5.10.2008

QUALIFICAÇÃO DE FORNECEDORES

QUALIFICAÇÃO DE FORNECEDORES NA
INDÚSTRIA FARMACÊUTICA
MARTA REGINA SANTIN1
OSVALDO ALBUQUERQUE CAVALCANTI2

INTRODUÇÃO
Com o advento da globalização, a queda das barreiras
de entrada de diferentes artigos importados tornou-se
inevitável. Por vezes, isso facilita nossas vidas pela competição
dos preços dos produtos importados versus o nacional,
diversificando as nossas opções de aquisição. Mas,
por outro lado, existe um perigo: a facilidade de aquisição e
os custos reduzidos podem levar a uma compra com qualidade
duvidosa (Simionato, 1999).
A abertura do mercado provocou uma maior exposição
das empresas à concorrência internacional. Devido a
esse fato, as empresas nacionais, cada vez mais, têm procurado
obter a satisfação dos clientes, e concomitantemente
garantir sua participação no mercado com produtos
de qualidade.
A melhoria contínua da qualidade dos processos
tem sido um instrumento bastante utilizado na busca da
satisfação do cliente. Entretanto, pouco se discute a respeito
da qualidade dos fornecedores, embora o desempenho
de uma empresa seja certamente afetado pelo desempenho
de seus fornecedores.
As empresas adquirem de seus fornecedores, muitas
vezes, mais que 50% do valor das suas vendas. Com
isso, poderão adquirir simultaneamente mais da metade dos
seus problemas de qualidade. Devido a importância dos
fornecedores nessa cadeia, o melhor caminho é formar um
time de empresas qualificadas, no qual o seu fornecedor
também esteja qualificado (Azevedo, 2003).
Homologação e Qualificação de Fornecedores constitui
o serviço de levantamento e avaliação de informações
de fornecedores, a fim de determinar suas capacidades técnicas
e aptidão para satisfazer às necessidades de seus
clientes, considerando a qualificação de seus meios, instalações
e organização (SGS do Brasil, 2003).
Segundo Dabkiewicz (1998), identificar, selecionar
e, principalmente, qualificar fornecedores é uma questão
de necessidade e sobrevivência para as indústrias farmacêuticas,
especialmente no mercado globalizado por vários
motivos, sendo os mais importantes deles, a qualidade gerada
com esse processo, a diminuição de estoques e melhorias
no desempenho da produção.

DESENVOLVIMENTO
Citando Harrington (1988), “o tempo fez com que
nossos padrões mudassem. Não podemos mais viver com
os níveis de defeitos que aceitávamos, no passado. Nossas
companhias precisam cometer menor número de erros, permitir
menos defeitos”, concebemos que o processo de seleção
e qualificação de fornecedores não pode mais ser efetuado
de forma simplista, baseando-se somente em cadastros
ultrapassados, coletânea de cartões de visita ou diretórios
de indústrias/serviços.
Há que se investigar, com profundidade, a competência
dos fornecedores nos aspectos produtivos, administrativos,
financeiros e mercadológicos. Tais investigações
devem ser conduzidas por pessoal das áreas técnicas e de
compras, utilizando-se instrumentos de pesquisa que permitam
tabulações práticas para eventuais comparações.
Avaliação do serviço prestado pelos fornecedores a seus
clientes também deve ser obtida através de sinais evidentes
(Sucupira, 2003).
O investimento de tempo e recursos, nesta etapa, é
fundamental para que as etapas seguintes sejam facilitadas.
Afinal de contas, conhecer bem as potencialidades e as
restrições de um fornecedor propicia um processo de desenvolvimento
e negociação bem mais orientado, evitando
que se negociem contratos baseados na prática simplista
da concorrência de preços (Sucupira, 2003). A qualificação
dos fornecedores é um requisito das Boas Práticas de Fabricação
(BPF) descrita na RDC 134. Todos os fabricantes de
medicamentos devem possuir um cadastro de fornecedores
qualificados. O seu cumprimento é obrigatório pela legislação
vigente, mas, muito, além disso, é uma necessidade de
mercado (Macedo, 2002).
Resolução RDC nº 210, de quatro de
Agosto de 2003, e as certificações
Conforme constatamos, a questão da aquisição das
matérias-primas constitui fator decisivo na manutenção da
garantia da qualidade dos produtos. Sendo recomendado
que este procedimento deve ser realizada por funcionários
qualificados e treinados. Aliado à necessidade dos funcionários
devidamente habilitados a tarefa de aquisição instruída:
“as matérias-primas devem ser adquiridas somente dos
fornecedores qualificados e incluídos na lista de fornecedores
da empresa, preferencialmente, diretamente do produtor.
As especificações estabelecidas pelo fabricante relativas
às matérias-primas devem ser discutidas com os fornecedores”.
Neste contexto, encontramos um elemento de
sustentação capaz de acenar com a possibilidade de assegurar
à sociedade/clientes produtos e serviços confiáveis,
com a qualidade requerida, estamos nos referindo a certificação,
seja ela compulsória e/ou voluntária.
Em meados da década de 80, a International Organization
for Standardization (ISO) iniciou a elaboração do
que foi denominada, norma sistêmica para a qualidade.
Essas normas são genéricas, não se prendem a um produto
ou um setor em particular, mas tratam da avaliação do processo
produtivo como um todo, qualquer que seja ele. Essas
normas foram denominadas série ISO 9000 (Bueno, 2003).
Segundo Marinho e Amato Neto (1997), a publicação
das normas internacionais da série ISO 9000 fortaleceu
a importância da qualidade como um fator determinante da
competitividade no mercado internacional. Além desta, os
autores citam outras normas industriais para processos de
certificação e prêmios nacionais da qualidade (ABNT, 1995):
ISO 14000, Malcolm Baldrige National Quality Award (prêmio
norte-americano), Prêmio Nacional da Qualidade (PNQ -
Brasil), Prêmio Deming (Japão), QS 9000 (Quality System
Requirements – criado em conjunto pela Chrysler, Ford e
GM).
Estas certificações, principalmente as da ISO 9000,
constituem, hoje, em um diferencial bastante atraente para
muitas empresas. Entretanto, um número significativo de
clientes já não considera a hipótese de negociar com fornecedores
que não sejam certificados. A certificação, portanto,
que atualmente constitui uma vantagem competitiva, em
breve será apenas um simples requisito.
Agora que as empresas brasileiras já se acostumaram
com a idéia de buscar a certificação de qualidade ISO
9000, aparece uma nova tendência mundial, mostrando que
a certificação pode ser apenas uma etapa no processo de
busca da excelência. Neste sentido, o Processo de Qualificação
da Excelência de Fornecedores (Supplier Excellence
Qualification Process) trata-se de um aprimoramento, em
que algumas empresas, as chamadas Classe Mundial, sentiram
necessidade de aperfeiçoar ainda mais os seus processos
e os de seus fornecedores, com a finalidade de reduzir
as não-conformidades, tornarem-se mais competitivas, habilitarem-
se a comparar seus fornecedores, incentivar as
melhorias, fomentar parcerias e melhorar a qualidade (Azevedo,
2003).
Parcerias entre cliente e fornecedor
Cada dia mais as exigências dos clientes aumentam,
procurando produtos e serviços de qualidade a preços reduzidos,
obrigando os fornecedores a desenvolverem metodologias
que atendam e superem a estas expectativas,
garantindo, assim, a sua continuidade e sobrevivência no
mercado competitivo (Macedo, 2002). Harrington (1988)
coloca que para uma companhia ser bem-sucedida, ela deve
buscar constantemente fornecer a seus consumidores produtos
melhores e a um menor custo.
Os produtos fornecidos devem não somente satisfazer os requisitos, mas, sim,
excedê-los, estabelecendo novos padrões para suas indústrias.
Segundo este mesmo autor, as companhias que produzem
sempre produtos de alta qualidade recebem três tipos
de benefícios:
• custo de fabricação mais baixos;
• margens de lucro mais altas;
• maiores porções do mercado.

A qualidade de um produto começa na aquisição
dos insumos e dos materiais de embalagem dentro de suas
especificações, em boas condições, nas quantidades certas
e dentro do prazo previsto. Uma aquisição bem sucedida é
um pré-requisito para a qualidade do produto final. Portanto,
para uma empresa que deseja manter uma política baseada
em desenvolver, produzir e comercializar medicamentos
com alto nível de qualidade é fundamental assumir uma sólida
parceria com seus fornecedores (Macedo, 2002).
Band (1997) defende a idéia de que a parceria com
fornecedores é um imperativo competitivo. A partir do preceito
de que os fornecedores têm o poder de colocar a empresa
cliente na frente ou deixá-la para trás, considerando
a possibilidade de um problema no cronograma de produção
do fornecedor ou uma falta de cumprimento dos prazos,
ou ainda, a existência de um erro administrativo. Estes
fatos naturalmente podem interferir nas metas de excelências
de serviço da empresa cliente.
Assim sendo, a união entre fornecedor e cliente auxilia
bastante na identificação da causa raiz dos problemas,
assim como na implementação das soluções. Neste sentido,
Carpenter (1994) comenta que a reunião de representações
de clientes e fornecedores em um time solucionador de
problemas pode trazer soluções que reduzem significativamente
as causas, além de oferecer a vantagem de estreitar a
relação de trabalho e direcionar a uma parceria, o que facilita
a construção de uma aliança duradoura.
Ishikawa (1985), citado por Campos (1992) e Slongo
(1992), formulou dez princípios do controle da qualidade
que devem reger os relacionamentos entre fornecedores e
clientes. Ele salienta que fornecedor e cliente devem, primeiramente,
desenvolver confiança mútua, cooperação e
uma determinação de mútua sobrevivência. Com este objetivo
em foco, ambos devem praticar os seguintes princípios:

1. Fornecedor e cliente são totalmente responsáveis
pela aplicação do controle da qualidade, com
entendimento e cooperação entre seus respectivos
sistemas de controle da qualidade;

2. Devem ser mutuamente independentes e promover
a independência do outro;

3. O cliente é responsável por entregar informações
e exigências claras e adequadas de tal maneira
que o fornecedor saiba, precisamente, o que deve
produzir e oferecer;

4. Fornecedor e cliente, antes de entrar nas negociações,
devem fazer um contrato racional com relação
à qualidade, quantidade, preço, termos de
entrega e condições de pagamento;

5. O fornecedor é responsável pela garantia da qualidade
que dará ao cliente a necessária satisfação;

6. Fornecedor e cliente devem decidir, com antecedência,
sobre o método de avaliação de vários
itens que seja admitido como satisfatório para
ambas as partes;

7. Ambos devem estabelecer no contrato os sistemas
e procedimentos através dos quais podem
atingir acordo amigável de disputas, sempre que
qualquer problema ocorrer;

8. Ambos, levando em consideração a posição do
outro, devem trocar informações necessárias à
melhor condução do controle da qualidade;

9. Ambos devem sempre conduzir de maneira eficaz
as atividades de controle dos negócios, tais
como pedidos, planejamento de produção e estoque,
trabalho administrativo e sistemas, de
maneira que o relacionamento deles seja mantido
numa base amigável e satisfatória;

10. Ambos, quando estiverem tratando de seus negócios,
devem sempre levar em conta o interesse
do consumidor final.

A idéia de cooperação explícita na visão de Ishikawa
(1985), aliada aos princípios do Controle da Qualidade Total,
busca substituir, de forma inequívoca, a abordagem de
disputa pelo poder, comum entre cliente e fornecedor. Desta
forma, aumenta-se à competitividade e integração da cadeia
produtiva, contribuindo na busca da satisfação dos consumidores
finais, e no crescimento de todas as empresas integradas
à cadeia.
Outra solução para problemas relacionados ao binômio
cliente-fornecedor, apresentada por Marinho e Amato
Neto (1997) é a certificação de fornecedores. Eles afirmam
ser “a única forma de conseguir que os fornecedores trabalhem
no sistema just-in-time (JIT), no qual o material fornecido
é levado à fábrica do cliente apenas no momento de
sua utilização, indo direto à linha de produção ou processo,
proporcionando, assim, redução nos custos da qualidade
relacionados às inspeções e aos testes de recebimento”
(Ishikawa, 1985).

Qualificação de fornecedores
Por que qualificar?
Em primeiro lugar, a indústria deve ter a preocupação
de contar com fontes confiáveis para operar no fornecimento
de matérias-primas para novos produtos. Além disso, ao
possuir um rol de Empresas aptas a satisfazer suas necessidades
de suprimento, a Indústria terá sempre à mão uma
alternativa para obter melhores condições de compra, o que
representa redução de custo e oportunidade de negócio.
Eventuais mudanças por razões farmacotécnicas, desvios
de qualidade ou na prestação de serviços e terceirização
são outras razões para manter ativo o processo de certificação
de fornecedores (Dabkiewicz, 1998).

Vantagens da qualificação de fornecedores
De acordo com Macedo (2002), a manutenção de um
cadastro de fornecedores qualificados se constitui numa
série de vantagens para a empresa, tais como:
- Evitar devoluções que podem acarretar em atrasos
do início do processo de fabricação de dado
produto;
- Evitar não conformidades que podem ser detectadas
adiante, em posições avançadas na cadeia
produtiva, ou somente no fim da linha, pelo próprio
consumidor, causando diferentes transtornos
internos ou podendo afetar a imagem e a
sobrevivência da empresa no mercado;
- Otimização da rotina de fabricação de um produto;
- No caso de um fornecedor com qualidade assegurada,
pode-se reduzir o número de inspeções a
serem efetuadas, otimizando os processos de recebimento
e incorporação ao estoque;
- Conformidade com a legislação de BPF vigente.

Além das vantagens citadas anteriormente, Soft Expert
(2003), lista alguns outros benefícios da inspeção e
qualificação de fornecedores, tais como:
• Redução de falhas internas e externas causadas
por produtos defeituosos;
• Identificação clara dos problemas de qualidade
nos fornecedores;
• Significativa redução nos custos de inspeção e
retrabalho;
• Melhor relacionamento e comunicação com os
fornecedores;
• Redução na circulação de documentos e formulários
impressos;
• Comparação precisa da qualidade entre seus fornecedores;
• Aumento da capacidade de negociação sobre os
fornecedores;
• Controle eficaz das não-conformidades e ações
corretivas/preventivas;
• Certificação do processo de inspeção nas normas
internacionais de qualidade.
O processo de qualificação também traz benefícios
para o fornecedor, que deve estar permanentemente buscando
um aprimoramento para atender às necessidades de
seus clientes sendo, portanto uma mola propulsora para
sua própria melhoria contínua (Macedo, 2002).
Qualificação de fornecedores propriamente dita
A qualificação de um fornecedor poderá ser fruto de
um resultado favorável de uma auditoria externa de BPF,
periodicamente realizada. Entretanto, para uma empresa que
48 Infarma, v.16, nº 11-12, 2004
possua um sistema da qualidade baseado nas BPF e complementado
pelos requisitos da ISO 9001/00, existe a necessidade
de uma avaliação mais abrangente, envolvendo além
do cumprimento das BPF, a verificação da qualidade total
efetivamente praticada pelo fornecedor: Condições de entrega
(prazo, quantidade, local), conformidade dos itens
adquiridos (material dentro das especificações), etc. O objetivo
deste tipo de avaliação é:
- Verificar a capacidade do fornecedor em implementar
e manter um Sistema de Qualidade eficaz,
compatível como nível desejado de qualidade dos
produtos e serviços;
- Identificar no Sistema de Qualidade, através do
exame de evidências objetivas, não-conformidades
relevantes, cuja implementação de medidas
corretivas contribuam de modo significativo para
o aperfeiçoamento ou adequação do sistema (Macedo,
2002).
Atualmente existem softwares que auxiliam o processo
de qualificação de fornecedores. Mas, se este não for
o caso, a qualificação de fornecedores pode ser implantada,
através de um Programa de Qualificação de Fornecedores.
Abrangência
Os programas de qualificação de fornecedores também
podem ser adotados para as empresas com as quais sejam
estabelecidos contratos de terceirização de fases do processo
produtivo. A terceirização de produtos ou processos é
uma alternativa bastante freqüente no mundo industrial. A
partir desse pressuposto, empresas de grande porte buscam
investir na qualificação das pequenas com o intuito de manter
a fidelidade na relação com seus fornecedores.
Grandes e pequenas empresas: pode-se dizer que
uma não vive sem a outra. As primeiras, em geral, na condição
de clientes. As outras, na de fornecedores. Esse relacionamento,
muitas vezes transformado em política por parte
das grandes organizações, tem suas vantagens. Para as grandes,
permite a concentração de investimentos e mão-deobra
na atividade-fim, além de um comprometimento maior
por parte do fornecedor. Para as pequenas, a garantia de
fluxo de receita e a possibilidade de qualificação subsidiada
(Sebrae, 2000).

CONCLUSÃO
Nos últimos anos, a qualidade dos processos internos
de uma empresa tem sido bastante discutida. Entretanto,
a qualidade de fornecedores não tem recebido a mesma
atenção, embora em algumas empresas o custo com fornecedores
representa uma parcela significativa do custo total.
Devido a estes e outros fatores, o presente trabalho se propôs
a analisar a importância da qualificação dos fornecedores
de uma empresa, já que este parâmetro influencia diretamente
na qualidade do produto final da empresa, o que justifica
a importância do tema mediante o cenário de competitividade
encontrado atualmente.
A qualificação dos fornecedores constitui uma importante
ferramenta para a promoção da melhoria contínua
entre a relação fornecedor/cliente. Num mercado cada vez
mais exigente, onde a qualidade é um diferencial competitivo,
isto se constitui numa real necessidade. Muito além de
ser uma exigência das Boas Práticas de Fabricação para os
produtores de medicamentos, é uma garantia de melhores
aquisições, de um menor índice de não-conformidades associadas.
Uma grande dificuldade enfrentada por empresas de
pequeno porte é a falta de recursos necessários para o desenvolvimento
de um programa eficiente de qualificação de
fornecedores. As grandes empresas, de um modo geral, têm
infra-estrutura para a realização de todas e quaisquer análises
requeridas para a comprovação da qualidade do material
adquirido, principalmente quando se trata de matériasprimas.
Por outro lado, sabemos que em indústrias de pequeno
porte existe uma forte limitação. Diante desse fato,
uma solução interessante seria a criação de um banco de
dados vinculado a uma entidade representativa de classe,
onde teríamos informações aprofundadas sobre fornecedores
de matérias-primas, ficando à disposição de toda e qualquer
empresa farmacêutica.

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