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4.13.2012

Crianças deficientes podem fazer tudo

Blitz sensorial

Com a ajuda de três pequenos repórteres especiais, exploramos a cidade e descobrimos onde o caminho é livre para a diversão de crianças com deficiência


Fernanda Araujo (com reportagem de Bernardo Leal Pereira, Ian Souto Izidoro e Wagner Morais Ale) - Divirta-se

Ian Izidoro se diverte no Parque da Xuxa, em São Paulo - Marcos Bizzotto/AE
Marcos Bizzotto/AE
Ian Izidoro se diverte no Parque da Xuxa, em São Paulo
Crianças deficientes podem fazer tudo - só precisam de uma mãozinha. Estendemos a nossa a três pequenos repórteres especiais para avaliar (um pedaço) da cidade
São 24,5 milhões. Esse é o tamanho da nossa dívida, que não tem nenhuma relação com dinheiro - é muito mais valioso. Esse número representa a quantidade de deficientes físicos brasileiros. Devíamos a eles uma avaliação, do ponto de vista de acessibilidade, de bons programas para fazer em São Paulo. E começamos por onde a vida começa: na infância.
Para cumprir a tarefa, reunimos uma equipe formada por três crianças - um cadeirante, um deficiente auditivo e um visual - acompanhados de seus pais. Foi deles a tarefa de avaliar a estrutura, as atrações e o atendimento em museus, parques, cinemas e até uma fazendinha.
Em dois meses e meio descobrimos que há poucos banheiros exclusivos para deficientes, nenhuma indicação em Libras e raríssimas atrações com audiodescrição.
Contornando barreiras como essas, juntos montamos um mapa que indica onde o caminho é livre para a diversão na cidade. E escolhemos este fim de semana, em que ocorre a Reatech - Feira Internacional de Tecnologias em Reabilitação, Inclusão e Acessibilidade, para apresentá-lo. E não vamos parar por aqui. A cidade é grande e ainda há muito a explorar.
Expedição científica
No Catavento, dia 7 de fevereiro, a experiência virou brincadeira, que virou conhecimento (mas só em alguns casos), pois o desafio, cumprido com mérito, foi se divertir.
250 atrações, muitas delas interativas, ocupam os 8 mil m2 do Catavento Cultural e Educacional.
150 milhões de quilômetros é a distância da Terra até o Sol, astro cuja réplica pode ser tocada por deficientes visuais.
98 metros é a extensão da faixa de paralelepípedos que o cadeirante tem de (tentar) percorrer entre o estacionamento e a rampa de acesso principal.
8 é o número de letras da palavra peixe-boi que Wagner, de tão encantado com os animais da Sala da Vida, conseguiu pronunciar.
ZERO foi a quantidade de funcionários que ofereceram ajuda a Bárbara e Bernardo quando foram ao Museu sem a reportagem.
 
Laudo da equipe:
Ótima estrutura física.
Há atrações acessíveis, inteligentes, modernas e criativas.
Além de rampas de acesso, tem dois elevadores (na bilheteria e Sala da Vida).
-
A maioria dos funcionários não está preparada para receber deficientes.
Falta um bom intérprete de Libras entre os guias.
Há poucas informações em braille e audiodescrição.
+/-
Estacionamento para deficientes sem recuo para desembarque e de difícil acesso à bilheteria.
Monitoria especial só atende a grupos de, no mínimo, 20 pessoas.
Não há sanitários do tipo ‘família’ para deficientes.
Pq. Dom Pedro II, s/nº, Centro, 3315-0051. 9h/17h (fecha 2ª). R$ 6. Deficientes pagam R$ 3.

Show de bola
Com três garotos na equipe, o Museu do Futebol foi vibrante, revelou um excelente time de educadores e fez do passeio, no dia 15/2, uma partida memorável
Laudo da equipe
+
Tem um excelente projeto, o ‘Deficiente Residente’, em que funcionários com necessidades especiais trabalham temporariamente no museus, para ajudar a tornar as atrações cada vez mais acessíveis.
Há dois elevadores, um deles especialmente projetado para cadeirantes.
Não é preciso reunir um grupo para fazer o passeio dirigido a visitantes especiais (recomenda-se reservar).
Tem audioguia.
-
Na sala dos divertidos pebolins as mesas são altas demais. 
+/-
Algumas portas, entre uma sala e outra, são giratórias - o que dificulta um pouco a passagem da cadeira de rodas.
Estádio do Pacaembu. Pça. Charles Miller, s/nº, Pacaembu, 3664- 3848. 9h/17h. R$ 6 (grátis 5ª). Deficientes não pagam



Danado de bom

O dia 21 de fevereiro, no Pet Zoo, ficou marcado pela surpresa. A fazendinha foi divertida, como se espera (teve até voo de tirolesa), e acessível como seria difícil de imaginar.
Laudo da equipe
+
Dispõe de serviço de monitoria para todos os grupos aproveitarem melhor o passeio.
O terreno é relativamente plano, com caminho de chão batido, coberto por uma fina camada de pedriscos - o que não chega a ser propriamente um obstáculo para as cadeiras de rodas.
Tem um banheiro exclusivo para deficientes: com espaço, inclusive, para estacionar a cadeira de rodas ao lado do vaso sanitário.
É possível tocar em quase todos os animais.
-
Não há estacionamento para deficientes. Aliás, não há estacionamento: os carros param no calçadão da fazendinha.
Ninguém fala Libras.
Estr. de Caucaia do Alto, 4.101 (acesso pela Rod. Raposo Tavares, Km 39), Cotia, 4158-1664. Sáb. e dom., 10h/17h. Entrada: R$ 25. Almoço: R$ 33, adulto; R$ 18, crianças. Tirolesa: R$ 5.

Caverna do tesouro
Além do maior T-Rex da América Latina, vimos outras raridades no Sabina, em 23/2: espaço 100% acessível e o melhor grupo de funcionários para turmas especiais.
Laudo da equipe
+
Do estacionamento às atrações, o local é totalmente acessível.
Para todos os monitores e educadores foi oferecido o curso básico de Libras. Além disso, ali trabalham pelo menos três funcionários fluentes na língua.
Todos os funcionários demonstram estar aptos a lidar com os diferentes tipos deficiências, Eles são solícitos e sem preconceito.
+/-
Não há sanitários do tipo ‘família’ para Deficientes.
R. Juquiá, s/nº (entrada na altura do nº 135), Paraíso, S. André, 4422-2000. 12h/18h (fecha 2ª). R$ 10 (grátis para crianças de até 5 anos).




Tipo exportação

Único museu com galeria tátil no Brasil, a Pinacoteca possui programa para públicos especiais e prova, em vários suportes, que a arte é acessível para todos.
 
Laudo da equipe
+
Tem o melhor modelo de acessibilidade cultural da cidade - e exporta este conhecimento para outras instituições, como o Museu do Futebol.
Há o Programa Educativo Públicos Especiais (Pepe), com releituras de obras em quatro criativos recursos de acessibilidade, distribuídos em três carrinhos batizados de Pepe-móvel. Entre eles, O Caipira Picando Fumo e O Violeiro, ambos de Almeida Júnior; O Mestiço, de Portinari; e São Paulo, de Tarsila do Amaral.
A única galeria tátil do Brasil.
Emprega funcionários deficientes, como a monitora Sabrina, surda de nascimento, no museu há 4 anos.
+/-
O tom sisudo da monitoria. Falta certa flexibilidade para lidar com crianças deficientes. Antes de sair da casa, vale estudar bem as dez recomendações listadas em ‘Dicas para sua visita’, no site do museu, pois os educadores fazem questão de chamar a atenção cada vez que as crianças se aproximam de quebrar algumas das regras.
Pça. da Luz, 2, Luz, 3324-1000. www.pinacoteca.org.br. 10h/17h30. R$ 6 (grátis, sáb.). Deficientes não pagam.

Água viva
Com cascos, guizos e peles para olhar e sentir, além da experiência de ‘ver com as mãos’ pelo menos dois animais, o Aquário surpreendeu e encantou no dia 6 de março.
 
Laudo da equipe
+
Há sempre um monitor para acompanhar os deficientes que, normalmente, é a ótima educadora ambiental Bianca Cavalcanti, há cinco anos no Aquário.
Há um carrinho de educação ambiental com vários elementos que os monitores oferecem para serem tocados ao longo do passeio. Entre eles, ovos e casco de tartaruga, pele e guizo de cobras, um cavalo marinho e a pele da pata de um teiú.
Nos passeios com deficientes visuais, os monitores selecionam dois animais para serem tocados pelos visitantes. A experiência, realizada na ‘Copa de Manejo’, geralmente é realizada com uma cobra e com um dragão barbudo.
Há elevador de acesso ao piso dos mamíferos e ao cinema 4D.
Tem banheiro exclusivo para deficientes.
-
Não há nada em braille ou com audiodescrição.
Ninguém se comunica em Libras, nem há sinalização nesta linguagem.
R. Huet Bacelar, 407, Ipiranga, 2273- 5500. 9h/18h. R$ 40 (R$ 20, crianças; R$ 20, toda 2ª, preço único). Cinema 4D, pago a parte, R$ 5. Deficientes não pagam.
Banquete ou aula
Acertar o ponto foi complicado, mas, no dia 10 de março, tivemos uma saborosa experiência - graças à boa vontade e ao talento da equipe dos Chefs Especiais.
Duas colheres de boa vontade e uma dose de persistência. Esses foram os ingredientes usados em nossa aula de culinária. Mas, como se sabe, ingredientes de qualidade nem sempre são fáceis de achar. Após ouvir a recusa de várias escolas (devido à inacessibilidade do espaço ou à falta de capacitação), Beth Kovesi indicou o casal Simone e Márcio Berti, da equipe dos Chefs Especiais (http://www.chefsespeciais.blogspot.com.br/), que dá aulas de cozinha gratuitas para pessoas com Síndrome de Down. Mesmo sem muita experiência com outras deficiências, eles toparam o desafio e ainda pediram reforço a especialistas para planejar a melhor maneira de por a aula em prática.
Até uma atividade sensorial o casal organizou para testar as limitações de cada um - e como lidar com elas. A escola Mais Gourmet cedeu o espaço e o chef Alessandro Segato topou o convite para se juntar à turma. Simone, porém, foi muito criteriosa: exigiu que o evento fosse estendido para mais três crianças. Para atender ao seu pedido, depois de encarar a burocracia de um famoso instituto para deficientes, conhecemos Patrícia, da ONG Vidas, que prontamente, indicou o cadeirante Gabriel Goloni Lolo, de 10 anos, e a deficiente auditiva Kelly Vitória Ribeiro da Silva, de 8 anos.
Para fazer dupla com Ian convidamos sua amiga Pâmera Nátali Dall'Agnol Rosembrá, de 11 anos. Para montar o cardápio da aula, Simone investigou os hábitos alimentares dos alunos, providenciou uniformes, ligou para as mães para instruí-las e garantiu que tudo saísse perfeito. E saiu! Pena que a próxima aula ainda não tenha data definida. O objetivo, agora, é levantar recursos para o Instituto Chefs Especiais, que esta semana ganhou sede na Praça Benedito Calixto. Só assim será possível realizar atividades com outras turminhas. Esperamos que elas possam ter a mesma sorte que a nossa - e muito em breve!
Laudo da equipe
+
Nossas crianças também podem cozinhar - basta um pitada de boa vontade.
Bê, de baixinho
Descabelados, suados e felizes, dia 23/3 concluímos que o Parque da Xuxa é bastante zeloso, mas precisa melhorar a acessibilidade - e tem potencial para isso.
 
Laudo da equipe 
+
Plano, com boa distância entre os brinquedos, o parque é bastante acessível aos deficientes físicos.
Tem banheiro de uso exclusivo para cadeirantes, independente dos sanitários femininos e masculinos.
Serviço de segurança impecável: equipe especializada indica os brinquedos que os deficientes podem e não podem ir - e deixam claros os motivos.
-
Apesar de Xuxa, dona do espaço, ser a pioneira do uso da linguagem de sinais nos meios de comunicação, não há shows ou atrações traduzidas em Libras.
Não há nada em braile ou audiodescrição.
+/-
Marcelo Beraldo, gerente geral do parque, pediu para ouvir as impressões de nossa ‘equipe de investigadores’ após a visita e disse que irá estudar alguma alternativa de inclusão para os deficientes auditivos.
Shopping SP Market. Av. das Nações Unidas, 22.540, Interlagos, 5541-2530. 6ª, 10h30/16h30; sáb., dom. e fer., 11h/19h. R$ 60, crianças e adultos. Deficientes não pagam.

Palhaçada (triste)
No Circo dos Sonhos, dia 29/3, o que deveria ser só alegria transformou-se em pesadelo: foi o mais inacessível dos passeios avaliados por nossa equipe
Laudo da equipe
+
O terreno plano facilita o acesso à cadeira de rodas.
-
Não há banheiros para deficientes e para acessar o fraldário é preciso subir cinco degraus.
Não há cadeiras demarcadas para deficientes.
O espetáculo não tem mestre de cerimônias ou algo que valha para introduzir o espetáculo às crianças. As músicas são orquestradas (não há preocupação em utilizar canções que formem uma trilha, demarcando atos ou cenas). Aliás, não há uma única palavra no espetáculo inteiro.
Não há nada em Libras ou audiodescrição.
Os profissionais não estão preparados para lidar com esse tipo de público.
Não há vagas reservadas a deficientes no estacionamento - operado por uma empresa terceirizada.
Av. Nicolas Boer, 120, ao lado do Viaduto Pompeia, 2076-0087. Sáb. e dom., 17h e 19h30. R$ 40/R$ 80 (camarote com 4 lugares, R$ 300). Até 29/7. Deficientes não pagam.

Uma prova de amor
Curtir um cineminha acessível e sem torcicolo é direito de todos. Encontrar um ambiente acolhedor é melhor ainda. Dia 8/4, no Cinesesc, encontramos tudo isso.
Laudo da equipe
+
Palco do festival de cinema mais antigo da cidade, o Cinesesc tem eventos com audiodescrição, como o ‘Festival Melhores Filmes de 2012’ - que há três anos conta com o sistema (e que pela primeira vez é oferecido para as crianças, este mês, no Cineclubinho). Para garantir a perfeita sintonia com o filme, a audiodescrição é feita ao vivo e todos os deficientes visuais recebem um fone para acompanhar a sessão.
Antes da cada filme, uma equipe anima a molecada com oficinas e contação de histórias inclusivas.
O espaço destinado a cadeiras de rodas fica nos fundos, logo na entrada da sala, em um pedaço com visão privilegiada da tela. 
+/-
Para os deficientes auditivos tem sistema de legenda open caption em português. O que é muito bom, mas não funciona para crianças alfabetizadas apenas em Libras.
Não há estacionamento para deficientes, mas há um estabelecimento ao lado do cinema.
Cinesesc. R. Augusta, 2.075, Cerqueira César, 3087-0500. Dom., 11h. Grátis. Até 29/4.



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