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1.29.2015

CRISE HÍDRICA

Transposição do Paraíba do Sul não é a melhor opção nem para São Paulo

Obra que reduzirá abastecimento do Rio não é prioritária para órgãos técnicos paulistas

Nonato Viegas

O síndico Saul Cusnir instalou sistema de irrigação das plantas que gasta menos água do que as mangueiras
Foto:  Fernando Souza / Agência O Dia

Rio - Embora seja anunciada como a panaceia necessária para resolver a questão da escassez de água em São Paulo, a transposição de parte do Paraíba do Sul para um dos reservatórios do sistema Cantareira não é sequer a primeira opção apontada por órgãos do próprio governo daquele estado. Ainda assim, o governador Geraldo Alckmin insistiu na intervenção no rio, que é o único em volume capaz de atender às necessidades dos municípios fluminenses.
O Plano Diretor de Aproveitamento dos Recursos Hídricos para a Macrometrópole Paulista, desenvolvido por técnicos daquele estado, prevê dez obras até 2030 para garantir o abastecimento. Entre os quais, o que levará água do reservatório Jaguari, na Bacia do Paraíba do Sul, a Atibainha, que pertence ao sistema Cantareira.
No relatório, que estabelece uma ordem de importância e viabilidade a cada uma delas, os técnicos citam o baixo volume retirado na transposição (5 metros cúbicos por segundo) e sugerem que se construa também “reservatórios de regularização nos afluentes do Rio Paraíba do Sul, visando a preservar as condições hídricas atuais do rio”.
Comparando com outra obra sugerida no Plano de Aproveitamento dos Recursos Hídricos, ainda para abastecer a Região Metropolitana de São Paulo, as barragens Duas Pontes e Pedreira, quando completas, terão vazão quase quatro vezes maior (18 metros cúbicos por segundo), beneficiando 20 municípios, segundo o relatório. Estas, porém, não afetariam o Paraíba do Sul.
O governo paulista, no entanto, defendeu a obra na Bacia do Paraíba do Sul, segundo ele, pela necessidade de uma interligação entre os dois reservatórios. Sobre quais medidas constarão no edital de licitação para a regularizar a perda nos afluentes do rio, a assessoria de imprensa do governo de São Paulo pediu prazo maior para responder. O edital de licitação para a transposição está previsto para ser lançado amanhã.
Desde 2013, o governo do Rio conhecia os malefícios que a obra em terras paulistas causaria ao abastecimento fluminense e à geração de energia, segundo apontou estudo de técnicos da UFRJ, conforme publicou nesta quarta-feira o DIA . O documento também sugeriu que nos fóruns de discussão entre os governos de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais — outro interessado no assunto — buscassem “políticas proativas tendo em vista soluções do tipo ‘ganha-ganha’”.
Existem, diz o relatório, “vários arranjos possíveis alternativos para o aumento de oferta hídrica da Macrometrópole Paulista, enquanto o Estado do Rio depende substantivamente das águas da Bacia do Rio Paraíba do Sul para o seu desenvolvimento socioeconômico.”
Pezão já fala em medidas drásticas
O governador Luiz Fernando Pezão admitiu nesta quarta-feira, após se reunir com a presidenta Dilma Rousseff, em Brasília, que, se a seca se prolongar até abril, quando termina o período de chuvas na região, terá de tomar medidas “drásticas” em relação ao consumo de água no estado.
De acordo com o governador, não será cobrada sobretaxa para quem consumir água em excesso, “pelo menos em janeiro e fevereiro”. “A gente vai intensificar o ritmo das obras (para garantir o abastecimento de água), que é o que a gente acredita. E agora é torcer muito para que comece a chover e que a gente não precise tomar outras medidas mais drásticas”, disse.
Dicas para economizar água
Indagado, ele não esclareceu quais seriam essas medidas e explicou que nenhuma possibilidade está afastada. “Neste momento, a gente não quer tomar nenhuma dessas medidas (sobretaxa e racionamento) porque ainda não são necessárias, mas nada está afastado. Se essa seca se prolongar em fevereiro, março, abril, que é o período de chuva no Rio, vamos tomar outras medidas, mas ainda estamos estudando”, declarou o governador, explicando que foi a Brasília mostrar à presidenta alguns projetos do estado para garantir o abastecimento de água.
Enquanto as medidas do governo não vêm, alguns cariocas já começam a economizar água. Em Botafogo, na Zona Sul, o síndico do Condomínio Golden Garden, Saul Cusnir, 48 anos, conta que, há um mês, a água despejada pela máquina de lavar de alguns moradores é aproveitada para limpar contêineres de lixo do prédio. A irrigação do jardim também é controlada para evitar desperdício. Em vez de mangueiras, pequenos canos com furos molham as plantas.

Paraíba do Sul é a única opção de abastecimento para o Estado do Rio
Foto:  Genilson Pessanha/ Folha da Manhã

Conta da Cedae
Apesar de o governador ter descartado, no momento, cobrança extra para quem consome água em excesso, na prática a Cedae já aplica sobretaxas a clientes que gastam mais de 15 mil litros por mês. Esse é o limite considerado prudente pela companhia para frear o desperdício e equivale a encher uma caixa d’água de mil litros a cada dois dias.
A estrutura de tarifas progressivas faz com que um consumidor com gasto mensal de 30 mil litros pague mais que o triplo de quem utilizou a metade do recurso. A Cedae aplica fórmulas diferentes para tarifar o consumo de até 15 mil, 30 mil, 45 mil ou 60 mil litros por habitação, por mês.
Um consumidor que se enquadra na faixa mínima paga R$ 34,48. Já quem consome o dobro paga R$ 126,46. “A estrutura tarifária é progressiva, justamente para desestimular o consumo excessivo. É assim desde 1975”, afirmou o presidente da concessionária, Jorge Briard, em nota.
De acordo com a Cedae, cerca de 70% dos consumidores estão na faixa do consumo não sobretaxada. Briard diz que a faixa mínima de 500 litros por dia é confortável, já que a Organização Mundial da Saúde recomenda 100 litros per capta por dia e a média do estado é de 3,3 moradores por habitação.
Nos condomínios com hidrômetro coletivo, a faixa de consumo é proporcional ao número de apartamentos. Na cidade do Rio, a legislação só passou a exigir que prédios novos tenham hidrômetros individuais em 2011. “A hidrometria individualizada faz com que cada pessoa tenha seu compromisso de economizar”, avalia o presidente do Conselho Estadual de Recursos Hídricos, Décio Tubbs.

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