7.18.2015

CAMBADA


Sim, Princesa!


Acordei e o despertar trouxe-me um certo medo...
De pensar no futuro, até do presente.
Hoje com o sol nasceram incertezas,
O certo já não é o seu sorriso, mas lágrimas,
Misturadas aos controversos sentimentos.

E o teu desabafo escrito sobre a mesa
Desejaria esquecê-lo, cada palavra.
Por ele, não vejo sequer uma possibilidade
Não há mais horizonte, nem planos
Nem roupas, só vazio.

Só vazio é que comportamos agora
Um vazio imenso de enorme distancias
Que se alongam e se alargam a cada minuto
Na contra partida na compressão do sentimento
E agravamento dos olhos turvos e poucos verdadeiros.

Fim.

Tens então meu ombro para tuas lágrimas
Acalento aos teus temores
Talvez, firmeza as tuas ruínas
E amor para o teu desamor.
Não sou, senão, parte que te pertence
Que não funciona quando distante
E desanda e desconcerta às vezes que diz adeus.
Não sou, senão, nada longe do teu olhar.
Tens-me inteiramente!
Os versos, os beijos, os olhares...
Os versos para te exaltarem, os beijos e os olhares
Para lembrarem-te que são sempre teus.
Tens a mim para teu refúgio
Companhia para os luares
Para as incertezas e horas escuras
E para o fim do mundo e uma vida longa.

Pôr do Sol

O sol adeus mais uma vez
E com ele vão-se os sonhos e os medos
A esperança por dias gloriosos dorme
Mas, desperta poucas horas depois.
Talvez posso responder agora, amor
Se o sol se pondo ainda te comove.
Diga-me baixinho, sem pressa...
Pois, ele se despede, mas renasce revigorado.
Põe-se para o nosso amor
E ilumina agora do outro lado do horizonte.
Ficamos com a lembrança;
Talvez uma fotografia, um sorriso antes de sua partida.
Recordo agora desse final de tarde,
Amarelado de um sol quase apagado.
Que se escondia atrás de teus cabelos
Despedindo-se mais uma vez do teu sorriso.

E de todos...

E de todos os versos que te fiz
Todo amor que doei
E de toda dor que evitei
Não pude conter
O simples ato de dizer não.
E depois te abraçar e prometer
Que o meu amor será como o sol
Nos teus dias escurecidos.
Será sublime encanto
Nos dias monótonos e tristonhos.

A cima

Sentados de olhos postos no horizonte
Segurava a tua mão firmemente;
Dedos entrelaçados e pensamentos que fugiam
Todas as vezes que confundidas estrelas e luzes noturnas.

De cima víamos pequenos de nós
E a cima de todos um céu abençoado
De uma noite estrelada...
De arrepios da pele pelo vento gelado.

Vamos dividir o mesmo fone?
Ouvir a mesma música tantas vezes tocada
Encantar-se com a mesma melodia
Tantas vezes relembrada e recantada.

"O azul do mar me chamou..."
E eu pulei!
E lembro agora sentados e desapressados
Assistindo uma grande noite no alto do horto.

Traze-me

Traze-me um pouco do teu sorriso
Mesmo entristecido.
Traz-me teu abraço
Mesmo enfraquecido.
Traze-me...
Tua presença que mesmo silenciosa
Preenche todo meu vazio.

Planos para o futuro

Esse pedaço de papel reserva
Poucas linhas de um futuro pretendido;
Não são lá grandes planos
Nem sequer os tenho definidos,
Apenas sei que os tenho em algum lugar.

Ser melhor do que sou está incluído!
Fazer e realizar o que ainda não pude.
Surpreender aos poucos decepcionados
Fazer entendê-los e ampliar a visão, pois
Alguns acontecimentos fogem a racional compreensão.

Não quero e nem preciso das grandes coisas
Porém, sou do tamanho que pretendo
E me reservo a tudo o que é essencial,
Que minha alma agradece
E meu coração se engrandece.

Um carro? Uma casa? Um novo emprego...?
Amar mais e se doar mais ainda?
Abrir os braços e esperar...
O amor que me aguarda
Repousando no sofá da sala.

Disse que não eram grandes coisas
Mas, reforço, o essencial importa mais:
Amar, doar-se, curar-se, arriscar-se, feri-se...
Cair e recompor-se!
Desistir e persistir segundos depois.
 
Amanheceu e permaneci escurecido
No peito a mesma esperança perdida
O mesmo tesouro enferrujado
Um punhado de ouro ensanguentado
Devaneios e tolerâncias de um amante enlouquecido.
Não é sequer um bilhete suicida
Um testamento rasurado com poesia
É somente o desabafo
De quem se esperou e perseguiu
O pote de ouro no final do arco-íris.
Em cada baú uma lembrança
Em cada carta uma despedida
No guarda-roupa saudade
Um quarto solitário e negro...
A cortina de flores murchas acinzentadas.
Amanheceu e eu anoiteci
Sentido a vontade de voltar
A ser pasto
Verme e micróbio
Voltar a ser frio e imóvel como pedra.

Escolha

Apesar do medo
escolho a ousadia.
Ao conforto das algemas, prefiro
a dura liberdade.
Vôo com meu par de asas tortas,
sem o tédio da comprovação.

Opto pela loucura, com um grão
de realidade:
meu ímpeto explode o ponto,
arqueia a linha, traça contornos
para os romper.

Desculpem, mas devo dizer:
eu
quero o delírio.

Lya Luft

Madrugada

Meu sono fluía com perfeição;
Sem pesadelos, sonhos e assombrações.
Como pedra a deleitar
O silêncio da madrugada morna.

Parece loucura ou devaneio,
Mas despertei atordoado procurando
Tua voz mansa que gritou
Rasgando o silêncio da noite com meu nome.

Seria sonho? Não!
Percebi que foi a tua falta.
Angustiado apenas pensei:
Foi a saudade batendo a minha porta!

E se fosse diferente?
Gritasse meu nome e aparecesse
Com tua luz e teu calor
Iluminando minha noite e aquecendo minha cama.

Que seja!

Amo-te, pois roubar-me do meu mundo
Sequestrou-me da minha própria vida
Agora, tenho a sua atrelada a minha
Linhas paralelas, movimentos sincronizados.
Sê assim o amor, que seja!
Entrego-me, desabo-me
Beijo-te e me perco
Olho-te e me reencontro.
Sê assim a paixão, que seja!
Com a intensidade de olhares
A pressa de viver e reviver
A ansiedade de tornar novo de novo.
Sim, que amor improvável...
Desconcertante, forte!
Mais forte que a força humana
Mais forte que a nossa capacidade de dizer não.

Mesma moeda

Disseram-me que o melhor de mim se perdeu
Foi deixado em qualquer rua sem nome,
Em qualquer casa sem endereço.
Errado, pois o melhor de mim ainda sou eu.

Não morri, tão pouco matei
Apenas escolhi!
Só não optei pela opção alheia
Mesmo assim ironiza, pisa e cospe.

Se intenciona afastar-me
Investe nas mesmas palavras.
Se o meu fracasso é o teu grande prazer...
É melhor esperar sentada.

Contradição

Torce pela derrota e pelo fracasso!
Não eras assim,
Nunca foste assim,
Mas tua incompreensão mudou
A cor do teu sorriso
E a mansidão da tua voz.
Desperto e vejo
Não os olhos de outrora, acolhedores.
Noto, agora, inquisição e julgamento;
Desprezo e repulsa!
Mas vos digo:
Pondera hoje, pois o seguinte é incerto.

Verdade?

Se a verdade se manifestasse 
E minha coragem impulsionasse o ato,
Não seria covarde, 
Não seria fraco, mas seria livre.

Talvez minhas verdades
Sejam de fato
Versões falseadas
Dessa verdade nunca dita.

Talvez, amor
Minha verdade não seja
Aquela que seus ouvidos querem ouvir,
E que seus olhos se recusam a perceber.

Somente

Ouso bocas que me condenam
Olhos que sentenciam meu atos
Cabe pena de morte ou perpétua?
Preciso de quantos advogados?

Farto da nossa hipocrisia
De tanta cautela e do excesso de moral
Farto do diverso julgamento...
Preciso que ousam apenas como estou!

Mudança

Já não vejo teus olhos há tempos
Busco às pressas no meu baú
Qualquer memória frágil... uma recordação
Um beijo, uma frase... uma canção.
E quando quase a esqueço
O céu noturno se encarrega de relembrar
Hoje há lua sob nossos corpos,
Mesmo sabendo que agora preferes
O nascer do sol a esse triste luar.

Sábado

Tu partirás hoje...
Não irás nem tão longe e nem tão perto
Mas suficiente para magoar minha saudade
Que já não se remenda e nem se cura.
Vais mesmo, amor?
Sei que serás outra
Habitarás outros céus e paraísos
Eu, apenas sentirei que perdi.
Tu recolherás os pedaços...
As estruturas que te quebrei
Os caminhos que te desviei
Levar-te-ão a outros universos.
Veja, minha princesa...
O derradeiro sábado
Que não é de aleluia e nem ressuscita
Mas, que se despede e entristece.

Tenso entardecer

Recordo-me agora
Da conversa no final de tarde
Tão pesada quanto uma tonelada
Tão dolorosa quanto a despedida.

Saí, então, com os olhos no chão
Tão vazio quanto o silêncio
Tão perdido quanto bússola quebrada
Vi-me só, sem presença de mim.

Abri o portão...
Não vi teu sorriso, tão pouco um riso
Fui-me despindo e pensando
Espalhei as roupas des-perfumadas de ti
Nesse quarto breu e solitário.

Resolvi banhar o corpo
Abri o chuveiro, água fria,
Chorei camuflando as lágrimas com a queda d'água
Abafei minhas lamúrias com o barulho de chuva
Por um minuto consegui esquecer de você.

Você é sempre tão cheia de Si, 
E Eu, contrariamente, 
Tão vazio de mim.

Aonde?...

Ando a chamar por ti, demente, alucinada,
Aonde estás, amor? Aonde... aonde... aonde?
O eco ao pé de mim segreda... desgraçada...
E só a voz do eco, irônica, responde!

Estendo os braços meus! Chamo por ti ainda!
O vento, aos meus ouvidos, soluça a murmurar;
Parece a tua voz, a tua voz tão linda
Cantante como um rio banhado de luar.

Eu grito a minha dor, a minha dor intensa!
Esta saudade enorme, esta saudade imensa!
E só a voz do eco à minha voz responde...

Em gritos, a chorar, soluço o nome teu
E grito ao mar, à terra, ao puro azul do céu:
Aonde estás, amor? Aonde... aonde... aonde?...

Florbela Espanca

Nenhum comentário: