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8.12.2014

Novo protocolo para antirretrovirais

 Novo protocolo para antirretrovirais
(Fonte: O Globo / Texto: Dandara Tinoco)
A sugestão de que homens gays usem medicamentos antirretrovirais como forma de prevenir a infecção pelo HIV, divulgada semana passada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), mobilizou médicos e ativistas em torno do tema. A eficácia do uso preventivo dos remédios — que, segundo pesquisas, pode reduzir em até 92% o risco de infecção — é enfatizada por especialistas que aplaudiram a recomendação, publicada em um momento em que as taxas de infecção pelo vírus da Aids entre gays estão atingindo altos níveis em todo o mundo.

A proposta é aprovada também por organizações civis. Alguns militantes defendem, no entanto, que o uso preventivo dos remédios deva ser voltado para gays em situação de maior vulnerabilidade, como profissionais do sexo e jovens, por exemplo. A viabilidade de colocar a proposta em prática também é motivo de discussão, mas o Ministério da Saúde informou que vai avaliar a ideia.

“Pela primeira vez, a OMS recomenda fortemente que os homens que fazem sexo com homens considerem tomar medicamentos antirretrovirais como um método adicional de prevenir a infecção pelo HIV, juntamente com o uso de preservativos”, informa a nota. O comunicado inclui os gays em uma lista de grupos-chave a quem não estão sendo oferecidos serviços adequados, o que muitas vezes é relacionado à criminalização e ao estigma que essas pessoas sofrem. A organização elenca ainda transsexuais, prisioneiros, pessoas que usam drogas injetáveis e profissionais do sexo entre os que estão em alto risco. Juntos, eles correspondem a cerca de metade de todas as novas infecções pelo HIV no mundo.

Gottfried Hirnschall, chefe do departamento de HIV da OMS, afirmou que as taxas de infecção entre homossexuais estão aumentando novamente após 33 anos do pico da epidemia. Haveria uma diminuição do medo da infecção entre os jovens, devido ao acesso a medicamentos que permitem que pacientes vítimas da Aids vivam com a doença, diminuindo a prevenção. Atualmente, jovens homossexuais homens possuem 19 vezes mais chances de infecção que a população em geral.

O infectologista Alexandre Barbosa, da Faculdade de Medicina da Unesp-Botucatu elogia a sugestão da organização: “Esse é um passo fundamental. A profilaxia pré-exposição já se mostrou extremamente eficaz e evita em mais de 90% o risco de infecção, quando o paciente toma o remédio todos os dias”, afirma. “A OMS está adotando o que os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC, na sigla em inglês) já recomendam desde 2011”.
O médico diz que, apesar de existirem grupos de maior risco entre os homossexuais, a abrangência da proposta da OMS deve ter levado em conta o fato de que a prática de sexo anal, comum entre gays, aumenta as chances de transmissão do vírus.

Para o médico e professor da UFRJ Amilcar Tanuri, a proposta da Organização Mundial de Saúde “faz sentido", já que há grupos em que a incidência de HIV é maior que na população em geral. No entanto, ele chama atenção para o fato de que o uso preventivo dos antirretrovirais pode ter efeitos contrários aos desejados, caso seja feito de forma irresponsável: “O problema maior é que, se os indivíduos em tratamento preventivo não tomarem a medicação regularmente, podem se infectar e selecionar vírus resistentes à medicação em uso e transmitir esse vírus para seus parceiros. Por isso, temos que ter um controle sobre os indivíduos em uso preventivo destas medicações”.

Os médicos afirmam que apesar de os antirretrovirais para uso preventivo terem efeitos colaterais — como problemas renais e ósseos — a incidência deles em pacientes é baixíssima. O volume de medicamentos usados é menor do que os recomendados na terapia regular, para soropositivos.
‘Os custos vão limitar isso’, diz ONG.

Já o diretor presidente da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (ABIA), Richard Parker, vê a sugestão da OMS com cautela. “É importante ampliar todas as tecnologias e técnicas de prevenção existentes, o tratamento com antirretrovirais deve fazer parte do leque de opções para pessoas que têm práticas de risco, mas é óbvio que os custos vão limitar o uso disso em todo o mundo, não só no Brasil”.

Para ele, é “exageradamente otimista” crer que o uso de antirretrovirais ganhará protagonismo na prevenção da epidemia de HIV: “Em muitas partes do mundo, nem as pessoas já infectadas têm acesso aos medicamentos. Ou seja, não é necessariamente uma tecnologia que poderá ser usada amplamente como resposta à epidemia. A camisinha continuará a ter um papel central nisso. Porém, para pessoas que não estão usando preservativo regularmente, o remédio pode ser muito importante”.

Militantes gays dizem apoiar o uso dos remédios na prevenção, mas fazem ressalvas em relação à recomendação para todos os homens que fazem sexo com homens. Beto de Jesus, secretário para América Latina e Caribe da Associação Internacional de Gays e Lésbicas (Ilga, na sigla em inglês), defende que a sugestão seja precedida por um exame caso a caso: “Esse tipo de recomendação não é para todo os homossexuais. Acho que deveria ser direcionada para pessoas que não conseguem ter adesão ao preservativo e pessoas que são mais vulneráveis, como profissionais do sexo e usuários de droga injetáveis”.

Já Carlos Magno Silva Fonseca, presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT ) afirma que é preciso assumir que “há um problema nessa população (homossexual)”. “Quando se falava em grupo de risco, lutamos para não ter haver um estigma sobre essa população, mas temos maturidade para entender que a Aids não está resolvida na nossa comunidade”, pondera. “A infecção está aumentando nessa galera de 15 a 25 anos”.

A nota da OMS esclarece que o uso de antirretrovirais seria uma complementação à prevenção. Segundo a organização, isso diminuiria a incidência do HIV entre homens entre 20% a 25% e evitaria um crescimento da Aids na próxima década.

A inclusão da profilaxia pré-exposição no Sistema Único de Saúde está sendo avaliada pelo Ministério da Saúde por meio de duas pesquisas de campo. A previsão é que os primeiros resultados sobre a viabilidade da oferta da terapia na rede pública sejam apresentados em 2015.

Um comentário:

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