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11.04.2010

Liberdade de Imprensa ou Liberdade de Expressão?

  Por Aluizio Belisário*
A recente campanha eleitoral para a Presidência da República me leva a fazer uma questão que, só por ser levantada já deve provocar a reação indignada daqueles que defendem cegamente que a imprensa seja intocável, se pretendemos viver em uma democracia. O papel desempenhado pela “grande imprensa” (grande no tamanho, não necessariamente nos valores) no processo eleitoral nos leva, os democratas, a refletir mais detidamente sobre a questão que dá título a este artigo.
Como cidadão brasileiro que, sem ter pegado em armas, lutou contra a ditadura militar, usando principalmente a palavra (oral e escrita) em sala de aula, com todos os riscos que isto envolvia, estou certo da importância da “liberdade de expressão” na luta contra a tirania: o uso de diversos tipos de mordaça sempre foi a principal arma dos tiranos, pois o uso da força pode até levar à eliminação de pessoas, mas só através do cerceamento da livre possibilidade de expressão se sufocam ideias.
Dito isto, que fique claro que defendo radicalmente a absoluta liberdade de expressão de todos os cidadãos, de qualquer origem socioeconômica, pertencentes a qualquer linha de pensamento, grupamento partidário ou matiz ideológica.
Assistimos, não foi a primeira vez e infelizmente não creio que será a ultima, à chamada (por alguns setores da sociedade) “grande imprensa” (chamada por outros setores de “PIG – Partido da Imprensa Golpista”), à participação de inúmeros de seus órgãos no processo eleitoral em que, longe de informarem, de nos fazerem chegar as notícias do dia-a-dia, de permitirem a livre expressão das várias correntes de opinião, trataram de tomar parte ativa no processo eleitoral, manipulando, omitindo, distorcendo, criando e repercutindo informações dentro de um circulo fechado e cruel, onde um as cria e os demais órgãos repercutem-nas criando a falsa ilusão de verdade – e o que é pior, criando com isto fatos que quase imediatamente eram incorporados oportunisticamente pela campanha de um dos candidatos, que os referenciava como verdades por terem sido extraídas da “imprensa livre”.
Na minha, às vezes solitária, militância contra a ditadura militar, exercida fundamentalmente nas salas de aula universitárias, ao me expressar sempre sem qualquer censura, sofri inúmeras perseguições e demissões, assim como testemunhei as mesmas ocorrências em relação a muitos colegas de profissão. Tenho orgulho, como outros, de nunca ter me dobrado às inevitáveis necessidades da vida material, garantido a dignidade que deve acompanhar que abraça a educação como missão.
Acreditar acriticamente, entretanto, que a “imprensa livre” é fundamental para a sobrevivência das democracias pode nos levar a “fechar os olhos” para outro lado, não menos importante: “a liberdade de expressão”.
Entendo que “liberdade de expressão” significa não apenas o não cerceamento de qualquer forma de expressão de ideias, mas também e principalmente a garantia de existência de meios através dos quais estas ideias possam ser expressas, de modo a poderem ser acessadas por qualquer cidadão.
Sei que inúmeros jornalistas se sacrificaram durante o período da ditadura, como inúmeros outros profissionais que não se dobraram, como já disse, às necessidades materiais e puseram seus empregos em risco ao não compactuarem com as diversas formas de manipulação da informação que se usava na época – e que nossa ultima campanha eleitoral mostrou que ainda estão em uso.
Entretanto, no período pós-ditadura, temos visto inúmeros jornalistas que, por estas necessidades ou mesmo, devido a distorções de formação, cumprem quase um papel meramente técnico (como se fosse possível alguma imparcialidade ideológica em sua ação), acrítico e submisso às ideias de seus “patrões”, possibilitando com seu trabalho manipulações e outras formas de mal-uso das informações.
A Televisão, que permite além dos textos escritos, a leitura de gestos e expressões faciais complementando a informação (muitas vezes até determinando as interpretações que desejam que o telespectador tenha) tem contado com inúmeros “áulicos do poder” que usam e abusam de “caras-e-bocas” na apresentação de noticiários e outros programas jornalísticos – normalmente substituídos por sorrisos e gestos simpáticos após a derrota dos eventuais candidatos de seus patrões (que precisam estar bem com quem vence para tentarem manter o privilégio de expressarem livremente suas ideias – não necessariamente as dos jornalistas que as veiculam – como verdades absolutas).
A garantia de real “liberdade de expressão” passa, entre outras coisas, por uma alteração nas formas de concessão de direitos para a veiculação de informações em todas as formas de imprensa (escrita, falada ou televisada) – que seja efetivamente democrática a concessão destas licenças, que não apenas os “grandes empresários” ou “políticos aliados de momento” as obtenham, mas que outros setores da sociedade possam também obtê-las; passa pela necessária responsabilização dos proprietários dos órgãos de imprensa pelo que produzem; pela obrigação de, uma vez assumida com clareza e honestidade sua posição, seja dado o mesmo espaço para que vozes divergentes se manifestem, garantindo o que os juristas e parlamentares adoram citar: “o contraditório”.
Ou seja, é preciso que se garanta a absoluta liberdade de expressão, fornecendo-se como condição sine-qua-non para tal, possibilidades concretas de liberdade de veiculação das informações.
Sei que o assunto é extenso e não é possível trata-lo de todas as formas e com a profundidade que merece em um artigo, mas creio que o principal está colocado:
Liberdade de imprensa não é sinônimo de liberdade de expressão e sendo ambas imprescindíveis à democracia, a segunda deve se constituir como base incondicional da primeira. Liberdade de expressão sem liberdade de imprensa é mero discurso teórico, enquanto liberdade de imprensa sem liberdade de expressão pode se constituir em fortíssimo instrumento de tirania.

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