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6.03.2013

Os riscos à saúde dos cosméticos nacionais

Produtos de beleza podem conter substâncias cancerígenas, alertam estudos

Flávia Milhorance
As amostras de lápis de olho analisadas pela Unicamp eram todas potencialmente causadoras de irritação ou de infecções
Foto: Divulgação
As amostras de lápis de olho analisadas pela Unicamp eram todas potencialmente causadoras de irritação ou de infecções Divulgação
A variedade de tons de esmaltes e batons ou a longa duração de xampus e cremes pode ter um preço: a composição química, muitas vezes, é prejudicial à saúde. Uma nova pesquisa da Unicamp desenvolveu uma técnica capaz de detectar, em segundos, os componentes de alguns produtos de beleza do mercado brasileiro, terceiro maior do mundo, com faturamento de R$ 85 milhões em 2012, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos. O resultado da pesquisa apontou para a existência de cosméticos com substâncias alérgenas ou até potencialmente cancerígenas e foi publicado no periódico científico “Materials”.
As marcas não foram divulgadas pelos pesquisadores, mas eles alertam que três de nove esmaltes investigados continham taxas elevadas de sudam III, corante que pode provocar câncer. No caso dos batons, eles oxidaram (ou perderam suas propriedades) antes do fim do prazo de validade, o que pode ter ocorrido, segundo os cientistas, devido ao contato com a saliva. E as amostras de lápis de olho eram todas potencialmente causadoras de irritação ou de infecções.
— Descobri que tinha alergia a cosméticos logo que usei pela primeira vez, principalmente os de olho, como o lápis. Logo depois que passo fica coçando muito e parece que chorei horas. Mesmo os que se dizem hipoalergênicos me causam problema. É muito difícil encontrar algo que não me irrite, mesmo das marcas mais caras e importadas — comenta a médica Juliana Keller.
O farmacêutico Diogo de Oliveira, coordenador do estudo, explica que o avanço científico ajuda a regular a composição cosmética. Ele cita os parabenos, cuja utilização era bastante difundida, mas perdeu força depois da divulgação de estudos identificando a toxidade de moléculas da classe. Ainda segundo Oliveira, os rótulos divulgam a composição, mas não a quantidade da substância, e é difícil o consumidor conseguir desvendar as informações.
— Quando tratamos de corantes, eles geralmente vêm em códigos, como o Color Index (CI). Cada um dos códigos do CI diz respeito a um corante diferente, o que dificulta a identificação rápida por parte de qualquer consumidor, sendo necessária a consulta à tabela dessas substâncias. Por exemplo, o sudam III que estudamos tem a identificação em rótulo como CI26000 ou Solvent Red 23 — exemplifica.
Chumbo presente em cosméticos
Este não é o único estudo alertando para substâncias dos cosméticos. A Universidade da Califórnia e a Escola de Saúde Pública de Berkeley divulgaram recentemente uma pesquisa em que, de 32 batons e gloss do mercado americano, metade tinha chumbo em quantidade maior que o permitido no país. Já em dez marcas, que também não foram identificadas, havia excesso de cromo, um cancerígeno, além de manganês, titânio e alumínio. Outro estudo publicado ano passado pelo Departamento de Química da Universidade Federal de Minas Gerais mostra que, de 22 tipos de batons no mercado brasileiro, apenas um, de origem francesa, não continha chumbo. O assunto é tão popular que, nos EUA, foi criada a ONG “Campaign for Safe Cosmetics”. Em parceria com institutos de pesquisas, eles criaram um banco de dados de análise de produtos, como forma de pressionar empresas e governos.
Um dos recados da ONG é ficar atento a algumas substâncias descritas nos rótulos. A Associação de Consumidores (Proteste) já divulgou pesquisas que dão dicas importantes: evitar os protetores solares com benzofenona-3, um filtro químico com potencial alergênico; xampus infantis com metildibromo glutaronitrilo, também um alérgeno; e esmaltes com dibutil ftalato, substância banida da Europa, além de nitrotolueno, tolueno e furfural, compostos cancerígenos.
— Em geral, as substâncias mais problemáticas são os conservantes e os pigmentos. É claro que depende da exposição para dizer que vai causar câncer, é mais comum que haja alergia — diz o coordenador de testes químicos da Proteste, Carlos Confort, lembrando que não são substâncias proibidas pela Anvisa. — Nenhuma empresa estava fora da lei, mas elas têm tecnologia para fazer produtos que deem mais atenção à saúde. E fica a cargo do consumidor ter que olhar mais o rótulo.
Os resultados da Proteste já renderam a assinatura de um Termo de Ajustamento de Condura (TAC), no caso das empresas de esmalte, e sempre são encaminhados à Anvisa, que em março limitou o uso de chumbo apenas à tintura capilar.
— Hoje leio as contraindicações e tento comprar marcas hipoalergênicas e mais naturais — conta a analista de documentação Mariana Barros, depois de ter desenvolvido rosácea, que são manchas avermelhadas na pele com o uso de base e blush.
Conservação e uso inadequados
Além da presença de substâncias químicas às vezes prejudiciais à saúde, a forma de conservação e o uso também influenciam diretamente na qualidade do produto e, geralmente, se inadequados, podem trazer alguns riscos, como o de infecções e alergias.
A professora da Faculdade de Medicina da Uerj Renata Aranha diz que faltam provas de que as substâncias presentes nos cosméticos sejam cancerígenas, por isso, para ela, o mais importante é estar atento à certificação da Anvisa e não deixar de fazer o teste de sensibilidade:
— É um teste bem popular, mas até eu já esqueci e fiquei com o rosto todo vermelho e queimando uma vez. O ideal, portanto, é testar o produto novo numa pequena área, como na mão, antes de colocar no rosto ou no corpo inteiro — alerta.
Segundo ela, seguir o prazo de validade é importante porque os conservantes protegem o produto de bactérias e fungos. Além disso, compartilhar maquiagem e até esmalte tem seus riscos de contaminação. Acessórios de manicure então nem se fala, só esterilizados.
Cuidados básicos são simples e eficientes: não deixar o produto exposto ao sol, não guardar nada molhado e notar se o produto teve mudança de coloração, cheiro ou textura. A médica ainda dá a dica de pesquisar a avaliação do produto e sugere o site www.belajuda.com.br.
Saiba mais
Esmalte
Em estudos diferentes foram encontradas substâncias cancerígenas, como sudam III, nitrotolueno, tolueno e furfural, além de compostos banidos da Europa, como dibutil ftalato. A legislação brasileira não cita ou limita a concentração no caso destes compostos.
Batom e gloss
Podem oxidar antes do fim do prazo de validade, talvez pelo contato com a saliva, por isso é bom ficar atento ao aspecto do produto. Pesquisas encontraram chumbo, manganês, titânio, ftalatos e alumínio em algumas marcas, todos considerados tóxicos. A Proteste reprovou o rótulo de algumas embalagens, por terem letras pequenas demais para ler.
Hidratante e protetor solar
A Proteste também encontrou ftalatos em algumas marcas de hidratante. Entre os protetores, a dica é evitar os que contenham benzofenona-3, que pode causar alergias. É bom lembrar que a aplicação deve ser feita 15 minutos antes da exposição e repetida a cada duas horas. Deve-se usar diariamente no rosto, mesmo em dias nublados.
Xampus e tintura
Nos xampus infantis, é bom ficar de olho no metildibromo glutaronitrilo, alérgeno. Entre as tinturas, evitar as com amônia, também alérgena e cujo cheiro forte pode trazer desconforto.
Rótulos em geral
Nem todas as substâncias estão descritas no rótulo, o que dificulta a verificação. Além disso, a quantidade não é algo aparente, ficando a cargo de pesquisas científicas apontarem seus valores. Buscar produtos naturais é uma forma de evitar alergias. Para fugir dos corantes, eles são identificados pela sigla CI seguida de um número.

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