Bichanos com Aids

Vírus da imunodeficiência infecta gatos e vacina aprovada nos EUA chega às farmácias em junho

EDNA DANTAS

Vira-lata de aproximadamente 8 anos, o robusto Ruivo começou a perder peso há um mês. Não bebia nem comia nada. Até a sardinha desidratada, sua refeição predileta, sobrava no prato. Teve febre e problemas de fígado. A professora universitária Vera Lúcia Saikovitch fez o que pôde para aliviar o sofrimento do gatinho, recolhido das ruas quando ainda era bebê. Levou o bichano ao veterinário, bancou exames de sangue, ultra-sonografia e internação. Gastou R$ 400. A queda drástica da taxa de linfócitos apontou o caminho para um teste — e o diagnóstico assustador: Ruivo é portador do vírus da imunodeficiência felina (FIV), a Aids dos gatos. Cálculos muito preliminares indicam que um em cada seis gatos no Brasil seja portador da doença. O FIV é parente do HIV, o vírus da Aids humana. No entanto, não afeta as pessoas. "Os sintomas são muito parecidos e a evolução da doença segue quase o mesmo caminho", explica a professora Heloisa Justen Moreira de Souza, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). A diferença é que, para o vírus dos bichos, já existe uma vacina, aprovada no mês passado pelo governo americano. Ela deverá chegar às farmácias em junho. Infelizmente, ainda não protegerá contra todas as formas do FIV. Na fase aguda, o animal portador do vírus tem febre, tosse, anemia, problemas de pele e gânglios pelo corpo. Em outro estágio parece curado. É a fase assintomática. No estágio terminal, uma simples infecção oportunista pode levá-lo à morte. Ruivo está na fase inicial e deve, por escolha de sua dona, ser tratado com AZT, que pode render-lhe mais quatro anos de vida.
São mais suscetíveis à doença os gatos de rua e aqueles domésticos que saem freqüentemente de casa. O principal meio de transmissão da doença, diferentemente do que ocorre com o ser humano, não é sexual. São as brigas, com arranhões e mordidas, nas quais sangue e saliva de um gato entram na corrente sanguínea do outro.
Uma pesquisa da UFRRJ mostrou que, em um grupo de 126 animais testados, 18,2% eram portadores do vírus. "O diagnóstico precoce ajuda a garantir uma sobrevida maior, porque permite tratamentos com AZT e Interferon Alfa", explica a professora Heloisa. No Brasil, porém, quase ninguém faz esses exames. O maior distribuidor de kits de diagnóstico, a Bio-Brasil, vende por mês cerca de 100 unidades para uma população estimada de 13 milhões de gatos, dos quais apenas 700 mil freqüentam veterinários.