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4.14.2018


Presidenta do STF, que ocupa presidência do país nesta sexta por viagem de Temer, foi decisiva para prisão de Lula, não cumprindo a constituição.

De unanimidade pelos discursos contra corrupção, ela sente o peso dos questionamentos enquanto detêm o enorme poder da pauta da corte



Cármen Lúcia
A ministra Cármen Lúcia, no STF. 



No momento mais importante de sua gestão à frente do
Supremo Tribunal Federal, a ministra Cármen Lúcia será 
promovida nesta sexta-feira, dia 13. Ela ocupará, por pouco 
mais de 24 horas, a cadeira de presidente da República. 
Sua assunção ao cargo se deve à viagem do 
presidente golpista Michel Temer ao Peru, onde participará da 
Cúpula das Américas. As outras duas autoridades que 
poderiam sucedê-lo, respectivamente os presidentes da 
Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Eunício Oliveira, 
(que apoiaram o golpe paralamentar) também se ausentarão
do país no período para evitar 
que assumissem um cargo no Executivo e, assim, fossem
proibidos de concorrer nas eleições.
A chegada temporária da magistrada ao principal cargo da República ocorre um pouco mais de uma semana depois do lance mais impactante de seu mandato, iniciado em 2016. Foi graças a uma escolha soberana de Cármen Lúcia que o plenário do Supremo votou - e negou - o habeas corpus rasgando a constituição no pedido feito pela defesa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao invés de discutir de maneira geral a questão do cumprimento da pena após condenação em segunda instância. Para a maioria, se o tema geral seguisse a constituição, o resultado seria outro.
O movimento de xadrez de Cármen jogou a ministra - antes vista com respeito e elogiada pelos discursos sucintos e claros contra corrupção e contra a desigualdade de gênero - no centro da polarização política. Sua casa, em Belo Horizonte, chegou a ser alvo de um escracho de apoiadores de Lula enquanto os coxinhas golpistas comemoravam sua prisão distribuindo via WhatsApp fotos da magistrada mineira.
Foi o auge de um movimento da crise política que engole o STF.
O tribunal tem se envolvido e tem sido chamado a se envolver,
cada vez mais, com temas políticos que acabam colocando em
dúvida o que ocorre neste momento no país: a judicialização
da política ou a politização do Judiciário? Não é por acaso que a
imprensa internacional considera o Lula um preso politico.
O que aconteceu com a magistrada nos últimos meses é o
que ocorre, geralmente, com quem assume funções ou cargos
de extrema relevância.
Deixa de ser pedra e se torna vidraça. Ainda mais quando tem
 que ouvir a toda poderosa Rede Globo que quer a todo
custo tirar o Lula das eleições.
 Nos quase 12 anos que
 está como juíza constitucional, Cármen Lúcia se notabilizou
pelos duros votos (decisões) em casos polêmicos, por seus
posicionamentos a favor da liberdade de expressão, por ter uma
postura ética na análise de processos em que poderia estar
direta ou indiretamente envolvida e por conseguir sintetizar
em poucas frases a importância do julgamento de determinados
temas. Mas, agora, entre muitos advogados, ela passou de uma
juíza admirada por seus discursos a ter sua condução à frente
da corte questionada por estar agindo politicamente.
 ora é chamada de insegura ora vista como inábil na hora de
conter as tensões de uma corte cheia de egos e majoritariamente
 masculina.
Foi na semana passada que mostrou resistência diante da
pressão máxima dos colegas. Ela, que já havia citado pesquisa
 norte-americana que mostra que mulheres são interrompidas
 18 vezes mais do que os pares homens em tribunais,
defendeu-se dos duros questionamentos dos ministros.
Eles eram contrários à sua decisão de não colocar em
votação as duas ações declaratórias de constitucionalidade
 (ADCs) que questionam a prisão provisória após condenação
em segunda instância. "Que isso fique nos anais do tribunal.
Vence a estratégia, o fato de Vossa Excelência não ter pautado
 as Ações Declaratórias de Constitucionalidade", lançou à
história o ministro Marco Aurélio Mello. Os casos ainda não
foram pautados. E, no que depender da vontade da presidenta,
 não serão tão cedo, mostrando o controle absoluto que ela tem
 do tabuleiro por dominar a pauta da corte. É que isso pode
beneficiar o Lula e ai a Globo não quer

Soluções Aécio e Renan

O impasse sobre as ADCs, no entanto, não foi a primeira conduta
da magistrada que dividiu juristas.  Ao mesmo tempo que seus
defensores dizem que ela tentou evitar recuos na Lava Jato
(impedindo que Lula permanecesse em liberdade) e atuou
em defesa da segurança jurídica, seu detratores lembram
que ela acabou beneficiando alguns dos investigados da
operação. Seus críticos se queixam de quando ela emitiu
restrição dada ao senador tucano Aécio Neves
(investigado por corrupção) - a palavra final sobre  o
mandato do mineiro ficou com o Senado, que o salvou.
 Também lembram quando, com seu voto, ela
 ajudou o senador emedebista Renan Calheiros,
 em dezembro de 2016, a recuperar o cargo de
presidente do Senado – do qual havia sido afastado
por se tornar réu.

“A presidente do Supremo mostrou que o discurso fica diferente
prática”, avaliou o juiz aposentado Walter Maierovitch.
Em sua análise, faltava a ela firmeza para administrar o principal órgão judiciário do país. “Quando apareceram as denúncias contra Michel Temer cogitou-se que a Cármen Lúcia poderia assumir a presidência por meio da votação indireta. Naquela época ela era a ministra dos belos discursos, de votos não
polêmicos, de votação das unanimidades. O que se percebeu
 logo depois era que ela não era tudo isso. Ela não tinha pulso, era muito fraca”.

Sobre a decisão de não pautar as ADCs sobre prisão em
segunda instância também não há consenso. “A orientação
do Supremo foi consolidada em 2016. Deve continuar assim.
Uma mudança seria um retrocesso”, declarou  o presidente
da Associação dos Juízes Federais, Roberto Velloso,
discordando da urgência de o plenário rediscutir o mérito
da questão apesar de ministros, como Gilmar Mendes,
 terem mudado de voto.
Para Walter Maierovitch e Roberto Tardelli, ex-promotor de
Justiça em São Paulo, a imagem de Cármen Lúcia poderia
ser outra caso ela tivesse escolhido pautar as ADCs.
“Evidentemente, ela é uma das responsáveis por essa
tumultuada prisão do Lula e pela situação de insegurança
jurídica do país”, afirmou o juiz Maierovitch. “É uma gestão
 errática, de quem espera obter legitimidade da forma mais
doida possível: ouvindo as ruas. Mas as ruas que ela ouve
são as ruas das elites. É a Oscar Freire. Não é a favela da
 Rocinha. Não é a região de Guaianazes”, diz Tardelli.
Até que deixe o cargo, em setembro, não se espera que as águas agitadas se acalmem em torno de Cármen Lúcia. Seguirá, sobre a cabeça da mineira, a pressão pela votação dos ADCs sem falar que outras decisões cruciais sobre a eleição - como um não definitivo a uma candidatura de Lula - devem chegar à corte máxima. 
Se no Judiciário ela tem sido confrontada, em sua brevíssima passagem pelo Executivo ela quer passar completamente despercebida. Nesta sexta-feira, tem agendada seis audiências, a maioria voltada para o próprio Judiciário. Nem pretende ir ao Palácio do Planalto. Em princípio, vai despachar apenas matérias urgentes, da mesa de seu gabinete.

CÁRMEN LÚCIA NO STF EM CINCO MOMENTOS MARCANTES

Temer e Cármen Lúcia na transmissão de cargo nessa sexta, 13.
Temer e Cármen Lúcia na transmissão de cargo nessa sexta, 13.  PR

1) Durante o julgamento em novembro de 2016 que decretou a prisão do então senador Delcídio do Amaral (PT-MS), Cármen Lúcia fez um histórico da corrupção durante os governos do PT (2003-2016): “na história recente de nossa pátria, houve um momento em que a maioria de nós brasileiros acreditou no mote de que a esperança tinha vencido o medo. Depois, nos deparamos com a ação penal 470 (mensalão) e descobrimos que o cinismo venceu a esperança. E agora parece se constatar que o escárnio venceu o cinismo. Quero avisar que o crime não vencerá a Justiça”;
2) Em 2015, quando foi analisar um processo em que se questionava a necessidade de autorização prévia para se publicar biografias (entre elas do cantor e compositor Roberto Carlos), Cármen Lúcia defendeu insistentemente a livre manifestação e disparou: “Cala a boca já morreu, quem disse foi a Constituição”;
3) Quando precisou julgar a validade das pesquisas com células embrionárias, deixou sua religião católica de lado e afirmou: “Aqui, a Constituição é a minha bíblia, o Brasil, minha única religião. Juiz, no foro, cultua o Direito”.
4) Em ao menos dois casos notórios, informou que não poderia participar dos julgamentos. Em um, que envolvia Eduardo Azeredo (PSDB), ex-governador de Minas Gerais, afirmou que não conseguiria julgá-lo, porque já havia trabalhado com ele. Em outro, quando tratava dos poupadores prejudicados pelo Governo Collor de Mello, se absteve de julgar porque o pai dela seria um dos beneficiários. Só se declarou desimpedida com a morte dele.
5) A presidenta do tribunal sempre militou pelo fim das desigualdades de gênero e provocou risos no Dia da Mulher de 2017. O ministro Luis Roberto Barroso pediu a palavra para saudar as mulheres entre os magistrados - Rosa Weber e a própria Cármen, que retrucou:  “Vossa Excelência vê como é a vida… Nós (mulheres) temos um dia, Vossa Excelência tem todos os outros. Olha o princípio da igualdade…

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