Atenção ao excesso de leite
Se você faz parte do grupo que não abre mão de um copo de leite à noite antes de dormir, mesmo depois de ter ingerido outros derivados desse alimento durante o dia, é melhor rever seus hábitos. Tido como um dos itens mais importantes na dieta, ele agora está sob suspeita. Pelo menos é o que garantem especialistas que participaram do Congresso Internacional de Nutrição Clínica, realizado na última semana de julho, em São Paulo.
Um de seus críticos mais vorazes é o português Pedro Bastos, mestrando em Nutrição e Dietética pela Fundação Universitária Iberoamericana (Funiber). Em seu trabalho Efeitos do Leite na Individualidade Bioquímica, apresentado no congresso, o pesquisador afirmou que essa não é a melhor opção de alimento para o ser humano. Ele citou países em que o consumo de laticínios é alto e nos quais são alarmantes as taxas de obesidade, osteoporose e câncer. E lembrou que em nações como China e Japão, onde ocorre o inverso, essas doenças estão entre as menos freqüentes.
Bastos questionou, inclusive, a recomendação universal de que tomar a bebida, por conta da presença do cálcio, é fundamental para prevenir a osteoporose. A partir da análise de registros fósseis, ele prova que os antepassados do homem — que abandonavam esse alimento tão logodesmamavam (vale lembrar que o ser humano é o único mamífero que continua consumindo leite ao longo da vida) – possuíam densidade mineral óssea comparável a dos adultos atuais, saudáveis e ativos.
PREVENÇÃO DA OSTEOPOROSE: É POSSÍVEL SEM ELE
A recomendação para evitar o enfraquecimento dos ossos ao longo dos anos sempre foi beber leite (bastante conhecido como uma fonte de cálcio). Mas os médicos, inclusive os defensores desse alimento, concordam que esse mineral é apenas um dos nutrientes necessários para a prevenção da osteoporose. Vitaminas e minerais atuam com ele para a manutenção da saúde. Além disso, existem outras fontes tão ricas em cálcio quanto o leite, como seus derivados, brócolis, couve-flor, nozes, castanhas, pistache, cereais e farinha de peixes. Para que o organismo absorva corretamente esses nutrientes e mantenha o equilíbrio orgânico necessário para se proteger, é recomendável manter uma alimentação balanceada, exercitar-se e evitar o consumo excessivo de cafeína, álcool, sal, açúcar, proteínas e gorduras. Esses alimentos diminuem a absorção do cálcio e aumentam sua eliminação.
O pesquisador atribui isso a três fatores: exposição ao sol (estimula a produção de vitamina D, que ajuda o organismo a absorver o cálcio), ao trabalho físico intenso (o exercício mantém a saúde óssea) e ao consumo elevado de vegetais (alimentos ricos em cálcio). “A bebida é considerada a melhor arma contra essa doença, mas não é. O cálcio é apenas um dos vários nutrientes, entre outros fatores, necessários para preveni-la”, alerta.
As opiniões dele fazem eco entre alguns especialistas brasileiros, como a nutricionista Denise Carreiro, da clínica paulistana Gastromed. Segundo ela, existem pesquisas científicas que comprovam que o consumo excessivo pode prejudicar a saúde. “O leite de vaca tem mais de 25 frações proteicas, que o organismo não consegue digerir. E uma proteína mal digerida causa várias inflamações. O corpo se defende porque não reconhece esses nutrientes”, explica. Entre os processos inflamatórios deflagrados estão enxaqueca, bronquite e dermatites.
Na composição do leite de vaca entram
ÁGUA ........................87%
GORDURA................ 3,9%
PROTEÍNAS.............. 3,4%
LACTOSE ................. 4,8%
MINERAIS ................ 0,8%
A jornalista Sonia Hirsch, estudiosa de alimentação e medicina natural, em seu livro Só para mulheres (Ed. Corre Cotia, 1995) já falava dessas proteínas e de sua ação no corpo humano: “... difícil de digerir, a proteína do leite sobrecarrega o sistema imunológico e na melhor hipótese inflama amígdalas ou adenóides, dá sinusite, catarro, resfriados constantes, gases e prisão de ventre”. No texto, ela cita ainda outro problema: os hormônios e antibióticos que a vaca tomou e, por tabela, são ingeridos também pelo homem. “...Por se destinar à formação de um animal de 800 quilos, quadrúpede com chifres, pêlo e rabo, a proteína do leite de vaca tem uma composição bem diferente da que nós precisamos para ser humanas”, cita a jornalista.
É bom para as crianças
Sim, porque é importante para o desenvolvimento ósseo. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda o leite materno até o sexto mês de vida como alimento único. O médico Hamilton Henrique Robledo, pediatra do Hospital e Maternidade São Camilo, em São Paulo, diz que, a partir desse período, o bebê pode consumir sucos, frutas e as primeiras refeições com sal. Dos dois aos três anos de idade, os pais devem oferecer leite de quatro a cinco vezes ao dia. A partir dos três anos, dois ou três. Aos sete, um copo apenas.
Antonio Carlos Ruffolo, geriatra e especialista em terapia ortomolecular, da clínica Belmonte, em São Paulo, também não é a favor do alimento, mas faz propaganda de seus derivados. “O líquido é o vilão, mas os produtos que vêm dele são fantásticos. O iogurte e o queijo branco têm grande quantidade de cálcio e não fazem mal à saúde”, diz.
Foi somente após a revolução agrícola e a domesticação dos animais que e o consumo de laticínios se tornou possível e virou hábito entre nós. Para o pesquisador português Pedro Bastos, esses derivados também deveriam estar no banco dos réus. Apesar de possuírem um baixo índice glicêmico (não provocam um aumento pronunciado da glicemia — as taxas de açúcar no sangue), eles turbinam a liberação de insulina pelo pâncreas, o que pode desencadear o diabetes tipo 2. “Pelo menos cinco estudos demonstram isso”, afirma.
O outro lado
A afirmação de Bastos é polêmica. Estudo recente da Universidade de Tufts, nos Estados Unidos, sugere justamente o contrário. Ou seja, que o consumo de leite conseguiria reduzir em 15% os riscos de uma pessoa desenvolver o diabetes tipo 2. Os pesquisadores americanos acreditam que os nutrientes desse alimento podem afetar a capacidade do corpo de produzir ou utilizar insulina. E não é só. Uma outra pesquisa do Centro Federal de Pesquisa em Nutrição de Kiel, na Alemanha, afirma que uma proteína do soro do leite auxiliaria a ação da insulina.
Na verdade, as opiniões e estudos divergem muito. Profissionais como Ari Stiel Radu, professor assistente do Departamento de Reumatologia do Hospital das Clínicas, eleva a bebida à categoria dos alimentos indispensáveis. Além das razões nutricionais, ele aponta uma financeira: o custo cabe no bolso de qualquer um. “Esse alimento é uma importante fonte de cálcio e, às vezes, a única na dieta da população”.
Um copo tem 246mg – praticamente 25% da quantidade que deve ser ingerida diariamente. “O mineral é importante para auxiliar a contração e o relaxamento muscular e também para o fortalecimento dos dentes e dos ossos”, confirma a nutróloga Daniela Hueb, de Bauru (SP).
O cálcio também auxilia na coagulação sangüínea, o que é fundamental para o processo de cicatrização. “Esse mineral ativa enzimas como a ATPase, que ajuda a queimar calorias, por isso também pode colaborar com o emagrecimento”, diz a nutróloga. Pesquisa realizada nos Estados Unidos mostrou que um grupo de mulheres emagreceu até sete quilos ao fim de dois anos, depois de ingerir 1900 calorias e a média de três copos de leite por dia.
Em pelo menos uma questão a maioria dos especialistas concorda: o que faz mal não é exatamente o leite, mas a quantidade desse alimento que é consumida. Até porque hoje há uma grande oferta de produtos industrializados desenvolvidos a partir dele e o consumo tem sido excessivo. Além disso, há pessoas que apresentam intolerância à lactose, o açúcar da bebida, ou alergia à sua proteína (veja boxe na página ao lado). Nesses casos, o ideal seria evitá-lo.
Fonte: Viva Saúde
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