Falhas na distribuição deixam sem remédios portadores de doenças graves, como artrite reumatóide e lúpus
Rachel CostaPREJUÍZO
Sem os remédios,
doentes tiveram sintomas agravados
A explicação para o sumiço do Adalimumabe das farmácias, todavia, segue insatisfatória. No Rio de Janeiro e em São Paulo as secretarias de Saúde relataram o atraso, mas o creditaram ao governo federal, responsável pelo programa de distribuição desta categoria de drogas. O Ministério da Saúde, porém, garante que o abastecimento, por parte da União, está normal. “As entregas foram feitas nas datas previstas e não recebi comunicado de falta de medicamentos”, afirmou José Miguel do Nascimento Júnior, diretor de assistência farmacêutica do ministério.
Quem perde nesta confusão é o cidadão, que tem o tratamento interrompido. “Sem o remédio, a artrite reumatoide já controlada volta”, diz a reumatologista Evelin Goldenberg. E, sem a distribuição gratuita pelo governo, dificilmente um paciente conseguiria manter os cuidados. No caso do Adalimumabe, por exemplo, uma ampola custa R$ 7.834 e, em média, os doentes usam duas por mês. “Manter a medicação sem o subsídio do governo é inviável”, fala Eloisa Bonfá, da Faculdade de Medicina da USP. Só no hospital da universidade, 90 pacientes sofreram com o desabastecimento.
Os problemas de acesso aos medicamentos não se restringiram ao Adalimumabe. ISTOÉ apurou, em São Paulo, falhas durante o mês de setembro na distribuição do Inflixmab, Etanercepte e Hidroxicloroquina, usados para problemas reumáticos, Tacrolimo, para transplante de rim ou fígado, Azatioprina, indicado em vários transplantes, lúpus e outras doenças, e Leuprorrelina, para disfunções da glândula hipófise e endometriose. Dessa lista, Adalimumabe, Inflixmab, Etanercepte e Tacrolimo tiveram uma alteração no seu sistema de compras. Antes adquiridos pelos governos estaduais, eles passaram a ser obtidos pelo Ministério da Saúde. O objetivo era negociar melhores preços com as indústrias farmacêuticas, permitindo que, com o recurso economizado, outras doenças fossem contempladas pela lista de medicamentos de alto custo.
No caso da Leuprorrelina, o laboratório responsável pelo fornecimento da droga, a farmacêutica Sandoz, recolheu o medicamento após constatar a possibilidade de haver quantidades diferentes do princípio ativo. Isso teria levado ao desabastecimento. Segundo a Secretaria de Saúde de São Paulo, a orientação é usar outra droga, a Gosserrelina. Mas a mudança não é tão simples assim. “Para substituí-lo nos casos em que é usado como bloqueador da puberdade, é preciso fazer novos exames para determinar quando as doses serão administradas”, observa Ruth Clapauch, da Sociedade Brasileira de Endocrinologia.
ESPERA
Luiza ficou um mês sem o remédio que
a impede de menstruar antes da hora
Para evitar problemas, a administradora Izabel Diogo, 38 anos, gastou mais de R$ 500 para garantir a injeção que sua filha Luiza, 8 anos, deveria tomar no último dia 30 – e que não recebeu do governo. A menina tem uma disfunção da hipófise, que, se não tratada, pode fazer com que ela menstrue a qualquer momento. Isso comprometeria sua estatura final, além de fazê-la sofrer os incômodos de ter um corpo de púbere ainda criança. “E nem me ofereceram outra opção de droga”, conta Izabel.
Atrasos como esses são inadmissíveis. “A maioria dos tratamentos é para pacientes em estágio avançado de doenças ou que têm moléstias raras”, avalia Vera Luiza, pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública. Na sua opinião, é certo que o acesso aos medicamentos de alto custo no Brasil está em um estágio avançado em relação a outros países do mesmo porte, mas ainda pode ir além. Vera defende a necessidade de ampliação da lista de doenças e remédios contemplados e a criação de ferramentas de controle da distribuição e da entrega dos remédios. Desafios que os próximos gestores federais e estaduais têm pela frente.
Isto é
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