França, caiu logo na primeira fase, mas pelo menos teve comportamento digno – faltou mesmo futebol. Os italianos trouxeram à África do Sul uma equipe que mesclava jovens jogadores e remanescentes da conquista de 2006. Não deu o resultado previsto. Carece de boas revelações, mas pode estar atravessando apenas uma etapa de transição entre duas gerações.
A Inglaterra perdeu uma chance de ouro de se confirmar entre as grandes campeãs. Contava com um técnico experiente e famoso por ganhar a qualquer preço; tinha uma equipe cheia de astros no auge, como Rooney, Terry e Gerrard; caiu numa chave fácil. Não adiantou: foi atropelada pela Alemanha. Como a França, ela é uma ex-campeã que parece não pertencer ao primeiro escalão.
Por Giancarlo Lepiani, de Johannesburgo

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