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4.10.2019

Se tiver decência, Câmara derruba reforma






Paulo Moreira Leite, do Jornalistas pela Democracia - Ao revelar que a maioria dos brasileiros rejeita a reforma da Previdência, numa diferença acima de qualquer dúvida -- 51% contra 41% -- a pesquisa DataFolha divulgada hoje mostra que a população tem consciência do que está em jogo no Brasil de 2019.  
Responsáveis por um projeto devastador em relação aos direitos e benefícios do sistema de previdência, o  levantamento é ruim para Jair Bolsonaro e Paulo Guedes e bom para dar um conteúdo realista à discussão.
Os números mostram que a população não quer ouvir falar de Nova Previdência, nome de batismo do projeto de Bolsonaro-Guedes, que de novo não tem nada -- apenas a velha ideia, típica do capitalismo selvagem do século XIX, quando os trabalhadores mal haviam se libertado da escravidão e não dispunham de direito algum. 
O levantamento ensina que, dois anos depois de Michel Temer ter sido forçado a desistir de seu projeto de ataque a Previdência, infinitamente mais suave do que a proposta Bolsonaro-Guedes, eleitores e eleitoras tem uma opinião clara a respeito do que querem e do que não querem. Preservam valores igualitários, mas têm uma noção de justiça social, que deve proteger os mais fracos. Aceitam propostas que podem gerar melhorias num mecanismo que parece funcionar -- mas não querem colocar em risco benefícios que tem como assegurados. Se  defendem mudanças em pontos específicos, estão longe de concordar com alterações que modifiquem um projeto construído ao longo de décadas, que tem um papel reconhecido no amparo da velhice e na preservação das famílias, em especial das mais pobres.
É assim que 53%  condenam as regras absurdas para a aposentadoria das mulheres e 64% acham que os servidores devem ter o mesmo teto de benefícios que empregados do  setor privado. Na mesma linha, ainda que numa proporção menor -- 54% a 44% -- a população também rejeita o tratamento diferenciado que o Planalto pretende reservar aos menos das  Forças Armadas. Titulares dos mais gordos benefícios do sistema público, eles foram chamados a fazer uma dieta de 1% num universo de sacrifício geral.  
A maioria dos entrevistados reconhece, no mesmo levantamento, que os trabalhadores rurais tem direito a um tratamento mais favorável, bem como os professores, uma das categorias mais atingidas pela reforma.  
A pesquisa vale como uma advertência ao jogo político de Brasília e às cenas de truculências exibidas ontem. Traindo o receio de que novos debates só irão produzir maiores maiores estragos no projeto Bolsonaro-Guedes, a bancada do governo forçou a barra para apressar os trabalhos, garantindo a leitura do voto do relator Marcelo Freitas (PSL-MG) de qualquer maneira.
Mesmo estranhando a ausência de qualquer referência a um ponto essencial do projeto de reforma -- a proposta de capitalização individual -- a pesquisa DataFolha confirma com números aquilo que só se podia supor.
A experiência ensina que  o jogo não terminou, obviamente. Não há motivo para imaginar que o Planalto irá desistir da reforma apenas porque os deputados e senadores podem ficar com medo de desagradar a população. A promessa de  desmontar da Previdência constitui o principal elo de ligação de Bolsonaro com o empresariado brasileiro e o mercado mundial, que já contabilizam lucros fantásticos em futuro próximo.
Pelo seu caráter decisivo do ponto de vista político e econômico, a reforma pode produzir uma  guerra seja de resultado imprevisível, que pode produzir um dos mais deprimentes, custosos e corruptos conflitos da história política brasileira.
Nesse ambiente, a pesquisa mostra uma verdade límpida. Se o Congresso tiver a dignidade de respeitar a verdade que os brasileiros expressaram na pesquisa, a reforma cai na primeira votação para nunca mais voltar a plenário. Nem no Senado. Para ser aprovada na Câmara, precisa ter apoio de pelo menos 308 dos 513 deputados, ou 60% dos votos a favor. Os levantamentos conhecidos  mostram que o governo está longe disso e não tem muita margem para trabalhar. Os 51% a 41% da pesquisa constituem um novo impulso na mesma direção, contra a reforma.

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