Estudo aponta impacto negativo de instituições desestruturadas sobre o desenvolvimento das crianças
- Se a creche não for de qualidade, o desempenho dos estudantes pode ser pior do que o alcançado por alunos que não frequentaram essas unidades
SÃO PAULO - Nem sempre as crianças que frequentaram creches terão
resultados escolares melhores no futuro do que aquelas que não tiveram
esta oportunidade. Se a creche não for de qualidade, o desempenho dos
estudantes pode ser, inclusive, pior do que o alcançado por alunos que
não frequentaram essas unidades. A conclusão é de um estudo desenvolvido
por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), da Fundação
Getúlio Vargas (FGV) e da Organização das Nações Unidas (ONU).
Especialistas analisaram as notas de matemática de crianças da 4ª série que participaram do Sistema de Avaliação de Educação Básica (Saeb), em 2005, levando em consideração também a escolaridade das mães. O objetivo era saber se ir à creche trazia resultados positivos para as crianças. Eles perceberam que, entre os filhos de mães com baixa escolaridade, os que frequentaram creches tiveram resultado pior no Saeb do que os que não frequentaram. O impacto positivo nas notas dos alunos só ocorreu nos casos em que as mães das crianças estudaram pelo menos até os últimos anos do ensino fundamental.
Segundo Daniel Santos, professor de Economia da USP e um dos autores da pesquisa, uma das principais hipóteses para explicar o resultado é a baixa qualidade das creches escolhidas por mães com menor escolaridade.
— Acredito que a criança estimulada desde bem pequena tem resultado melhor. A questão é saber se a criança foi realmente estimulada. Muitas vezes, as creches são depósitos delas, não estão prontas para estimular as crianças — afirma Santos.
De acordo com o especialista, a preocupação com o estímulo ao aprendizado nas creches é recente, pois somente em 2006 elas passaram a integrar o sistema educacional. Antes, segundo ele, as instituições faziam parte da estrutura de assistência social e serviam apenas para alimentar, garantir a saúde das crianças e permitir que as mães pudessem trabalhar.
— Estamos num momento de transição. Grande parte das creches ainda está no modelo antigo. Talvez a maioria delas ainda não dê estímulo às crianças. E o problema é que a chance de uma criança ir para uma creche assim, sem estímulo, é maior entre os filhos de mães analfabetas. O mecanismo que deveria ser corretor de desigualdade acaba não sendo — diz Santos.
Na Inglaterra, um estudo de pesquisadores da Universidade de Londres e de Oxford chegou a resultados semelhantes. Os autores acompanharam um grupo de 3.000 estudantes, desde sua entrada na pré-escola até os 11 anos de idade. Eles também avaliaram 141 pré-escolas britânicas, e, após observações in loco, dividiram os estudantes entre aqueles que tiveram acesso a uma pré-escola de qualidade e os que não tiveram essa sorte. A conclusão foi que a qualidade da pré-escola era um forte indício do desempenho escolar e comportamental dos estudantes. Mais importante: crianças que frequentaram pré-escolas de baixa qualidade não apresentavam ganho algum, se comparadas àquelas que sequer chegaram a frequentar escolas na primeira infância.
Segundo a ONG Campanha Nacional pelo Direito à Educação, o gasto com creche no Brasil é menor do que o recomendado para que elas atendam a requisitos mínimos de qualidade. Dados aferidos em 2012 pela organização comprovam que uma creche de período integral deve investir, por ano, R$ 8.804 por aluno matriculado, para oferecer profissionais qualificados, espaço físico e materiais apropriados. No entanto, os gastos com creche e pré-escolas informados pelo governo brasileiro à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) foi de US$ 1.696 (ou R$ 3.475, segundo a cotação atual). O valor deixa o país na terceira pior posição num ranking de 34 países.
De acordo com o Ministério da Educação, o valor mínimo que deveria ser investido por aluno, em 2013, é de R$ 2.221,73.
— O Brasil não percebe o quão importante é a educação infantil, e investe pouco. O direito à educação só é pleno quando alia acesso à qualidade. O direito à creche, que envolve o direito à educação da criança e o direito da família ao trabalho, por exemplo, é um elemento-chave para a qualidade de vida — disse Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
Na opinião de Patrícia Mota Guedes, especialista em gestão educacional da Fundação Itaú Social, é preciso investir em qualificação e formação de profissionais que trabalham nas creches, que, muitas vezes, não têm a escolaridade indicada. Ela acrescenta que orientar o pais também é importante.
— Para pais de mais baixa escolaridade e em situação mais vulnerável, é difícil fazer escolhas sobre a creche e avaliar a qualidade do serviço a que eles têm acesso. Pais menos escolarizados muitas vezes acham que, se a creche cuida da criança e a mantém saudável, isso significa que há qualidade — analisa Patrícia.
No Rio, a prefeitura tem construído creches mais bem equipadas e com proposta de trabalho mais bem definida para crianças de regiões mais pobres e mais violentas na cidade. No final de 2009, começaram a ser construídos os Espaços de Desenvolvimento Infantil (EDI), que são mais amplos, têm melhor estrutura para atendimento e mais livros para crianças de 6 meses a 5 anos de idade. A fim de estimular mais os pequenos, os berços deram lugar a pisos onde eles podem dormir, brincar e aprender por meio de atividades lúdicas. A capital tem hoje 108 EDIs, com cerca de 150 alunos, em média. A meta é construir outras 31 unidades até o fim do ano.
— Além disso, passamos a orientar os educadores a fazerem uma reserva de tempo para desenvolver atividades como ler histórias, folhear livrinhos e trabalhar com materiais com formas geométricas, por exemplo. Tem que haver essa reserva, senão o risco é que se gaste o tempo todo cuidando do bebê sem colocar o ato
Especialistas analisaram as notas de matemática de crianças da 4ª série que participaram do Sistema de Avaliação de Educação Básica (Saeb), em 2005, levando em consideração também a escolaridade das mães. O objetivo era saber se ir à creche trazia resultados positivos para as crianças. Eles perceberam que, entre os filhos de mães com baixa escolaridade, os que frequentaram creches tiveram resultado pior no Saeb do que os que não frequentaram. O impacto positivo nas notas dos alunos só ocorreu nos casos em que as mães das crianças estudaram pelo menos até os últimos anos do ensino fundamental.
Segundo Daniel Santos, professor de Economia da USP e um dos autores da pesquisa, uma das principais hipóteses para explicar o resultado é a baixa qualidade das creches escolhidas por mães com menor escolaridade.
— Acredito que a criança estimulada desde bem pequena tem resultado melhor. A questão é saber se a criança foi realmente estimulada. Muitas vezes, as creches são depósitos delas, não estão prontas para estimular as crianças — afirma Santos.
De acordo com o especialista, a preocupação com o estímulo ao aprendizado nas creches é recente, pois somente em 2006 elas passaram a integrar o sistema educacional. Antes, segundo ele, as instituições faziam parte da estrutura de assistência social e serviam apenas para alimentar, garantir a saúde das crianças e permitir que as mães pudessem trabalhar.
— Estamos num momento de transição. Grande parte das creches ainda está no modelo antigo. Talvez a maioria delas ainda não dê estímulo às crianças. E o problema é que a chance de uma criança ir para uma creche assim, sem estímulo, é maior entre os filhos de mães analfabetas. O mecanismo que deveria ser corretor de desigualdade acaba não sendo — diz Santos.
Na Inglaterra, um estudo de pesquisadores da Universidade de Londres e de Oxford chegou a resultados semelhantes. Os autores acompanharam um grupo de 3.000 estudantes, desde sua entrada na pré-escola até os 11 anos de idade. Eles também avaliaram 141 pré-escolas britânicas, e, após observações in loco, dividiram os estudantes entre aqueles que tiveram acesso a uma pré-escola de qualidade e os que não tiveram essa sorte. A conclusão foi que a qualidade da pré-escola era um forte indício do desempenho escolar e comportamental dos estudantes. Mais importante: crianças que frequentaram pré-escolas de baixa qualidade não apresentavam ganho algum, se comparadas àquelas que sequer chegaram a frequentar escolas na primeira infância.
Segundo a ONG Campanha Nacional pelo Direito à Educação, o gasto com creche no Brasil é menor do que o recomendado para que elas atendam a requisitos mínimos de qualidade. Dados aferidos em 2012 pela organização comprovam que uma creche de período integral deve investir, por ano, R$ 8.804 por aluno matriculado, para oferecer profissionais qualificados, espaço físico e materiais apropriados. No entanto, os gastos com creche e pré-escolas informados pelo governo brasileiro à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) foi de US$ 1.696 (ou R$ 3.475, segundo a cotação atual). O valor deixa o país na terceira pior posição num ranking de 34 países.
De acordo com o Ministério da Educação, o valor mínimo que deveria ser investido por aluno, em 2013, é de R$ 2.221,73.
— O Brasil não percebe o quão importante é a educação infantil, e investe pouco. O direito à educação só é pleno quando alia acesso à qualidade. O direito à creche, que envolve o direito à educação da criança e o direito da família ao trabalho, por exemplo, é um elemento-chave para a qualidade de vida — disse Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
Na opinião de Patrícia Mota Guedes, especialista em gestão educacional da Fundação Itaú Social, é preciso investir em qualificação e formação de profissionais que trabalham nas creches, que, muitas vezes, não têm a escolaridade indicada. Ela acrescenta que orientar o pais também é importante.
— Para pais de mais baixa escolaridade e em situação mais vulnerável, é difícil fazer escolhas sobre a creche e avaliar a qualidade do serviço a que eles têm acesso. Pais menos escolarizados muitas vezes acham que, se a creche cuida da criança e a mantém saudável, isso significa que há qualidade — analisa Patrícia.
No Rio, a prefeitura tem construído creches mais bem equipadas e com proposta de trabalho mais bem definida para crianças de regiões mais pobres e mais violentas na cidade. No final de 2009, começaram a ser construídos os Espaços de Desenvolvimento Infantil (EDI), que são mais amplos, têm melhor estrutura para atendimento e mais livros para crianças de 6 meses a 5 anos de idade. A fim de estimular mais os pequenos, os berços deram lugar a pisos onde eles podem dormir, brincar e aprender por meio de atividades lúdicas. A capital tem hoje 108 EDIs, com cerca de 150 alunos, em média. A meta é construir outras 31 unidades até o fim do ano.
— Além disso, passamos a orientar os educadores a fazerem uma reserva de tempo para desenvolver atividades como ler histórias, folhear livrinhos e trabalhar com materiais com formas geométricas, por exemplo. Tem que haver essa reserva, senão o risco é que se gaste o tempo todo cuidando do bebê sem colocar o ato
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