Um editorial desta sexta é exemplar.
O jornal investe furiosamente contra os manifestantes anti-Temer que têm tomado as ruas de São Paulo. Chama-os de baderneiros, vândalos e coisas do gênero.
O motivo: os manifestantes elegeram a Folha como um dos alvos do esculacho. Foram até a sede do jornal na Barão de Limeira, no centro de São Paulo. Picharam “Folha Golpista”.
A Folha fez jornalismo de guerra contra Dilma. Mas parece que gostaria de ser aplaudida por sua contribuição ao golpe.
Considere a diferença.
Nos anos 1980, a Folha se tornou o jornal mais influente, admirado e lido porque capturou a bandeira das Diretas Já.
Que as urnas falem. Que os brasileiros se manifestem. A Folha tinha captado o Zeitgeist, a expressão alemã que designa o espírito do tempo. Era vista como moderna, inovadora, sob certos aspectos até revolucionário no cenário da mídia brasileira.
Era chique ler a Folha, carregá-la sob os braços, citá-la para amigos. Era a referência número um dos universitários e dos formadores de opinião.
Agora, quando podemos estar no limiar de uma nova Diretas Já, a Folha está do lado oposto. É o anti-Zeitgeist. Não está entedendo o que se passa, como aquele personagem de Flaubert que passa por Waterloo e enxerga apenas homens lutando uns contra os outros.
A Folha era jovem, como as pessoas que pediam diretas já. Agora é velha como Temer, conservadora. Era venerada pela juventude. É detestada.
E o editorial em que ataca brutalmente os manifestantes anti-Temer mostra isso em cada detalhe.
Em nenhum momento a Folha sai da superfície e se pergunta por que a garotada está irada.
Ora, ora, ora.
Violência é pichar um jornal? Como classificaremos, então, a supressão de 54 milhões de votos por um grupo conservador e corrupto como este apoiado pela Folha?
A democracia brasileira foi estuprada à luz do dia mediante mentiras abjetas propagadas por todas as empresas jornalísticas.
Isso não é violência?
A Folha gostaria aparentemente que os brasileiros apanhassem calados. Que aplaudissem Temer, Cunha e todos os corruptos que fizeram o Brasil retroceder décadas com o golpe.
As Diretas Já foram um marco na ascensão da Folha mais de trinta anos atrás.
A segunda onda das Diretas Já vai ser um marco na decrepitude do jornal.
A Folha estava do lado certo. E por isso era louvada. Hoje está do lado errado e por isso é detestada. Os filhos e netos dos manifestantes daqueles dias em que a ditadura estertorava agora vão à Barão de Limeira para externar seu repúdio pelo mesmo jornal que seus pais e avós adoravam.
E os Frias parecem achar que vão resolver seu insolúvel problema de destruição de imagem terceirizando a responsabilidade por ele.
Não somos nós que estamos errados. É a sociedade. Esta é a lógica doentia da Folha.
A Folha não responde por seus atos. Daqui a pouco poderá lavrar um editorial com palavras semelhantes às imortalizadas nestes dias por Temer: “Não aceitaremos ser chamados de golpistas.”
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