Ao parabenizar Donald Trump pela vitória na eleição americana, a nota oficial do presidente Michel Temer foi protocolar e cordata. Refletiu a surpresa e decepção do governo brasileiro, que torcia por Hillary Clinton. A reação do ministro José Serra, das Relações Exteriores, teve o objetivo de corrigir declarações dele que consideravam a hipótese Trump um “pesadelo”.
A frase “treino é treino, jogo é jogo” foi uma boa sacada. Mas Serra falar em respeito ao voto soou irônico. Ele chegou ao cargo por indicação de Temer pertencendo a um partido que perdeu as últimas quatro eleições presidenciais para o PT e que, nos dias seguintes à eleição de Dilma Rousseff, contestou o resultado na Justiça Eleitoral. Respeito ao placar eleitoral não foi uma atitude do PSDB em 2014.
Serra não tem preparo para a diplomacia. É um político beligerante e deu uma guinada na política externa na hora errada. Com Trump ameaçando o México e a China, seria o momento de o Brasil reforçar laços com a América Latina e a África, como fez o governo Lula. Nessas regiões, o Brasil tem projeção geopolítica para disputar mercado de modo competitivo com empresas americanas e chinesas.
Também seria a hora de o Itamaraty buscar uma aproximação ainda maior com os chineses para fazer contraponto aos Estados Unidos, mas Serra errou até o nome dos países que compõem o Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). O Itamaraty retornou a uma posição de submissão aos EUA no momento inadequado. Reforçar o Brics e os laços com a América Latina seria uma reação inteligente de Temer a Trump.
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Merkel faz a coisa certa
Das reações dos líderes mundiais à vitória de Donald Trump na eleição americana, a mais importante foi a da chanceler da Alemanha, Angela Merkel. Elegante, mas dura, ela enviou a mensagem correta e necessária.
A chanceler se disse disposta a trabalhar de perto com Trump desde que ele siga uma agenda de valores que unem tradicionalmente as relações entre os Estados Unidos e a Alemanha. E citou então uma lista de temas nas quais Trump foi xenófobo, racista e fascista durante a campanha. Ela falou em “democracia, liberdade, respeito ao Estado de direito, dignidade das pessoas independentemente de sua origem, cor da sua pele, religião, gênero, orientação sexual e visões políticas”.
Esse tipo de reação mostra que Trump poderá muito, porque vai comandar o país mais poderoso do planeta, mas não poderá tudo. Ele enfrentará contraponto de líderes responsáveis e mais preparados, como Angela Merkel.
As reações da França e do Reino Unido foram mais moderadas do que a da Alemanha, apesar de o presidente François Hollande ter feito um pronunciamento mais próximo de Merkel do que o da primeira-ministra Teresa May. Hollande tocou no ponto da geração de incertezas.
A França e a Alemanha são os principais países da União Europeia. Os franceses têm uma máquina militar respeitável. Os alemães, uma economia saudável em meio a um quadro de adversidade. Uma união franco-alemã poderá fazer um contraponto fundamental a uma eventual aliança entre Trump e Vladimin Putin, por exemplo.
Já Teresa May tem um grande abacaxi para descascar. Com a decisão do Reino Unido de deixar a União Europeia, os britânicos tinham esperança de maior aproximação comercial bilateral com os EUA no futuro. Se Trump cumprir as promessas de políticas industriais e comerciais mais fechadas, o Reino Unido terá mais dificuldade econômica pós-Brexit, já que a União Europeia também deixou claro que a saída do bloco terá um preço em menos privilégios e benefícios do que a permanência.
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