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10.14.2011

Vacinas são as novas arma contra o câncer

Câncer Steve Jobs em lançamento do iPad 2. Reprodução do Engadget
RIO - O gênio da Apple, Steve Jobs, foi diagnosticado com câncer de pâncreas em 2004. O mesmo aconteceu, em 2007, com o cientista canadense Ralph Steinman - um dos agraciados com o Prêmio Nobel de Medicina de 2011, morto semana passada. Ambos descobriram que a estimativa de vida de alguém com câncer de pâncreas costuma ser de seis meses. Mas Jobs e Steinman tiveram tipos diferentes de tumor.
No caso de Jobs, houve um pouco de sorte, em meio ao diagnóstico sombrio: em novos exames, os médicos viram que o executivo da Apple sofria de um tipo raro de tumor de pâncreas, em que a expectativa de vida é maior. Já o canadense descobriu que sofria da forma mais letal de câncer de pâncreas. Para Jobs, havia opções de tratamento. Steinman, porém, precisou inventar alternativas para o seu caso: pesquisou as vacinas terapêuticas, que lhe permitiram ter quatro anos de sobrevida.
Os estudos em imunologia revolucionaram tratamentos de várias doenças. Investigações que levaram à produção de fármacos contra diversos tipos de câncer, entre eles as drogas alvo (que atacam alterações específicas das células malignas, poupando as saudáveis) e vacinas terapêuticas, que despertam as defesas do organismo contra os tumores.
Steinman descobriu as células dendríticas. Elas têm a capacidade exclusiva de ativar os linfócitos T, essenciais na formação de uma memória imunológica contra intrusos. A partir daí, foi possível criar fármacos específicos. E ele se beneficiou disso para controlar o seu câncer de pâncreas. Este órgão - de 15cm em formato de pera - fabrica a insulina - importante para manter o nível de açúcar.
Ralph Steinman, ganhador do Nobel de Medicina morreu de câncer/ Reuters
O maior problema é que o câncer de pâncreas, traiçoeiro e fatal, só apresenta sintomas quando já avançou. Há vários tipos, mas o mais comum (95% dos casos) é o exócrino, o adenocarcinoma, igual ao de Steinman. O tumor de Jobs era neuroendócrino, caso de 1% dos pacientes e com expectativa de vida de 5 a 10 anos.
Se Steinman e Jobs fossem brasileiros, só o executivo da Apple teria chance de igualar o tempo de sobrevida que teve nos EUA. Tratamentos de ponta são pouco acessíveis a brasileiros. E vacinas terapêuticas não estão disponíveis aqui para casos como o de Steinman. O médico Daniel Herchenhorn, chefe do Serviço de Oncologia Clínica do Hospital do Câncer do Instituto Nacional de Câncer (Inca), acredita que só Jobs teria a mesma sobrevida no Brasil.
- O tumor neuroendócrino de pâncreas, apesar de poder apresentar comportamento agressivo, muitas vezes é mais lento. Pode atacar, além do pâncreas, apenas o fígado. Então um transplante deste órgão é tentado, o que de fato ocorreu com Jobs - diz.
O câncer de Jobs é controlado com combinações de quimioterapia ou fármacos especiais, chamados de terapia com radiofármacos, explica Herchenhorn. Nesse caso, um elemento químico (o lutécio, por exemplo), aplicado na veia, localiza e destrói células malignas. Apesar de raros, os radiofármacos podem ser encontrados em centros de referência aqui, como Inca e o Instituto do Câncer do Estado de São Paulo.
A maior promessa no tratamento do câncer são as vacinas terapêuticas. Não são preventivas, e sim usadas durante o tratamento. A pessoa já sofre de câncer e a vacina vai ajudá-la a combater o tumor. Ela carrega antígenos, que estimulam a defesa do organismo contra proteínas, que, em geral, são parte do material genético do tumor.
Essas vacinas, diz Herchenhorn, vêm sendo testadas há décadas, mas poucas foram aprovadas. É preciso ter mais estudos de eficácia. Para o câncer de próstata, existe a Provenge, nos EUA, que custa mais de US$ 90 mil cada aplicação e precisa ser manipulada na fábrica.
- Por ter pouco impacto na doença, não costuma ser usada em outros países, nem no Brasil - afirma o oncologista. - Há outra vacina, contra o câncer de pele mais grave, o melanoma. A ipilimumabe, de aplicação na veia a cada três semanas, quatro doses, que estimula os linfócitos T, e está em fase de aprovação no Brasil - diz Herchenhorn, que testa uma vacina cubana para estimular a imunidade contra câncer de pulmão, em casos criteriosamente selecionados.
Também o oncologista Ricardo Teixeira, diretor da Clínica Oncohemato, aposta nas aplicações das vacinas contra câncer.
- Ainda são protocolos de pesquisa e as mais estudadas são em câncer de pele, rim e próstata. Os resultados, até agora, são pobres - diz Teixeira.
Alexandre Palladino, do Centro de Oncologia da Rede D' Or, acredita que as vacinas podem fazer a diferença:
- O mecanismo de ação das vacinas é complexo, mas a proposta é aumentar a atividade do sistema imunológico contra o tumor. Por enquanto não fazem parte da prática clínica.
Carlos Gil Ferreira, coordenador do Serviço de Pesquisa Clínica do Inca, é mais otimista. Ele lembra que, na década 70, pensava-se que a imunoterapia fosse a saída para o tratamento oncológico, mas os resultados nas décadas 80 e 90 não foram bons. Agora, com o avanço de pesquisas como a de Steinman, o quadro começa a mudar.
- Muitas das terapias imunológicas, como as vacinas complementando a quimioterapia no câncer, hoje são baseadas nas células dendríticas - explica - As vacinas contra câncer são promissoras e acredito que estarão disponíveis nos próximos anos. Acontece que o câncer é uma doença complexa e não tem uma solução única para todos. Ele continuará a se tratado com quimioterapia, radioterapia, terapia-alvo e vacina, dependendo de cada caso - diz.
Há pesquisas com novos tratamentos oncológicos em dezenas de centros no Brasil, como Inca e Icesp, da rede pública. Esses estudos devem ser questionados pelos pacientes e discutidos com os médicos. Isso porque nem todos se enquadram nos critérios para as terapias experimentais. Para saber mais, há o site www.clinicaltrialsbrazil.com, em português.
O Globo
Antônio Marinho (amarinho@oglobo.com.br)

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