Oito meses depois de revelarem as cenas de maus-tratos contra crianças de menos de 5 anos praticados pela dona de uma escola infantil, em São Paulo, as famílias não conseguem superar o trauma da violência. E a professora não foi punida
Nathalia ZiemkiewiczAssista ao vídeo que comprova os maus-tratos:
"Ela apertava minha boca, me beliscava e batia para eu comer”, relata Felipe Moraes, 6 anos. “A tia Conceição era uma bruxa, mas a gente não tinha o telefone da polícia para contar o que ela fazia.” Sem tirar os olhos do tablet apoiado em seu colo, o garoto de bochechas coradas relata suas memórias da escola infantil de classe média alta Trenzinho Feliz. Boa parte de suas referências foi construída naquele endereço da Vila Mariana, zona sul de São Paulo, onde estava desde os seis meses de idade em período integral. Em dezembro do ano passado, uma funcionária revelou os maus-tratos aos quais as crianças ali matriculadas eram submetidas com a ajuda de uma câmera escondida. Enquanto alimentava os alunos grosseiramente, a diretora-pedagoga Conceição Tomaz Cruz dava puxões no cabelo e na orelha, tapa na cara, chacoalhões. Há relatos de que os obrigava a engolir o próprio vômito, provocado pelo excesso de comida. Felipe e seus colegas não podiam contar a ninguém, sob uma suposta ameaça da diretora em “cortar a cabeça dos pais”. Os mesmos que pagavam mensalidade superior a R$ 1.500, confiaram na tradição de 30 anos da instituição e nas credenciais acadêmicas de Conceição. Logo depois que o escândalo veio à tona, a escola foi fechada e a diretora foi denunciada por maus-tratos. Mas o terror que essas crianças tão pequenas passaram ainda reverbera na rotina das famílias, muitas sob tratamento psicológico e medicação. Há até quem mudou de cidade para tentar superar o trauma. Enquanto isso, a diretora aguarda a decisão da Justiça em sua casa, em São Paulo, e leva uma vida normal.
TRAUMA
Quando não comia, Felipe apanhava na escola. Seus pais, Evandro e Flavia Moraes,
não sabiam, mas estranhavam seu comportamento agressivo
O Ministério Público ofereceu uma denúncia de maus-tratos contra Conceição. Se condenada, a previsão é de que fique cerca de um ano presa. A decisão contrariou a vontade dos pais. Eles pediam que a diretora fosse incriminada por tortura, sujeita a uma pena muito mais rigorosa. ISTOÉ solicitou uma entrevista com a acusada, mas ela se negou. Seu advogado, Antônio Sidnei Ramos de Brito, afirma que a cliente está desempregada, já foi agredida fisicamente e não se sente preparada para falar. O processo corre em sigilo e a primeira audiência está marcada para janeiro de 2014, mais de um ano depois da data das cenas anexadas como prova. Só então serão feitas as avaliações psicológicas de 19 crianças por profissionais do Tribunal de Justiça – com resultados prejudicados, devido ao tempo entre os episódios e os exames.
Especialista em crianças e adolescentes, a psicóloga Ceres Araújo analisa que a diretora era uma das figuras adultas mais presentes no cotidiano desses meninos e meninas. Um modelo hostil e assustador que provocou uma complicada inversão de valores. “Ela não só transformou a escola em um ambiente inseguro como abalou a confiança que tinham em vínculos muito próximos”, diz. Isso explica por que as crianças começaram a verbalizar situações apenas agora, meses depois de o episódio vir à tona. Há um longo período de estresse após o trauma. Felipe teve transtornos de adaptação na nova escola e estranhou que não havia castigo por lá. Rafaela ainda tem muitos pesadelos e dificuldade de fazer amizade. Guilherme teme ficar sozinho e desenvolveu um problema na tireoide. “A alimentação é uma das primeiras referências afetivas, mas essas crianças a associaram com sofrimento e vergonha”, afirma a presidenta da Associação Brasileira de Psicopedagogia, Quézia Bombonatto.
Somos mais que responsáveis pelos nossos infantes. Temos o dever e a obrigação de tratar a todos os pequeninos com carinho, pois são completamente indefesos em sua época de formação. Fico indignada quando alguém com força física e mental faz uma atrocidades dessas. Durante meus mais de 20 anos em sala de aula nunca tive um momento INFELIZ com meus pequeninos. Muito pelo contrário, aprendi muito por conta da tamanha sensibilidade e inteligência que as crianças possuem. Sempre presenciei um ambiente saudável e construtor... uma pena quando acontecem esses fatos!
ResponderExcluirUm abraço