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4.04.2014

Você é viciado em internet?

Estima-se que o problema afete cerca de 10% dos usuários da rede e 20% daqueles que têm smartphone. Tratamento inclui psicoterapia e medicamentos


Patricia Orlando

Uso de celular
Mudar as atividades cotidianas para permanecer on-line é um dos sinais do vício (Thinkstock)
Calcula-se que cerca de 10% dos usuários da internet sejam viciados na rede. Entre aqueles que têm smartphones, o número é estimado em 20%. “Qualquer pessoa, de qualquer idade, que tenha fácil acesso à internet e esteja passando por algum problema, como depressão ou stress, está no grupo de risco”, diz o psicólogo Cristiano Nabuco, coordenador do Grupo de Dependências Tecnológicas do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas, em São Paulo.

O vício em internet não é considerado uma doença pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM, na sigla em inglês), documento elaborado pela Associação Americana de Psiquiatria desde 1952 e atualizado pela última vez em 2013. "Mas essa dependência pode ser enquadrada na categoria de compulsões do DSM, pois a pessoa sofre um alto grau de ansiedade quando fica longe da rede", diz o psiquiatra Daniel Costa, do Hospital Barra D'Or, no Rio de Janeiro.

Quantidade de horas no computador, no tablet ou no smartphone não determina o problema. Os cinco sinais da dependência são pensar exageradamente na internet, ter necessidade de ficar cada vez mais tempo conectado para se sentir bem, esforçar-se continuamente para diminuir o tempo online, irritar-se quando está longe da internet e usar a rede para escapar de problemas ocasionais.

É requisito do diagnóstico, também, que o uso da tecnologia interfira nas atividades cotidianas e no comportamento psicológico. "Afastar-se das pessoas, ter um menor rendimento no trabalho e deixar de fazer qualquer coisa para estar conectado pode ser sinal de dependência", diz Sandro Caramaschi, professor do departamento de psicologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp). Segundo Caramaschi, o diagnóstico costuma ser feito por pessoas que convivem com dependente. "O indivíduo em si não repara. É preciso alertá-lo e ajudá-lo a procurar um especialista."

O tratamento se baseia em psicoterapia e medicamentos como antidepressivos, ansiolíticos e estabilizadores de humor. "Nas sessões, não falamos sobre a internet, mas sim do contexto em que a pessoa está vivendo e as emoções que ela estaria evitando. Quando se descobre os principais motivos, fica mais fácil o próprio usuário achar outros meios de se confortar, como conversar com um amigo", explica Nabuco. Segundo ele, a adição à internet pode ser uma muleta psicológica para outros problemas pré-existentes. "Pesquisas constataram que 90% desses viciados têm traços de depressão, bipolaridade e fobia social."

Confira os sintomas apresentados por viciados em internet

O vício em internet, assim como muitos outros vícios chamados de dependências comportamentais, podem causar danos físicos e emocionais ao portador do problema.

Entre os sintomas físicos, estão incluídos a taquicardia, a sudorese, a secura da boca e as tremedeiras. A longo prazo, a longevidade diante do computador ainda resulta em problemas como comprometimento da postura, lesões por esforço repetitivo, como tendinite, obesidade ou subnutrição, devido a má alimentação, e deformidade na visão, atacada pela luminosidade do monitor.

Do lado psíquico, a incapacidade de concentração, a angústia por estar longe de um computador e o sentimento de impotência estão entre os problemas apresentados. Todas estas características comprometem o indivíduo de diversas formas, como baixo rendimento escolar e profissional, e o sono, por passar madrugadas diante do computador.

"Há casos de dependentes que renegaram a segundo plano a higiene somente para ficar mais tempo na frente de um computador", conta Rosa. 'Mas isso não é comum em casos de viciados em internet', completa a psicóloga.

A tendência é que o vício em internet seja apenas uma ponta do iceberg. E, com o tempo, mais problemas gerados pela tecnologia comecem a aparecer. "Quanto mais presente a tecnologia em nossa vida, mais problemas haverá na relação entre homem e máquina. O vício em internet é só uma das vertentes. O tempo trará mais", diz Erick Itakura, psicólogo da clínica da PUC.

O Núcleo de Pesquisas em Psicologia e Informática da PUC preparou um relatório com alguns procedimentos comuns a pessoas viciadas em internet. Tomando por base os casos atendidos desde 1995, alguns adictos apresentam como principais características:

Preocupação
O viciado fica constantemente preocupado com a internet quando está off-line e mal consegue pensar em outra coisa.

Necessidade
O indivíduo tem a necessidade contínua e crescente de utilizar a internet como forma de obter a excitação desejada.

Irritabilidade Quando tentam reduzir seu tempo na internet, o adicto apresenta reação irritada e grande dificuldade de aceitação.

Fuga
Utilização da internet como forma de fugir de problemas, ou de aliviar sentimentos de impotência, culpa, ansiedade ou depressão é o modo como o viciado se relaciona com ela.

Mentira
O viciado tem o hábito de mentir para familiares e pessoas próximas com o intuito de encobrir a extensão do seu envolvimento com as atividades on-line.

Prejuízos
Com o excesso de tempo na internet, o adicto compromete sua vida social e profissional, evitando compromissos off-line.

Lesões
O uso prolongado do computador causa problemas nas articulações motoras utilizadas na digitação, o que causa lesões por esforços repetitivos (LER).

Apatia
O viciado em internet tem falta de interesse em atividades que sejam realizadas fora da rede ou longe do mundo digital.

Sonho
Sensação de estar vivendo um sonho, durante um período prolongado na internet, é comum no dia-a-dia da pessoa com compulsão ao acesso.

Tempo
Tempo exagerado de conexão, aliado à má qualidade do uso da internet, é uma constante na vida do viciado. A forma da utilização da internet é o elemento determinante para definir se o indivíduo é viciado ou não.

Temas
Os temas abordados normalmente pelo indivíduo são relacionados, de forma direta ou indireta, com a própria internet.

SÉRGIO VINÍCIUS
da Folha de S.Paulo

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