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5.25.2013

Refugiados mirins

Como é a adaptação ao Brasil de crianças que, junto com seus pais, fogem de guerras e de perseguições políticas e religiosas em sua terra natal. Nos últimos três anos, triplicou o número de asilados no País

Michel Alecrim

Aos 5 anos, Riqueza Valuse já fala três línguas: lingala, francês e português. As duas primeiras, aprendeu na conturbada República Democrática do Congo, onde nasceu. A terceira, ele começou a falar há um ano, desde que sua família veio para o Brasil fugindo da guerra civil do país centro-africano. O menino é um dos 2.008 refugiados que desembarcaram aqui no ano passado, um número três vezes superior ao de 2010. Crianças são 8% do total. De modo geral, os motivos que levam à busca de uma nova cidadania são conflitos religiosos ou políticos, mas começam a aparecer nas estatísticas também os refugiados ambientais, pessoas que se deslocam atrás de água e condições climáticas mais favoráveis. O Brasil, com democracia estável, boas perspectivas econômicas e fama de país acolhedor, atrai todos os perfis. Atualmente, há 4.262 pessoas vivendo com esse status em território brasileiro. O número só não é maior porque muitos, especialmente os angolanos, já conseguiram cidadania permanente.
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CASA NOVA
Os paquistaneses Taha, Muzamil e Sohaib: ajuste para
orações não coincidirem com o horário do colégio
A adaptação à cultura, à língua e a hábitos diferentes é um dos maiores desafios de quem resolve tentar a sorte em outro país. As crianças, especialmente, se veem tiradas de seu ambiente, muitas vezes sem entender o porquê, e precisam integrar-se logo à nova vida escolar. Diante dessa realidade crescente, alguns colégios brasileiros estão desenvolvendo programas para atendê-las. É o caso da escola municipal Afrânio Costa, na zona norte do Rio de Janeiro, onde Valuse estuda. A instituição especializou-se no apoio a alunos que foram retirados de seu habitat e têm de enfrentar os novos códigos culturais. A coordenadora Maria da Penha Fontes diz que esses pequenos refugiados se integram bem, e que só teve “um caso em que um menino sofreu deboche pelo sotaque carregado, mas foi resolvido”. A especialização da unidade vem da experiência dos profissionais e do aprimoramento com os colegas da escola São Paulo, também na zona norte, que trabalha, atualmente, com 13 crianças imigrantes. A estratégia é oferecer aulas de reforço para quem apresenta dificuldade e/ou acompanhamento interdisciplinar, com pedagogos, psicólogos e assistentes sociais.
A maioria das crianças chega ao Brasil sem documentos ou comprovantes de escolaridade anterior. ONGs como a Cáritas, do Rio e de São Paulo, ou o Instituto Migrações e Direitos Humanos, de Brasília, auxiliam na regularização da papelada. A grande maioria dos solicitantes é do Sudeste e do Distrito Federal. Um protocolo emitido pela Polícia Federal tem servido de “salvo-conduto” para os pequenos se matricularem nas escolas e conseguirem atendimento médico. Entre as crianças, o maior contingente é de congoleses, mas, no total de refugiados no País, predominam os angolanos: 1.060 ao todo. É um status diferente dos haitianos, que atualmente lotam o Acre, ou dos estimados 400 mil bolivianos em situação ilegal que vêm em busca de uma vida melhor, mas não sofrem perseguição em seus países.
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NO COLÉGIO
Alunos refugiados na escola municipal Afrânio Costa, no Rio,
que tem um programa para atender essas crianças
 
O representante do Alto Comissariado para Refugiados das Nações Unidas (ACNUR) no Brasil, o mexicano Andrés Ramirez, diz que, devido à intensificação de conflitos no mundo, o número de famílias em fuga também aumenta. “A Síria e o Egito são novos países com grande êxodo de população”, afirma. Em geral, refugiados buscam países mais próximos, mas a grande distância e o alto custo de passagem não impediram que o paquistanês Kaleen Masood, 37 anos, levasse para Petrópolis (RJ) toda a família, composta da esposa, Aqila, 37 anos, e quatro filhos. Os Masood fazem parte da comunidade Ahmadia, segmento do islamismo perseguido no Paquistão.
No Brasil, eles seguem suas tradições sem medo. Aqila, por exemplo, não sai de casa sem a burca, o que causa certa surpresa na pacata Petrópolis. Mas também tiveram de fazer adaptações. Para que as crianças seguissem a obrigatoriedade de rezar cinco vezes por dia e também frequentassem a escola, decidiram agrupar duas orações e as outras são feitas após as aulas. Taha, 7 anos, Muzamil, 10, e Sohaib, 13, já arriscam frases em português, apesar da enorme diferença para o idioma urdu. A culinária brasileira, bem menos condimentada, é outra dificuldade. Os meninos detestam arroz e feijão, mas já aprovaram o guaraná e o suco de caju. É o retrato da vida em um novo país.
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