webmaster@boaspraticasfarmaceuticas.com.br

3.07.2010

Quando a escola vira o inferno: Bullying

Um em cada três estudantes da Educação Básica tem amigos vítimas de bullying. Aumentam os casos na Internet


Rio - 'Chegar ao colégio era entrar no inferno. Eu era xingada de burra, p., drogada. Falavam que eu namorava traficantes e que tinha um filho”. Os olhos de Mariana Mello Portugal, 15 anos, marejam quando ela relata as agressões sofridas em agosto de 2009, na escola onde estudava, em Niterói. Traumatizada, a estudante mudou de cidade, mas ainda não conseguiu voltar a estudar.

Embora se sentisse isolada no colégio, a adolescente vítima de bullying — termo derivado de verbo em inglês que significa ameaçar ou assustar e designa agressões com o objetivo de humilhar ou ridicularizar — não está sozinha. Pesquisa feita no semestre passado pela ONG SaferNet Brasil, com estudantes e professores das redes públicas e privadas do Rio e mais cinco estados, revelou que um a cada três alunos já tem amigos vítimas de cyberbullying (bullying pela Internet) e 26% dos professores já presenciaram casos.

O crescimento do problema — notícia no mundo inteiro na última sexta, quando a princesa do Japão, Aiko, 8 anos, deixou de ir à escola por ser vítima de humilhações — preocupa educadores e especialistas no Rio.



Mariana acredita que foi rejeitada pela turma porque tinha origem humilde. Família voltou para São Gonçalo e a adolescente, traumatizada, até hoje não conseguiu retomar estudos | Foto: Alexandre Vieira / Agência O Dia
Estudos revelam que as agressões vêm aumentando sobretudo na Internet. O promotor Rodrigo Medina, do Centro de Apoio às Promotorias da Infância e Juventude, do Ministério Público do Rio, afirma que o número de denúncias de bullying também registrou aumento considerável no MP.

Vítima de agressões físicas e pela Internet, Mariana conta que foi ‘marcada’ por ter origem humilde. “Eu morava em São Gonçalo e me mudei para Niterói, onde fui cursar o Ensino Médio. Entrei na escola em maio e não fui bem aceita pela turma. No início, encarei as provocações como brincadeira. Mas, com o tempo, as coisas ficaram sérias. Escreveram mentiras na Internet, fizeram montagem com fotos. Um grupo de meninas começou a me perseguir nas ruas e na porta da minha casa. Até que fui agredida fisicamente. Foi o pior dia da minha vida. Passei por um corredor onde levei tapas, chutes e puxões de cabelo. Alguns alunos filmaram e passaram o vídeo para a escola toda”, lembra a estudante.

“Nunca imaginei que ela passaria por isso num colégio católico, cuja mensalidade chegava a R$ 600. Ela me contava tudo. Uma das agressoras pertencia a uma família tradicional, ligada a políticos. Procurei a escola, mas nada foi feito. Resolvi voltar para São Gonçalo porque estava com medo de minha filha ser agredida na rua”, afirma Rosângela da Silva Mello, 41 anos, mãe da estudante, que registrou o caso na polícia.

Segundo especialistas, o ideal é tentar resolver os casos dentro da escola, antes de procurar ajuda fora. “Os pais devem buscar os profissionais da instituição de ensino. Caso não haja retorno, os conselhos tutelares devem ser acionados”, orienta o pediatra especialista em bullying, Aramis Lopes Neto.

Maior número vítimas entre adolescentes

Crianças e adolescentes tímidos e com dificuldades de se relacionar em grupo são as principais vítimas do bullying. Embora não exista uma idade padrão para o problema, especialistas afirmam que a maior incidência dos casos é no início da adolescência. “A faixa etária dos 11 aos 15 anos é a mais crítica. As agressões acontecem sobretudo no horário de recreio, quando os estudantes estão um pouco mais distante da supervisão dos adultos”, explica a doutora em Educação, Cleo Fante, autora do livro ‘Fenômeno Bullying’.

O pediatra Aramis Lopes Neto, que coordenou pesquisa em 11 escolas do Rio sobre o tema, diz que as consequências podem ser graves: “As vítimas sofrem de baixa auto-estima. Principalmente entre as meninas, chegam a ocorrer casos de bulimia e anorexia. Também podem ocorrer manifestações de auto-flagelação e, em casos extremos, até suicídio”.

Os agressores também têm um perfil específico. “Geralmente são crianças e jovens que não respeitam os adultos e têm o hábito de se envolver em confusões. As famílias devem estar atentas, pois em muitos casos esses estudantes reproduzem o que estão vivendo em casa na escola”, explica Fante.

Lei antibullying ainda não é praticada na rede pública

No município do Rio, o combate ao bullying já é lei (nº 5.089), sancionada pelo prefeito Eduardo Paes em outubro de 2009. O texto determina que as unidades de ensino da rede municipal incluam em seus projetos pedagógicos ações antibullying. Na rede municipal, o projeto ainda está sendo elaborado.

A Secretaria Municipal de Educação prevê a capacitação dos coordenadores pedagógicos para trabalhar a educação inclusiva. O projeto será iniciado ainda este ano nas 150 unidades incluídas no programa Escolas do Amanhã. Só depois, será expandido para toda a rede de ensino. A Secretaria de Estado de Educação informou que, embora não tenha um projeto específico sobre bullying, trabalha o tema nos programas ‘Escola Aberta’ e ‘Mais Educação’, que incluem atividades esportivas, sociais e culturais nos fins de semana.

O presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Educação Básica do Rio de Janeiro, Victor Notrica, afirma que o problema é debatido periodicamente na rede particular. “Estamos sempre monitorando possíveis casos. Em agosto, teremos um seminário sobre respeito às diferenças, discutindo o bullying”, conta.

O Dia
DIEGO BARRETO

Nenhum comentário:

Postar um comentário