2.14.2009

O infarto agudo do miocárdio é responsável por 60.080 óbitos no Brasil

O infarto agudo do miocárdio é responsável por 60.080 óbitos
no Brasil, sendo considerado a principal causa isolada de morte
no país. Esses dados coincidem com aqueles encontrados em
países desenvolvidos.
Não se conhece o número de infartos que ocorre anualmente
no Brasil.
Estima-se em 300 mil a 400 mil casos anuais, ou seja,
a cada 5 a 7 casos ocorre um óbito, o que confere a esta doença,
nos dias atuais, elevada taxa de mortalidade, apesar dos inúmeros
avanços terapêuticos obtidos na última década.
Para normatizar o tratamento do infarto agudo do miocárdio
para os cardiologistas brasileiros, com o intuito de obter melhores
resultados quer reduzindo a mortalidade quer reduzindo o tamanho
da necrose miocárdica e a conseqüente morbidade, a Sociedade
Brasileira de Cardiologia (SBC) publica, desde 1995, suas diretrizes
de tratamento do infarto agudo do miocárdio, constituindo-se esta
sua terceira versão.
Foram convocados cardiologistas de todo o país, de diferentes
Estados, cidades e serviços, buscando sempre aqueles que têm
se destacado e contribuído na área. Esta tarefa hercúlea foi distribuída
entre 47 cardiologistas, dos quais 6 tiveram também a
tarefa de coordenar, revisar e equalizar os distintos textos, e sem
a fantástica colaboração de todos não se teria finalizado um documento
tão atual e tão bem fundamentado.
Face aos novos conhecimentos acumulados nos últimos anos,
não só na terapêutica como também nos mecanismos fisiopatológicos
e mesmo nas novas indicações de fármacos já utilizados em Cardiologia.
O tratamento do Infarto Agudo do Miocárdio, ora publicada, representa as recomendações oficiais e atuais da SBC para o tratamento do infarto agudo do miocárdio, com base nas evidências disponíveis até o ano de 2004, referendadas
pelos atuais colaboradores.

Para gerar um documento prático e de fácil consulta, decidiuse
manter, além da classe de indicação, o nível de evidência
apenas nos tratamentos, abolindo-os nos procedimentos diagnósticos.
Procurou-se abordar todos os períodos de evolução do infarto
agudo do miocárdio, desde o atendimento pré-hospitalar, passando
pelo hospitalar e finalizando nas recomendações de alta hospitalar
e de controle dos fatores de risco. Decidiu-se não abordar as
terapias gênica e celular por representarem ainda tratamento exploratório
e limitado a poucos serviços, com escassa experiência e
resultados ainda controversos.
Pela vastidão de tópicos incluídos, procurou-se resumir os achados
dos trabalhos clínicos controlados nos quais se apóiam as
evidências, publicando, sempre que possível, apenas suas conclusões
e evitando o detalhamento excessivo. Entretanto, toda a
bibliografia existente sobre o assunto abordado está citada no
texto, constituído de 776 citações bibliográficas.
As recomendações desta III Diretriz sobre Tratamento do Infarto
Agudo do Miocárdio respeitaram e foram equalizadas com as diretrizes
já publicadas pela SBC em áreas afins.
Em alguns tópicos as recomendações foram adequadas às
características socioeconômicas próprias, bem como aos recursos
disponíveis no país.
Esperamos que este documento contribua para o progresso da
Cardiologia brasileira, sirva como fonte de consulta e orientação
para o médico e para o cardiologista, e reduza, por intermédio de
sua correta aplicação, a morbidade e a mortalidade decorrentes
do infarto agudo do miocárdio em nosso meio.

Atendimento pré-hospitalar

- Condutas pré-hospitalares
A mortalidade hospitalar por infarto agudo do miocárdio (IAM)
situava-se ao redor de 30% na década de 50. Com o advento, na
década seguinte, das Unidades de Tratamento Intensivo e, em
seguida, das Unidades Coronarianas, essa mortalidade caiu quase
que pela metade, fundamentalmente por conta do melhor controle
das arritmias. A partir da década de 80, houve plena confirmação
de evidências demonstradas experimentalmente, apontando para
os benefícios da recanalização da artéria coronária relacionada ao
IAM, basicamente com o uso dos fibrinolíticos e dos novos processos
de intervenção percutânea. Com essa abordagem, a incidência
de óbitos em pacientes com IAM atingiu os atuais 6% a
10%. Apesar disso, o IAM continua sendo causa líder de mortalidade
no Mundo Ocidental, pela alta prevalência e pela mortalidade
pré-hospitalar.
Conceitualmente, a proposta mais recente considera os pacientes
com IAM basicamente de dois tipos: aqueles que chegam
ao hospital com ou sem supradesnível do segmento ST. Esse é o
grande diferencial quanto ao tratamento a ser instituído.
Pelo fato de a conduta terapêutica no IAM sem supradesnível do
segmento ST, de maneira geral, se aproximar muito daquela adotada
na angina instável, estas recomendações vão se ater aos infartos
com supradesnível do segmento ST.

Fase pré-hospitalar - O período pré-hospitalar compreende
dois momentos: a) do início da dor e reconhecimento do
sintoma do IAM pelo paciente até a procura por socorro; b) da
procura por socorro até o deslocamento ao hospital mais próximo.
O primeiro momento está vinculado à educação comunitária
para o reconhecimento da dor e à procura imediata pelos serviços
de emergência. O principal componente do retardo desse momento
é o prolongado tempo, por parte do paciente, em procurar ajuda1.
Apenas 20% dos pacientes com dor torácica aguda chegam ao
setor de emergências antes de 2h do início dos sintomas2. O
segundo momento está principalmente relacionado à assistência
domiciliar, que deve ser acessível e rápida e com recursos tecnológicos
e humanos treinados para ressuscitação cardiorrespiratória,
diagnóstico e tratamento do IAM.
Desde o final dos anos 60, sabe-se que a maioria das mortes
ocorre nas primeiras horas de manifestação da doença, sendo
40% a 65% na primeira hora do início dos sintomas e aproximadamente
80% nas primeiras 24 horas3-5. Assim, a maioria das
mortes por IAM acontece fora do hospital, sendo muitas vezes
desassistidas pelos médicos e até mesmo pelos familiares6. A
modalidade mais freqüente de parada cardiorrespiratória nas primeiras
horas de IAM é a fibrilação ventricular5, que só pode ser
revertida pela desfibrilação elétrica; se realizada no primeiro minuto
após o colapso, a desfibrilação elétrica reverte mais de 90% dos
casos. A causa da elevada mortalidade pré-hospitalar reside, principalmente,
no desconhecimento da dor do IAM, assim como em
fatores como idade avançada, baixo nível socioeconômico, sexo
feminino e automedicação6,7, levando ao retardo na procura por
serviços de emergência. A redução do retardo pré-hospitalar diminui
não só o número de casos de morte súbita pré-hospitalar, como
também a mortalidade hospitalar8;9. O tempo decorrido entre o
início da dor e a recanalização coronária, química ou mecânica, é
o fator fundamental para o benefício do tratamento, tanto imediato
quanto tardio, em relação à mortalidade e à morbidade, em pacientes
tratados em até 12 horas do início da dor.

Medidas na fase pré-hospitalar - O interesse no atendimento
pré-hospitalar do IAM foi desenvolvido na década de 60,
pelo grande número de óbitos que ocorria antes que o paciente
chegasse ao hospital. Àquela época, 60% dos pacientes faleciam
na primeira hora e muitos não chegavam ao hospital nas primeiras
12h de evolução.
Como tem sido demonstrado, a maioria das mortes por IAM
ocorre antes da chegada do paciente ao hospital. E esses dados
sugerem que, apesar da significativa redução da mortalidade hospitalar,
houve pouca mudança na mortalidade pré-hospitalar.
A importância da fibrilação ventricular como mecanismo de
óbito precoce e a habilidade na ressuscitação e na desfibrilação
foram os fatores que propiciaram o desenvolvimento, fundamentalmente
nos Estados Unidos e na Europa, dos programas de
tratamento pré-hospitalar do IAM. Estima-se que a desfibrilação
salve cerca de seis vezes mais vidas que o tratamento trombolítico,
mas depende do rápido acesso ao procedimento. Entretanto, inúmeros
problemas logísticos dificultaram a implementação desses
programas de maneira mais abrangente, ficando assim restritos a
uma proporção pequena do universo de infartados. O recente reconhecimento
da importância da fibrinólise, principalmente quando
realizada precocemente, renovou o interesse no manuseio préhospitalar
do IAM. Análises de custo/benefício são atualmente
mais favoráveis, em decorrência do grande número de pacientes
que podem potencialmente se beneficiar com tais condutas, embora
muitos dos problemas logísticos continuem.
É desejável que haja um esforço por parte da comunidade em
geral, e da cardiológica em especial, no sentido de serem desenvolvidos
programas que permitam: a) educar a população sobre
os sinais/sintomas do IAM, inclusive com a possibilidade de acesso
a um telefone de emergência à menor suspeita; e b) treinar pessoal
especializado, disponibilizando material adequado para tratamento
das emergências médicas ainda dentro das ambulâncias. O programa
Advanced Cardiac Life Support (ACLS) seguramente é
um excelente instrumento nesse sentido.
Estudos recentes, embora não metodologicamente adequados,
analisam o impacto da abordagem do IAM na fase pré-hospitalar
com o uso ou não de fibrinolíticos, a realização de eletrocardiografia,
o uso de aspirina ou na comparação com a abordagem intra-hospitalar.
Finalmente, é importante salientar que todas as propostas de
tratamento incluídas neste documento devem levar em consideração
as contra-indicações a cada um desses tratamentos, que
constam de anexos específicos.

Recomendações - A hipoxemia durante episódios de
isquemia miocárdica decorre de alterações da relação ventilaçãoperfusão,
secundárias ao aumento da pressão diastólica final do
ventrículo esquerdo e à formação de edema intersticial e/ou alveolar.
Agrava a isquemia miocárdica, aumentando a lesão miocárdica.
Administração de oxigênio (3 l/min a 100%, por meio de
cateter nasal) - é indicada por tempo indefinido para pacientes
com congestão pulmonar e/ou dessaturação de oxigênio (saturação
de oxigênio < que 90%), tornando-se, portanto, necessária a
monitorização da saturação sanguínea de oxigênio pela oximetria
de pulso. Sua administração rotineira em todos os pacientes com
IAM não-complicado nas primeiras 3 a 6h é aceitável. Passadas
as primeiras horas de uso, sua administração rotineira em todos
os pacientes com IAM não-complicado não tem evidências de
benefícios. Quando utilizada de forma desnecessária, a administração
de oxigênio por tempo prolongado pode causar vasoconstrição
sistêmica, aumentando a resistência vascular sistêmica
e a pressão arterial e reduzindo o débito cardíaco, sendo, portanto,
prejudicial.

Tratamento da dor - diminui o consumo de oxigênio pelo miocárdio
isquêmico, provocado pela ativação do sistema nervoso simpático.
A analgesia deve ser feita de preferência com sulfato de morfina
endovenosa, exceto para pacientes alérgicos a esse fármaco, na
dose inicial de 2 mg a 8 mg (geralmente suficiente para aliviar a
dor e a ansiedade). Com a monitorização da pressão arterial, essas
doses podem ser repetidas a intervalos de 5 a 15min. Em caso de
não-disponibilidade desse fármaco ou de hipersensibilidade ao
medicamento, o sulfato de morfina pode ser substituído pelo sulfato
de meperidina, em doses fracionadas de 20 mg a 50 mg.
Nitratos - devem ser utilizados na formulação sublingual (nitroglicerina,
mononitrato de isossorbida ou dinitrato de isossorbida),
para reversão de eventual espasmo e/ou para alívio de sintoma
doloroso. Também estão recomendados para controle da hipertensão
arterial ou alívio da congestão pulmonar, se presentes.
Estão contra-indicados na presença de hipotensão arterial (pressão
arterial sistólica < 100 mmHg) ou uso prévio de sildenafil nas
últimas 24h. A dose sublingual preconizada é de: nitroglicerina,
0,4 mg; mononitrato de isossorbida, 5 mg; ou dinitrato de isossorbida,
5 mg. Devem ser administradas no máximo três doses,
separadas por intervalos de 5min.
Ácido acetilsalicílico (aspirina) - indicado rotineiramente para
todos os pacientes com suspeita de IAM, eventualmente como automedicação,
exceto nos casos de contra-indicação (alergia ou intolerância
ao medicamento, sangramento ativo, hemofilia, úlcera
péptica ativa). Pacientes com maior risco de doença coronariana
devem ser instruídos por seus médicos assistentes a tomar aspirina
não-tamponada em situações emergenciais6. O modo de administração
é o mesmo utilizado na fase intra-hospitalar. É o antiplaquetário
de eleição a ser utilizado no IAM, tendo sido demonstrado,
pelo estudo ISIS-2 (Second International Study of Infarct Survival),
que reduz a mortalidade em 20%, isoladamente, quase tanto quanto
a estreptoquinase. Além disso, tem ação sinérgica com o próprio
fibrinolítico, levando a associação de ambos os medicamentos a
um decréscimo de 42% na mortalidade10. A dose recomendada é
de 160 mg/dia a 325 mg/dia, devendo a 1º dose ser utilizada de
forma mastigável quando da chegada do paciente ao hospital, ainda
antes da realização da eletrocardiografia.
Betabloqueadores - inibem competitivamente os efeitos das
catecolaminas circulantes. Diminuem a freqüência cardíaca, a
pressão arterial e a contratilidade miocárdica, reduzindo, assim, o
consumo de oxigênio pelo miocárdio. Na ausência de contra-indicações,
essa classe de medicamentos deve ser iniciada imediatamente,
de preferência por via oral, após a admissão do paciente.
Não existem, até o momento, dados sobre a avaliação sistemática
de seu emprego na fase pré-hospitalar. O estudo clínico TEAHAT
(Thrombolysis Early in Heart Attack)11 foi o único a avaliar o uso de
betabloqueadores (metoprolol) na fase pré-hospitalar do IAM, em
associação com fibrinolítico ou placebo. Seus achados demonstraram
menor taxa de IAM com onda Q, de insuficiência cardíaca congestiva
e de fibrilação ventricular, sem aumento acentuado dos efeitos colaterais.
As indicações e contra-indicações são as mesmas da utilização
intra hospitalar.
Heparinas - tanto as heparinas não-fracionadas como as heparinas
de baixo peso molecular, por não terem sido testadas na fase
pré-hospitalar, não recebem indicação para seu uso, neste momento.
No final da década de 70 e início dos anos 80, o uso de
lidocaína profilática foi comum, com o objetivo de reduzir a incidência
de fibrilação ventricular.
Apesar de ter diminuído a incidência desta arritmia, foi registrada elevação dos índices de mortalidade hospitalar, possivelmente decorrente de aumento da assistolia12. Sua utilização no atendimento tanto pré-hospitalar como
hospitalar, portanto, não tem indicação rotineira, podendo ser
prejudicial no uso profilático.

Fibrinólise pré-hospitalar
A utilização da terapêutica fibrinolítica pré-hospitalar baseia-se
no conceito clássico experimental de que, ao se abreviar o tempo
de isquemia miocárdica aguda, se reduz o tamanho do infarto do
miocárdio13, resultando na redução da mortalidade – não só hospitalar
como pré-hospitalar – e das complicações imediatas e tardias,
notadamente as decorrentes da disfunção contrátil ventricular. Diversos
ensaios clínicos demonstraram que quanto mais precocemente
é administrada a terapêutica fibrinolítica menores são a
mortalidade tanto imediata como tardia e o grau de disfunção ventricular1,8,14-
Por outro lado, não há vantagem em se administrar
fibrinolíticos após 12h do início da oclusão coronariana15.
O retardo pré-hospitalar – intervalo entre o início dos sintomas
isquêmicos e a chegada ao hospital – é um dos determinantes
do tamanho do infarto e da mortalidade pré e intra-hospitalar.
Esse tempo é de, em média, 3 a 4h, e apenas 20% dos
pacientes com IAM chegam à sala de emergência nas primeiras 2h1.
A utilização pré-hospitalar da terapêutica fibrinolítica visa
a reduzir esse retardo.
Em países e cidades com sistema de atendimento emergencial
móvel – ambulâncias que respondem aos chamados em domicílio,
existe uma razão lógica para a administração pré-hospitalar de fibrinolíticos.
É importante reconhecer que em todos os estudos que
utilizaram fibrinolíticos fora do ambiente hospitalar havia condições
operacionais apropriadas para seu uso, para a monitorização tanto
clínica como eletrocardiográfica pré-hospitalar dos pacientes e para
o tratamento das taquiarritmias. Além disso, os meios facilitadores
para o correto diagnóstico do IAM, para o rápido transporte e para a
imediata hospitalização dos pacientes estavam programados9,20-25.
Estudos de fibrinólise hospitalar realizados em diferentes países,
inclusive no Brasil, demonstraram que este procedimento é factível e
capaz de reduzir o tempo para administração do fibrinolítico9,18,20,23-25.
Meta-análise dos principais estudos randomizados entre trombólise
pré e intra-hospitalar apresentou resultados significativamente
favoráveis ao uso da primeira estratégia, com redução da
mortalidade de 17%.
Apesar de existirem vários estudos comparando o uso de fibrinolítico
intra-hospitalar com angioplastia primária, os quais favorecem
esta última estratégia em relação à redução do desfecho
composto de morte, reinfarto, acidente vascular cerebral e melhora
da contratilidade ventricular 27-30, são poucas as informações sobre
sua vantagem em relação à fibrinólise pré-hospitalar. O estudo
CAPTIM (Comparison of Primary Angioplasty and Prehospital
Thrombolysis in the Acute Phase of Myocardial Infarction) não
demonstrou desvantagem da fibrinólise pré-hospitalar sobre a angioplastia
primária no desfecho composto de óbito, reinfarto e
acidente vascular cerebral em 30 dias.
Os medicamentos fibrinolíticos utilizados no cenário pré-hospitalar
são os mesmos usados dentro do hospital, inclusive as doses,
dando-se natural preferência àquelas de mais fácil administração
endovenosa, como é o caso dos fibrinolíticos utilizados em bolo,
como o TNK-tPA (tecnecteplase), único disponível em nosso meio
e utilizado em dose única. Quando disponível, a reteplase (rPA),
administrada na forma de duplo-bolo, também poderá ser empregada.
É importante chamar a atenção para o fato de que a implantação
de um modelo de atendimento emergencial com a possibilidade
de realizar fibrinólise pré-hospitalar deve levar em conta
os seguintes conhecimentos: a) é baixa a taxa de IAM entre os
pacientes atendidos por dor torácica pelas ambulâncias ou nas
salas de emergência gerais (5% a 10%)9,32; b) é relativamente
baixa a taxa de pacientes atendidos em domicílio com IAM e que
são elegíveis para o tratamento fibrinolítico (≈30%)20; e
c) é elevado (US$ 70 mil) o valor monetário calculado para cada vida
salva com a utilização da fibrinólise pré-hospitalar34.
Segundo a presente Diretriz, a utilização pré-hospitalar de
fibrinolítico no IAM com supradesnível de ST pode ser considerada
para aqueles pacientes atendidos por ambulância com pessoal
treinado para esse fim e equipada para administrar o medicamento,
monitorizar continuamente o eletrocardiograma e prover cardioversão
elétrica, e para os quais se antecipa uma demora de pelo
menos 180min até a chegada ao hospital onde lhe seria oferecida
a terapêutica fibrinolítica. Quando o hospital para onde o paciente
será levado dispuser de condições para realizar ou prover angioplastia
primária de imediato, esta última estratégia é preferida,
mesmo que as condições acima exigidas para a fibrinólise préhospitalar
sejam atendidas.

Atendimento na Unidade de Emergência:
diagnóstico e estratificação de risco

Clínico e eletrocardiográfico

Avaliação inicial - Embora a apresentação clínica de
pacientes com isquemia miocárdica aguda possa ser muito diversa,
cerca de 75% a 85% dos pacientes apresentam dor torácica
como sintoma predominante. A dor, usualmente prolongada (>
20min) e desencadeada por exercício ou por estresse, pode ocorrer
em repouso. A dor, em geral intensa, é aliviada parcialmente com
repouso ou com nitratos, e pode ser acompanhada de irradiação
para membros superiores e pescoço e por outros sintomas associados
(dispnéia, náuseas e vômitos)34,35. Em pacientes com angina
prévia, a mudança do caráter da dor é um indicador de instabilização.
É importante ressaltar que a obtenção da história detalhada
sobre as características da dor e o relato prévio de cardiopatia
isquêmica auxiliam muito no diagnóstico, mas não têm acurácia
clínica adequada para afastar ou confirmar um quadro de isquemia
aguda do miocárdio.
O exame físico é freqüentemente pobre e inespecífico. Menos
de 20% dos pacientes apresentam alterações significativas à avaliação
inicial. Entretanto, a presença de estertores pulmonares,
hipotensão arterial sistêmica (pressão arterial sistólica < 110
mmHg) e taquicardia sinusal coloca o paciente em maior risco de
desenvolver eventos cardíacos nas próximas 72h.

Eletrocardiografia - O exame eletrocardiográfico deve
ser realizado idealmente em menos de 10min da apresentação à
emergência e é o centro do processo decisório inicial em pacientes
com suspeita de IAM. Em pacientes com sintomas sugestivos, a
elevação do segmento ST tem especificidade de 91% e sensibilidade
de 46% para diagnóstico de IAM. A mortalidade aumenta
com o número de derivações no eletrocardiograma com supradesnível
de ST35-37. Como o eletrocardiograma pode ser inespecífico
nas primeiras horas, é importante avaliar traçados seriados. Eventualmente
é necessária a obtenção de outras derivações (V7, V8
ou precordiais direitas) para confirmação diagnóstica. Embora a
presença de supra de ST e/ou o desenvolvimento de onda Q sejam
altamente indicativos de IAM, eles ocorrem em apenas 50% dos
pacientes com IAM, devendo os mesmos ser subestratificados de
acordo com a presença de outras evidências de isquemia no eletrocardiograma.
Resultados com infradesnível do segmento ST ≥ 0,05 mm em duas derivações contíguas ou inversão de onda T ≥ 0,2 mm conferem risco moderado de síndrome isquêmica e de
maior morbidade e mortalidade37.
O exame eletrocardiográfico deve ser repetido após a terapêutica inicial, 12h após a internação e diariamente até alta da Unidade Coronariana.
de risco inicial de acordo com a probabilidade de os mesmos
desenvolverem eventos e complicações cardíacas isquêmicas no
futuro. Por definição, pacientes com síndrome coronariana aguda
e supradesnível do segmento ST são classificados como de alto
risco para eventos, embora exista ainda muita heterogeneidade
nesse grupo.
Recentemente, foram desenvolvidos e validados escores de
estratificação de risco provenientes de análises multivariadas. Os
mais utilizados e que têm demonstrado impacto na tomada de
decisão clínica são os escores TIMI (Thrombolysis in Myocardial
Infarction) para pacientes com e sem supradesnível do segmento
ST no eletrocardiograma. O escore de TIMI com supra-ST tem
maior validade em pacientes submetidos a terapia de reperfusão.
Naqueles com escore inferior a 2, a mortalidade hospitalar é
inferior a 2%; escore 5, o risco é intermediário, com mortalidade
de 10%; escores acima de 8 estão associados com mortalidade
maior que 20%38-40. Na tabela a seguir estão apresentados os
escores de risco TIMI para síndrome coronariana aguda com supradesnível
do segmento ST38,.

Diagnóstico - Até recentemente, o IAM era diagnosticado
com base na recomendação da Organização Mundial da
Saúde, segundo a qual a presença de pelo menos dois dos três
critérios a seguir estabelecia o diagnóstico: a) história clínica de
desconforto precordial sugestivo de isquemia; b) alterações em traçados
seriados de eletrocardiograma; e c) aumento e queda das enzimas
cardíacas.
Com o desenvolvimento de marcadores mais específicos para
detecção de lesão do miocárdio, um Comitê Internacional se reuniu,
recentemente, para revisar os critérios diagnósticos de IAM43. A
principal modificação foi a incorporação das troponinas como marcadores
de necrose tecidual44. Conforme a redefinição de critérios
para o diagnóstico de IAM, recente ou em evolução, pode-se estabelecer
o diagnóstico de IAM se houver aumento característico
e diminuição gradual da troponina ou aumento e diminuição mais
rápidos para CK fração MB (CK-MB), com pelo menos um dos
seguintes critérios: a) sintomas isquêmicos;
b) desenvolvimento de ondas Q patológicas no eletrocardiograma; ou c) alterações
eletrocardiográficas indicativas de isquemia (elevação ou depressão
do segmento ST).
O impacto desta redefinição para o paciente e para o sistema
de saúde será considerável. É esperado aumento da incidência de
casos de IAM da ordem de 30% a 70%, dependendo do nível de
marcador aceito como elevado, e incremento dos faturamentos
hospitalares com a nova definição, Marcadores bioquímicos de lesão miocárdica
A evolução do IAM é um processo dinâmico e sua progressão
bem como sua extensão podem ser modificadas favoravelmente.
Após lesão celular isquêmica ocorre aumento da permeabilidade
da membrana e a conseqüente liberação de seus constituintes na
circulação sanguínea. Quanto maior o dano celular maiores serão
as moléculas liberadas.
Os marcadores de lesão miocárdica são macromoléculas intracelulares
liberadas após lesão da membrana do sarcolema dos miócitos
decorrente de necrose.
A velocidade de aparecimento dessas
macromoléculas na circulação periférica depende de vários fatores,
incluindo a localização intracelular, o peso molecular, os fluxos
sanguíneo e linfáticos locais, e a taxa de eliminação no sangue47.
A creatina cinase (CK-total) encontrada na forma de dímero é
uma importante enzima reguladora da produção e da utilização
do fosfato de alta energia nos tecidos contráteis. Embora seja um
indicador sensível de lesão muscular, não é específico para o diagnóstico
de lesão miocárdica. Resultados anormais da atividade e
da concentração da CK-total podem ocorrer em razão de: problemas
intrínsecos aos testes laboratoriais; doenças associadas, que diminuem
a depuração de proteínas; liberação de tecidos necróticos
contendo níveis elevados da enzima; presença de lesões musculares
agudas e crônicas; e uso de medicamentos e drogas ilícitas48.
Com o desenvolvimento de novos marcadores mais sensíveis e
específicos para o diagnóstico de lesão miocárdica, como a dosagem
da concentração protéica da CK-MB e das troponinas, sua utilização
atualmente é uma medida de exceção, na indisponibilidade de
marcadores mais modernos.
A CK-MB atividade, com uma curva característica de elevação
e normalização de seus níveis, foi padrão para o diagnóstico
do IAM nas últimas três décadas. Eleva-se em 4 a 6h após o
início dos sintomas, com pico em torno de 18h, e normaliza-se
entre 48 e 72h. Permite o diagnóstico tardio do IAM, após 12h
do início dos sintomas, quando possui sensibilidade de cerca de
93%, porém é pouco sensível para o diagnóstico precoce nas
primeiras 6h do início dos sintomas.
Embora possua a mesma sensibilidade da CK para o diagnóstico
de lesão miocárdica, a CK-MB atividade é mais específica.
Seus níveis também se elevam em outras situações que não o
IAM, como nas cardiopatias, nas cirurgias cardíacas, na presença
de doenças musculares periféricas agudas e crônicas, e na presença
de doença maligna.
A utilização de testes imunológicos com anticorpo anti-CKMB,
que dosam a concentração protéica da CK-MB (ng/ml), melhorou
sua sensibilidade clínica, sua especificidade analítica e sua
rapidez na realização do exame, superando, sem dúvida, qualquer
outra técnica de dosagem da CK-MB.
A CK-MB massa eleva-se entre 3 e 6h após o início dos sintomas,
com pico entre 16 e 24h, normalizando-se entre 48 e 72h.
Apresenta sensibilidade diagnóstica de 50% 3h após o início dos
sintomas e de 80% 6h após.
Estudos comparando a dosagem da CK-MB massa e da mioglobina
no diagnóstico precoce do IAM, entre 2 e 6h após o início
dos sintomas, têm demonstrado a mesma sensibilidade. Conseqüentemente,
muitos serviços vêm substituindo a medida da CKMB
atividade pela dosagem da CK-MB massa para o diagnóstico
do infarto.
A mioglobina é uma hemoproteína citoplasmática transportadora
de oxigênio, de baixo peso molecular, encontrada tanto no músculo
esquelético como no músculo cardíaco. Seus valores de referência
variam com a idade, o sexo e a raça. Sua eliminação é por via
renal, e apresenta vida média de dez minutos52. Liberada rapidamente
pelo miocárdio lesado, começa a elevar-se entre 1 e 2h após o
início dos sintomas, com pico entre 6 e 9h e normalização entre
12 e 24h52;
A mioglobina é mais sensível que a CK e a CK-MB atividade;
entretanto, essas diferenças são menos pronunciadas quando é
comparada a isoformas da CK-MB e à CK-MB massa51;54. Pelo seu
elevado valor preditivo negativo, que varia de 83% a 98%, é
considerada excelente para afastar o diagnóstico de IAM52. Seu
elevado valor preditivo negativo permite afastar o diagnóstico de
IAM em pacientes que apresentem alterações eletrocardiográficas
que dificultem o diagnóstico de IAM. Cerca de 10% a 20% dos
pacientes atendidos com supradesnível do segmento ST não apresentam
IAM. Outras causas de elevação do segmento ST são:
hipertrofia ventricular esquerda, bloqueio completo de ramo esquerdo,
repolarização precoce, bloqueio completo de ramo direito,
aneurisma do ventrículo esquerdo, pericardite aguda e ritmo de
marcapasso.
Embora sensível, não é um marcador específico, alterando-se
na presença de lesões musculares, insuficiência renal crônica,
exercícios extenuantes, exposição a drogas e toxinas. Cerca de
25% dos pacientes em estado crítico apresentam elevação de
seus níveis sanguíneos, mesmo na ausência de lesão cardíaca.
Sua utilização em pacientes com dor torácica apresenta melhores
resultados nas sete primeiras horas do início dos sintomas; após
esse período, sua sensibilidade começa a diminuir e os marcadores
mais específicos são mais efetivos.
As troponinas estão presentes nos filamentos finos dos músculos
estriados, formando um complexo com três polipeptídeos: a
troponina C (TnC), a troponina I (cTnI) e a troponina T (cTnT),
envolvidas com o mecanismo de regulação do cálcio celular57;58.
Elevam-se entre 4 e 8h após o início dos sintomas, com pico entre
36 e 72h e normalização entre 5 e 14 dias. Apresentam a mesma
sensibilidade diagnóstica da CK-MB entre 12 e 48h após o início
dos sintomas no IAM, mas na presença de portadores de doenças
que diminuem a especificidade da CK-MB elas são indispensáveis57;58.
Embora consideradas específicas para o miocárdio, resultados
falso positivos de troponina foram publicados por causa da presença
de fibrina no soro, da presença de anticorpos heterofílicos e da
reação cruzada com anticorpos humanos.
Sua maior limitação atualmente está na falta de padronização
dos testes de troponina (apresentam coeficiente de variação superior
a 10%), e no diagnóstico de pequenos infartos, o que não ocorre
em pacientes com supradesnível do segmento ST60.
Quando um paciente é atendido, queixando-se de dor preEstudos comparando a dosagem da CK-MB massa e da mioglobina
no diagnóstico precoce do IAM, entre 2 e 6h após o início
dos sintomas, têm demonstrado a mesma sensibilidade. Conseqüentemente,
muitos serviços vêm substituindo a medida da CKMB
atividade pela dosagem da CK-MB massa para o diagnóstico
do infarto.
A mioglobina é uma hemoproteína citoplasmática transportadora
de oxigênio, de baixo peso molecular, encontrada tanto no músculo
esquelético como no músculo cardíaco. Seus valores de referência
variam com a idade, o sexo e a raça. Sua eliminação é por via
renal, e apresenta vida média de dez minutos52. Liberada rapidamente
pelo miocárdio lesado, começa a elevar-se entre 1 e 2h após o
início dos sintomas, com pico entre 6 e 9h e normalização entre
12 e 24h52;.
A mioglobina é mais sensível que a CK e a CK-MB atividade;
entretanto, essas diferenças são menos pronunciadas quando é
comparada a isoformas da CK-MB e à CK-MB massa51;54. Pelo seu
elevado valor preditivo negativo, que varia de 83% a 98%, é
considerada excelente para afastar o diagnóstico de IAM52. Seu
elevado valor preditivo negativo permite afastar o diagnóstico de
IAM em pacientes que apresentem alterações eletrocardiográficas
que dificultem o diagnóstico de IAM. Cerca de 10% a 20% dos
pacientes atendidos com supradesnível do segmento ST não apresentam
IAM. Outras causas de elevação do segmento ST são:
hipertrofia ventricular esquerda, bloqueio completo de ramo esquerdo,
repolarização precoce, bloqueio completo de ramo direito,
aneurisma do ventrículo esquerdo, pericardite aguda e ritmo de
marcapasso.
Embora sensível, não é um marcador específico, alterando-se
na presença de lesões musculares, insuficiência renal crônica,
exercícios extenuantes, exposição a drogas e toxinas. Cerca de
25% dos pacientes em estado crítico apresentam elevação de
seus níveis sanguíneos, mesmo na ausência de lesão cardíaca.
Sua utilização em pacientes com dor torácica apresenta melhores
resultados nas sete primeiras horas do início dos sintomas; após
esse período, sua sensibilidade começa a diminuir e os marcadores
mais específicos são mais efetivos.
As troponinas estão presentes nos filamentos finos dos músculos
estriados, formando um complexo com três polipeptídeos: a
troponina C (TnC), a troponina I (cTnI) e a troponina T (cTnT),
envolvidas com o mecanismo de regulação do cálcio celular57;58.
Elevam-se entre 4 e 8h após o início dos sintomas, com pico entre
36 e 72h e normalização entre 5 e 14 dias. Apresentam a mesma
sensibilidade diagnóstica da CK-MB entre 12 e 48h após o início
dos sintomas no IAM, mas na presença de portadores de doenças
que diminuem a especificidade da CK-MB elas são indispensáveis57;58.
Embora consideradas específicas para o miocárdio, resultados
falso positivos de troponina foram publicados por causa da presença
de fibrina no soro, da presença de anticorpos heterofílicos e da
reação cruzada com anticorpos humanos59.
Sua maior limitação atualmente está na falta de padronização
dos testes de troponina (apresentam coeficiente de variação superior
a 10%), e no diagnóstico de pequenos infartos, o que não ocorre
em pacientes com supradesnível do segmento ST60.
Quando um paciente é atendido, queixando-se de dor precordial
prolongada e apresentando supradesnível do segmento ST
no eletrocardiograma, resistente ao uso de nitratos, geralmente
dosam-se os marcadores bioquímicos de lesão miocárdica. Essa
dosagem, porém, não é essencial para seu manejo. Deve-se dar
início rapidamente à terapia de reperfusão coronariana, mecânica
ou com fibrinolíticos, sem se aguardar seus resultados.
Os marcadores bioquímicos de lesão miocárdica atualmente
disponíveis começam a se elevar na circulação sanguínea após o
tempo ideal de reperfusão arterial coronariana e não são essenciais
para o diagnóstico de IAM16.
Mais do que para o diagnóstico, os marcadores bioquímicos de
lesão miocárdica possuem papel prognóstico nesses pacientes61-65.
Os marcadores bioquímicos de lesão miocárdica também são
úteis para o diagnóstico de reperfusão coronariana à beira do leito
em pacientes submetidos a terapia fibrinolítica. Sua liberação
pelo miocárdio lesado depende da perfusão na área de infarto e a
reperfusão coronária causa elevação precoce e pico mais elevado
desses marcadores por causa do maior fluxo sanguíneo na área
lesada após o restabelecimento do fluxo arterial (washout). Entretanto,
após a ocorrência do pico, não há diferença em relação
ao tempo de eliminação dos marcadores entre os pacientes reperfundidos
com sucesso ou não.
A liberação da CK total não é um bom marcador para o diagnóstico
de reperfusão arterial. Os estudos clínicos têm demonstrado
especificidade de 80%, com sensibilidade que varia de 10% a
40% quando o pico é atingido com menos de 4h e mais de 16h66.
A razão da concentração da CK-MB após 90min do início da
terapia fibrinolítica (CK-MB 90min/CK-MB pré-terapia) apresenta
sensibilidade de 92% e especificidade de 100% para diagnóstico
de reperfusão quando seu valor é de 2,5 vezes.
Para a troponina I, essa razão maior que 6,0 apresenta sensibilidade
de 82% e especificidade de 100%. Para a troponina T,
essa razão deve ser maior que 6,8 e apresenta sensibilidade de
89% e especificidade de 83%.
A utilização da razão em 90min após terapia fibrinolítica, portanto,
permite o diagnóstico de reperfusão miocárdica67.

Fonte:Leopoldo S. Piegas

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