O governo federal anunciou ontem que irá pagar 13º às famílias
cadastradas no Bolsa Família com o dinheiro economizado por
cortes de beneficiários irregulares do programa social.
Entretanto, o UOL pesquisou os dados oficiais fornecidos pelo
Ministério da Cidadania e viu que, desde a posse de
Michel Temer (MDB) na Presidência, em abril de 2016,
houve aumento do número de famílias beneficiárias e de gastos.
Tampouco houve redução na folha de pagamento como dito
pelo governo.
Em 2019, devem ser gastos mais de R$ 30 bilhões com o auxílio.
Ontem, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) fez uma postagem no
Twitter dizendo que os recursos para pagar o 13° são "oriundos em sua esmagadora maioria de desvios e recebimentos indevidos".
O ministro da Cidadania, Osmar Terra, afirmou na segunda que
"E isso foi graças a um pente fino e isso reflete no orçamento
deste ano."
Terra era ministro da então chamada pasta do Desenvolvimento
Social durante o governo Temer.
Segundo dados oficiais, em maio de 2016, primeiro mês completo
de Temer no poder, o Bolsa Família beneficiou 13,8 milhões de
famílias, com pagamento total de R$ 2,23 bilhões.
Em dezembro de 2018, quando Michel Temer deixou o cargo,
esse número era de 14,1 milhões de famílias, com gasto de
R$ 2,64 bilhões. Ou seja, os números de famílias e de gastos
com o programa só se ampliou no período: 330 mil famílias
e R$ 407 milhões a mais.
No mês de março deste ano, 14,1 milhões de famílias receberam
valores do Bolsa Família, ao custo de R$ 2,63 bilhões
--praticamente os mesmos números de dezembro do ano passado.
Ainda segundo o governo, não haverá reajuste do valor do auxílio
pela inflação neste ano por conta da implantação desta 13ª parcela.
Nunca houve 17 milhões de inscritos no programa
A afirmação do ministro Osmar Terra de que em 2015 havia
17 milhões de beneficiários também não encontra respaldo
nos dados oficiais. Na análise durante todos os meses desde
janeiro de 2004, quando o programa foi criado, o recorde em
número de famílias aconteceu em novembro de 2018, com 14.227.451 pagamentos.
Durante discurso na Marcha de Prefeitos, na última terça-feira,
o ministro afirmou que em 2015 havia 17 milhões de famílias
inscritas no programa, mas que apenas 15 milhões recebiam
o benefício. Outros 2 milhões estariam numa fila de espera.
Entretanto, em e-mail enviado ao UOL em 8 de agosto de 2017,
o mesmo ministério informou que "a média mensal [era] de 840
mil famílias [na fila de espera] (maio/15 a abril/16) na gestão anterior".
À época do questionamento, a fila de espera era de 551 mil famílias.
O que diz o governo?
Procurado para comentar os dados e de onde virão os recursos para o pagamento extra, o Ministério da Cidadania não respondeu aos pedidos
da reportagem. Receberam as perguntas e foram procurados por duas
vezes por telefone, mas não atenderam a solicitação. O texto será
atualizado assim que uma resposta for enviada.
Em publicação em sua página no último dia 5, o ministério da
Cidadania informou que não existe mais fila de espera e que
todos que solicitam a inclusão passam rapidamente a receber
o valor devido se tiverem direito.
"O Bolsa Família já teve fila de milhões de pessoas que precisavam
participar do programa e que não conseguiam, porque a vaga
estava ocupada por quem não necessitava. Acabou a fila para
proteger aqueles que realmente carecem do benefício",
disse Osmar Terra no texto do site do governo.
Em postagem em sua rede social, Terra disse que
"o Bolsa Família ficará com o maior poder aquisitivo da sua
história", o que "equivalerá a um aumento de 8,3% neste ano,
que será pago integralmente em dezembro".
Bolsa Família se consolida como política pública
Para o professor da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo)
Cícero Péricles, o 13° do Bolsa Família é uma iniciativa positiva
"na medida em que se reconhece a importância de uma política
pública de transferência direta de renda".
"Ao atravessar os governos Lula, Dilma, Temer e Bolsonaro,
o Bolsa Família fica sedimentado como status de política de
Estado e não mais de governo", afirma o pesquisador.
"Depois de 15 anos de existência, passa a fazer parte do conjunto
de iniciativas como o BPC [Benefício de Prestação Continuada,
pago a idosos de baixa renda e deficientes], um programa que t
ransfere renda dos setores mais ricos para os mais pobres."
Para ele, o problema é a falta de reajuste, que deveria ser
automático, como é o do BPC. "Comprovadamente, esses dois
programas, mais os ganhos reais do salário mínimo, permitiram,
nas duas últimas décadas, melhorias na vida da imensa maioria dos brasileiros", diz.
Regras do programa
O Bolsa Família beneficia todas as famílias com renda per capita
de até R$ 89 mensais e as que tenham renda por pessoa entre
R$ 89,01 e R$ 178 mensais com crianças ou adolescentes
até 17 anos. O número de beneficiários varia mês a mês,
a depender de pedidos de desligamentos, suspensões,
cancelamentos e adesões.
Segundo o Ministério da Cidadania, o programa possui uma série de mecanismos de controle e suspende beneficiários que não atualizam as informações cadastrais. Também há cortes pelo descumprimento dos compromissos nas áreas de educação e de saúde.
O beneficiário pode pedir o desligamento do programa em caso
de melhoria de renda. De 2004 a 2018, 520 mil famílias deixaram
o programa voluntariamente
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