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1.09.2013

No gosto do povo


Técnica competente e política habilidosa, Dilma Rousseff está em situação confortável para a disputa eleitoral de 2014. Foto: Masao Goto Filho
Quando o presidente Lula anunciou Dilma Rousseff como sua candidata à Presidência, a reação foi de completa perplexidade. Executiva decidida e conhecida por suas opiniões fortes, Dilma nunca havia concorrido a uma eleição. Tinha uma história de vida complexa, uma reconhecida competência técnica e uma experiência de sucesso substituindo o até então insubstituível ministro José Dirceu na Casa Civil do governo. Mesmo assim, essas credenciais pareciam insuficientes, até porque ela não era uma petista histórica, suas raízes partidárias estavam no PDT de Brizola, onde exerceu diversas funções na cidade de Porto Alegre e no governo do Rio Grande do Sul, adquirindo experiência administrativa.
Primeiro veio a campanha, e ela mostrou-se uma candidata competitiva. A pupila foi boa aluna, aprendeu lições valiosas com um professor generoso. Foi bem nos debates e sua personalidade forte começou a aparecer para quem prestava atenção. Ganhou a eleição com méritos.
Elegemos então a primeira mulher presidente do Brasil. Enchemos o peito de orgulho e Dilma foi empossada sob os aplausos do mundo, ratificando o compromisso brasileiro com a modernidade e a igualdade entre o homem e a mulher.
Iniciou seu governo sob a sombra poderosa do mais popular presidente da nossa história. Poderia, sem conflito com o antecessor e padrinho, impor sua própria marca? Aos poucos essa questão foi sendo respondida. Positivamente. Dilma surpreendeu nos primeiros cem dias, na primeira crise, nas primeiras insatisfações. Os ataques éticos a membros do seu governo deram o mote para a imagem de faxineira. As tentativas de insubordinação trouxeram à tona seu estilo durão. As inquietações na ampla base foram encaradas com firmeza.
Pouco a pouco se viu que não era apenas a primeira mulher que ocupava a Presidência. Era uma ex-guerrilheira heroica e determinada. Uma estudante torturada com o espírito da anistia e da conciliação. Mas sem fugir do encontro com a história. Está aí a Comissão da Verdade, avançando, sem revanchismo e com firmeza.
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Era também uma técnica competente, uma política habilidosa, capaz de administrar sem fraturas a mais extensa base aliada que já se viu neste país. Participou de pouquíssimas campanhas e exclusivamente quando sua presença provou-se imprescindível. No ciclone das recentes eleições municipais, que em muitos lugares conflitaram aliados federais em lutas sem quartel, conseguiu escapar sem uma defecção sequer. Não é pouco, é muito.
Existem questionamentos naturais quanto ao desempenho administrativo, mas vejamos… A prioridade do social continua sendo religiosamente cumprida. Algumas outras áreas ficam carentes. É a sina administrativa dos países em desenvolvimento: é simplesmente impossível para qualquer governo atender a todas as expectativas, mas educação, saúde e segurança não podem deixar de ser prioridade em nenhuma circunstância. Estamos com problemas graves a serem resolvidos. Também na infraestrutura, onde Dilma quer deixar sua marca, está sendo atrasada pela burocracia e pelo gigantismo de uma máquina antiga, concentrada no poder central. As agências reguladoras não funcionam. O serviço de telefonia, por exemplo, transformou-se em um dos piores do mundo. A burocracia continua emperrando a máquina pública.
Os recursos são mal distribuídos, mas esses males independem do presidente da vez. Só serão efetivamente combatidos, como já é lugar-comum mencionar, com uma reforma ampla e profunda do Estado.
A presidenta caiu no gosto do povo. Deu ao cargo uma dignidade diferente, com um comportamento mais parecido com os dos governantes do Primeiro Mundo. Sua popularidade, com dois anos decorridos de governo, supera em muito a votação que recebeu. Sabemos que política é mutável como as nuvens, mas, consultando os astros, sua situação para a eleição de 2014 é muito confortável.
No entanto, no meu entender, o mais importante ato do governo Dilma, até agora, foi a sua decisão de reservar os rendimentos dos royalties do petróleo para utilização exclusiva na educação. Uma tese antiga, defendida, entre outros, pelo meu amigo o senador Cristovam Buarque. Essa decisão, sim, é capaz de garantir de uma vez por todas o encontro do Brasil com seu futuro. Hoje, esse encontro parece distante. Os índices educacionais brasileiros podem até ser maquiados para aparentar melhorias, mas temos de reconhecer, mais uma vez, nossa incompetência. Pouco melhorou.
No começo de dezembro, um Cristovam Buarque indignado discursou na tribuna do Senado sobre recente pesquisa na área de educação que coloca o -Brasil em um vergonhoso 39º lugar entre 40 países. Um Cristovam indignado surpreendeu-se com a falta de repercussão de tanta vergonha. Um Cristovam indignado perguntou “se não temos vergonha na cara de sermos a sexta economia do mundo e apresentarmos índices tão baixos de educação”. Um Cristovam indignado disse “eu faço esse discurso e, amanhã, nada acontece”. E continua… “A impressão que me está passando é de que está faltando vergonha na cara da gente, mas, além de faltar vergonha, sobra burrice.”
Quero me associar a Cristovam na indignação e na vergonha. Isso tem de mudar. Tem de haver uma reforma estrutural, a federalização das escolas públicas de ensino fundamental e médio. Educação tem de ser prioridade absoluta. E não é e nunca foi. Desde os tempos do império. Mas poderá ser. A presidenta Dilma pode deixar sua marca na maior revolução da história deste país. Pode, por meio das melhorias na educação, ensinar uma nação a pensar, se reinventar e, assim, trabalhar para fazer do Brasil finalmente o país do futuro que tanto já foi cantado mundo afora.
Sonho também com uma profunda reforma política. Pareço disco arranhado, eu sei. Assim como Cristovam e a educação, há anos luto por mudanças na estrutura política do nosso país.
A reforma tributária, a reforma política, a reforma no Judiciário. Tudo isso é base, é fundação para o crescimento deste nosso Brasil. Mas nada, nada disso terá consequências se a educação não for prioridade antes.
Como é tímido o nosso crescimento na educação, quando o comparamos com o de outros países emergentes que fizeram e fazem da educação a plataforma para o seu desenvolvimento.
Caso o Congresso reconheça a importância da iniciativa e referende a reserva dos rendimentos dos royalties do petróleo para utilização exclusiva na -educação, e caso a sociedade se mobilize para cobrar e fiscalizar a sua aplicação, podemos passar da esperança à realidade e confiar que, finalmente, estamos lançando as bases de uma grande nação. Com educação de qualidade e sem máscaras.

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