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8.14.2012

Sexóloga Laura Muller


Fui parada na Polícia Federal por dúvida de sexo, diz sexóloga do 'Altas Horas'

 Foto: Vagner Campos / Terra
Foto: Vagner Campos / Terra
Danielle Barg

São cabeludas as perguntas que a sexóloga Laura Muller responde no programa Altas Horas, comandado por Serginho Groisman, nas madrugadas de sábado na Globo. Mas o interessante é que o autor das questões, talvez por vergonha ou medo da opinião alheia,  nunca assume a imaginação fértil e os hormônios à flor da pele – de um modo geral, a pergunta sempre vem de “uma amiga”, “uma prima” ou “uma vizinha”.
A mais recente e inusitada pergunta veio de "uma tia”. “A minha tia perguntou...”, disse uma adolescente, não se aguentando com as próprias risadas, acompanhadas da plateia, dos convidados, do apresentador e da própria sexóloga. “Porque quando ejaculam na boca dela... no caso, o marido dela, meu tio (risos), o gosto demora para sair, depois de algumas horas”. O vídeo teve tanta repercussão que, até o fechamento dessa matéria, já tinha mais de 1 milhão de exibições no Youtube.
Diante desse tipo de pergunta, é com bom humor e jogo de cintura que Laura responde às questões dos adolescentes, sempre enfatizando a importância do sexo seguro e dos limites emocionais e físicos que envolvem este aspecto. Em palestras pelo Brasil, e no seu consultório, ela fala com adultos e idosos, mas também não escapa de perguntas surpreendentes quando está caminhando pelo shopping, pelo aeroporto ou até mesmo pelos corredores da Globo. "A Polícia Federal já me parou alguma vez, e eu falei ‘fiz alguma coisa?’, e ele, ‘não é uma perguntinha’, enfim, é muito engraçado".
As respostas da especialista sempre vêm acompanhadas por um largo sorriso e sem tabus – coisa que ela acredita que ainda exista, apesar de toda a liberdade trazida pelas revoluções comportamentais que a sociedade atravessou ao longo dos anos.  Em entrevista exclusiva ao Terra, ela falou sobre as principais dificuldades sexuais que as pessoas enfrentam hoje em dia e situações engraçadas que vive por trabalhar com um tema que instiga tanto a curiosidade humana, independente da idade. Confira os principais trechos.
Terra: Por que você resolveu se especializar na área sexual, o que te motivou a estudar o tema?
Laura Muller: A minha primeira formação é jornalismo. Trabalhei alguns anos na Folha da Tarde, na Folha de S.Paulo, até que pintou uma vaga de editora de sexo na revista Cláudia. No primeiro ano que eu estava lá eu vi que era muito difícil editar essa área, aí eu fui fazer uma pós-graduação em educação sexual. Fiz meu primeiro livro e começaram a me chamar para palestras. Ao final das palestras, as pessoas começaram a me pedir para eu atender em consultório, e a minha especialização era para falar em público, não para atender em consultório.
Aí eu fui fazer psicologia, e hoje eu continuo como palestrante, para jovens, adultos e terceira idade, e com ações na mídia. Enfim, a minha atuação hoje também inclui consultório, hoje eu atuo mais como psicóloga mesmo, o jornalismo ficou para trás, e as palestras são embasadas na área da sexualidade.
T: Como foi que você chegou a Globo?
LM: O meu primeiro livro foi de perguntas e respostas para adultos, e o segundo foi  500 Perguntas Sobre Sexo do Adolescente, um guia para jovens, educadores e pais, e eram perguntas e respostas do público jovem que eu fui colhendo. Lancei esse livro em 2006, a turma do Altas Horas leu, e o Serginho (Groisman) teve a ideia de fazer um quadro exatamente de perguntas e respostas. Fizemos uma primeira entrevista e deu certo, estou lá desde 2007.
T: Você sempre se considerou uma pessoa livre com relação aos temas sexuais, ou também já enfrentou ou enfrenta algum tabu?
LM: Na verdade eu tive uma educação sexual como qualquer adulto hoje, que é uma educação sexual que não existiu. Eu tive realmente contato com a educação sexual quando eu fui me especializar, e realmente é preciso estudar e se especializar para poder trabalhar com isso. Então a minha vida, até então, foi muito parecida com a dos adultos em geral, que é com um monte de dificuldades para entender o tema, porque é um assunto tabu ainda na nossa cultura, não é tão simples assim falar sobre sexo e hoje a gente já está bem mais aberto.
Mas temos alguns dados, por exemplo, que é sugestão dos parâmetros curriculares nacionais, desde 97, que as escolas brasileiras tenham o tema sexualidade como transversal no ensino a partir dos sete anos de idade. E isso não acontece na totalidade das escolas brasileiras e já estamos em 2012. Então para a gente ver como é difícil ainda.
T: Por que você acha que existe essa dificuldade, mesmo tendo essa recomendação?
LM: Olha, precisa ter capacitação dos professores, mobilização da sociedade como um todo, da própria escola, o tema precisa entrar de vez, os pais também precisam ser contemplados, e também porque é um tema delicado, tabu, precisamos abrir espaços para discussão, abrindo o campo para a gente olhar de uma forma mais saudável e mais prazerosa.
T: Dentro dos tabus sexuais entre um homem e uma mulher, o que você acha mais difícil de mudar?
LM: As questões principais masculinas têm a ver com a ejaculação, com a ereção e como lidar com isso. As questões sexuais femininas têm mais a ver com a obtenção do orgasmo, com dor na penetração, e ambos têm a ver com desejo. E um grande tabu, tanto de homens, quanto de mulheres, é o de ‘não posso falhar nunca’. Quando a mulher não chega ao orgasmo ela encara como uma falha, e o homem quando perde a ereção ou ejacula rapidamente, encara como uma falha.
Se a gente colocar muito peso nisso, se exigir tanto assim, fica mais difícil ter prazer. E a gente pode falhar sim porque somos seres humanos. Então de vez em quando perder a ereção, ejacular fora de hora, de vez em quando não tem orgasmo, isso é natural. Se a dificuldade persiste, aí é o caso de buscar ajuda, tem tratamento, as dificuldades sexuais têm causas emocionais e físicas, em conjunto.
T: Falando um pouco sobre as mulheres – você acha que, embora o comportamento sexual delas tenha mudado, elas continuam sendo menos erotizadas do que o homem? A que você atribui isso?
LM: Viemos de uma educação sexual bastante repressora, principalmente com a sexualidade feminina, por isso ela tem maior dificuldade de lidar com a sexualidade. E isso vem de séculos de repressão sexual, sempre a sexualidade do homem foi mais aberta, vivemos em uma sociedade conservadora, machista. E por muito tempo, na época das nossas avós e bisavós, a mulher não podia ter orgasmo. O homem sim, a mulher não. Isso é uma conquista dos últimos tempos.
T: Você acha que os homens se aproximam mais de você por você ser uma conhecedora do sexo? Você acha que, com isso, passa uma imagem de que é boa de cama?
LM: Em geral, ou sexólogo acaba passando uma imagem muito cheia de fantasia, que a gente sabe tudo sobre sexo. E na verdade não é assim, porque todo mundo é ser humano, esse é o nosso trabalho. Isso pode povoar a cabeça das pessoas, mas todo mundo é cheio de defeitos.
T: Alguma pergunta no programa Altas Horas, ou em palestras, já te deixou constrangida alguma vez?
LM: Não, na verdade eu acabo respondendo a todas as perguntas da forma mais natural possível até para mudar esse pensamento de que sexo é feio, errado e sujo. É que sexo é uma prática saudável, prazerosa, precisamos ter alguns cuidados, claro, como o uso de camisinha, de medicamento para evitar gravidez fora de hora, escolher uma parceria bacana, mas é uma prática saudável. Tento responder da forma mais saudável possível.
Agora, as perguntas que venham direcionadas à minha vida particular eu acabo não respondendo. O sexólogo não fala da vida pessoal porque não é para sermos modelo de nada. Se falarmos da nossa vida, e aparecer como um modelo de conduta, isso foge totalmente do conceito da educação sexual que é cada um escolher os seus limites e as suas possiblidades.
T: Alguma vez já fizeram perguntas sobre sexo para você em locais inusitados? E na Globo, os atores costumam “se consultar” com você?
LM: Em todo lugar, no shopping, no aeroporto. A Polícia Federal já me parou alguma vez, e eu falei ‘fiz alguma coisa?’, e ele, ‘não é uma perguntinha’, enfim, é muito engraçado. Na Globo também, nos bastidores, na maquiagem, os atores perguntam. As perguntas acabam sendo não tão íntimas, a pessoa só abre a sexualidade dela quando consegue um espacinho a sós comigo. Por exemplo, vou ao toillet, estou eu e uma moça lavando a mão, na pia, aí ela consegue me fazer uma pergunta. Mas se a gente está em público, as perguntas são mais light.
T: Depois de tantas quebras de regras no campo sexual, o que é considerado tabu ainda nos dias de hoje, de um modo geral?
LM: Temos uma série de tabus. O orgasmo ainda é uma dificuldade, um tabu. A mulher saiu lá de trás da época das nossas bisavós de um orgasmo que ela não tinha, para agora a obrigatoriedade do orgasmo, e isso vira um tabu.
T: Você teria como listar alguns passos para um desempenho melhor na cama?
LM: Não tem um passo a passo para a gente se satisfazer na cama. A principal dica que eu dou para o homem e para a mulher é o respeito às suas possibilidades. É estar confortável na cama, não querendo copiar ninguém, fazendo do seu jeito. Essa seria a principal dica para a gente ser mais feliz e viver uma prática sexual mais saudável e prazerosa.
T: Você se considera boa de cama?
LM: Esse conceito do bom de cama é um conceito que precisamos rever. O que é ser bom de cama? Precisamos pensar que o sexo é um dos aspectos da nossa sexualidade e cada pessoa vai viver de um jeito muito especial. Então não cabe eu falar como é o meu sexo, porque eu vou acabar influenciando. E aí fica uma dica de que estamos perseguindo um ideal de perfeição e isso é a maior bobagem possível. Precisamos respeitar os nossos limites e entender que temos flutuações, que vai ter dia que vai ser mais legal, dia que vai ser menos, e que isso faz parte da brincadeira.
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