Número de passageiros chega a 4 milhões
Foram 52 mil a mais que em 2013. Já em relação a 2012 o salto foi maior: 250 mil a mais. Em 70% dos registros, usuário é a classe média que antes de 2002 andava de ônibus.RIO - Às 5h46m de uma segunda-feira, malas deslizam sobre rodinhas
em direção às filas de check-in das companhias áreas.
Apressados,
homens e mulheres param no meio do saguão do Aeroporto Santos
Dumont. A busca no painel luminoso com as chegadas e partidas
de aviões é para confirmar o status de cada voo. Assim que vê o
“confirmado”, a gerente financeira Fernanda Rocha sobe a escada
rolante rumo ao portão 4. Em alguns minutos vai começar o embarque
de passageiros com destino a Congonhas, em São Paulo.— No caminho já fico nervosa só de pensar que meu voo pode estar atrasado ou corre o risco de ser cancelado. Quem vive na ponte aérea não tem tempo a perder. Saber que o voo está confirmado é a primeira boa notícia do dia — brinca a carioca Fernanda, que passa pelo menos três dias por semana em São Paulo.
Naquele dia, o trecho Santos Dumont-Congonhas, denominado Ponte Aérea, movimentou cerca de 14 mil passageiros em 142 pousos e decolagens nos dois aeroportos. Segundo a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), nunca houve tantos cariocas rumo a São Paulo e paulistas chegando ao Rio. No ano passado, o total chegou a quatro milhões — dois milhões em cada sentido. Foram 52 mil a mais que em 2013. Já em relação a 2012 o salto foi maior: 250 mil passageiros a mais. Segundas e sextas são os dias mais movimentados. De acordo com as companhias, cerca de 78 mil pessoas viajam entre um lugar e outro semanalmente.
EM 70% DOS CASOS, USUÁRIO É A CLASSE MÉDIA
O número maior de pessoas é puxado pelo aumento de negócios, ea melhores oportunidades de emprego surgidas com a melhoria da qualidade de vida, pelo acesso às universidades. Para o recrutador de executivos Marcelo Cuellar, sócio da consultoria 2Get, o fluxo mais intenso entre as duas cidades, principalmente de moradores do Rio para São Paulo, decorre do bom momento econômico que o Rio viveu na última década.
— Depois de um momento econômico ruim nos anos 1990 durante o governo FHC, o Rio se recuperou nos anos 2000. A indústria de óleo e gás cresceu, e muitas companhias investiram na cidade. Mas, como a força motriz do país é São Paulo, sempre haverá reflexos do outro lado da Dutra — diz Cuellar. — É cada vez mais frequente as agendas de muitos executivos intercalarem reuniões de negócios nas duas capitais.
Segundo o perfil do viajante da Ponte Aérea traçado pelas empresas aéreas, ele é, em 85% dos casos, das classes A, B e C. Em 70% dos casos, é executivo. Em geral, viaja sozinho ou acompanhado por colegas de empresa e não despacha as malas, para não perder tempo quando chega ao seu destino.
O perfil do usuário da Ponte Aérea também muda dependendo da hora. De manhã, é grande o número de passageiros que viajam a negócios; à tarde já se veem mais pessoas que fazem o percurso a passeio.
— De manhã, o passageiro não quer perder tempo. Assim que chega quer entrar no primeiro avião disponível (havendo vaga, o usuário da Ponte Aérea pode antecipar o horário do seu voo). À tarde, os bancos de espera do aeroporto ficam mais cheios. Os passageiros chegam antes e têm disponibilidade para esperar pelo horário original do voo — diz Marcelo Bento, diretor de Planejamento da Azul Linhas Aéreas.
Para economizar tempo de quem é habitué da Ponte Aérea, as companhias precisaram investir em tecnologia. A TAM Linhas Aéreas, por exemplo, há quatro anos oferece a opção do check-in pelo celular, permitindo ao passageiro ir direto para a sala de embarque. A Azul e a Avianca têm serviço idêntico. A Gol faz o mesmo e permite ainda ao passageiro, com o aplicativo do celular, adiantar ou cancelar a viagem. Para quem precisa despachar malas, as quatro empresas dispõem de máquinas de autoatendimento: o próprio passageiro pesa a bagagem e a entrega no balcão da companhia.
— As empresas souberam aliar a tecnologia ao processo para quem faz o trecho frequentemente. O que ainda está faltando é melhorar a estrutura do Santos Dumont — critica Carlos Alberto, analista financeiro. — Às vezes, sofro para conseguir um táxi. Como o aeroporto é pequeno, a fila começa no desembarque e vai até setor de embarque. Já fiquei uma hora esperando.
Para atender uma demanda maior, com uma estrutura que se manteve a mesma, as companhias precisaram se adaptar. A Gol, por exemplo, empresa que lidera em número de passageiros o movimento no trecho Santos Dumont-Congonhas, começou no final da década passada a renovar sua frota. Hoje, das 141 aeronaves, 98 são Boeing 737 com capacidade para 15 pessoas a mais do que os aviões antigos.
— Como não dava para colocar mais aviões no pátio do aeroporto, o jeito foi crescer dentro da própria aeronave — diz Eduardo Bernardes, diretor de Vendas da Gol, companhia que oferece a tarifa mais barata (R$ 102 reais) para quem compra antecipado.
Além de preços mais em conta, as empresas tentam fisgar passageiros com outros atrativos. Bernardes explica que a Gol não fornece alimentação em voos de curta duração — apenas na Ponte Aérea. Já a Avianca bate no peito para dizer que oferece mais conforto interno.
— Nossa aeronave tem 76 centímetros entre uma poltrona e outra. É a maior distância entre as companhias — afirma Tarcisio Gargioni, vice-presidente de Vendas da Avianca.
O início dos voos entre Rio e São Paulo ocorreu em 1936, em aviões trimotores Junkers 52, de 17 lugares. O conceito da Ponte Aérea nasceu em 6 de julho de 1959. Na época, formou-se um consórcio com Varig, Cruzeiro do Sul e Vasp, para enfrentar a concorrência da poderosa Real. Com o formato, as companhias passaram a oferecer aos passageiros horários escalonados e preço de passagem padronizado (o tíquete podia ser utilizado em qualquer empresa). O usuário não precisava esperar horas pelo voo e embarcava muito mais rápido. Deu tão certo o serviço, que inspirou outras rotas do gênero, como as pontes Nova York-Washington e Madri-Barcelona.
Em 1971, estrearam na Ponte Aérea Rio-São Paulo os turboélices Electra II. O conforto e o fato de não terem sido registrados acidentes com esses aparelhos fizeram do avião um símbolo da rota. Antes dele, ocorreram dois acidentes, com 59 mortos no total. Em 1992, depois de muita polêmica sobre a segurança dos pousos de jatos na pista de 1.325 metros do Santos Dumont — uma das menores do país —, os Electras começam a ser substituídos por Boeings 737. Um ano antes, também havia chegado ao fim o acordo entre as companhias que operavam a Ponte Aérea, restabelecendo o formato que vigora hoje em dia. Uma empresa vende bilhetes só para seus voos e permite o adiantamento do horário quando há vagas.
O Departamento de Controle do Espaço Aéreo, do Comando da Aeronáutica, estuda a utilização de uma rota que faria cair dos atuais 44 minutos para 36 o tempo do voo entre Santos Dumont e Congonhas. Atualmente, há quatro rotas disponíveis. Essa seria a quinta. O problema é que a empresa Embraer utiliza esse percurso para testar suas aeronaves. A companhia não comenta o assunto.
— Seria um ganho para todos. Com voos mais rápidos, as companhias aéreas teriam um gasto menor, o que poderia beneficiar os passageiros com tarifas menores — diz o coronel Ary Bertolino, da Aeronáutica.
SANTOS DUMONT, O 2º PIOR AEROPORTO
Na última quarta-feira, a Secretaria de Aviação Civil divulgou uma pesquisa em que aponta o Aeroporto Santos Dumont como o segundo pior do país. O estudo leva em conta as avaliações de passageiros no primeiro trimestre deste ano.
Além dos problemas de gestão, o Santos Dumont sofre com a localização geográfica. Por ficar na entrada da Baía da Guanabara, em dias de chuvas e muita nebulosidade o aeroporto precisa ser fechado. Em 2014, houve 16 paralisações. Em abril do ano passado, em dois dias, o espaço ficou fechado por nove horas, e 38 voos precisaram ser desviados para o Galeão.
— Os fechamentos do Santos Dumont acontecem por causa da sua posição geográfica. Isso não há como mudar. O problema é que é um aeroporto gerido de uma forma não moderna. Quando você o compara com qualquer aeroporto, vê que faltam limpeza, organização e conforto para os passageiros — diz Respício Espírito Santo, professor de engenharia da UFRJ e especialista em aviação.
Para o empresário paulista João Malaquias, só a localização do Santo Dumont já vale a viagem São Paulo-Rio.
— Da janela do avião, a gente fica impressionado com a beleza natural do Rio. É até brincadeira comparar essa vista com a de prédios que temos ao chegar a Congonhas — diz Malaquias, que vem ao Rio semanalmente. — Mas, assim que pousamos, vemos um aeroporto sujo e, no verão, o lugar parece uma estufa. É impressionante como a gestão do aeroporto é ruim.
Em nota, a Infraero diz que a limpeza do aeroporto foi impactada pelas obras no terceiro piso do local. Em relação ao calor, um sistema novo de ar-condicionado será inaugurado no primeiro semestre de 2016.
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A crise não chegou para os emergentes.
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