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12.02.2016

Lindbergh a Moro: e se um juiz do Texas grampeasse Clinton e Obama?


Leia reportagem do Infomoney sobre o assunto:
Em meio a um clima de tensão entre os poderes Legislativo e Judiciário, o Senado realizou, nesta quinta-feira, debate público sobre projeto de lei que tramita na casa e trata da tipificação de crimes de abuso de autoridade cometidos por magistrados e procuradores. Participaram como convidados da discussão os juízes federais Silvio da Rocha e Sergio Moro, além do ministro do Supremo Tribunal Federal e presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Gilmar Mendes. Após a exposição dos convidados, a sessão foi aberta à participação dos parlamentares. O clima esquentou na vez de Lindbergh Farias (PT-RJ), que usou seu tempo para defender o projeto e questionar possíveis abusos cometidos por Moro na condução do processo da Lava Jato na 13ª Vara Federal de Curitiba, sobretudo no caso envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O magistrado disse que não poderia comentar os casos envolvendo o processo, mas respondeu o senador dizendo que o projeto em discussão seria uma afronta às investigações.
Confira a transcrição de parte da discussão:
Senador Lindbergh Farias (PT-RJ): Uma lei contra abuso de autoridade no Brasil é uma necessidade, e, por isso, acho que esse é o momento de discuti-la. Mais do que uma necessidade, uma nova de abuso de autoridade é uma urgência. Diariamente, o povo brasileiro sofre na pele o abuso de autoridade. Segundo dados do CNJ, 21 mil casos de abuso de autoridade foram catalogados em 2015. Ontem, teve aqui a votação da audiência de custódia. Nós temos 600 mil presos. Destes, 240 mil em prisão preventiva – e a sorte é que o CNJ implantou a audiência de custódia, porque, antes dela, existia prisão em flagrante, o preso demorava uma média de seis meses para ser levado ao juiz. Vossa excelência também falou da violência. Fui o relator da CPI sobre assassinato de jovens. Há um verdadeiro genocídio no país. Morrem 59 mil por ano assassinadas, metade jovens, 77% jovens, negros, moradores das periferias. E lá, como bem falou vossa excelência, não tem mandado de busca e apreensão para entrar na porta da casa do cidadão morador na favela, é pé na porta.
Trago aqui as palavras de Pedro Aleixo a Costa e Silva no dia da assinatura do AI-5. Disse ele: "o problema de uma lei assim não é o senhor, nem os que com o senhor governam o país. O problema é o guarda da esquina". Agora, na minha avaliação, tem que haver abuso de autoridade para todo mundo: polícia, deputado, senador... e também para o Ministério Público e o Judiciário. Impressiona algumas corporações entrarem nesse debate dizendo o seguinte: "não. Ministério Público e o Judiciário ficam fora do abuso de autoridade". Impressiona também algumas entidades de classe dizerem que é ataque ao Judiciário quando aqui foi formada uma comissão de senadores para discutir salários acima do teto. Tem desembargador e juiz ganhando R$ 90/100 mil. Isso não é ataque ao Judiciário. Agora, a discussão não é abuso de autoridade tirando Ministério Público e Poder Judiciário. A discussão tinha que ser outra. Tinha que ser: como construir uma lei de abuso de autoridade que não atrapalhe as investigações. É a isso que nós devemos nos deter aqui.
Conversei com os membros do Ministério Público e concordo com eles quando dizem o seguinte: "Olha, o Ministério Público é responsável por abrir o inquérito. Se eu não consigo colher provas mais à frente para apresentar uma denúncia...". Ele não pode ser responsabilizado, porque ele está trabalhando inicialmente com indícios.
Eu falo aqui porque nós queremos investigações amplas neste país. Agora, investigações dentro da lei, respeitando a Constituição. E falo isso com a autoridade de fazer parte de um partido que é muito atacado, mas a gente não teria essa legislação de combate às investigações sem os governos dos presidentes Lula e Dilma. A lei de organizações criminosas, e aí tem delações; a lei de transparência, a lei de acesso à informação; a constituição do CGU, a nomeação do promotor do Ministério Público mais votado. Porque antes, lembro-me na época do Fernando Henrique Cardoso: tinha o "Engavetador-Geral da República". O Brindeiro foi o 7º votado. Não. Com nós, é autonomia do Ministério Público plena, colocando o mais votado. As operações da Polícia Federal: em 8 anos de governo Fernando Henrique Cardoso, foram 48, seis por ano. Nós aparelhamos a PF e saltou de uma média de 6 por ano para 385. Por isso, eu digo: nós queremos investigação, mas tem que ter o respeito à lei e à Constituição.
Nos impressiona e preocupa a generalização de medidas e exceção, o uso abusivo de prisões preventivas para forçar delação, o uso abusivo de interceptações telefônicas, vazamentos. A discussão sobre direitos e garantias individuais, a presunção da inocência. Nos preocupa a seletividade quando se trata de agentes públicos, porque está na cara que tratam as organizações de esquerda, o PT, de forma diferenciada nesse processo todo.
E aí, digo, com todo respeito ao juiz Sergio Moro – não deixa de ser interessante vossa presença para discutir abuso de autoridade. E quero mostrar que há abuso de autoridade no Judiciário também. E digo no caso das conduções coercitivas, algo em torno de 200 na Lava Jato. No caso do presidente Lula, não poderia ter intimado? Ele iria lá depor. A lei é clara. O artigo 260 do Código Processual Penal diz: se o acusado não atender intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer ato, poderá mandar conduzi-lo a sua presença. Mas se ele não atender à intimação. No caso do Lula o que fizeram? Um grande espetáculo. Atacando o presidente Lula, conflagração das ruas, passeatas... e o pior, doutor Sergio Moro, o argumento de vossa excelência que diz que foi para garantir a segurança do Lula, a fim de evitar perturbação da ordem pública. Aí, o senhor leva ao aeroporto. O que houve? Briga de grupos rivais em frente.
[Interrupção de senadores]
E falo isso porque o ministro Marco Aurélio foi muito claro. Naquele caso, o ministro Marco Aurélio disse o seguinte: "eu não entendo. Um mandato de condução coercitiva só é aplicável quando o indivíduo apresenta resistência e não aparece para depor". E Lula não recebeu intimação. E diz mais ele: "Será que ele (Lula) quer esse tipo de proteção oferecida pelo juiz Sergio Moro? Eu acredito que, na verdade, esse argumento foi dado para justificar um ato de força. Esse é um revés, e não um progresso. Somos juízes, e não legisladores ou vingadores".
Mas eu mais adiante, doutor Sergio Moro, para mostrar abuso no Judiciário: interceptação telefônica de uma conversa da presidenta Dilma com o presidente Lula. Vossa Excelência gosta muito, vai muito e fala dos Estados Unidos. Imagine nos Estados Unidos, um juiz de primeira instância do Texas gravar uma conversa de Bill Clinton com Obama e divulgar em horário nobre horas depois da gravação. Foi isso que houve naquele casa. E o senhor sabe que foi uma gravação ilegal, porque o senhor já tinha mandado interromper interceptação às 11h12 da manhã. A gravação foi às 13h32. 6h da tarde estava na Globonews. Dá para aceitar isso? Naquele caso, o ministro Teori disse o seguinte: determinou que "as razões dadas pelo juiz Moro eram insuficientes para justificar essas medidas excepcionais, que foram tomadas por razões meramente abusivas. Quem diz é o ministro Teori. Ele diz mais: em linhas gerais, houve usurpação de competência do STF no curso da interceptação telefônica deferido pelo juízo reclamado, tendo como investigado Luiz Inácio Lula da Silva, foram captadas conversas com a presidenta da República. O magistrado de primeira instância, ao constatar a presença de conversas de autoridades com prerrogativa de foro, como é o caso da presidenta da República, deveria encaminhar essas conversas interceptadas para o Supremo Tribunal Federal". Vai mais o ministro Teori: "a divulgação pública – porque tem uma lei de interceptação telefônica; o artigo 8º diz que não pode haver vazamento – é inaceitável, contra uma regra constitucional expressa. Não é razoável dizer que o interesse público justifica a divulgação ou que as partes afetadas são figuras públicas. É preciso reconhecer a irreversibilidade dos efeitos práticos decorrentes da divulgação indevida de conversas telefônicas". Tem mais: para quê divulgar conversa da ex-primeira dama, dona Marisa, e dos seus filhos. Conversas íntimas, de sua nora. Nós não podemos aceitar isso. Estou discutindo abusos. Tem mais: interceptação de advogados. Isso em canto nenhum do mundo é aceito.
Tem uma nota da OAB. Gravaram o escritório de advocacia que defendia o presidente Lula. 25 advogados gravados, 300 clientes. Tem uma nota da OAB contra isso. Prisões preventivas abusivas. Tem um caso agora do funcionário da OAS: foi preso preventivamente por nove meses, condenado pelo juiz Sergio Moro a onze anos de prisão. O caso foi para o TRF e sabe o que aconteceu? Absolvido por unanimidade. Agora, o senhor prendeu por nove meses em prisão preventiva. Como restituir isso?
Esse uso abusivo de prisão preventiva está acontecendo a todo instante. Eu falo isso para encerrar meus questionamentos. Volto a dizer: nós defendemos investigações amplas, mas achamos que investigações amplas podem ser conduzidas respeitando a lei. É isso que está em jogo aqui. Estou tendo coragem para vir aqui para dizer o seguinte: acho que vivemos uma escalada autoritária. Há ameaça ao Estado democrático de Direito. Há elementos de Estado de Exceção se construindo.
O filósofo italiano Giorgio Agamben fala da convivência do Estado de Exceção com o Estado de Direito. Muitos falaram de Rui Barbosa. Citei Agamben porque me impressionou quando houve a reclamação do presidente Lula no TRF-4 e disseram que, no caso da Lava Jato, é uma situação excepcional. Como situação excepcional? Toda investigação tem que respeitar a lei. No caso da interceptação telefônica, não houve respeito à lei. Encerro falando de Rui Barbosa, que dizia: "a pior ditadura é a do Judiciário, porque contra ela você não tem a quem recorrer".
[PRESIDENTE DO SENADO RENAN CALHEIROS, ATENDENDO A PEDIDO, CONCEDE A PALAVRA AO JUIZ SERGIO MORO, CITADO EM DISCURSO ANTERIOR]
Juiz Sergio Moro: Sou um magistrado e esse caso Operação Lava Jato envolve casos que já foram julgados e casos, no entanto, que encontram-se pendentes. Não seria prudente da minha parte discutir esses casos pendentes, porque poderia ter interferência no meu julgamento deles, e mantenho essa imparcialidade. Teria o prazer em discutir esses casos, o que foi feito especificamente com a Petrobras quando isso fosse encerrado e dar minha opinião sobre o saque que foi feito. Mas fico preocupado – e aqui externo essa posição. Há essa afirmação de que o projeto da lei de abuso de autoridade não tem nenhuma intenção de frear a operação Lava Jato. Há essas afirmações de que a operação Lava Jato é sagrada, mas não obstante, com todo respeito ao eminente senador, aqui está se afirmando que eu, na condução do caso, cometi abuso de autoridade e devo ser punido. Parece-me claro que há uma intenção – não digo em relação a todos – clara de que o projeto de lei de abuso de autoridade seja utilizado especificamente para criminalizar condutas de autoridades envolvidas na operação Lava Jato. Para mim, ficou evidente com o discurso do eminente senador que o propósito é exatamente esse ao afirmar categoricamente que eu teria cometido atos de abuso de autoridade na condução dessa operação.
A questão a ser colocada é saber exatamente: é essa a intenção do projeto ou não é? Se for essa a intenção do projeto, insisto na necessidade ou do adiamento – porque vai passar um recado errado para a população – ou pelo menos a colocação dessas normas de salvaguarda para o juiz saber – e não digo aqui só o juiz de primeira instâncias... Várias das minhas decisões proferidas (e pode sempre haver discordância em relação a elas) foram mantidas pelo Tribunal Regional Federal da 4ª região, pelo Tribunal Superior Eleitoral e várias vezes por unanimidade, mesmo em relação a prisões preventivas decretadas na operação Lava Jato, pelo Supremo Tribunal Federal. Então, a intenção é essa: criminalizar todas essas autoridades? Porque há divergência eventual na interpretação que foi adotada pelos juízes.
Se a operação Lava Jato, como muitos dizem, é de fato sagrada, então tem que se pensar acerca da proposição dessa inovação na lei de abuso de autoridade e na intenção aparentemente explícita de que sejam criminalizados agentes envolvidos nessa operação

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