Mônica Tarantino e Rachel Costa
Sabe-se também que a alimentação materna pode ter impacto na chance de a criança vir a desenvolver câncer. “Dependendo de sua qualidade, a nutrição da mãe pode produzir células geneticamente instáveis e propensas à doença”, David Barker, da Universidade de Southampton, na Inglaterra. Um dos principais vilões, neste caso, são os embutidos. “Eles apresentam em sua composição uma substância carcinogênica que pode atuar sobre o feto”, explica a nutricionista Elaine de Pádua, de São Paulo. Porém, o risco para o bebê não está apenas na dieta equivocada. Se a gestante fumar, usar drogas ou tomar antibióticos inadequados, também deixará o feto mais vulnerável à enfermidade. “E há evidências de que a exposição da grávida a inseticidas aumenta as chances de tumores renais”, afirma a oncopediatra Viviane Sonaglio, do Hospital do Câncer de São Paulo.
Presente no cotidiano da maioria dos moradores das grandes cidades, a poluição é considerada um dos maiores inimigos da evolução saudável dos fetos no ambiente uterino. Diversos trabalhos feitos pela equipe do Children’s Environmental Health, da Universidade Colúmbia, nos EUA, mostram que, além de aumentar os riscos de câncer de modo geral, os poluentes emitidos pela queima de combustíveis por veículos, pesticidas ou pelo fumo passivo estão ligados a problemas de desenvolvimento do raciocínio dos pequenos. Uma investigação feita com crianças de 3 anos de idade, nascidas de mães expostas a constante poluição atmosférica, indicou atraso em funções cerebrais como a compreensão dos tamanhos, a habilidade para fazer contas e a identificação de padrões bastante simples. “Esses resultados têm se repetido nos estudos em andamento em vários países”, disse à ISTOÉ Julia Vishnevetsky, coordenadora do centro de pesquisa da instituição americana. “As crianças que já manifestam algum déficit de cognição originado quando ainda estavam no útero da mãe poderão ter pior desempenho escolar quando forem mais velhas, se nada for feito. Mas os danos podem ser revertidos se houver uma intervenção precoce”, diz a especialista.
Outro fator comum ao estilo de vida atual e extremamente nocivo é o estresse. Há indicativos de que ele seja capaz de produzir sequelas físicas e mentais no ser em formação. Um exemplo é aumentar a predisposição do bebê à asma, como atestou um estudo americano feito com 557 famílias. Os cientistas analisaram o cordão umbilical dos filhos das mulheres submetidas a tensão intensa e contínua com o das crianças geradas por mães mais tranquilas. “Vimos diferenças importantes na produção de substâncias associadas ao risco de asma na vida adulta”, disse Rosalind Wright, uma das autoras da pesquisa. “Nos bebês gerados por mães estressadas, a chance de surgimento da doença era muito maior”, disse a estudiosa.
Tão forte quanto isso é o impacto do estresse da mãe na formação de toda a rede de neurônios do bebê. “As experiências emocionais da mulher durante a gestação ajudam a moldar a arquitetura do cérebro do bebê. Isso, a longo prazo, vai afetar a capacidade de aprendizagem, o comportamento e a saúde mental da criança”, considera a psicóloga Maria Tereza Maldonado, autora do livro “Nós Estamos Grávidos”.
Um dos assuntos que mais interessam aos pesquisadores nessa área de investigação é entender melhor como o estresse materno pode predispor o bebê a maior chance de vir a sofrer de depressão quando adulto – situação que começa a ser apontada em alguns trabalhos. Um deles foi realizado, em animais, na Escola de Farmácia da Hebrew University of Jerusalem. Nos seus experimentos, os cientistas observaram que as cobaias submetidas a ambientes estressantes (ouviam sons irritantes em períodos alternados) tiveram filhotes que, quando adultos, demonstraram alguns prejuízos importantes: tinham debilitada sua capacidade de aprendizado e de memória, apresentavam menor habilidade de lidar com situações adversas e manifestavam sintomas de ansiedade e de depressão.
Na Inglaterra, pesquisadores do Imperial College of London chegaram inclusive a montar, no ano passado, uma exposição dirigida a pais para informá-los sobre a conexão. O objetivo era deixar bem claro que o estresse da gestante pode ter um impacto tão sério a ponto de alterar o desenvolvimento cerebral da criança, deixando-a suscetível à enfermidade.
No entanto, muita coisa ainda precisa ser descoberta sobre como se dá esse tipo de interação. Parte da resposta estaria na exposição do feto aos hormônios desbalanceados da mãe. Sob condições de tensão constante, todos nós produzimos quantidades excessivas do hormônio cortisol, inclusive a gestante. E o excedente passaria através da placenta e chegaria ao feto, provocando mudanças na sua rede neuronal que podem estar associadas ao surgimento da depressão na vida adulta.
Todas essas descobertas têm reforçado a importância do pré-natal como um período fundamental para garantir a saúde futura do bebê que está sendo gerado. De acordo com o ginecologista Nilson Melo, presidente da Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, o mínimo necessário são sete consultas, distribuídas do primeiro ao nono mês. “É o melhor investimento na dupla mamãe-bebê e na saúde das futuras gerações”, diz o especialista.
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