Um golpe sempre produz gravíssimas
rupturas de ordens institucional, jurídica, econômica e social. E esse
golpe tem um agravante: diferentemente da ditadura civil-militar, quando
os militares assumiram o controle, enquadrando as demais instituições
(para gerar alguma estabilidade, pela força), o que vemos agora é uma
luta fratricida entre os três poderes pelo controle do golpe.
As consequências das rupturas
democráticas aparecem de variadas formas (disputa entre poderes,
instabilidade das instituições, experimentos de golpes dentro do
golpe...). Nas tentativas de contorna-las, os golpistas sempre abrem
novas frestas a indicarem que “remendos novos em panos velhos” só servem
para tamponar momentaneamente o caos.
Todos sabemos que o golpe no
Brasil é patrocinado pelos Estados Unidos, especificamente pela Wall
Street (o rentismo financeiro internacional). Apesar de as eleições
americanas terem consagrado justamente a Main Street (o setor
produtivo), na figura de Donald Trump, o capital especulativo
internacional, concentrador de renda e riqueza, precisa manter nosso
país como uma colônia extrativista (haja vista nossos abundantes
recursos naturais) e de mão-de-obra precarizada. Ademais, para a
geopolítica estadunidense, o Brasil não tem o direito de dar voo solo em
nenhuma hipótese.
Para conseguir golpear nossa
democracia de baixa intensidade, os rentistas internacionais optaram por
patrocinarem um tipo de ruptura diferente. Ao invés de invasão externa
(impossível num país da nossa dimensão) ou na aliança com os setores
militares (metodologia utilizada na América Latina na segunda metade do
século passado), resolveram apostar em figuras autóctones para tocar a
empreitada.
Há características
psicopatológicas comuns, perceptíveis nos principais líderes golpistas
brasileiros: desejo incontido de poder, prestígio e bajulação e uma
imensa fraqueza moral e ética, própria de personalidades pueris.
Investir nesse tipo de
personalidade - de pessoas que não têm limites; vivem num mundo
paralelo; postam-se como cidadãos acima do bem e do mal e são obcecados
pelo poder a qualquer custo -, foi o tiro certeiro e bem orquestrado
para a implementação do golpe. No momento adequado, serão descartados do
jogo.
Fundamentalmente, duas estratégias
foram utilizadas para criar as condições para o golpe: a primeira,
treinar pessoas cuidadosamente escolhidas para executarem
milimetricamente o enredo golpista. E, depois, utilizar da grande mídia
para endeusar esses “salvadores da pátria”, distorcer fatos, eleger
bodes expiatórios, criar um clima de instabilidade, ódio e manipulação
da realidade.
As principais faces autóctones do
golpe são: no campo político, Aécio Neves e Cunha (já descartado) e no
campo jurídico, Gilmar Mendes, Janot, Moro e os procuradores da
Lava-jato. Vejam que essas personagens têm em comum as mesmas
características mencionadas acima: desejo incontido de poder, prestígio e
bajulação e uma imensa fraqueza moral e ética, própria de sujeitos
pueris. As cenas amistosas entre Aécio e Moro, recentemente, foram mais
uma evidência da trama golpista, entre tantas outras.
Temer, como já discutimos em outro post,
é uma espécie de mamulengo. Está, literalmente, nas mãos dos nominados
acima e de outros de igual extirpe aninhados no seu partido, o PMDB.
Muito provavelmente continuará dançando conforme a música tocada pelos
verdadeiros líderes golpistas ou será solenemente descartado quando sua
“missão” tiver sido devidamente cumprida.
Na atual fase do golpe importa
consolidar as condições para devolver o Brasil à sua condição de colônia
do capitalismo rentista. Portanto, aniquilar os direitos sociais
conquistados na Constituição Federal de 1988 (antiga PEC 55 e as
“reforma” da previdência e trabalhista). Para tanto, há uma orquestração
das ações nos campos político (poderes executivo e legislativo) e
jurídico-constitucional (STF).
Porém, devido a onda crescente de
insatisfação popular (capturada nas pesquisas de avaliação do governo) e
a disputa figadal entre os três poderes (cujo objetivo comum é a
autopreservação de seus quadros, dado a evidente corrupção sistêmica e
estrutural que os domina), resta agora apelar para estratégias de
comunicação de massa com o objetivo de dissuadir uma revolta popular.
Registre-se que somente uma revolta poderá deter o golpe; afinal, o
enfraquecimento e as disputas entre os campos progressistas e de
esquerda não impõem qualquer perigo.
Para tentar contornar um possível
caos social, uma avalanche de anúncios e programas midiáticos otimistas
estão em curso. O objetivo é contrapor o clima policialesco que domina
os noticiários – sempre à caça de culpados seletivamente escolhidos - e
tamponar o saque ao erário e a guerra entre os golpistas. O encontro
ocorrido entre o presidente e o dono da emissora oficial do golpe, a
Rede Globo, nesses dias, evidencia parte dessa estratégia.
Por outro lado, para aplacar a ira
dos setores econômicos, que perceberam que o golpe está aprofundando
seus prejuízos, o governo anunciou um pacote de bondades para as áreas
financeira e empresarial e de maldades para os trabalhadores.
Imaginem os lucros estratosféricos
que serão auferidos pelos setores farmacêutico, hospitalar, de seguros e
de planos de saúde com o desmonte da previdência e da saúde pública,
por exemplo. Esses são alguns dos ganhadores do golpe. Nem os militares
tiveram tanta ousadia. O custo dessa aventura será alto...
Acontece que, nas economias
capitalistas, a somatória de golpe com recessão econômica gera,
inevitavelmente, além da incerteza, uma avalanche de temor, medo difuso e
“salve-se quem puder”. Preocupados com a sobrevivência, os
trabalhadores (parte mais fraca) se recolhem num primeiro momento. Por
isso, o esvaziamento das ruas. Mas a recessão impõe condições de vida
tão precarizadas que os grupos rancorosos, racistas, fascistas e movidos
por medo e ódio, de todos os segmentos sociais, aparecem, derivando
numa situação sem controle, mais cedo ou mais tarde. Já começamos a
viver essa situação.
Enganam-se aqueles que pensam em
futuro promissor nessas condições, ainda mais num país onde a justiça
sempre foi seletiva e desacreditada e as instituições referenciais, como
as igrejas, também são objeto de desconfiança pública.
Ou o país retoma os rumos de uma democracia (o arranjo menos ruim), pelo voto popular, ou cairemos numa situação de barbárie.
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