7.27.2015

"Suicídio é problema de saúde pública no Brasil e no mundo. Cerca de 90% dos casos são preveníveis"

     
Autor: Luciana Castro | lcpereira@redegazeta.com.br

Jornalista lança livro amanhã em Vitória onde alerta para o perigo da falta de informação sobre o assunto. Os direitos autorais da obra foram todos revertidos para o Centro de Valorização da Vida

Tema de extrema delicadeza, o suicídio tira cerca de 800 mil vidas por ano no mundo, mais ainda é tratado como um tabu por muita gente. Porém, 90% dos casos são preveníveis por estarem relacionados a psicopatologias que podem ser diagnosticadas e tratadas, como é o caso da depressão.
E para que o tema possa ser encarado com mais naturalidade e informação, o jornalista André Trigueiro escreveu o livro “Viver é a melhor opção - A prevenção do suicídio no Brasil e no mundo”.
Trigueiro é pós-graduado em Gestão ambiental e durante 16 anos foi âncora e repórter do Jornal das Dez da Globo News. Desde de 2012 é repórter da TV Globo. É editor-chefe do programa Cidades e Soluções, da Globo News, comentarista da Rádio CBN e colaborador voluntário da Rádio Rio de Janeiro.
Ele estará no Estado amanhã para o lançamento de seu livro e uma palestra aberta ao público no Centro de Convenções de Vitória, às 19h30. O jornalista doou 100% dos direitos autorais para o Centro de Valorização da Vida
Foto: Jornalista lança livro amanhã em Vitória onde alerta para o perigo da falta de informação sobre o assunto. Os direitos autorais da obra foram todos revertidos para o Centro de Valorização da Vida
André Trigueiro
Por quê você decidiu escrever sobre o suicídio?
Porque é problema de saúde pública no Brasil e no mundo e quase ninguém sabe. Outra informação importante amplamente desconhecida é a de que o suicídio é prevenível em 90% dos casos, quando há intercorrência com patologias de ordem mental diagnosticáveis e tratáveis, principalmente a depressão. Apesar de tudo, permanece o tabu na sociedade e nas mídias.
Suicídio continua sendo um assunto invisível, mesmo quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) reforça o papel estratégico da comunicação para que se reduza o número de casos. É preciso saber o que dizem os especialistas, mapear os riscos, identificar os sinais de alerta e procurar ajuda quando necessário. A informação correta pode salvar vidas. Essa é a principal contribuição do livro.
Você destinou os direitos do livro ao Centro de Valorização da Vida. Qual a importância do CVV?
Sou fã do CVV. Este é o terceiro livro que abro mão dos direitos autorais em favor do Centro de Valorização da Vida. O CVV é uma entidade filantrópica sem vinculações políticas ou religiosas que realiza desde 1962 um serviço gratuito de apoio emocional e prevenção do suicídio por telefone (141) e, mais recentemente, pela internet, no site do CVV.
Em mais de 50 anos de atividade voluntária no Brasil, o CVV construiu um legado valiosíssimo de como acolher pessoas que invariavelmente precisam desabafar ou compartilhar situações de vida.
É gente que busca um produto cada vez mais em falta no “mercado”: a escuta amorosa. Os voluntários do CVV (basta ter mais de 18 anos e boa vontade) são treinados para lidar com diferentes tipos de situação sempre respeitando o sigilo. A instituição recebe aproximadamente 800 mil ligações por ano sem grande exposição na mídia. Isso nos dá uma noção da demanda reprimida por esse tipo de assistência.
Se em 90% dos casos o suicídio é prevenível, como evitá-lo?
Informação e atitude. Um diagnóstico preciso é apenas o primeiro passo. Importante dizer que a maioria das pessoas com depressão, transtornos de personalidade, esquizofrenia ou outras patologias de ordem mental não comete suicídio. Mas é importante acompanhar de perto a evolução do tratamento.
A assistência especializada (psicólogos ou psiquiatras) ajuda bastante, mas os resultados são ainda melhores quando há o apoio de familiares e amigos. Atribui-se como causa principal do suicídio uma dor intensa, difícil de descrever. Os suicidólogos reportam esse sofrimento com muito respeito e sugerem que se dê a ele o devido acolhimento.
A mídia, em geral, não aborda este tema alegando que a divulgação aumentaria os casos. Como o tema poderia ser veiculado?
No livro compartilho as orientações da OMS aos profissionais de imprensa sobre como falar de suicídio nas mídias. Entre outras recomendações, sugere-se não destacar esse tipo assunto com manchetes e fotos, não informar o meio empregado para consumar o suicídio, não enaltecer as qualidades morais do suicida, e sempre abrir espaço para as informações que aludem a prevenção. É importante dizer que o jornalismo tem uma função social, ele precisa ser útil à sociedade, e neste capítulo da prevenção do suicídio, é preciso fazer mais e melhor.
Acredita que escolas e igrejas também podem participar desse processo de informação?
Sem dúvida. No que se refere às escolas, cito no livro o exemplo do Japão, que sempre teve índices elevados de suicídio até o país resolver enfrentar o tabu e desenvolver políticas públicas que alcançam atividades como palestras e seminários em instituições de ensino. Em relação às igrejas, vale dizer que todas as grandes religiões e tradições espiritualistas do Ocidente e do Oriente se manifestam claramente contra o suicídio.
Com toda sua pesquisa você conseguiu identificar qual é o perfil do suicida?
O perfil sociodemográfico mais exposto ao risco suicida é de homens entre 15 e 35 anos (ou acima de 73 anos) residentes em áreas urbanas, desempregados ou aposentados, isolados socialmente, solteiros ou separados, migrantes. Mas dentre todos os fatores de risco há dois que se destacam: já ter tentado se matar ao menos uma vez e ser portador de algum transtorno mental (principalmente depressão).
O Brasil ocupa atualmente uma posição preocupante no ranking mundial de mortes...
Em números absolutos, o Brasil aparece em 8º no ranking mundial de suicídios com 11.821 óbitos por suicídio por ano, o que dá uma média de 32 casos por dia. Importante dizer que estes números não expressam a realidade das ocorrências, há na verdade muito mais suicídios acontecendo por aí, já que as próprias autoridades de saúde reconhecem o problema da subnotificação, ou seja, muitos atestados de óbito são preenchidos de maneira imprecisa, atribuindo a “causa indeterminada” ou “acidente” o que na verdade foi suicídio.
Você deve ter falado com familiares de pessoas que se suicidaram. Como se recuperar desta tragédia? Estas pessoas conseguem apoio?
Cada caso é um caso. Há quem leve mais tempo para se recuperar, outros conseguem enfrentar a situação com serenidade em menos tempo. O importante é seguir em frente. Cada um de nós é responsável pelo próprio destino. De uma forma ou de outra, aprende-se a lidar com a dor e superá-la. Desconhecemos o poder que temos para enfrentar situações inimagináveis.
A ajuda especializada pode ser importante (psicólogos principalmente), mas quem depende do serviço público deverá procurar os serviços gratuitos oferecidos por universidades ou entidades classistas.
Você vê relação da internet com o suicídio. A divulgação de conteúdos íntimos, pornografia, por exemplo, podem gerar novos suicidas? E no que se refere a sites que estimulam o suicídio, é possível combatê-los?
O chamado bullying virtual já determinou vários casos de suicídio no Brasil e no mundo. A humilhação de ver imagens ou informações íntimas “viralizadas” nas redes gera enorme constrangimento sem que as pessoas expostas se sintam preparadas para enfrentar a situação com a devida serenidade.
Entendo que no Brasil se deveria mobilizar o mesmo aparato utilizado no combate a pedofilia na internet para desabilitar os sites que promovem o suicídio. Grandes empresas de conteúdo na internet (Yahoo e Google, por exemplo) já reprogramaram seus softwares para “encaminhar” pessoas que realizam pesquisas sobre suicídio a acessarem primeiro os sites que falam de prevenção. É preciso atuar com mais rigor nas redes.
Agora mudando um pouco de assunto, você que leciona e trabalha com o tema ambiental. O Brasil vem passando por uma crise hídrica que se agravou meses atrás. Como evitar que a escassez da água seja um problema recorrente no país?
O Brasil perdeu o direito de errar quando o assunto é gestão dos recursos hídricos. Depredamos as bacias hidrográficas, desmatamos as matas ciliares e nascentes, ostentamos indicadores subsaarianos de saneamento básico. Em resumo: registramos nas últimas décadas a destruição sistemática das condições que permitem o fornecimento regular de água em volume e qualidade confiáveis. Ou corrigimos o rumo, ou a situação será ainda mais difícil.
Ajude!
Seja um voluntário do CVV
Telefone: 141
Endereço: Av. Adalberto Torres, 153, Jucutuquara, Vitória
O CVV precisa: uma pessoa a cada quatro horas para atender ligações (cada voluntário trabalha uma vez por semana)
Média por semana: 50 voluntários
Cursos: todo voluntário do CVV passa
por preparação antes de poder ajudar a quem precisa
NÚMEROS DO SUICÍDIO
No Brasil
Ranking mundial: 8ª posição
Mortes por ano: 11.821 
Mortes por dia: 32 (média)
No Mundo: mais de 800 mil por ano
André Trigueiro
Viver é a melhor opção - A prevenção do suicídio no Brasil e no mundo
Autor: André Trigueiro
Editora: Correio Fraterno

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