12.12.2011

Crianças zen

A onda de meninos e meninas que preferem brócolis a coxinha, Índia a Disney, ioga a futebol - e até meditam

Débora Rubin

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IOGUES
Noah, 7 anos, pediu à mãe, Rosana, uma aula de ioga
para ele e seus amigos de presente de aniversário
Na festa de 1 ano de Laurinha não teve brigadeiro, coxinha nem refrigerante. No cardápio, espetinhos de tomate-cereja, queijo e manjericão e suco de laranja com beterraba. A alimentação saudável, sem carne, sem açúcar refinado e com poucos produtos industrializados também já é parte da rotina de Noah, 7 anos, um pequeno iogue que se prepara para ir pela segunda vez à Índia. E de Anne, 11 anos, que, por causa da ioga, introduziu também a meditação em sua vida. Os três formam um grupo crescente entre os pequenos brasileiros, as chamadas crianças zen. “É uma tendência que veio para ficar”, confirma a psicanalista infantil Anelize Sandoval. “Ainda é coisa de uma minoria das classes média e alta, mas que deve se expandir da mesma forma que a terapia para crianças virou moda há alguns anos.” Com os pais estressados e em busca de caminhos alternativos que atenuem a estafa física e mental do cotidiano, é natural que os pequenos se mirem nesses exemplos. E o que muitas vezes começa como uma imitação natural dos genitores pode se tornar uma atividade regular e divertida. “Desde que elas não sejam obrigadas pelos pais a fazer, só vejo benefícios”, diz a psicanalista.

Muitas vezes, os próprios pais se surpreendem com a adesão dos filhos. É o caso da professora universitária e instrutora de ioga Rosana Seligmann, de São Paulo. Há 15 anos, ela trabalhava como atriz e praticava ioga porque se sentia muito estressada. Uma viagem à Índia mudou seu caminho profissional, a ponto de ela decidir abrir uma escola para ensinar a milenar prática. Sua didática, porém, só incluía adultos. Até Noah fazer 6 anos e pedir de presente de aniversário uma aula para ele e seus amigos. Por causa do pedido, Rosana abriu sua primeira turma infantil. O filho mais novo, David, 5 anos, não pratica ainda porque é muito pequeno, mas brinca de fazer posições. Nessas férias, a família toda vai à Índia. “É a nossa Disney”, diz Rosana.

Algumas escolas também já introduziram a ioga em seu currículo, como o Colégio Hugo Sarmento, de São Paulo, e a Escola Pedra da Gávea, no Rio de Janeiro. “As pessoas perguntam se usamos a ioga para deixar os alunos calmos e assim controlá-los”, afirma o diretor do colégio paulista, João Mendes de Almeida Jr. “É o contrário: nós queremos que eles aprendam a se autocontrolar.” Depois que a prática passou a fazer parte do dia a dia do colégio, os conflitos diminuíram, afirma o educador. Mas os especialistas alertam que a prática deve ser diferente para as crianças. É preciso que seja em uma velocidade mais acelerada e tenha uma dimensão lúdica, explica Júlia Signer, professora do espaço Lótus Urbano, de São Paulo. É ela quem ensina Anne Arbaitmann Veraart, que acha a técnica difícil, mas divertida. Além de se esticar toda, Anne aprendeu a meditar durante as aulas. A meditação também deve ser adaptada para a realidade infantil. York Stillman, diretor do Centro Shambhala de Meditação de São Paulo, diz que o ideal é que crianças de até 8 anos pratiquem informalmente, sentadas no colo dos pais. “Já os mais velhos podem se concentrar num som, em um objeto ou na própria respiração”, orienta.

Alguns pais são influenciados pelos filhos zen. É o caso da funcionária pública Letícia Duarte, de Belo Horizonte, mãe da Laurinha, aquela da “festa natureba”, que, até ficar grávida da menina, tinha uma alimentação à base de arroz, feijão e carne. Com a chegada da pequena, ela começou a mudar a dieta, dispensou remédios e até o cigarrinho eventual. “Comecei a estudar o assunto e vi quanto lixo e veneno comíamos”, diz. “Não queria isso para a minha filha.” É preciso viver como um ET para garantir a alimentação saudável da família, diz ela. Mas vale cada gota de suor e centavo. Laurinha é um bebê sereno, que ouve mantras e adora massagem nos pés antes de dormir. A mudança radical de hábitos valeu a pena. “A Laura me fez evoluir.” 
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