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11.26.2014

Joaquim Levy dança conforme a valsa?

Ninguém desconhece o que pensa e pontifica para o Brasil o ortodoxo economista Joaquim Levy, cogitado como novo ministro da Fazenda do governo Dilma.



Saul Leblon Agência Brasil
Ninguém desconhece o que pensa e pontifica para o Brasil o ortodoxo economista Joaquim Levy, cogitado como novo ministro da Fazenda do governo Dilma.
Suas sabidas concepções fiscais e de desenvolvimento renderam-lhe o ilustrativo epíteto de Joaquim Mãos de Tesoura. Era assim que se referiam a ele os corredores palacianos no primeiro governo Lula, do qual foi Secretário do Tesouro, ao lado do não menos afiado Antônio Palocci, então ministro da Fazenda.
 Suas ideias filiam-se à matriz  que levou o mundo ao desenlace  sistêmico de 2008. Obra respeitável, diga-se.  Injustamente negligenciada pelo mutirão que se esforça em louvar as qualidades técnicas, inequívocas, do escolhido para comandar a economia no quarto ciclo do PT na presidência da República.
A esses cumpre observar que a maior crise sistêmica do capitalismo desde 1929 avança para o seu sétimo ano.
Evidências cravadas em taxas anêmicas de crescimento, desemprego maciço e ameaças deflacionistas  fazem dela o episódio de recuperação mais lenta entre todas as últimas crises do capitalismo registradas no século XX.
Que isso aconteça em paralelo a uma épica abundância de capitais e de liquidez é ilustrativo do imbróglio que significa escapar de um abismo escavando o seu fundo  --receita apregoada pelos manuais abraçados pelos Levys de todas as latitudes.
Bancos e as empresas estão líquidos em todo o planeta. Os mercados financeiros hospedam cerca de US$ 75 trilhões em capitais ociosos, divididos em voos especulativos pelos seis continentes.
Ao contrário do que martelam os manuais abraçados pelos Levys e assemelhados, esse tsunami, equivalente a um PIB mundial, mantém-se distante da economia real  não por excesso de regulação (a ausência delas, ao contrário, explica a crise).
O que o impede de desembarcar na vida das nações, na verdade, é, de um lado, a escassez de demanda em uma economia internacional asfixiada por 200 milhões de desempregados, ademais de um poder de compra das famílias assalariadas devastado.
Mas, sobretudo,   faltam  ferramentas estatais e instituições multilaterais  capazes de orientar e induzir o pouso dessa nuvem financeira  para reverte-la em obras, empregos, modernização urbana, energia sustentável, economia verde, etc.
 A carência é tão gritante que mesmo os velhos organismos domesticados pelo catecismo neoliberal, do FMI ao Banco Mundial, passando pela OCDE,   apressam-se agora a  prescrever políticas fiscais ativas de Estados e governos para salvar mercados e nações da longa estagnação em marcha.
Por que não acontece?
Porque ao longo de décadas,   Levys e assemelhados cuidaram de demonizar teoricamente e de desmontar na prática as ferramentas de que se ressentem agora governos e partidos para sacudir a economia e mudar o destino da sociedade.
 A saber: políticas fiscais ativas; ação estatal reguladora do investimento e do crédito, mitigando-se as oscilações de ciclo inerentes ao capitalismo; controles de capitais indissociáveis da rígida repressão à lambança financeira, de modo a impedir a esterilização do excedente em especulação rentista; fomento e proteção à indústria; ênfase na ação de bancos públicos; coordenação dos mercados internacionais, sobretudo dos mercados financeiros, através de fundos contracíclicos e bancos de investimento.
Levy foi aluno de Armínio Fraga com quem colaborou informalmente na costura do programa do candidato da derrota conservadora em outubro, Aécio Neves.
O anunciado novo ministro da Fazenda foi um dos colaboradores do texto ‘Sob a luz do sol, uma agenda para o Brasil’, veiculado um mês antes das eleições de outubro pelo  Centro de Debate de Políticas Públicas, uma versão bandeirante da Casa das Garças, o think tank tucano, no Rio.
O texto elaborado por um frente ecumênica do conservadorismo acadêmico incluiu, além de Levy, economistas e interlocutores das campanhas de Aécio Neves (PSDB) e de Marina Silva (PSB), como o ex-presidente tucano do BNDES, Edmar Bacha, ademais de Samuel Pessoa, Marcos Lisboa, Mário Mesquita e o economista-chefe do Itaú, Ilan Goldfajn. (http://www.insper.edu.br/wp-content/uploads/2014/09/Coletanea-capitulos-Sob-a-Luz-do-Sol-final.pdf).
As  propostas assim harmonizadas passam ao largo de qualquer autocrítica em relação ao cuore neoliberal, como se o ano de 2008 nunca tivesse existido no calendário do século XXI.
Desse bunker de certezas inoxidáveis saltam  as linhas mestras adequadas a qualquer governo resultante das urnas de outubro.
Exceto o do PT.
Incluem-se nessa bateria:
a) a redução ‘gradativa’ da meta de inflação dos atuais 4,5% para 3% (não sem mensurar  o custo em juros e desemprego dessa transição);
b) o fim do financiamento subsidiado do BNDES (o que inviabiliza qualquer política industrial);
c) o fim da exigência de conteúdo nacional nas compras do Estado (pá de cal no poder indutor dos gastos públicos para desenvolver setores produtivos locais);
d) ‘liberar’ a Petrobras da obrigatoriedade de participação em todos os projetos do pré-sal e, literalmente,  “gerar uma melhora no marco regulatório no setor de petróleo” ( leia-se, fim da regulação soberana do pré-sal);
e) a criação de um Conselho de Avaliação Fiscal independente do governo “para auxiliar a preparação dos orçamentos e avaliar a aderência da política fiscal em curso aos objetivos declarados pelas autoridades” (cabeça de ponte de um engessamento ainda maior do governo, que ficaria tutelado por um regulador fiscal acima das urnas e dos votos);
f) a autonomia operacional do Banco Central com mandatos fixos para sua diretoria estabelecidos por lei (retira do Presidente da República a autoridade para demitir e renomear diretorias alargando assim a ingerência do mercado sobre a política monetária);
g) repensar a ênfase do Brasil às negociações multilaterais da Rodada de Doha e ao MERCOSUL (contorcionismo em defesa de acordos de livre comércio que miram um renascimento da Alca);
h) e, por fim,  um melífluo arrazoado sobre a necessidade de ‘estimular a volta’ da mão-de-obra ao mercado de trabalho, sem explicar o que estaria impedindo esse retorno (Bolsa Família, seguro-desemprego?). O que se depreende, de qualquer forma, é a preocupação subjacente em baixar o custo do trabalho no país –pressionado, a longo, prazo, diz o documento,  pela queda da natalidade e o fim da transição urbano/rural, o que reforça a importância de se elevar a produtividade do assalariado brasileiro.
Não se duvida da competência técnica de Joaquim Levy. Essa competência como mostra o resumo acima está a serviço de ideias.
E essas ideias e concepções históricas são distintas daquelas que as urnas de outubro consagraram como mais adequadas ao país nos próximos quatro anos.
A macroeconomia reúne técnicas úteis à direita e à esquerda.
 Responsabilidade fiscal, inflação baixa, câmbio competitivos, ademais, não são apanágios de qualquer coloração partidária.
O amálgama, porém, quem dá é a concepção política que maneja as alavancas do desenvolvimento de uma nação. (É prerrogativa da Dilma)
O amálgama da coalizão conservadora que tentou derrotar Dilma tem como requisito abortar um processo de crescimento baseado na distribuição da riqueza para devolver o país aos trilhos de um neoliberalismo puro sangue.
Ungido ministro da Fazenda do PT, Joaquim Levy vai dançar conforme  a valsa?
Ou tentará adaptar a valsa ao compasso da marcha que levou o Brasil nos anos 90, e o mundo em 2008, ao tombo neoliberal?

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