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11.07.2017

Lula seria vítima do “Direito Penal do inimigo?”





Ricardo Stuckert

No caso do TRIPLEX do Guarujá Lula foi condenado sem provas. Esse é um fato que qualquer processualista ou criminalista sério sustentará, em havendo honestidade na análise.
O juiz Sérgio Moro condenou Lula com base nas delações e no chamado ‘conjunto das circunstâncias’ e, inegavelmente, inexiste um documento que ateste que o apartamento pertence ao ex-presidente. Ao contrário: os que existem provam e atestam não pertencer a Lula.
Se é assim, por que Lula foi condenado?
Foi condenado porque a 13ª Vara Federal de Curitiba decidiu trata-lo como inimigo do Estado e condená-lo, eventuais razões ocultas para a injusta condenação serão reveladas pelo Tempo, primo-irmão da Verdade e da Justiça.
Talvez possamos compreender essa condenação à luz do tal Direito Penal do Inimigo.
A ideia foi introduzida por Gunther Jakobs e segundo ela certas pessoas, por serem inimigas da sociedade ou do Estado, não detém todas as proteções penais e processuais penais que são dadas aos demais indivíduos.
O Jurista Gunther  Jakobs propõe a distinção entre um direito penal do cidadão, que se caracteriza pela manutenção da vigência da norma, e um direito penal para inimigos, orientado para o combate a perigos e que permite que qualquer meio disponível seja utilizado para punir esses inimigos.
Propõe sistemas antinômicos e não responde questão fundamenal: QUEM ESTABELECE QUEM É O INIMIGO?
Na prática o direito penal do inimigo significa a suspensão de certas leis justificada pela necessidade de proteger a sociedade ou o Estado, o que é definido ideologiacamente pelo magistrado, pois segunda a teoria qualquer pessoa que não respeite as leis e a ordem legal de um Estado, ou que pretenda mesmo destruí-los, deve perder todos os direitos como cidadão e como ser humano, e o Estado deve permitir que essa pessoa seja perseguida (Lawfare?) por todos os meios disponíveis.
A sanha punitivista desses nossos dias transformou o Poder Judiciário. O Judiciário está politizado e logo ele que deveria ser o guardião da lei e da constituição, deveria ser o garantidor dos direitos e garantias fundamentais, presta-se a instrumentaliza o Direito Penal do Inimigo e declara que vivemos em Estado de Exceção.
Tudo para que Golpe de Estado de 2016 seja concluído sem os entraves que a lei e a constituição poderiam criar.
A que me refiro? Ao fato de o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o mesmo que vai julgar o recurso de Lula, haver conferido ao Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba verdadeira "carta branca" para desrespeitar a lei e a constituição, tudo com base na "Teoria do Estado de Exceção" e, talvez, na perspectiva do Direito Penal do Inimigo.
Bem, o TRF 4 fundamentou a citada e temerária decisão na "Teoria do Estado de Exceção", o que é, data máxima vênia, um crime contra a nação (e o STF, a imprensa e os partidos democráticos quedam silentes).
Tudo isso é uma estupidez. A Teoria do Estado de Exceção, o Direito Penal do Inimigo, a supressão de direitos patrocianada por alguns órgaos do Poder Judiciário são manifestações esquizofrenicas da estultice desses tempos sombrios e constrangedores.
Mas voltando ao Direito Penal do Inimigo temos que a maioria dos estudiosos do direito penal e da filosofia do Direito se opõem a tal conceito.

E a fragilidade, sob a perspectiva filosófica, reside no fato de que, não obstante Günther Jakobs tentar demonstrar que sua ideia foi baseada na obra de Kant, o professor alemão se afasta do pensamento do filósofo, pois para Kant, somente se pode proceder de forma hostil contra alguém "quando ele de fato já me lesou", enquanto Jakobs defende o posicionamento de que a punibilidade seja "amplamente antecipada para o âmbito da preparação.".
Ademais, mesmo que Jakobs tivesse se mantido integralmente fiel ao pensamento kantiano, o que não ocorre em sua tese, ainda assim seria absolutamente impossível transportar as ideias de Kant para os dias de hoje, especialmente em virtude da nova concepção de direitos humanos.
Por fim, ainda no que tange à fragilidade sob o ponto de vista jurídico, é conveniente lembrar que o artigo 11, § 1° da Declaração Universal dos Direitos Humanos, prevê que "Toda pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa."
E o art. 30 do mesmo documento liquida os defensores da ideia ao estabelecer que "Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada como o reconhecimento a qualquer Estado, grupo ou pessoa, do direito de exercer qualquer atividade ou praticar qualquer ato destinado à destruição de quaisquer dos direitos e liberdades aqui estabelecidos."
E no Brasil nosso ordenamento jurídico, o art. 5°, LV, da CR/88 dispõe que "aos litigantes em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes."
Ampla defesa, ao contrário do que Moro e o MPF de Curitiba imaginam, é a expressão que denomina o princípio pelo qual a todos é garantido o direito de expor, desde que lícitas, quaisquer razões na defesa de direitos, ensejando ao juiz firmar sua convicção com base nos argumentos e provas apresentadas, devendo fundamentar sua decisão com base naquilo que for demonstrado pelas partes, justamente por isso a ideia de Jakobs, no sentido da supressão das garantias processuais, nas hipóteses de crimes cometidos por inimigos, jamais pode prevalecer, pois entendemos que tal posicionamento seria um dos maiores retrocessos da história da humanidade, no que tange aos direitos humanos fundamentais.
A verdade é que esses fatos, que merecerão análise de gente mais qualificada que eu, é a gênese do estado de incerteza e insegurança atual e, para além dos dramas pessoais, a nossa enfrenta sua pior crise desde a promulgação da Constituição de 1988.

Pedro Benedito Maciel Neto, 53, advogado, sócio da MACIEL NETO ADVOCACIA, autor de “Reflexões sobre o estudo do Direito”, ed. Komedi, 2007

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