A fabricação de medicamentos biológicos está exigindo perfis profissionais até
então inexistentes, ou pouco frequentes, no mercado de trabalho. A nova
indústria, que opera com processos complexos de produção, treina equipes
internas, contrata no Brasil e no exterior, e monta estratégias para recrutar
quadros nas universidades. De forma geral, em uma primeira fase, elas vão
produzir biossimilares, de marcas consagradas, cujas patentes estão próximas
de expirar. Esse cenário foi apresentado na última terça-feira (09/09), em São
Paulo, durante o debate “Capacitação de Recursos Humanos para Biotecnologia”,
que aconteceu no 8º Encontro Nacional de Inovação em Fármacos e Medicamentos
(ENIFarMed), em São Paulo. Representantes de quatro empresas, Orygen,
Bionovis, Libbs e Biocad Brasil, falaram de seus planos para formar pessoal no
mercado nascente.
Priscila Scheinberg, gerente de assuntos regulatórios da Orygen, assinalou a
tendência de crescimento dos medicamentos biológicos. Em 2010 eles
representavam 18,4% do mercado global e a previsão para 2016 é que chegarão a
21% do total. Na rede pública de saúde brasileira, os biológicos equivalem a
5% da oferta, mas consomem 43% dos gastos. Há desafios na produção,
desenvolvimento e inovação, explica. Um deles está em recursos humanos que são
escassos para ocupar os cerca de 600 postos ofertados pelas quatro companhias
participantes do evento.
Na Orygen, diz ela, está em foco não somente a falta de mão de obra, mas
também a estrutura para treinamento de operários e a necessidade de adaptar
cursos de graduação e pós-graduação em biotecnologia. Outro caminho é procurar
profissionais brasileiros que estão no exterior e desejam voltar ao País – ela
própria uma biomédica que passou quinze anos nos EUA. “Acreditamos nos jovens
talentos do Brasil”, diz, referindo-se à iniciativa de recrutar pessoal de
nível superior. Nos Estados Unidos existem técnicos trabalhando nessas
indústrias, mas aqui será necessário contratar profissionais graduados e
pós-graduados para exercer tais funções. A Orygen, joint venture entre os
laboratórios Biolab e Eurofarm, tem como parceira a multinacional Pfizer.
O “repatriamento” de pesquisadores brasileiros no exterior também é uma opção
da Bionovis, apontou Thiago Mares Guia, gerente médico e científico da
empresa. Com previsão de lançar seu primeiro produto em 2015, a Bionovis tem
urgência de se preparar para a fabricação. O primeiro passo é a transferência
de tecnologia do parceiro internacional, a Merck, alemã, para a produção de
biossimilares. Neste ciclo, o parceiro será responsável pelo treinamento dos
funcionários.
Mares Guia nota que cada uma das várias etapas da cadeia produtiva exige
qualificações específicas, às vezes de âmbito multidisciplinar. Esse
conhecimento existe nas universidades, mas não na forma que será utilizado
pela indústria, observa. A Bionovis abriu um processo de contratação de
profissionais do exterior, começando pelo diretor responsável pela área de
pesquisa e desenvolvimento, norte-americano, com experiência no mercado
internacional de biofármacos. Ao mesmo tempo, trabalha em conjunto com os
outros integrantes do segmento para levar essas necessidades às universidades
brasileiras.
A Libbs apoia-se em sua trajetória industrial para ingressar no segmento. A
empresa introduziu, em 2006, mudanças em sua fábrica para produção de
hormônios com o aval de uma agência certificadora alemã, o que lhe permite
exportar para a Europa. A atividade exige processos de fermentação, etapa
intermediária para a biotecnologia. “Já tínhamos essa base instalada de
fermentação”, nota Marcia Martini Bueno, diretora de relações institucionais
da Libbs, falando sobre a parceria internacional com a Mabxience, que pertence
à farmacêutica alemã Chemo. É na indústria europeia que estão sendo treinadas
as equipes da Libbs. Participam também dessa formação os profissionais que
integram o projeto, do Instituto Butantan e da Bahia Farma. É a forma
encontrada para que o processo caminhasse mesmo com a defasagem de recursos
humanos, observa.
“Já fechamos acordos com algumas universidades”, informa o presidente da
Biocad Brasil, David Zylbergeld Neto. A empresa russa que se instalou no
Brasil há três anos também fechou acordos de cooperação com o Tecpar,
Instituto de Tecnologia do Paraná. Para determinadas posições, diz Zylbergeld,
“o menor nível que vamos aceitar é o de PhD”, dada a necessidade da alta
especialização. “Vamos trazer profissionais para o Brasil, para capacitar e
dar aulas, e levar funcionários para a Rússia.”
A Biocad atua no mercado de biofármacos com um modelo verticalizado, que vai
da molécula ao produto final, afirma. No Brasil, a empresa tem o compromisso
de construir duas fábricas, uma de insumos farmacêuticos ativos, e outra de
produtos finais. O interesse da multinacional russa no mercado brasileiro,
assim como o de outros fabricantes, está na dimensão atual dessa demanda e,
principalmente, no futuro. O País tem hoje um gasto anual de US$ 13 bilhões
com a aquisição de produtos biológicos, onde se incluem medicamentos,
dispositivos, kits de diagnóstico e outros. A quase totalidade desse dispêndio
é de importados. Zylbergeld destaca, além disso, um dado impactante: dentro de
dois anos, dos dez produtos mais vendidos no mundo, sete serão de
biotecnologia, registra.
Fonte: Carlos Martins - Interface CTI
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