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6.18.2013

Excesso de carne vermelha pode aumentar risco de diabetes tipo 2

  • Estudo analisou 149 mil pessoas por até 16 anos e notaram aumento de 48% no risco de desenvolver doença
Flávia Milhorance
Carne vermelha. O consumo pode aumentar o risco de diabetes tipo 2, doença que afeta 250 milhões de pessoas no mundo, segundo a OMS. No país, são 12 milhões Foto: Nathan Myhrvold / AP
Carne vermelha. O consumo pode aumentar o risco de diabetes tipo 2, doença que afeta 250 milhões de pessoas no mundo, segundo a OMS. No país, são 12 milhões Nathan Myhrvold / AP
Cientistas já afirmaram que a carne vermelha foi fundamental para a evolução humana, porque se não fosse ela, talvez nossos antepassados não teriam ingerido a quantidade suficiente de nutrientes e não teriam desenvolvido o cérebro no patamar de hoje. Mas se por um lado é fonte importante de proteína, ferro e vitaminas, ela também desperta animados debates científicos, uma parte deles condenando o seu consumo exagerado. Um novo estudo publicado ontem na “Journal of the American Medical Association” revela que o excesso de carne vermelha está associada ao maior risco de diabetes tipo 2.
Estudos anteriores já vinham fazendo esta relação, mas esta é uma das maiores análises já publicadas. Cerca de 149 mil homens e mulheres foram acompanhados por meio de três diferentes pesquisas num período de até 16 anos. A cada quatro anos, os pesquisadores analisavam as dietas através de questionários. Os voluntários afirmaram ter o hábito de consumir de meia a duas porções diárias. Eles foram separados em três grupos: que aumentou, diminuiu ou manteve a mesma ingestão.
Risco reduzido em 14% com menor ingestão
Os que aumentaram tiveram um acréscimo de 48% no risco de desenvolver a doença já num período de quatro anos, enquanto que a redução diminuiu o risco em 14%, porém apenas no período de 16 anos. Isso porque, numa primeira análise, a diminuição do consumo não provocou nenhuma diferença de incidência. Mas quando contextualizados num período maior, além de considerados fatores como o consumo inicial e histórico de doenças, a incidência se sobressaiu. No final do estudo, foram registrados 7.540 casos de diabetes tipo 2, sendo dois a cada 300 dos que aumentaram o consumo, e um a cada 300, dos que diminuíram.
— Se você está fazendo algo de errado, você verá um impacto imediato. Mas para o bom hábito de estilo de vida surtir efeito, é preciso esperar mais tempo e acumular outras mudanças — comentou o autor do estudo, An Pan, professor da Universidade Nacional de Singapura.
Na pesquisa, há uma ressalva de que o consumo de carne não é a causa da diabetes tipo 2, mas o autor alerta para a relação entre o aumento da ingestão e do risco.
— Nossos resultados confirmam a solidez da associação entre carne vermelha e diabetes, e adiciona mais uma prova de que limitar o consumo ao longo do tempo traz benefícios para a prevenção da doença — conclui Pan.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), quase 250 milhões de pessoas no mundo têm diabetes. No Brasil, a Sociedade Brasileira de Diabetes, com base em dados do Censo, estima haver 12 milhões de indivíduos com doença, sendo que metade não sabe. Isso porque os sintomas nem sempre são aparentes. A diabetes tipo 2 corresponde a 90% dos casos, segundo a associação. Ela é crônica, ocorre geralmente em pessoas obesas com mais de 40 anos de idade, embora com a mudanças dos hábitos alimentares, com o aumento do consumo de produtos industrializados e calóricos, além do sedentarismo e estresse, ela tem atingido cada vez mais a faixas etárias jovens.
Não são poucos os estudos que relacionam o excesso de carne vermelha com complicações no organismo. Em geral, eles apontam para a alta concentração de gordura saturada no alimento, o que pode levar, principalmente, a problemas cardíacos. Mas também há pesquisas apontando para o aumento do risco de morte prematura por câncer e doenças cardiovasculares por motivos que vão além da gordura; um da “Nature Medicine”, por exemplo, aponta os malefícios da carnitina, substância presente na carne vermelha.
Apesar disto, o endocrinologista Amélio Godoy-Matos, ex-presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem), pondera sobre esses resultados. O especialista lembra que a gordura saturada aumenta a resistência à ação da insulina, o que representa um risco de ocorrência de diabetes, mas ele alerta que este fator não pode ser visto isoladamente.
— Eles avaliam o consumo de carne isolado, sem acompanhar o que elas comem ou deixam de comer: o tipo de carne, se come com arroz e feijão ou com macarrão, se ingere muito doce, se é sedentário, se ingere outros alimentos muito calóricos etc — exemplifica Godoy-Matos. — O que de fato está associado ao risco de diabetes é o ganho de peso e carboidratos.
Segundo Godoy-Matos, a carne vermelha é uma das principais fontes de vitamina B12 e de proteínas. Para ele, a ingestão deve ser moderada, não ultrapassando três vezes na semana. O problema é que, na sociedade atual, com facilidade de acesso, os carnívoros costumam consumir muito mais do que isso. Já a importância do consumo de carne (e de outros alimentos cozidos) foi apontado pela neurocientista Suzana Herculano, da UFRJ, que apresentou sua tese na última quarta-feira na conferência TED (Tecnologia, Entretenimento e Design, em português).
Pesquisas relacionaram consumo exagerado a câncer e problemas cardíacos
Um dos maiores estudos a relacionar o consumo de carne vermelha a doenças foi divulgado em março deste ano pela Perspectiva Europeia de Investigação sobre Câncer e Nutrição e publicado na revista “BMC Medicine”. O levantamento, que analisou a dieta de cerca 450 mil europeus, concluiu que homens e mulheres com um alto consumo de carne processada — linguiça, bacon, salsicha, hambúrguer e apresuntados — têm mais chances de morrer precocemente, em especial devido a doenças cardiovasculares, mas também com câncer.
Embora rica em proteínas e ferro, o consumo de carne vermelha em excesso está relacionado à formação endógena de compostos de nitrogênio no trato gastrointestinal e, assim, pode se tornar um fator de risco para alguns tipos de câncer, como o de intestino, de acordo com a pesquisa. De cada 17 pessoas acompanhadas pela pesquisa, durante 13 anos, em média, uma morreu.
Mas aquelas que comiam mais de 160 gramas de carne processada por dia — o equivalente a duas salsichas e uma fatia de bacon — tiveram o risco 44% maior de morrer durante o período da pesquisa, em comparação com aquelas que comiam cerca de 20 gramas por dia. O estudo ressaltava, no entanto, que as pessoas que tendiam a comer mais carne vermelha também tendiam a beber mais e a consumir menos frutas e verduras.
Alimento de reconhecido valor nutritivo, a carne vermelha é fonte de proteína, ferro e vitaminas. Mas em excesso pode causar sérios problemas. Um outro estudo, feito pela Escola de Saúde Pública da Universidade de Harvard e divulgado no ano passado, com 120 mil americanos ao longo de 20 anos, também constatou que a ingestão diária do alimento aumenta as chances de morte prematura por câncer e doenças cardiovasculares. Segundo a pesquisa, uma porção diária de carne processada eleva em 20% o risco de morte, enquanto a carne não processada aumenta as chances em 13%

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