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9.12.2012

As novas regras para uma dieta saudável

Como montar seu prato

A combinação correta dos alimentos aumenta nossa capacidade de aproveitar o melhor de seus nutrientes.

NATÁLIA SPINACÉ E MARGARIDA TELLES
Houve um tempo em que, se alguém dizia que uma comida era boa, queria dizer que sentia prazer na refeição. Hoje, quando alguém fala em comida boa, em geral quer dizer que faz bem à saúde. Parece que, depois de 2.500 anos, finalmente estamos prestando atenção ao que o grego Hipócrates, pai da medicina, pregava: “Faça do seu alimento seu remédio”. E tome alho para resfriado, abacate para a pele, feijão para controlar o nível de ferro... Se você é dessas pessoas (e quem não é?) que vivem prestando atenção aos efeitos dos alimentos que consomem, prepare-se: a lista acaba de crescer. Segundo estudos recentes em culinária e saúde, os alimentos não têm efeito isolado. Eles agem em conjunto. Ingerir dois ingredientes juntos surte efeitos diferentes de consumi-los em separado. Isso porque, em seu corpo, eles interagem. No pior dos casos, fazem você passar mal. No melhor, facilitam a absorção de seus nutrientes e podem ajudar no tratamento de doenças como alergias, insônias e até alguns tipos de câncer. Antes, para comer bem, bastava procurar alimentos saudáveis, como frutas, verduras, legumes, cereais integrais e carnes com pouca gordura. De preferência, de boa procedência. Agora, os pesquisadores de alimentos afirmam que é preciso pensar em como combinar esses ingredientes.
744 alimentação imagem 1 v2 (Foto: Epoca)
Vem daí a nova moda no mundo da culinária saudável: o poder da combinação dos alimentos. De acordo com ela, comer dois ingredientes cria reações superpoderosas. “Ao somarmos um mais um podemos obter quatro. O total é maior que a soma das partes individuais”, diz Elaine Magee, nutricionista da Universidade Stanford, nos Estados Unidos, e autora de 25 livros sobre nutrição, incluindo o Food sinergy (Sinergia da comida). “Está provado que alguns componentes produzem grandes resultados quando consumidos juntos.” Essas combinações podem ser feitas em nossa casa. Uma série de estudos mostra que ampliar a potência de um nutriente é simples. A maior parte usa alimentos comuns à mesa do brasileiro, como alface, rúcula, tomate, laranja, ovos e peixes. As combinações são especialmente valiosas para quem precisa repor algum tipo de nutriente ou usar a alimentação como forma de reforçar terapias.
A importância da combinação entre alimentos voltou a ganhar força nos últimos anos com o aumento do número de estudos. “A eficácia de certas combinações é comprovada”, afirma Steven Schwartz, pesquisador de ciência dos alimentos na Universidade de Ohio. “Um exemplo é a união do tomate ou da cenoura com a gordura presente em comidas como o abacate. Quando consumidos juntos, esses alimentos reduzem a ação das substâncias chamadas radicais livres, que aceleram o envelhecimento das células.” Diferentemente de outras dietas famosas, que ainda levantam polêmica sobre sua eficácia para a saúde, a sinergia entre alimentos é apoiada por diferentes linhas de pesquisa. Médicos e nutricionistas concordam que, em muitos casos, comer dois nutrientes numa mesma refeição aumenta o aproveitamento de um deles. “Alguns alimentos precisam necessariamente de outros para ser absorvidos”, diz Renata Cintra, professora do instituto de biociências da Unifesp.
A ciência da combinação dos alimentos começa a chegar às mesas de restaurantes. Foi criado nos Estados Unidos, no fim do ano passado, um selo para cozinhas que investem em misturas saudáveis, o SPE, abreviação do latim Sanitas per escam (algo como “saúde por meio da comida”). Seu criador, o belga Emmanuel Verstraeten, pesquisou durante dez anos combinações de alimentos na cozinha de seu restaurante, o Rouge Tomate, em Bruxelas. Ao levar seu restaurante para Nova York, Emmanuel se uniu aos pesquisadores Eric Rimm, de Harvard, Jeffrey Blumberg, da Escola de Medicina de Tufts, e John Foreyt, da Escola de Medicina de Baylor, ambas nos EUA, para criar combinações que ajudem os nutrientes dos pratos e tenham menos gordura, sal e açúcar. Ele conseguiu montar um cardápio sem descuidar do sabor. Seu Rouge Tomate está entre os restaurantes recomendados pelo conceituado guia de gastronomia Michelin. De quebra, Emmanuel criou um novo negócio: presta consultoria para restaurantes que queiram ajustar seus menus às combinações propostas pelo selo. Ele cobra, em média, R$ 600 por prato. Nos EUA, mais seis restaurantes conseguiram o certificado, e outros 15 estão com o processo em andamento.
744 alimentação imagem 2 v2 (Foto: Epoca)
No restaurante The Living Room, em Nova York, um dos primeiros a aderir ao SPE, o frango assado passou por modificações para conseguir o certificado. A manteiga foi trocada por uma quantidade reduzida de óleo, que deve permanecer no prato para auxiliar a absorção da vitamina A. As batatas assadas com a casca são ricas em fibra e em vitamina C. Entraram no lugar do purê de batatas. A couve-de-bruxelas deu lugar às folhas de dente-de-leão, fonte de minerais como potássio e cálcio e das vitaminas A, B6 e C. O resultado foi uma diminuição em 39% das calorias totais, e o prato passou a ter 25% do total de vitaminas e minerais recomendados durante um dia. “Já seguíamos essa filosofia da comida saudável, mas o certificado legitimará isso”, afirma James Carpenter, chef do The Living Room.
No Brasil, ainda não existe iniciativa parecida com o SPE. A última tentativa de estimular a adoção de escolhas mais saudáveis nos restaurantes falhou. Em 2009, o Conselho de Nutricionistas de São Paulo criou um certificado para restaurantes com um nutricionista na equipe. “A maioria dos donos de restaurantes acha um custo desnecessário”, diz Maria Lúcia Tafuri Garcia, presidente da Sociedade Brasileira de Nutrição. O certificado foi abolido no ano passado.

Mas há restaurantes que cuidam da combinação de nutrientes. A chef Tatiana Cardoso, formada pela Natural Cookery School, em Nova York, é uma delas. “Pensar em combinar os nutrientes adequados é nutrição básica. Mas quase ninguém se lembra disso”, afirma. Tatiana comanda as cozinhas do Moinho de Pedra e do Natural com Arte, em São Paulo. O paulistano Renato Caleffi, chef do Le Manjue Bistrô, conta com a ajuda de um nutricionista para montar seus pratos. O arroz amazônico, um dos mais pedidos, mistura pirarucu em cubos grelhado com três tipos de arroz: cateto, vermelho e negro integral. Leva ainda pequi, espinafre, castanha-de-caju, salsa, tomate-cereja e azeite. O ferro do espinafre é absorvido com a ajuda da vitamina C da salsa; o licopeno do tomate, com o auxílio do azeite; e a gordura do pirarucu ajuda a diluir as vitaminas da castanha e do pequi. “A comida precisa ser pensada como uma forma de obter saúde”, diz Renato.
TERAPIA ALIMENTAR
Uma combinação campeã são alimentos ricos em gordura (como azeite, castanhas e abacate) com as fontes de vitaminas A (do agrião), E (do brócolis), D (do salmão) e K (da couve-flor). São ingredientes que muitas vezes andam juntos nas receitas do dia a dia. Além de gostosa, agora se sabe que a combinação também é boa para a saúde. “Essa mistura é eficaz porque essas vitaminas precisam ser dissolvidas na gordura para uma melhor absorção pelo intestino”, diz Linda Antinoro, nutricionista do hospital Brigham and Women’s, em Boston. Muitas dessas duplas de alimentos parecem eficazes no combate às células cancerígenas. Diferentes estudos sugerem que sua ingestão é aconselhável para quem trata algum tipo de câncer ou tenha predisposição à doença. A ingestão de um nutriente presente nas maçãs (a quercetina) aumenta a capacidade de outro encontrado nas framboesas (o antioxidante elágico) para destruir células cancerígenas. A combinação de uma substância presente no chá-verde (a catequina) com a vitamina C encontrada no suco de limão tem efeito similar. A vitamina C também pode fazer par com outra substância. Quando consumida com aveia ou cenoura (ricos em ácido fenólico), atua de forma mais rápida e eficaz para combater o colesterol ruim, que pode entupir as artérias (LDL). Isso é importante para pessoas com doenças coronárias ou histórico de derrames.
Um desses estudos, conduzido pela Universidade de Illinois e publicado na revista científica Cancer Research, trata dos benefícios da combinação de tomates e brócolis para quem tem câncer de próstata. Os cientistas de alimentos John Erdman e Kirstie Canene-Adams alimentaram ratos com células cancerígenas com uma dieta composta de 10% de tomate e 10% de brócolis. Outros ratos comeram esses alimentos separados, ou apenas suplementos com seus princípios ativos. Depois de 22 semanas, os ratos com dieta combinada de brócolis e tomate tinham os menores tumores. “Homens mais velhos com câncer de próstata que optaram por observar a evolução da doença antes da químio ou da radiação devem considerar seriamente a inclusão de mais brócolis e tomate em suas dietas”, afirma Kirstie. As pesquisas sobre combinações de alimentos consideram apenas os ingredientes naturais, não suplementos nem vitaminas em cápsulas. Os estudos do pesquisador David Jacob, da Universidade de Minnesota, mostram por quê. Ele afirma que a interação existe até mesmo dentro de um único ingrediente. “Cada alimento tem milhares de componentes. Eles são digeridos pelo corpo em sequências que ajudam na absorção dos nutrientes, ou para evitar componentes ruins”, diz. Como as nozes, ricas em propriedades antioxidantes que protegem contra as gorduras do próprio alimento.
744 alimentação imagem 3 v2 (Foto: Epoca)

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