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12.08.2012

CERIMÔNIA MEMORIAL H.L. Mencken

Onde fica o cemitério dos deuses mortos? Algum enlutado ainda regará as flores de seus túmulos? Houve uma época em que Júpiter era o rei dos deuses, e qualquer homem que duvidasse de seu poder era ipso facto um bárbaro ou um quadrúpede.
Haverá hoje um único homem no mundo que adore Júpiter? E que fim levou Huitzilopochtli? Em um só ano – e isto foi há apenas cerca de quinhentos anos – 50 mil rapazes e moças foram mortos em sacrifício a ele. Hoje, se alguém se lembra dele, só pode ser um selvagem errante perdido nos cafundós da floresta mexicana.
Huitzilopochtli, como muito outros deuses, não tinha um pai humano; sua mãe era uma virtuosa viúva; nasceu de um inocente flerte dela com o sol. Quando ele resmungava, seu pai, o sol, ficava quieto. Quando trovejava de ira, terremotos engoliam cidades inteiras. Quando tinha sede, era saciado por 5 mil litros de sangue humano. Hoje, Huitzilopochtli está tão esquecido quanto Allen G. Thurman. Para quem já teve como seus pares Alá, Buda, e Wotan, seus colegas atualmente são Richmond P. Robinson, Alton B. Parker, Adelina Patti, Tom Sharkey e o general Wayler, sejam quem forem.
Falando em Huitzilopochtli, logo vem à memória seu irmão Tezcatilpoca. Tezcatilpoca era quase tão poderoso: devorava 25mil virgens por ano. Levem-me a seu túmulo: prometo chorar e depositar uma couronne des perles. Mas quem sabe onde fica? E onde fica túmulo de Quitzalcoatl? Ou o de Xiehtecutli? Ou o de Centeotl, aquela gracinha de deus Ou o de Tlazolteotl, a deusa do amor? Ou o de Mictlan? Ou o de Xipe? Ou os restos de Tzitzimitles? Onde estão seus ossos? Onde fica o salgueiro onde eles penduraram suas harpas? Em qual Inferno perdido e desconhecido esperam pela ressuirreição? Quem desfruta suas heranças? E onde fica o túmulo de Dis, de quem César dizia que era principal deus dos celtas? Ou o de Tarves, o touro? Ou o de Moccos, o porco? Ou o de Épona, a égua? Ou o de Mullo, o asno celestial? Houve uma época em que os irlandeses reverenciavam todos esses deuses, mas hoje até o mais bêbado deles só consegue rir disso.
Mas eles têm companhia no oblívio: o Inferno dos deuses mortos é tão superlotado quanto o Inferno presbiteriano para bebês. Damona está num deles, assim como Ésus, Drunemeton, Silvana, Dervones, Adsalluta, Deva, Belisama, Uxellimus, borvo, Grannos e Mogons. Todos deuses poderosos em seu tempo, adorados por milhões, cheios de exigências e imposições, todos capazes de unir e desunir – enfim, deuses de primeira classe. Durante gerações, os homens trabalharam para construir-lhes vastos templos – cada qual com pedras do tamanho de um bonde.
O trabalho de interpretar os seus caprichos ocupava milhares de sacerdotes, bispos e arcebispos. Desafiá-la significava a morte, geralmente na fogueira. Os exércitos os defendiam contra os infiéis: cidades eram queimadas,mulheres e crianças chacinadas, seu gado afugentado. No fim das contas, no entanto, todos declinaram e morreram, e, hoje, não se encontra uma única alma penada para reverenciá-los.
O que terá acontecido a Sutekh, antigo deus de todo o vale do Nilo? O que terá acontecido a:  Resheph Baal, Anath Astrarte, Ashtoreth Hadad, Nebo Dagon, Melek Yau, Ahijah Amon-Ra, Ísis, Osíris, Ptah, Molech?
Todos estes foram deuses da mais alta eminência. Muitos são mencionados com temor e respeito no Velho Testamento. Há 5 ou 6 mil anos, estavam taco a taco com o próprio Jeová, e o mais galinha-morta de todos era muito superior a Thor. Pois foram todos para o nada e, com eles, os seguintes:
Arianrod, Morrigu, Govannon, Gunfled, Dagda, Ogurvan, Dea, Dia, Iuno, Lucina, Saturno, Furrina, Cronos, Engurra, Belus, Ubililu, U-dimmer-an-kia, U-sab-sib, U-Mersi, Tammuz, Vênus, Belis, Nusku, Aa, Sin, Apsu, Elali, Mami, Zaraqu,  Zagaga, Nuada, Argetlam, Tagd, Goibniu, Odim, Ogma, Marzin, Marte, Diana de Éfeso, Robigus, Plutão, Vesta, Zer-panitu, Merodach, Elum, Marduk, Nin, Perséfone, Istar, Lagas, Nirig, Nebo, En-Mersi, Assur, Beltu, Kusky-banda, Nin-azu, Qarradu, Ueras.
Peça ao seu vigário que lhe empreste um livro sobre religião comparada: você encontrará todos eles devidamente listados. Todos foram deuses da mais alta dignidade – deuses de povos civilizados --, adorados e venerados por milhões. Todos eram onipotentes, oniscientes e imortais. E todos estão mortos.  
 Colaboração Anibal Pinheiro
         agcpinheiro@uol.com.br

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