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5.09.2018

Historiador suíço mostra por que Lula é um preso político

Professor na Universidade de Zurique, o historiador Antoine Acker diz que o Brasil entrou numa era “não democrática” e explica por que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é um preso político. “Como explicar que o ex-presidente Lula esteja confinado em uma solitária, privado de suas visitas e proibido de expressar-se publicamente? Este tratamento de exceção, habitualmente reservado aos criminosos perigosos dá margem a muitas dúvidas”, diz ele. Acker lembra ainda que a condenação, “sem base material”, foi tomada apenas com base em “convicções” e visa exclui-lo do processo eleitoral de 2018

Por Antoine Acker, professor assistente na Universidade de Zurique – Como explicar que o ex-presidente Lula esteja confinado em uma solitária, privado de suas visitas e proibido de expressar-se publicamente? Este tratamento de exceção, habitualmente reservado aos criminosos perigosos dá margem a muitas dúvidas. Ele é o resultado de uma condenação de 12 anos de prisão do líder do Partido dos Trabalhadores (PT) por ter supostamente recebido um apartamento triplex em troca de favores atribuídos à empresa OAS. Esta sentença sem base material, como o admitiu o próprio Ministério Público, se apoia unicamente sobre as convicções dos seus investigadores. Durante o processo de acusação o juiz não conseguiu provar o usufruto do triplex por Lula e nem ao menos identificar um ato de favoritismo cometido durante seu mandato presidencial.
A prisão de Lula faz pairar muitas dúvidas sobre a parcialidade da justiça em relação aos suspeitos das outras tendências políticas no escândalo da Petrobras, um gigantesco caso de corrupção no qual, a questão do “triplex da OAS” não é mais do que um mínimo enredo. As posições nem sempre isentas da mais alta corte do país, o Supremo Tribunal Federal (STF) suscitaram a cautela de muitos juristas. De um lado, o STF mostrou-se inflexível frente a Lula, particularmente quando autorizou sua prisão antes do esgotamento de todos os recursos judiciários. Do outro, ele recusou, malgrado os reiterados pedidos do procurador geral, a emissão de um mandado de prisão contra Aécio Neves, líder da direita brasileira, pego em flagrante delito de extorsão de fundos públicos em 2017.


Equilíbrio democrático ameaçado
No contexto da “Lava Jato”, a vasta operação judiciária que acompanha o escândalo Petrobras, alguns membros do Supremo Tribunal Federal tomaram inesperadas liberdades com o princípio de neutralidade. O mais controverso dentre eles, Gilmar Mendes, esteve, em dois meses, quarenta e três vezes ao telefone com Aécio Neves, já na época sob investigação. Sua presidente, Carmen Lúcia, recebeu em seu domicílio o atual Chefe de Estado Michel Temer que é objeto de uma investigação da Corte por fatos graves de corrupção. Estes comportamentos ambíguos, ameaçam o equilíbrio democrático. Ao organizar a prisão de Lula, a justiça elimina o favorito da eleição presidencial de outubro de 2018, enquanto que seu concorrente de centro direita, Geraldo Alckmin, investigado por desvio de fundos públicos acabou de ser salvo das garras da “Lava Jato”. Para a surpresa de todos, a candidatura de Alckmim poderá ser mantida graças à transferência do seu dossiê ao Tribunal Superior Eleitoral, um órgão cujos trâmites são notórios pela sua lentidão.
A agenda política que parece guiar alguns magistrados pode ser compreendida como uma solução de continuidade ao impeachment de Dilma Roussef (PT), afastada da Presidência da República em 2016, em proveito de seu vice-presidente Michel Temer, graças a uma manobra do Congresso. Não só Roussef é uma das raras personalidades a não ter à sua carga nenhum processo judicial, como também, quando estava à frente do executivo, havia reforçado consideravelmente a força da Lava Jato, dando-lhe poderes mais amplos para a investigação do delito de corrupção e estendendo a competência dos juízes em matéria de negociação de pena. Uma conversa telefônica de Romero Jucá, chefe do partido conservador agora no poder (PMDB), gravada sem seu conhecimento pouco antes da sua destituição de Dilma Roussef, é profundamente perturbadora. Ele fala em organizar um “grande acordo nacional” para substituir Roussef por Temer (também do PMDB) com o concurso do “Supremo” (o STF) e os “generais” do Exército como garantia. Assim, não raros são aqueles que interpretam o impeachment de 2016 como uma forma sofisticada de golpe de estado, visando a pôr uma clique de políticos corrompidos fora do alcance da justiça. De fato, dois terços dos ministros nomeados então por Temer estavam sob investigação da “Lava Jato” ou eram réus de outros processos.
Ameaças de intervenção armada
O novo presidente não hesitou a apropriar-se dos fundos públicos para comprar o voto dos deputados a fim de obter um arquivamento dos processos penais que o acusavam. Sua chegada ao poder levou a hemorragia de processos da “Lava Jato”, em um contexto de degradação do Estado de Direito e de chantagens relativas a um eventual golpe militar. O general Villas Boas, chefe do Estado-Maior, quase que declaradamente, ameaçou o país de uma intervenção do exército em caso de decisão favorável a Lula por parte do STF. O sistema de governo que se organizou desde 2016, repousa sobre relações de pressão entre as instituições políticas, judiciárias e militares e de cumplicidade entre alguns dos indivíduos chave que as compõem. Se sua culpabilidade não for provada antes da realização das próximas eleições, Lula entrará para a história como o primeiro prisioneiro político desta “não democracia”.
(este artigo foi originalmente publicado no jornal Le Temps e traduzido para o Brasil 247 por Sylvie Giraud) Veja o artigo original em Francês

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