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3.15.2011

Comissão da Verdade

No dia de hoje (15), em que a Comissão de Anistia completa 10 anos de existência no Brasil, o Ministério da Justiça (MJ) promoveu uma homenagem quando da concessão de anistia para quatro mulheres que lutaram pela democracia do país na ditadura militar. A sessão para o julgamento dos pedidos ocorreu de forma pública, no Salão Negro do MJ, depois dos discursos oficiais da 13ª Anistia Cultural. O ato foi para simbolizar o sofrimento de todos os perseguidos políticos do regime de exceção e também a participação das mulheres na defesa dos Direitos Humanos no mês do Dia Internacional da Mulher (8 de março). Como tema nada secundário havia o reforço à necessidade da aprovação de uma Comissão da Verdade no Brasil.
Antes das falas oficiais, foi exibido ao público um vídeo produzido pelo governo federal com depoimentos de mulheres brasileiras vítimas de tortura e presas políticas em 1964. Os relatos trouxeram lágrimas às testemunhas que estavam na plateia. “Choques elétricos nos ouvidos e genitálias, cortes nos bicos dos seios, exposições públicas de nudez, casas fuziladas e prisão”. Estes foram os principais métodos descritos no vídeo usados para aniquilar ou torturar mulheres durante a ditadura.
Para a presa política Sônia Hipólito, acusada em 1968 de participar de um congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), a homenagem não serviu como reparação, mas não por ser insuficiente, e sim pela consciência de que o que fez não foi algo errado que careça ser reparado. “O que eu fiz foi por eu ter certeza de que era a minha batalha naquele momento. Eu sabia os riscos que eu corria. Eu tive a oportunidade de lutar pela democracia do meu país. Não queria ser reparada por nada”, disse Sônia sobre a anistia que recebeu no evento.
Sônia foi colega de cela no presídio de Tiradentes, da então militante Dilma Rousseff. Ela foi uma das presas políticas que a presidenta fez questão de que comparecesse a sua posse. E ela conta o orgulho da companheira: “É muita emoção. Nós éramos jovens quando dividimos cela. Ela desde lá batalhava e hoje está na presidência da República e poderá garantir os direitos que tanto lutamos, para todos”.
Primeiro a falar, devido a necessidade de comparecer a cerimônia de instalação do Fórum Direitos e Cidadania, a pedido da presidenta Dilma Rousseff, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo salientou a importância de realizar eventos que valorizem a luta dos perseguidos políticos para manter viva a memória do período de exceção para que ele nunca mais aconteça. “A capacidade de lembrar-se do passado é o que nos diferencia dos animais. O ser humano lembra e pauta suas ações presentes. A história pauta o futuro. Por uma busca de justiça de outros momentos da história, realizamos este evento”, disse.
Sobre a opressão e a tortura que marcaram o regime militar de 1964, ele considerou o período como inesquecível sob perspectivas que considerou “odiosas”: o preconceito contra a mulher e contra a liberdade humana. E resumiu o dever do estado na reparação dos erros do passado na garantia da indenização e anistia às vítimas daquele tempo.
À imprensa, Cardozo explicou sua argumentação. “Estamos cumprindo um dever histórico, temos que arcar com os erros do passado. A anistia significa isso. O estado de direito tem que cumprir as regras atuais, mas sem esquecer o passado. A anistia não pode sofrer acusações de ser um gasto público desnecessário ou um ato ilegal ou imoral”, disse sobre as críticas já disparadas por setores que consideram a Comissão de Anistia um “escritório de indenizações”.
10 anos da Comissão de Anistia
Em continuidade à cerimônia, o secretário nacional de Justiça, Paulo Abrão explicou a funcionalidade e os méritos do espaço que completa 10 anos nesta terça-feira, 15. Na Comissão de Justiça, que funciona junto ao prédio do Ministério da Justiça, são julgados processos daqueles que resistiram ao autoritarismo do regime militar. Em sua maioria, são anônimos que deram a vida pela democracia e aguardam por reconhecimento e indenização pelos danos que sofreram.
A criação da Comissão foi avaliada por Paulo Abrão como um passo significativo no processo de redemocratização do Brasil. “Diante de um cenário anterior de negação das atrocidades e das violações, romper com o discurso da ditadura e da resistência faz com que a Comissão sofra um pouco rejeição. Mas, aos poucos vamos incorporar a recuperação dos direitos humanos nos discursos da sociedade, que até então desconhecia este pedaço da nossa história”, argumentou.






Sentença do Caso Araguaia
O secretário nacional de Justiça, Paulo Abrão, também lembrou que existem outros processos em aberto para o acerto de contas do estado brasileiro com as vítimas de sua história. Ele citou o caso dos desaparecidos da região do Araguaia, no sul do Pará, entre 1969 e 1974.
No dia 14 de dezembro de 2010, duas semanas antes da troca presidencial no Palácio do Planalto, o Brasil foi condenado por crimes praticados durante a ditadura militar que sufocou o país entre 1964 e 1985. Por unanimidade, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) decidiu reconhecer a responsabilidade do Estado brasileiro na prisão, tortura, morte e desaparecimento forçado de 70 camponeses e guerrilheiros caçados pelas forças militares brasileiras nas matas da região do Araguaia.
“Não tenho dúvida que a sentença deve ser cumprida na íntegra. Ela dispõe de obrigações dos distintos poderes. O Executivo deve terminar o processo de reparação às vítimas, levar adiante a construção do Memorial da Anistia e criar políticas públicas de memória e reparação. Cabe ao Legislativo aprovar a Comissão da Verdade e ao judiciário interiorizar os fundamentos da decisão da Corte Interamericana sobre o tratado de proteção judicial das vítimas e garantia dos direitos humanos”, explica Paulo Abrão.
Aprovação da Comissão da Verdade em 2011
O tema consensual durante os discursos de representantes do executivo, legislativo e judiciário na 13ª Anistia Cultural foi a instalação de uma Comissão da Verdade para investigar os casos de perseguidos políticos no Brasil. O tema já virou proposta de projeto de lei no Congresso Nacional, apresentado pela ministra Maria do Rosário, da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos.
A deputada federal Luiza Erundina (PSB – SP ) salientou o atraso do Brasil neste processo e a importância da sociedade na exigência da aprovação da Comissão da Verdade no Congresso Nacional. “Esta é uma agenda prioritária. Outros países já concluíram o trabalho de investigação da verdade ou pelo menos já tem suas comissões. Precisamos corrigir nossas injustiças, de dor, desaparecimentos, torturas, exílios…”, relatou.
Para o secretário nacional de Justiça, Paulo Abrão, o interesse presidencial será importante para a aprovação da Comissão, que ele acredita que será aprovada ainda em 2011. “Estou otimista. Mas a sociedade tem que se mobilizar e dialogar com os representantes na Câmara Federal”, disse sobre a necessidade de monitoramento do tema junto aos deputados federais.
Carta Capital

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