ANVISA PERMITIRÁ MEDIR A PRESSÃO NA FARMÁCIA E RESOLUÇÃO RECEBE CRÍTICAS
27/07 - Texto que ainda está em consulta pública divide diretoria da agência; para especialistas, atividade é ato médico. A Sociedade Brasileira de Cardiologia reagiu indignada a uma proposta da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que permite farmacêuticos medir a pressão arterial de seus clientes. A prática - atualmente proibida por lei - integra uma resolução da Anvisa, em fase de consulta pública, que regula o funcionamento de farmácias e drogarias. A resolução traz exigências para impedir uma série de abusos, como a venda de carvão ou ração animal no mesmo local onde são oferecidos remédios. Mas, ao mesmo tempo, permite que farmacêuticos se responsabilizem por alguns procedimentos, incluindo a medição da pressão arterial. Algo que, de acordo com a Sociedade Brasileira de Cardiologia, é atribuição exclusiva de médicos. A Anvisa deve permitir, também, que farmacêuticos possam fazer testes rápidos de glicose, pequenos curativos, inalação e medir temperatura dos clientes. A mudança prevista segue a filosofia de que farmácia deve ser local de promoção à saúde, não apenas ponto de venda de medicamentos. Uma tese defendida pelo Conselho Federal de Farmacêuticos e pelo Ministério da Saúde. Mas, dentro da própria Anvisa, há quem considere que tais serviços não combinam com farmácia. O texto da resolução não foi aprovado por dois de seus quatro diretores. Seu formato foi mantido porque o diretor presidente da agência, Dirceu Raposo de Mello, tem poder de desempate. EMPURROTERAPIA - O diretor Cláudio Maierovitch é contrário às novas atribuições para o farmacêutico. Por princípio, diz, o diagnóstico não pode ser feito no mesmo local onde o remédio é vendido. Para ele, o maior problema é a medição da pressão arterial. "Uma única medição não é suficiente para dizer se a pessoa é ou não hipertensa. "Se o cliente ouve do farmacêutico que sua pressão é alta, há risco de ele se declarar hipertenso e tomar remédios sem necessidade." Uma brecha, completa, para a prática da "empurroterapia", estratégia usada por maus profissionais para incentivar a compra de medicamentos que lhes rendam gratificações. O diretor da Sociedade Brasileira de Cardiologia, Washington Barbosa Araújo, tem opinião semelhante. Araújo afirma que a sociedade já prepara reação contrária à proposta, mas somente sobre pressão arterial. Os demais procedimentos poderiam ser realizados na farmácia, porque não são considerados ato médico. "A medição na farmácia é meio passo para uma prescrição indevida ou a mudança de comportamento do paciente", diz. Para o diretor substituto do departamento de Assistência Farmacêutica do Ministério da Saúde, José Miguel do Nascimento Júnior, a medição da pressão arterial pode ser útil à população. "A resolução exige que o serviço na farmácia seja de qualidade", observa. A proximidade das farmácias, afirma, pode ser de grande ajuda a públicos específicos. Como idosos. "Eles mediriam a pressão nas farmácias e saberiam se remédios em uso estão adequados. Facilitaria o controle." IDÉIA É ORIENTAR CLIENTE, DIZ CONSELHO DE FARMÁCIA. Para chefe da unidade de Hipertensão do HC-USP, checagem regular da pressão arterial pode reduzir ansiedade de pacientes diante do médico. - LÍGIA FORMENTI, BRASÍLIA - A permissão para que farmacêuticos verifiquem a pressão arterial dos clientes tem apoio de alguns especialistas. O chefe da unidade de Hipertensão do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP), Décio Mion, considera que a medição da pressão arterial em farmácias pode ajudar os médicos. "Desde que o aparelho esteja validado, o profissional treinado, não vejo nenhum impedimento." Além de o paciente poder fazer medições com maior freqüência, é possível evitar a "hipertensão do avental branco" - a ansiedade diante do médico pode fazer com que os níveis de pressão aumentem temporariamente. Para medir a pressão arterial, uma série de quesitos são necessários. Até mesmo a localização do aparelho pode implicar em um resultado incorreto. "Se o farmacêutico tiver todo treinamento adequado, perfeito", afirma Mion. O presidente do Conselho Federal de Farmácia, Jaldo de Souza Santos, acredita que a medida, caso seja mantida depois da consulta pública, poderá trazer um impacto positivo para a saúde pública. "Além de monitorar a pressão de clientes, podemos dar conselhos básicos, alertar para o risco de familiares desenvolverem o mesmo problema", diz. "Ninguém aqui quer medicar. Queremos apenas orientar." Souza Santos também rebate o argumento de que a medição de pressão arterial é ato exclusivo de médicos. "Se é assim, por que em hospitais tal prática fica sob responsabilidade de enfermeiros?" Para Mion, a idéia de que a medição poderia abrir espaço para a prescrição indevida de medicamentos não justificaria a mudança do texto da resolução. "Temos de pensar que as pessoas vão agir corretamente. Para isso que há os serviços de vigilância, para fiscalizar e punir aqueles que não seguem a lei." A Consulta Pública 69 foi aberta no dia 13. As pessoas interessadas poderão fazer críticas ou sugestões em um prazo de 60 dias. O texto está disponível no site da Anvisa. COM A RESOLUÇÃO - Venda proibida: sucos, refrigerantes, pães, biscoitos e balas, chicletes, laticínios, mel, café, artigos de uso pessoal, como cartões telefônicos, produtos saneantes, como odorizantes de ambiente, artigos de uso doméstico, como panos, produtos veterinários, como acessórios para animais de estimação. O que ficará permitido: adoçantes; alimentos para dietas com restrição de sacarose, sódio, gorduras ou proteínas; suplementos de vitaminas ou minerais; vitaminas isoladas ou associadas; cosméticos; medicamentos; perfumes; produtos médicos e de higiene pessoal. FRASES - José Miguel do Nascimento Júnior - Diretor de Assistência Farmacêutica do Ministério da Saúde - "Um idoso com hipertensão diagnosticada, não precisaria ir até um ambulatório. Na farmácia qualificada, teria a informação e repassaria ao médico." Cláudio Maierovitch - Diretor e presidente em exercício da Anvisa - "O local do diagnóstico não pode ser o mesmo da medicação. Isso eleva o risco da 'empurroterapia'" - Lígia Formenti, Brasília - Fonte: Estado de São Paulo
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