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10.07.2013

Crianças incomuns

Americano escreve dossiê sobre tolerância ao analisar como pais e mães lidam com crianças incomuns, por razões biológicas ou comportamentais

Mariana Timóteo da Costa

Família do século XXI. Oliver, John, George, Andrew, Blaine mãe, Blaine filha, Tammy, Laura e Lucy: crianças geradas por inseminação artificial, filhos de um casal gay, um lésbico e uma hétero
Foto: Terceiro / Álbum de família
Família do século XXI. Oliver, John, George, Andrew, Blaine mãe, Blaine filha, Tammy, Laura e Lucy: crianças geradas por inseminação artificial, filhos de um casal gay, um lésbico e uma hétero Terceiro / Álbum de família

Filhos devem ser amados por si mesmos
Prestes a completar 50 anos, além de depressão, o escritor teve que lidar com a dislexia e escondeu, durante anos, uma identidade horizontal: a homossexualidade (seus pais, como os da maioria dos pais de gays, são heterossexuais). Hoje feliz e com uma família “inimaginável até pouco tempo atrás” - Solomon é pai biológico da filha de uma amiga heterossexual, tem um filho com seu marido John que, por sua vez, tem outros dois filhos com um casal de lésbicas —, o autor garante ter entendido a importância da aceitação ao analisar as histórias dessas famílias. Partindo do princípio de que “não existe isso de reprodução. Quando duas pessoas decidem ter um bebê, elas se envolvem em um ato de produção”, ele mostra como o tratamento de identidades horizontais atípicas pode inspirar pais, sejam eles de filhos especiais ou não. Condições como o Down ou o nanismo, diz Solomon, são nada mais do que o extremo de uma realidade: os filhos são diferentes dos pais e devem ser amados por si mesmos e não pelo que os pais projetam nele.
A ideia de incluir crianças vítimas de estupro aconteceu quando ele percebeu que essas mães dividiam muita coisa com as demais relatadas no livro - se sentiam alienadas, não amadas, zangadas. O mesmo pode-se dizer em relação às crianças superdotadas - “uma experiência que pode ser bastante solitária para pais e filhos”.
Um das passagens de maior destaque, e não à toa controversa, cita a convivência do autor com Sue e Tom, pais de Dylan Klebold, um dos atiradores da escola Columbine, em 1999. O casal vive até hoje na mesma casa, no Colorado, visitada diversas vezes pelo autor. Dylan era um monstro? Sem dúvida. Mas por culpa dos pais? Solomon acha que não.
- Eu penso que há dois tipos de criminosos: os que se tornam assim por abuso e negligência, e outros que são assim e não há nada que os pais possam fazer de diferente. No caso de Dylan, estou convencido de que Sue e Tom são pessoas excelentes. Crianças e jovens são capazes de guardar segredos muito bem. Falo por mim: escondi dos meus pais que eu era gay durante anos - relata.
O ponto é que, mesmo no meio da tragédia, Andrew Solomon identificou a existência do amor. Quando indagada se pudesse voltar no tempo para conversar com Dylan, por exemplo, Sue Klebold diz que pediria perdão ao filho por “nunca ter conseguido perceber o que se passava na cabeça dele para tê-lo ajudado”.
No capítulo sobre o autismo, condição na qual pais também não têm ideia sobre o que se passa na cabeça dos filhos, impressiona a quantidade de crianças, nos EUA, internadas em instituições especializadas, sendo apenas visitadas pelo pais. O que não é prática comum no Brasil. O autor vê prós e contras nas duas tradições.
Pais devem confiar no próprio diagnóstico
- Às vezes, quando você interna a criança, ela convive com outras parecidas com ela e seu quadro melhora com tratamento especializado. Por outro lado, pelo que vi, manter as crianças em casa as fazem se sentir mais acolhidas. Não há regras. Para mim, o autismo está entre as identidades horizontais com mais obstáculos - acredita o autor. - Quando você tem um filho anão, por exemplo, você fala: ‘o.k., ele tem limitações, mas vou ajudá-lo a tornar a sua vida a melhor possível’. Mas com o autismo há sempre uma nova abordagem surgindo, e o pai sempre se sente fazendo pouco. É claro que pais não podem ficar de braços cruzados e ignorar uma criança autista, mas esta confusão pode ser muito tóxica.
Solomon cita, no entanto, casos de autismo em que grandes progressos ocorreram e defende “intervenções precoces” para todas as condições relatadas. Para ele, pais devem confiar em sua capacidade de fazer diagnósticos “melhor do que muitos médicos”, no sentido de procurar ajuda se observarem algo incomum. O autor acha que o grande desafio de qualquer pai é encontrar um equilíbrio entre moldar, mudar e aceitar uma criança. Entre as famílias pesquisadas, as mais felizes, diz ele, são as que melhor aceitam a identidade horizontal dos pequenos.
A pesquisa
Em entrevistas com mais de 300 famílias em que existem crianças com identidades diferentes das dos pais — seja por mutações genéticas, psicopatias, valores e preferências — Solomon mostra como os pais lidam com os desafios.
Desafios
Surdez: ao lado da cegueira, já se definiu como cultura. Escolha da forma de comunicação é dilema para os pais.
Nanismo: obstáculo maior é lidar com algo que provoca tanta curiosidade.
Síndrome de Down: a vida das crianças tem melhorado muito e, segundo Solomon, grande parte das ideias relacionadas à condição são ultrapassadas. O autor pesquisa casais que, com o avanço dos testes genéticos, debateram interromper ou não a gravidez; ninguém se arrependeu de levá-la adiante.
Autismo: pais ainda confusos e sentindo-se incapazes, dada a complexidade de diagnóstico e tratamento.
Esquizofrenia: como amar um filho que virou outra pessoa é desafio para pais.
Deficiências: dificuldade é experimentar a humanidade de filhos que não apresentam características humanas básicas, como andar e falar.
Altas-habilidades: filhos-prodígio também exigem dos pais uma ‘negociação da diferença’.
Filhos de estupro: o desconforto vem mais da experiência da mãe e de um eventual companheiro dela do que da criança em si, mas isso pode afetar a relação familiar.
Criminosos: como os pais convivem com a dor de terem produzido filhos que levam à destruição? É possível detectar precocemente esta propensão ao mal?
Transgêneros: uma área onde as mudanças acontecem rápido e o potencial inclusivo é enorme. Pais e médicos devem estimular rapidamente uma transição? Mais tarde, uma cirurgia de mudança de sexo é garantia de felicidade? O autor analisa vários casos diferentes.

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