Como muitos de vocês devem ter visto, eu fui perseguido e ameaçado por um cidadão em Balneário Camboriú. Faço abaixo um breve relato. No dia 9 de janeiro, começo da tarde, eu, minha esposa e meu filho fomos até uma mercearia comprar velas para comemorar um aniversário. Chegando ao local notamos que estávamos sem cartão de crédito. Deixamos as compras para trás e voltamos para casa para buscar o cartão. Ao sair de lá, caminhamos por cerca de meia quadra até um cruzamento. Atravessamos a rua. Neste instante, uma pessoa chegou pelas nossas costas – ela nos seguiu desde a mercearia, saberíamos depois –, colocou a mão no meu ombro e me disse para eu “me ligar” porque “a vida do teu filho depende de ti”. O tom foi, inequivocamente, de ameaça. Imediatamente após a abordagem a pessoa mudou de direção e desapareceu em uma rua enquanto eu e minha mulher nos olhávamos incrédulos. Há um vídeo comprovando o fato. Estou acostumado com abordagens públicas. Antes de mais nada, acho importante dizer para vocês que a imensa maioria delas é positiva. As pessoas agradecem pelo meu trabalho, dizem que admiram o que faço e as posturas que tenho – com alguma frequência, pedem uma selfie. Todo o ódio que recebo nas redes sociais não costuma se manifestar ao vivo. Pelo contrário: o afeto é bem maior.Há um fator que inibe esse tipo de agressão fora das redes sociais: eu ando com seguranças desde 2019. Há quase três anos, a ONU recomenda que o governo brasileiro seja responsável por garantir minha integridade física. Nunca, em momento nenhum, qualquer pessoa do governo entrou em contato comigo, nem mesmo para fingir que se importa (de onde menos se espera…). Meus seguranças são integralmente custeados pelo Intercept, graças aos nossos apoiadores mensais. Certamente muitas pessoas que pensam em dizer (ou em fazer) algo contra mim são inibidas justamente por esse motivo. Foram duas as abordagens que me causaram mais preocupação nos últimos meses (por acaso, ambas em Santa Catarina). Nos dois casos eu estava sem os seguranças. Sou uma pessoa relativamente tranquila em relação a isso, quem me conhece sabe que procuro manter a calma e fazer com que essa energia não entre na minha casa e na vida da minha família. É cada vez mais difícil, no entanto, ignorar que o perigo está mais próximo do que eu gostaria. Meus olhos estão treinados para identificar quando alguém me reconhece na rua (acontece mesmo de máscara) e para sacar se a pessoa gosta ou não de mim. Pessoas são muito ruins em esconder as próprias emoções. Tento me expor o menos possível, mas não posso abrir mão da minha vida social. Acionei a polícia e muitas outras pessoas em Santa Catarina por um motivo: quero identificar o homem que nos ameaçou para entender se foi algo premeditado ou se ele só se aproveitou, covardemente, de uma família que passeava distraída com uma criança de três anos em um carrinho de bebê. O delegado do caso, David Queiroz, se mostrou muito interessado em resolver a situação. Eu e minha mulher fomos ouvidos na delegacia. O homem já foi identificado e prestará esclarecimentos nos próximos dias. Admito que cheguei a pensar em deixar o caso pra lá porque, afinal, tomar qualquer atitude acabaria com minhas férias, como acabou. Mas, para além de mudar o local onde estávamos hospedados, o pessoal da minha segurança, os nossos advogados e outras pessoas me aconselharam a ir até o fim. Para que uma ameaça como essa não se transforme, no futuro, em algo muito pior. Posso dizer que fiquei chocado ao ver o vídeo da abordagem, obtido pela persistente jornalista Dagmara Spautz, que rodou pelos prédios da rua atrás de câmeras de segurança. Incrivelmente foi só ali, diante da imagem, que vi a fragilidade da vida. Aquele homem poderia ter feito qualquer coisa contra mim ou contra minha família. A decisão cabia inteiramente a ele. Escrevo este breve relato apenas para deixar todos vocês, pessoas que assinam nossa newsletter, cientes do momento perigoso para o jornalismo neste país. Não se trata apenas do meu caso, mas de um ambiente criado pelo presidente da República e pelo grupo político que o apoia. O ódio à imprensa, que já atingiu muitos dos meus colegas, é parte da engrenagem de funcionamento da máquina dos militares que colocaram Jair Bolsonaro no poder. Precisamos combatê-la até que ela seja varrida de vez. É o que me disponho a fazer. Um abraço, |
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