7.14.2018

O OPERÁRIO NO MAR

Foto de Michelle Dovigo.

Na rua passa um operário. Como vai firme! Não tem blusa. No conto, no drama, no discurso político, a dor do operário está na blusa azul, de pano grosso, nas mãos grossas, nos pés enormes, nos desconfortos enormes. Esse é um homem comum, apenas mais escuro que os outros, e com uma significação estranha no corpo, que carrega desígnios e segredos. Para onde vai ele, pisando assim tão firme? Não sei. A fábrica ficou lá atrás. Adiante é só o campo, com algumas árvores, o grande anúncio de gasolina americana e os fios, os fios, os fios. O operário não lhe sobra tempo de perceber que eles levam e trazem mensagens, que contam da Rússia, do Araguaia, dos Estados Unidos. Não ouve, na Câmara dos Deputados, o líder oposicionista vociferando. Caminha no campo e apenas repara que ali corre água, que mais adiante faz calor. Para onde vai o operário? Teria vergonha de chamá-lo meu irmão. Ele sabe que não é, nunca foi meu irmão, que não nos entenderemos nunca. E me despreza... Ou talvez seja eu próprio que me despreze a seus olhos. Tenho vergonha e vontade de encará-lo: uma fascinação quase me obriga a pular a janela, a cair em frente dele, sustar-lhe a marcha, pelo menos implorar lhe que suste a marcha. Agora está caminhando no mar. Eu pensava que isso fosse privilégio de alguns santos e de navios. Mas não há nenhuma santidade no operário, e não vejo rodas nem hélices no seu corpo, aparentemente banal. Sinto que o mar se acovardou e deixou-o passar. Onde estão nossos exércitos que não impediram o milagre? Mas agora vejo que o operário está cansado e que se molhou, não muito, mas se molhou, e peixes escorrem de suas mãos. Vejo-o que se volta e me dirige um sorriso úmido. A palidez e confusão do seu rosto são a própria tarde que se decompõe. Daqui a um minuto será noite e estaremos irremediavelmente separados pelas circunstâncias atmosféricas, eu em terra firme, ele no meio do mar. Único e precário agente de ligação entre nós, seu sorriso cada vez mais frio atravessa as grandes massas líquidas, choca-se contra as formações salinas, as fortalezas da costa, as medusas, atravessa tudo e vem beijar-me o rosto, trazer-me uma esperança de compreensão.
Sim, quem sabe se um dia o compreenderei? 

Carlos Drummond de Andrade 
"Sentimento do Mundo". 
Foto: Francisco Proner

EX-CORREGEDOR DO CNJ E STJ DIZ QUE ATITUDE DE FAVRETO “FOI LEGAL” E CRITICA MORO



EX-CORREGEDOR DO CNJ E STJ 
DIZ QUE ATITUDE DE FAVRETO 
“FOI LEGAL” E CRITICA MORO



O ex-ministro Gilson Dipp, que foi 
vice-presidente do STJ e corregedor
 nacional de justiça no CNJ, deu 
entrevista ao Jota sobre o imbróglio
 causado pela sucessão de decisões 
envolvendo um pedido de habeas
 corpus para Lula:

Confusão não, foi a cena mais 
patética que eu jamais vi na minha
 vida em todo o Judiciário. 

Tudo isso me choca muito porque esse 
imbróglio foi feito no tribunal de onde 
sou egresso e do qual fui presidente.
 Sem apontar qualquer culpa de ninguém,
 mas foi um processo altamente 
politizado. 

(…)

O ato do desembargador Favreto 
tinha competência?

 Claro. Todo mundo sabe que no plantão
 os advogados, e isso faz parte do jogo,
 escolhem um plantonista. 

Agora mesmo há a discussão se a 
Cármen Lúcia vai ser presidente [do STF]
 ou não durante o recesso. 

É isso aí. Escolheram um sujeito
 que tinha maior possibilidade 
ideológica. 

Ele estava na sua plena competência. 
Era o juiz plantonista indicado pelo
 Tribunal Regional Federal da 4ª Região

Naquele momento ele representava o tribunal.
Eu posso não concordar com o teor,
 o conteúdo da decisão judicial. 

Basicamente porque não há nenhuma
 urgência ou nenhum fato novo que 
implique em um exame da matéria 
num domingo, sendo que no dia 
seguinte o relator da apelação originária
 já estaria trabalhando.

 Então a decisão do Favreto foi uma
 decisão fundamentada de acordo 
com a sua convicção, com seu 
entendimento. 

E isso faz parte do livre convencimento 
do juiz. Queira-se, concorde-se ou não. 

Eu não daria no mérito essa decisão, 
mas ela é legítima, o desembargador
 tem competência e é uma decisão 
judicial. Plantonista é instrumento
 do tribunal.

Ele [Moro] se manifestou em um 
momento inapropriado. 

Porque no caso da liminar ele seria ouvido. 

Pela lei, tanto a autoridade coatora 
quanto o MPF são ouvidos em um 
prazo de cinco dias. 

Ele, no entanto, atravessou um 
despacho questionando a 
competência de um superior
 hierárquico seu. 

Afirmou falta de competência, afirmou
 que falou com o presidente do tribunal,
 afirmou que teria que ouvir o relator.
 Nada disso poderia ter sido feito.

Quem menos errou aí, em termos
 de competência, em termos de 
processo penal, foi o desembargador
 Favreto, apesar de eu não concordar
 no conteúdo com a tese dele, porque
 não tinha urgência. 

E a questão está sendo examinada pelas 
instâncias superiores. Não dá para decidir
 isso num domingo.

 Mas ele resolveu, e ele estava no 
direito, tinha competência para tanto, 
resolveu enfrentar a questão. 

E no caso do HC o recurso não se confunde
 totalmente com a apelação no mérito,
 aquela que está sendo julgada pelo tribunal,
 e que tem recursos no STF e no STJ. 

O HC tem particularidades, é uma medida
 constitucional que tem particularidades,
 que foram desenvolvidas ali naquele HC. 
Certo ou errado, não interessa.

Para mim, todas essas decisões foram 
decisões jurisdicionais. Certas ou erradas

E sendo decisões jurisdicionais podem
 ser atacadas pelo recurso cabível em 
matéria processual penal da legislação.

 Não se trata de infração disciplinar que
 mereça a atenção do CNJ. Houve um 
fundamento na decisão.

 O CNJ não é um órgão judicial, 
é um órgão administrativo disciplinar
 do Judiciário. 

Aqui se tratam de várias decisões 
judiciais, mesmo que quase todas 
formuladas de modo irregular.

CLICK POLÍTICA com informações de DCM

PT: DODGE MENTIU PARA ATACAR DEPUTADOS E O DESEMBARGADOR FAVRETO

COM LULA FORTALECIDO, SUCESSÃO JÁ TEM DEZ EX-CANDIDATOS

Uma boa nova para os diabéticos: a insulina em cápsula está próxima







Pesquisadores estão perto de uma conquista que se 

busca desde 1921: testam, com bons resultados, 

uma pílula que libertará os diabéticos das injeções

Um trabalho desenvolvido por pesquisadores da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, pode estar prestes a revolucionar o estilo de vida dos 425 milhões de diabéticos no mundo: a insulina em cápsula. Para quem tem o tipo 1 da doença — autoimune, em que o pâncreas não produz insulina, o hormônio crucial para regular os níveis de açúcar no sangue —, a única opção é injetar a substância em sua forma sintética sob a pele até quatro vezes por dia. Para os cerca de 90% da população com o tipo 2 — em que o corpo não produz insulina suficiente ou não responde ao hormônio como deveria —, as injeções também podem ser necessárias.




Em busca da cápsula  

de insulina

Nosso colunista comenta as reais perspectivas de termos 

em breve uma insulina oral no tratamento do diabetes







Quando a insulina injetável foi desenvolvida por pesquisadores canadenses no início do século passado, muita gente achou que haviam encontrado a cura do diabetes. Embora a inovação não tenha erradicado o problema da face da Terra, não há como negar que representou um grande avanço. O tratamento com insulina fez aumentar (e muito) a qualidade e a expectativa de vida dessa população, que antes vivia refém de uma doença letal.
Décadas depois, apesar do surgimento de novos tipos de insulina, de agulhas de aplicação cada vez menores e menos dolorosas e das bombas de insulina, não é pequeno o número de diabéticos que gostariam de usá-la na forma de comprimidos. É um anseio antigo, com mais de 90 anos.
O grande desafio é que a insulina é uma proteína e, como tal, tende a ser digerida durante sua passagem pelo estômago e pelo intestino. Mas a ciência está de olho em uma possibilidade real.
Pesquisadores do Instituto Profil, na Alemanha, e do laboratório Novo Nordisk desenvolveram uma molécula de insulina oral que já está em fase de estudos com seres humanos.
Para impedir que ela seja destruída pelas enzimas do sistema digestivo e consiga ser absorvida convenientemente pela corrente sanguínea, os cientistas utilizaram uma espécie de envelope conhecido pela sigla GIPET (do inglês “Gastro-intestinal Permeation Enhancement Technology”).
A insulina oral é absorvida, então, no intestino, passa pelo fígado e ganha a corrente sanguínea para promover a redução da glicose no sangue. Vale lembrar que a insulina produzida pelo pâncreas de pessoas que não têm diabetes segue a mesma rota passando pelo fígado. Muitos estudiosos defendem que essa via é a mais adequada para a administração de uma insulina “artificial”.
Quando injetamos insulina na pele (como se faz usualmente), não ocorre tal passagem pelo fígado, o que ajuda a explicar o maior ganho de peso e o maior risco de hipoglicemia que vemos por aí.
A nova insulina oral tem ação média de 70 horas, sendo considerada uma insulina basal que deve ser tomada uma vez ao dia.
No último Congresso Europeu de Diabetes, ocorrido em Lisboa, Portugal, foram apresentados os primeiros estudos de segurança e eficácia com a medicação. As análises envolveram 50 voluntários com diabetes tipo 2 que usavam apenas medicamentos orais e ainda assim estavam descontrolados. Os pacientes tinham em média 60 anos de idade e diagnóstico de diabetes há mais de dez anos.
Metade das pessoas usou uma insulina injetável de longa duração bem conhecida e confiável – a insulina Glargina – e a outra metade usou a nova insulina oral. Num seguimento de oito semanas, os pacientes que usaram a versão oral da insulina conseguiram apresentar as mesmas reduções nos níveis de glicose sem maiores efeitos adversos. Inclusive, o número de episódios de hipoglicemia foi menor no grupo da insulina oral.
Podemos dizer que foi dado o primeiro passo para uma nova terapia promissora contra o diabetes. Essa pesquisa abre uma enorme avenida para o desenvolvimento de estudos mais completos para avaliar eficácia e segurança a longo prazo. Sem contar que há a perspectiva de testar a inovação em pessoas com diabetes tipo 1.
Mas isso são cenas dos próximos capítulos. Isso ainda faz parte do futuro do diabetes.
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