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11.09.2018

Por que votamos em Hitler

Por que a Alemanha, o país com um dos melhores sistemas de educação pública e a maior concentração de doutores do mundo na época, sucumbiu a um charlatão fascista?


Ao longo da década de 1920, Adolf Hitler era pouco mais do que
 um ex-militar bizarro de baixo escalão, que poucas pessoas 
levavam a sério. Ele era conhecido principalmente por seus 
discursos contra minorias, políticos de esquerda, pacifistas, 
feministas, gays, elites progressistas, imigrantes, a mídia e a
 Liga das Nações, precursora das Nações Unidas. Em 1932,
 porém, 37% dos eleitores alemães votaram no partido de 
Hitler, a nova força política dominante no país. Em janeiro 
de 1933, ele tornou-se chefe de governo. Por que tantos 
alemães instruídos votaram em um patético bufão que levou
 o país ao abismo?
Em primeiro lugar, os alemães tinham perdido a fé no 
sistema político da época. A jovem democracia não trouxera
 os benefícios que muitos esperavam. Muitos sentiam raiva
 das elites tradicionais, cujas políticas tinham causado a pior crise
Em segundo lugar, Hitler sabia como usar a mídia para 
seus propósitos. Contrastando o discurso burocrático da 
maioria dos outros políticos, Hitler usava um linguajar simples,
 espalhava fake news, e os jornais adoravam sugerir que
 muito do que ele dizia era absurdo. Hitler era politicamente
 incorreto de propósito, o que o tornava mais autêntico
aos olhos dos eleitores. Cada discurso era um espetáculo.
 Diferentemente dos outros políticos, ele foi recebido com
 aplausos de pé onde quer que fosse, empolgando as 
multidões. Como escreveu em seu livro "Minha Luta":
Toda propaganda deve ser apresentada em uma forma 
popular (...), não estar acima das cabeças dos menos 
intelectuais daqueles a quem é dirigida. (...) A arte da
 propaganda consiste precisamente em poder despertar
 a imaginação do público através de um apelo aos seus
 sentimentos.
Em terceiro lugar, muitos alemães sentiram que seu país
 sofria com uma crise moral, e Hitler prometeu uma 
restauração. Pessoas religiosas, sobretudo, ficaram 
horrorizadas com a arte moderna e os costumes culturais
 progressistas que surgiram por volta de 1920, época
 em que as mulheres se tornavam cada vez mais 
independentes, e a comunidade LGBT em Berlim 
começava a ganhar visibilidade. Os conservadores 
sonhavam com restabelecer a antiga ordem. 
Os conselheiros de Hitler eram todos homens 
heterossexuais brancos. As mulheres, ele argumentou,
 deveriam se limitar a administrar a casa e ter filhos. 
Homens inseguros podiam, de vez em quando, quebrar
 vitrines de lojas, cujos donos eram judeus, para reafirmarem
 sua masculinidade.
Em quarto lugar, apesar de Hitler fazer declarações 
ultrajantes – como a de que judeus e gays deveriam ser
 mortos -, muitos pensavam que ele só queria chocar 
as pessoas. Muitos alemães que tinham amigos gays 
ou judeus votaram em Hitler, confiantes de que ele nunca
 implementaria suas promessas. Simplista, inexperiente 
e muitas vezes tão esdrúxulo, que até mesmo seus 
concorrentes riam dele, Hitler poderia ser controlado 
por conselheiros mais experientes, ou ele logo deixaria 
a política. Afinal, ele precisava de partidos tradicionais 
para governar.
Em quinto, Hitler ofereceu soluções simplistas que, 
à primeira vista, faziam sentido para todos. O problema
 do crime, argumentava, poderia ser resolvido aplicando
 a pena de morte com mais frequência e aumentando 
as sentenças de prisão. Problemas econômicos, segundo
 ele, eram causados por atores externos e conspiradores
 comunistas. Os judeus - que representavam menos de 
1% da população total - eram o bode expiatório favorito.
 Os alemães "verdadeiros" não deviam se culpar por nada.
 Tudo foi embalado em slogans fáceis de lembrar:
 "Alemanha acima de tudo", "Renascimento da Alemanha",
 "Um povo, uma nação, um líder."
Em sexto lugar, as elites logo aderiram a Hitler porque 
ele prometeu -- e implementou -- um atraente regime 
clientelista, cleptocrata, que beneficiava grupos de 
interesses especiais. Os industriais ganharam contratos
 suculentos, que os fizeram ignorar as tendências fascistas de Hitler.
Em sétimo, mesmo antes da eleição de 1932, falar contra
 Hitler tornou-se cada vez mais perigoso. Jovens agressivos,
 que apoiavam Hitler, ameaçavam os oponentes, 
limitando-se inicialmente ao abuso verbal, mas logo 
passando para a violência física. Muitos alemães que não
 apoiavam o regime preferiam ficar calados para evitar
 problemas com os nazistas.
Doze anos depois, com seis milhões de judeus exterminados
 e mais de 50 milhões de pessoas mortas na 
Segunda Guerra Mundial, muitos alemães que votaram
em Hitler disseram a si mesmos que não tinham ideia de
 que ele traria tanta miséria ao mundo. “Se soubesse que
 ele mataria pessoas ou invadiria outros países, eu nunca
 teria votado nele ”, contou-me um amigo da minha família.
 “Mas como você pode dizer isso, considerando que Hitler
 falou publicamente de enforcar criminosos judeus durante 
a campanha?”, perguntei. “Eu achava que ele era pouco 
mais que um palhaço, um trapaceiro”, minha avó, cujo irmão
 morreu na guerra, responderia.
De fato, uma análise mais objetiva mostra que, justamente
 quando era mais necessário defender a democracia, 
os alemães caíram na tentação fácil de um demagogo 
patético que fornecia uma falsa sensação de segurança
 e muito poucas propostas concretas de como lidar com
 os problemas da Alemanha em 1932. Diferentemente 
do que se ouve hoje em dia, Hitler não era um gênio. 
Não passava de um charlatão oportunista que identificou 
e explorou uma profunda insegurança na sociedade alemã.
Hitler não chegou ao poder porque todos os alemães eram
 nazistas ou anti-semitas, mas porque muitas pessoas 
razoáveis fizeram vista grossa. O mal se estabeleceu na
 vida cotidiana porque as pessoas eram incapazes ou sem
 vontade de reconhecê-lo ou denunciá-lo, disseminando-se
 entre os alemães porque o povo estava disposto a minimizá-lo.
 Antes de muitos perceberem o que a maquinaria fascista 
do partido governista estava fazendo, ele já não podia 
mais ser contido. Era tarde demais

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