6.03.2015

Conceitos de masculino e feminino são construções sociais

O conceito de gênero e suas representações sociaisEl concepto de género y sus representaciones sociales
Mestrandos em Política Social pela UFF/RJ
(Brasil)
Vagner Caminhas Santanacaminhasdokiau@hotmail.comClaudia Toffano Beneventoclaudiabenevento@gmail.com





Resumo
          O presente artigo aborda o conceito de gênero, enquanto instrumento teórico que permite uma abordagem empírica e analítica das relações sociais. O objetivo é mostrar algumas das desconstruções sobre sexo, gênero e sexualidade, realizados nos âmbitos dos Estudos Feministas, de Gênero e sobre Masculinidade. Mais do que isto, mostrar como as reflexões sobre gênero não podem estar desconectadas das reflexões sobre sexualidade, e vice-versa. Concluímos com este estudo que gênero é uma construção cultural e social e, como tal, sua representação e disseminação pelos meios comunicacionais é responsável pela construção de ideais sociais, valores, estereótipos e preconceitos.

          Unitermos: Gênero. Representação social. Relações sociais.

Abstract
          This article discusses the concept of gender as a tool that allows a theoretical empirical and analytical approach of social relations. The goal is to show some of deconstructions about sex, gender and sexuality, made ​​in the areas of Women's Studies, Gender and Masculinity on. More than that, showing how the reflections on gender can not be disconnected from the reflections on sexuality, and vice versa. We conclude from this study that gender is a cultural and social construction and, as such, its representation and dissemination by means communication is responsible for the construction of social ideals, values, stereotypes and prejudices.
          Keywords: Gender. Social representation. Social relations.


EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 17, Nº 176, Enero de 2013. http://www.efdeportes.com/



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Introdução
    Em primeiro lugar é importante definir as relações de sexo, gênero e sexualidade, com freqüência, que são erroneamente usados como sinônimos. Quando conceituamos sexo, refere-se às características biológicas de homens e mulheres, ou seja, às características específicas dos aparelhos reprodutores femininos e masculinos, ao seu funcionamento e aos caracteres sexuais secundários decorrentes dos hormônios. Sobre esta questão Bourdieu (2003) nos explica que há:
    Semelhanças na diferença, tais oposições são suficiente pelo jogo inesgotável de transferências práticas e metáforas; e também suficientemente divergentes para conferir, cada uma, uma espécie de espessura semântica, nascida da sobre determinação pelas harmonias, conotações e correspondências. (p.16)
    Definindo gênero, podemos dizer que se refere às relações sociais desiguais de poder entre homens e mulheres que são o resultado de uma construção social do papel do homem e da mulher a partir das diferenças sexuais.
    O conceito de sexualidade refere-se ao dado sexual, que se define pelas práticas erótico-sexuais nas quais as pessoas se envolvem, bem como pelo desejo e atração que leva a sua expressão (ou não) através de determinadas práticas. Esse dado também é chamado por alguns/as de “orientação sexual”, e comumente classifica as pessoas em “heterossexuais”, “homossexuais” e “bissexuais”.
    O papel do homem e da mulher é constituído culturalmente e muda conforme a sociedade e o tempo. Esse papel começa a ser construído desde que o (a) bebê está na barriga da mãe, quando a família de acordo à expectativa começa a preparar o enxoval de acordo ao sexo. Dessa forma, cor de rosa para as meninas e azul para os meninos. Depois que nasce um bebê, a primeira coisa que se identifica é o sexo: “menina ou menino” e a partir desse momento começará a receber mensagens sobre o que a sociedade espera desta menina ou menino. Ou seja, por ter genitais femininos ou masculinos, eles são ensinados pelo pai, mãe, família, escola, mídia, sociedade em geral, diferentes modos de pensar, de sentir, de atuar. O que Bourdieu (2003) vai nos afirmar que a divisão das coisas e atividades na oposição entre masculino e feminino recebe sua necessidade subjetiva e objetiva na inserção de um sistema de oposições homólogas.
    Este artigo aborda a emergência e importância do conceito de gênero, enquanto instrumento teórico que permite uma abordagem empírica e analítica das relações sociais. O objetivo é mostrar algumas destas “desconstruções” sobre sexo, gênero e sexualidade, realizados nos âmbitos dos Estudos Feministas, de Gênero e sobre Masculinidade, através de bibliografias nesta temática. Com isso, discutiremos o gênero, seus conceitos e suas representações sociais, assim como a relação de gênero e sua condição divergente.

1.     Gênero: seus conceitos e suas representações sociais

    Acerca dos conceitos de gênero discutidos neste tópico iremos abordar a importância que está em mostrar que certos modelos de conduta e expectativa para homens e mulheres são construídos socialmente através dos tempos e não determinados pelo sexo. Estes são desenvolvidos a partir das relações durante todo o processo de crescimento e desenvolvimento dos seres humanos, determinando papéis e funções, impostos e adaptados ao período histórico, ideologia1, cultura e religião, acompanhando o desenvolvimento econômico (SWAIN, 2001), simbolizando, portanto, uma retradução cultural do biológico, definido por qualidades opostas atribuídas ao homem e a mulher.


1.1.     Breve introdução conceitual

    O conceito de gênero é definido, segundo Alves e Pitanguy (1985), como uma construção sociocultural, que atribui a homem e mulher papéis diferentes dentro da sociedade e depende dos costumes de cada lugar, da experiência cotidiana das pessoas, bem como da maneira como se organiza a vida familiar e política de cada povo.
    Destarte Suárez (2000), também corrobora com os autores acima descritos a qual ressalta que o gênero demonstra a ligação entre homens e mulheres e a natureza com finalidade mesmo que simbólicos, da igualdade entre eles. Neste sentido, o conceito de gênero é compreendido como a desnaturalização do sexo, como características biológicas de cada indivíduo, delimitando o poder entre os sexos.
    Desse modo, as mulheres são vistas como passivas atribuindo-lhes as qualidades como paciência, fragilidade, emoção, enquanto as qualidades ativas como agressividade, força, dinamismo, que caracterizam o masculino. Assim, o conhecimento do gênero permite pensar nas diferenças sem transformá-las em desigualdade2, ou seja, sem que as diferenças sejam ponto de partida para a discriminação.
    A mulher deve ser considerada uma parceira nas questões tanto sociais quanto profissionais, visto que sua força traduz-se no emocional, quando gera e educa os filhos, edifica o lar, sendo compreensiva com todas as questões do marido e de toda a família. Cabral e Diaz (1999) ressaltam que as questões relativas à mulher são tratadas sob o termo de gênero, construído socialmente buscando compreender as relações estabelecidas entre homens e mulheres, os papéis que cada um assume na sociedade e as relações de poder estabelecidas entre eles. Assim, desde pequena a mulher é conduzida ao papel que deve desempenhar, sendo estimulada em brincadeiras consideradas tipicamente femininas, como bonecas, casinha, entre outras. Os brinquedos infantis expressam as diferenças de sexo, mais que os instintos naturais, uma convenção social.
    O conceito de gênero diz respeito ao conjunto das representações sociais e culturais elaboradas a partir da diferença biológica dos sexos. Enquanto o sexo no conceito biológico diz respeito ao tributo anatômico, no conceito de gênero refere-se ao desenvolvimento das noções de masculino e feminino como construção social (CARLOTO, 2001).
    Assim, podemos notar que as representações sociais se definem como uma categoria social que retratam a realidade como ela é, e que serão discutidas em seguida.

1.2.     Representações sociais: o masculino e o feminino

    As representações sociais são como formas de compreender a relação diária da vida em sociedade, onde o individuo é valorizado com a sua participação na reelaboração de significados para fenômeno da vida cotidiana3 (TEIXEIRA, 1999). De acordo com essa análise entende-se que as representações sociais são construídas no dia-a-dia da vida social, a partir de um processo sócio cultural local, entre os sujeitos sociais. Essa construção ocorre em todos os espaços da sociedade.
    Na representação social há uma necessidade de entender e compreender o processo de modernização e como pode influenciar nas relações sociais, transformando e contribuindo para a construção de identidades pessoais e das unidades simbólicas. (Moscovici 1994, p. 16 apud TEIXEIRA, 1999). Assim é possível inferir que as representações sociais são construídas, através da percepção de si e do outro. Através do caráter simbólico e imaginário dos saberes sociais pode-se compreender como sujeitos sociais se empenham em entender e dar sentido ao mundo em que vivem.
    Teixeira (1999) entende as relações sociais como a relação de dois mundos sendo o primeiro da experiência individual, de onde resultam os comportamentos e percepções advindas de processos íntimos, às vezes de natureza fisiológica. O segundo mundo, por sua vez é propriamente o das relações interpessoais, explicando em função de interação, estruturas e trocas de poder.
    Por outro lado, Moscovici (1994 apud TEIXEIRA, 1999), afirma que a separação de dois mundos traduz-se em uma separação errônea de vista, pois existe o conflito entre o individual e o coletivo de cada um.
    A construção do real e o domínio do mundo colocam em evidência o papel que as representações sociais assumem na dinâmica das relações práticas, sociais, cotidianas e se explicam através das diferentes funções assumidas pelas representações sociais. Neste caso as representações se formam e se modificam a partir do que foi absorvido pelas mulheres durante o percurso da sua vida.
    O ator social depende da sua história de vida, através dos conhecimentos de sua experiência a determinado tema, aspecto ou situação de acordo com a história já existente. Dessa forma, através da experiência adquirida anteriormente são construídos os símbolos e significados que permitem aos indivíduos de um determinado grupo interpretar a ação recebida frente às suas necessidades.
    A sociedade humana é histórica, muda conforme o padrão de desenvolvimento da produção, dos valores e normas sociais. Na medida em que ocorre a transformação, atinge as representações de gênero, que constituem os papéis de cada um em seu modelo de ser. É uma construção cultural que transcende os séculos, passando pelas representações transmitidas de geração em geração e que, constituída em “cultura”, define o lugar do homem e da mulher com âmbitos diferenciados e antagônicos. Mesmo com a grande transformação dos costumes e valores que vem ocorrendo nas últimas décadas, ainda perduram muitas discriminações, muitas vezes ocultas, relacionadas a gênero (SWAIN, 2001).
    Discorrendo sobre o que expõe o autor acima, inúmeros são os instrumentos de socialização para conformação de identidade de gênero. Relações sociais complexas interagem em diversos níveis, sejam eles no âmbito familiar, comunitário e nas políticas públicas que se fazem presentes, não só no domínio das práticas, mas também no domínio psíquico. Tais relações definem-se, portanto, pela colocação de papéis sociais, representações e expectativas de comportamentos, partindo de uma caracterização biológica do masculino e do feminino, da masculinidade e da feminilidade.
    Ademais, essa definição restrita de papéis sociais dá origem à relação de opressão, exploração e domínio. A natureza da mulher é a todo o momento, passível de ser perdida, sendo assim é necessário que ela seja constantemente apreendida, controlada, vigiada, entende-se então que perder a feminilidade ou a masculinidade é uma ameaça constante, e para que isso não ocorra existem regras que devem ser acatadas desde infância, nos tipos de brincadeiras, nos modos, próprio de ser meninos e meninas.
    Moreira (2012) e Carloto (2001) corroboram com a idéia de que as atividades masculinas são distintas das femininas, em espaços produzidos pelas esferas domésticas e públicas. Cada uma desta constitui-se num espaço pertencente a um dos gêneros, difícil de sobreporem. O afastamento da mulher da esfera doméstica, seu lugar natural, é muitas vezes tido como uma degradação moral, conseqüência da exploração capitalista.
    Essa afirmação dos autores pode ser observada ainda na infância, constatando que as meninas brincam com panelinhas, bonecas, de casinha, sendo motivadas através dos brinquedos, a maternidade e cuidar do lar e da família, reprodução da prole. Os meninos brincam com carrinhos, de bombeiro, polícia, caminhão, bicicleta, brincadeiras diretamente ligadas a profissões, imputando a idéia de que, ao homem cabe a função de trabalhar para sustentar a família.
    O destino de identidades e atividades como a separação dos âmbitos de ação para homens e mulheres, que estão valorizados de forma diferente, é a expressão social da desigualdade (VELOSO, 2001). Desta valorização desigual surge um acesso também desigual ao poder e aos recursos, o que hierarquiza as relações entre homens e mulheres.
    As diferenças nas remunerações no mercado de trabalho, por exemplo, são partes importantes da desigualdade entre os sexos. Mas existem muitas outras esferas de benefícios diferenciados: na divisão do trabalho dentro do lar, no grau de cuidados ou de educação recebidos, na liberdade de escolha, respeito ao tipo de vida que se deseja levar.
    A desigualdade gera uma situação vulnerável para as mulheres, impede o aprofundamento da democracia e a vivência da cidadania para todos. Ao mesmo tempo, as relações são acompanhadas de desigualdades de classe, raça e etnia, determinantes da construção de inúmeras discriminações e injustiças (Ammann 1997 apud ARAÚJO, 2002).
    Há muitas formas de discriminação que permeia o cotidiano da mulher, como a dificuldade de promoção profissional, a contratação de mulheres casadas, assédio sexual, entre outras. As mulheres sofrem pressão no mercado de trabalho, tanto com a exigência de qualificação profissional e também da aparência física.
    O assédio sexual ainda é uma realidade para a mulher no mundo do trabalho, conseqüência de uma cultura que coloca o homem em posição superior à da mulher. Segundo Moreira (2012), a expressão do interesse do homem pela mulher, é tida como forma de autoafirmação da masculinidade, o assédio se caracteriza quando é utilizada a condição de poder, tentando subjugar a pessoa abordada ao seu interesse sexual.
    A existência de gêneros produz uma distribuição variável na produção social, alheias às vontades dos envolvidos, baseada em sexo, classe e raça, sendo que essa relação depende de uma visão particular, atribuindo a cada um, o seu lugar social, de acordo com os atributos que possui e se dá através da dinâmica das relações sociais.
    Diante disso, o gênero constitui uma realidade complexa, não podendo, portanto, ser considerado um conceito fixo (Saffioti 1999 apud CARLOTO, 2001), mas constantemente redefinido pelos indivíduos em situações na qual se encontram e que acabam por compor-se em momentos históricos. De fato, quase sempre as mulheres são cerceadas em suas necessidades e capacidades em função da diferença sexual.
    Destarte Moreira (2012) considera que ambos os sexos são capazes de qualquer função, sendo possível discorrer que não é a natureza, mas a sociedade que impõe à mulher e ao homem certos comportamentos e normas distintas. O ser humano nasce sexualmente neutro em atribuições e o meio social em que vive determina os papéis masculinos ou femininos, instituindo assim o gênero, isto é, hierarquias socialmente constituídas.
    Tradicionalmente, os homens são conduzidos à condição de provedor da família, sentindo-se obrigados ao trabalho fora de casa, enquanto as mulheres sentem necessidade de ficar junto aos filhos, não sendo fundamentalmente uma condição da natureza do sexo. Este autor diz que tais idéias são meras construções sociais, procurando justificar o domínio do homem sobre a mulher. Assim, a mulher, ingenuamente, acredita que seu lugar mais importante é o lar, que nasceu para ser mãe, que deve sacrificar-se pelos filhos e ser fiel ao marido.
    De acordo com Suárez (2000) a composição de gênero determina os valores e modelos do corpo, suas aptidões e possibilidades. Criam paradigmas físicos, morais e mentais, cujas associações tendem a homogeneizar o ser, desenhando em múltiplo registro o perfil da verdadeira mulher. Na sociedade moderna, o masculino também é submetido ao modelo de performance e comportamento, a hierarquia que funda sua instituição no social o qual se apóia a construção dos estereótipos, um exercício de poder que se exprime em todos os níveis sociais.
    Ainda segundo a autora, a ideologia de posse material e garantia da herança para as gerações futuras, levou o homem a interessar-se mais pelo convívio familiar. Assim, a mulher foi sendo cada vez mais submetida aos interesses masculinos, tanto no repasse dos bens como na reprodução da linhagem. Além disso, é sua função educar e perpetuar a sociedade estabelecida, através de condutas e decências, restringindo-se ao universo doméstico.
    A divisão de gênero inscrita na ordem dos espaços, bem como a oposição entre o meio doméstico e o público, constitui a concordância espontânea entre estruturas sociais e cognitivas, percebidas na diferença dos corpos, confere-se, assim, a base experimental da dominância inscrita na natureza das coisas invisíveis e não questionadas.
    Essa idéia é compartilhada por Moreira (2012), a qual acrescenta que, além do papel social definido em feminino e masculino, as representações e imagem de gênero constroem os corpos biológicos, não só como sexo genital, mas igualmente moldando-os e sujeitando-os às práticas normativas que hoje se encontram disseminadas no ocidente. Nessa perspectiva, as representações sociais são consideradas uma forma de construção da realidade, cuja mediação atravessa e constitui as práticas pelas quais se expressam.
    Para Moreira (2012), algumas transformações realizaram-se, em níveis legais ou jurídicos, graças aos movimentos feministas, caracterizados por sua multiplicidade, táticas e estratégias, como veremos no próximo subitem.


1.3.     Movimentos feministas: conquistas e desafios

    Os movimentos tiveram origem quando as primeiras reivindicações desafiaram a ordem conservadora, a qual excluía a mulher do mundo público. Foi também uma luta pela emancipação feminina, principalmente como forma de questionar a dominação masculina em todos os aspectos. A maior transformação foi verificada nas classes média e alta, onde a mulher avança em suas conquistas, abrindo espaço de trabalho nas grandes empresas e áreas públicas (SARTI, 2004).
    Atualmente, reitera-se que, embora continue buscando a emancipação feminina, tornou-se uma necessidade a presença da mulher em todas as esferas sociais, verificando-se que, muito mais que uma forma de auto afirmar-se, a participação feminina alia-se ao homem na construção de melhores condições financeiras e de convivência dentro e fora do lar.
    O exposto é sustentado por Galeazzi (2001), em seu trabalho, a autora analisa a participação econômica das mulheres na estrutura da família e diz que, a despeito das desigualdades é acompanhado de alterações que fazem ampliar as responsabilidades femininas, sendo observado em diferentes países o crescente número de famílias chefiadas por mulheres. A autora discute ainda que a tal situação pudesse significar um aprofundamento de problemas sociais, levando essas famílias a uma situação de empobrecimento e exclusão social.
    Nas lutas femininas as mulheres ousaram reivindicar por espaços e direitos em um mundo culturalmente pertencentes aos homens, pois estes naturalmente sempre tiveram garantido seus direitos. Elas conquistaram o direito ao voto, cidadania e no mundo do trabalho vêm buscando igualdade de oportunidades, nada aconteceu por acaso, tudo foi conquistado através de reivindicações.
    Os avanços supracitados ressaltam o movimento feminista como um dos protagonistas para fazer pensar as diferenças com direitos iguais, a construção de uma verdadeira cidadania que só será possível na diversidade.
    O século XX foi importante para as mulheres na organização em defesa dos seus direitos. A luta das mulheres contra as formas de opressão a que eram submetidas foi denominada de feminismo e a sua organização em prol de melhorias na infraestrutura social foi conhecida como movimento feminista. Esta também tem divisão dentro dela, pois o valor moral imposto às mulheres durante muito tempo dificultou a luta pelo direito de igualdade. Foram discriminadas pelos homens e também por aquelas que aceitavam o papel de submissão na sociedade patriarcal4.
    Deste modo, Carneiro (2012), mostra que a luta feminina é uma busca para a construção de novos valores sociais, morais e culturais. É uma luta pela democracia, que deve nascer da igualdade entre os sexos e evoluir para igualdade entre todos, suprimindo a desigualdade de classe. A busca pela democratização das relações de gênero persistiu e com a Constituição Federal de 1988 a mulher conquistou a igualdade jurídica (CARNEIRO, 2012).
    Pode-se dizer, então, que o movimento feminista foi imprescindível na luta do reconhecimento dos direitos da mulher. Neste sentindo, vem travando uma luta, a fim de acabar com o conceito de masculino e feminino na sua posição de superior e inferior.
    Os movimentos feministas consideram, segundo Rago (2001) e Sarti (2004), que a opressão pode ser erradicada, fazendo com que homens e mulheres compartilhem por igual às responsabilidades atualmente realizadas por sexo feminino, tanto nas instituições políticas, econômicas como nos cuidados dos filhos e nos afazeres domésticos. É preciso uma nova construção social. Esses movimentos buscam uma razão pela qual as mulheres são submetidas aos homens quando a natureza não determina o domínio de um sexo sobre o outro.
    A luta das mulheres foi contra a discriminação, violência, preconceito e ganha cada vez mais visibilidade na sociedade. Isso é fruto das mobilizações, movimento, estudo e participação efetiva das mulheres nos sindicatos, escolas, universidades, associações. As histórias de vida, desejos, angústias, denúncias e propostas saem da esfera doméstica e ganha o mundo público. Entretanto, mesmo com todas as transformações ocorridas na condição feminina, muitas mulheres ainda não podem decidir sobre suas vidas, não se constituem enquanto sujeito e estão sendo lançadas á exclusão social por esse modelo econômico injusto imposto pelo capitalismo.
    A partir dos anos 1980, o movimento feminista imprimiu um caráter político às suas demandas, além de um contínuo diálogo com o Estado e com a sociedade. Foi uma luta por igualdade de leis, políticas públicas que contemplassem as necessidades de elaboração e implementação de uma política nacional voltada para o combate da criminalidade, baseada nas relações de gênero. Os movimentos feministas apresentaram-se como ameaça a sobrevivência do homem. Assim, o acesso ao trabalho, liberdade sexual, o investimento na educação, a conquista de cargos políticos, a diminuição do número de filhos e os casamentos tardios vêm obrigando os homens a repensar a sua maneira de agir frente às mulheres e a si mesmo (SARTI, 2004).
    Desta forma, Sarti (2004), diz que a ideologia de feminilidade ultrapassa a porta da casa e se verifica, também, no tipo de formação profissional da mulher, pois determinadas carreiras seriam próprias da mulher na medida em que, se encaixaria à sua natureza.
    Nas últimas décadas, as mulheres têm participado das conferências mundiais de forma organizada como a Conferência de Beijing em 1995, ocorrida na cidade de Huairou, China, a qual foi a IV Conferência Mundial sobre a Mulher, promovida pela ONU. O tema desta conferência, como nas outras do chamado ciclo social, com o lema de igualdade e paz, discutiu vários temas pertinentes, entre eles pobreza, educação, saúde e violência, além dos direitos humanos. A plataforma dessas conferências aborda também as iniciativas que devem ser tomadas para promover as mulheres, no sentido de aumentar a participação destas, em pé de igualdade com os homens, em todos os domínios da vida social. Este foi então, o compromisso assumido pelas organizações governamentais presentes (ALVES, 2012).
    As mulheres lutaram muito para conquistar seus direitos, essa luta tem sido histórica, pois ao compreender como as relações de gênero estruturam o conjunto das relações sociais, torna-se mais fácil a um grupo ou uma comunidade compreender o sistema a que pertence e questioná-lo em função dos seus objetivos e propostas de crescimento e desenvolvimento.
    Com este conceito, as relações que se formam a partir das dimensões sociais do sexo perfazem as dimensões do gênero a partir das quais se desenvolverá todo o discurso, inicialmente elaborado pelo direito de família, uma vez que é exatamente na instituição familiar que desenvolve uma grande parcela, ou pelo menos a mais significativa da construção dos papéis sexuais (MAGALHÃES, 2012).
    Há mais de três décadas, a militância dos movimentos feministas encontrou seu referencial empírico na denúncia da violência sexual contra a mulher. A ideologia de inferioridade feminina justificou o autoritarismo masculino, interpretando a violência do homem contra mulher como algo natural e, assim, fazendo com que a mulher não reconheça o tipo de violência sofrida.


2.     As relações de gênero e suas condições divergentes

    O conceito de gênero procura abarcar questões históricas e contemporâneas no que se refere às relações desiguais entre os homens e mulheres. O termo vem do movimento feminista, que segundo Scott (1995), gênero é uma categoria de análise sociológica e histórica que permite compreender as relações sociais que estabelecem saberes para a diferença sexual, isto é, saberes que dão significados às diferenças corporais e que implicam numa organização social a partir delas. Estes saberes não são absolutos, mas sim relativos para cada cultura.
    Atualmente os debates sobre a condição da mulher e principalmente sobre a produção de conhecimento na visão feminista vêm desenvolvendo-se e ganhando espaços na política, na sociedade e na academia.
    Scott (1995) coloca a necessidade de rever se estamos no campo das relações assimétricas de poder social, pois a concepção de que o poder social é unificado, coerente e centralizado, imobiliza qualquer tentativa inovadora. Apóia-se no conceito de poder de Michel Foucault, entendido como constelações dispersas de relações desiguais, discursivamente constituídas em diferentes campos sociais.Scott continua nos explicando que esses campos são entendidos como processos e estruturas, que abrigam o conceito, utilizado por Foucault: capacidade do ser humano de se autogerenciar no embate constante com as múltiplas circunstâncias de vida:
    [...] construir uma identidade, uma vida, um conjunto de relações, uma sociedade estabelecida dentro de certos limites e dotada de uma linguagem – uma linguagem conceitual que estabeleça fronteiras e contenha, ao mesmo tempo, a possibilidade de negação, da resistência, da reinterpretarão e permita o jogo da invenção metafórica e da imaginação. (Scott, 1995, p.86)
    Para Scott, a questão da dominação de gênero não deve ser encarada como algo natural, ou simplesmente explicável. No interior de cada situação social e histórica, podem-se identificar resistência e múltiplas versões que, são mantidas, transformadas ou sustentadas, dependendo do aprofundamento teórico empregado como lente para interpretar, avançar e elucidar essa dominação.
    Como instrumento teórico para os estudos feministas, baseamos em Jacques Derrida, para realizar a crítica aos estudos que postulam uma oposição binária entre masculino e feminino, homem e mulher, levando em conta o contexto, a forma pela qual opera, reproduz e se mantém qualquer oposição binária, desvelando sua construção hierárquica, em vez de aceitá-la como real ou evidente, ou como fazendo parte da natureza das coisas.
    A princípio vamos considerar as diferenças entre os gêneros homem e mulher e avaliar suas atuações ao longo da história. Sob perspectiva biológica, as diferenças são evidentes, pois ao observar os corpos de homens e mulheres conclui-se que não são iguais. A mulher possui traços mais finos e um órgão sexual interno, o homem possui formas mais grossas e órgão sexual externo. As diferenças físicas podem ter contribuído para a elaboração de posições sociais deferentes para cada gênero. Bourdieu (1996) cita muito bem essas diferenças físicas quando narra a questão sexual em consonância com a dominação, ocasionada pela filosofia social da época:
    (...) fazer parte do sistema confere uma força sistematicamente que faz com que não se escape facilmente desse gênero de pensamento. A ratificação social de fatos fisiológicos (a ereção, pensada segundo o esquema do “inflar” que permite pensar todos os fatos da fecundidade) conduz a fundar, numa razão mitológica, os traços mais arbitrários da denominação masculina, e a estabelecer, por exemplo, a ligação entre a virilidade física e a virilidade psíquica ou ética (...) (BOURDIEU, 1996 p.32).
    As construções de valores a partir das características físicas estabelecem funções de gêneros sociais. As mulheres por sua “fragilidade” física, consideradas doces e indefesas; o homem é tido o responsável pelo trabalho, pela mente e pelo saber. Pelos conceitos apresentados já se considera que o homem, devido a sua força, é capaz de liderar enquanto que a mulher deve segui-lo. A partir daí já se determina então, o dominante e o dominado, historicamente as características físicas determinavam quem deveria liderar.
    A intenção aqui, não é discutir quem é o mais forte ou quem tem mais capacidade de dominação, ou tencionar que os gêneros são iguais e etc. Mas elaborar uma reflexão do que é o homem hoje e o que é a mulher hoje mediante sua formação sociológica, biológica, psicológica, tentando mostrar como as reflexões sobre gênero não pode estar desconectado das reflexões sobre sexualidade, e vice-versa.
    Saffioti (1992), em seu texto “Rearticulando gênero e Classe social” critica a determinação física sexual como representação do papel social que as pessoas vão desempenhar. A relação entre os gêneros vai além da existência de dois sexos, mas compreende a construção feita do social para o individuo, pois dependendo dos valores de cada momento histórico, os indivíduos terão seus corpos e funções determinados de formas diferentes.
    Portanto, é necessário avaliar as diferenças isoladas de interferências sociológicas, ideológicas, religiosas e etc. O pai da sociobiologia, Edwarde O. Wilson, da Universidade de Harvard, em seus estudos avaliou a mulher concluindo que esta tende a ser melhores que os homens em empatia, habilidades verbais, sociais e de proteção, dentre outras, quando os homens superam as mulheres em habilidades de independência, de dominação e habilidades matemático-espaciais, atividades que exigem força, agressão e outras características. Inicialmente suas pesquisas eram vistas com descrença pelos cientistas, dado que o aprendizado cultural é muito influente entre os seres humanos.
    Contudo, as diferenças entre homem e mulher já são evidentes após o nascimento, quando há pouca influencia social. Anne Moir e David Jessel (1992, p.67) em seu livro “Brain Sex” oferecem explicações para essas diferenças:
    Essas diferenças discerníveis e mensuráveis do comportamento são programadas muito antes que as influências externas tenham a oportunidade de se manifestar. Elas refletem uma diferença básica no cérebro do recém-nascido que já conhecemos -- a maior eficiência dos homens quanto a habilidades espaciais, a maior habilidade das mulheres quanto à fala.
    Após muitas pesquisas controladas, onde o meio ambiente e a aprendizagem social foram isoladas, cientistas concluem que existe grande diferença neurofisiológica e anatômicas entre os gêneros.
    Dr. Godfrey Pearlson produziu um estudo que comprova as diferenças de tamanho nos cérebros; os volumes calculados através de software desenvolvido por Dr. Patrick Barta, analisou 15 homens e mulheres. Mesmo após observarem que o cérebro do homem e naturalmente maior do que o das mulheres, ainda permanecia uma diferença de 5% nos volumes do LIP (lóbulo infero-parietal). Em geral o LIP permite que o cérebro processe informações por meio dos órgãos de sentido, auxilia na atenção e percepção seletiva (por exemplo, as mulheres são mais capazes de se concentrar em um estímulo específico, como por exemplo, o choro do bebê à noite). (WILSON, 1992)
    Estudos comprovaram que o LIP direito da memória esta relacionado a compreensão e manipulação das relações espaciais e estabelecer relações entre as partes do corpo, bem como a percepção de sentimentos e emoções. Por sua vez, o LIP esquerdo abrange as percepções de tempo e espaço e capacidade de rotação mental de figuras tridimensionais. (op. cit.)
    Um estudo anterior a este, também dirigido pelo Dr. Godfrey Pearlson, demonstrou que duas áreas nos lobos frontais e temporais responsáveis pela linguagem são significativamente maiores nas mulheres, o que comprova suas habilidades lingüísticas.
    Os estudos demonstram a razão de as mulheres serem mais emocionais que os homens, e os homens serem mais racionais que as mulheres, isolado de questões sociais.
    Avaliando o aspecto biológico e cientifico nos certificamos que homens e mulheres nascem com características peculiares que independem de sua classe social, educação adquirida e etc. Concluímos também que cada gênero possui, por sua formação biológica, tendências que despertaram maiores e menores interesses. Tendências femininas e tendências masculinas que vão além do interesse pela boneca e o interesse pelo carrinho, desde a sua concepção.


Considerações finais

    Todavia, ao pensarmos em gênero vamos encontrar um sistema disciplinário e normativo que define as bases do papel da mulher e que tem determinado sua posição na sociedade ao longo da história humana, à raiz de uma conseqüência biológica, a capacidade de gerar filhos. A partir disto, se estabelece um dos mais importantes mecanismos de controle e poder, o controle da reprodução, que não podendo ser desvinculada da mulher, determina “esse seu lugar social”.
    A questão de gênero é, antes de tudo, uma construção social e uma realização cultural. Essa construção sexista “masculino/feminino” coloca evidentemente o primeiro elemento em superioridade, propagando a noção simplista de “homem dominante versus mulher dominada”.
    Conclui-se que gênero é uma construção cultural e social e, como tal, sua representação e disseminação pelos meios comunicacionais é responsável pela construção de ideais sociais, valores, estereótipos e preconceitos.


Notas

  1. Um dos traços fundamentais da ideologia consiste, justamente, em tomar as idéias como independentes da realidade histórica e social, de modo a fazer com que tais idéias expliquem aquela realidade, quando na verdade é essa realidade que torna compreensíveis as idéias elaboradas. (CHAUÍ, 1986, p.10-11)
  2. Na espécie humana, dois tipos de desigualdade: uma que chamo de natural ou física, por ser estabelecida pela natureza e que consiste na diferença das idades, da saúde, das forças do corpo e das qualidades do espírito e da alma; a outra, que se pode chamar de desigualdade moral ou política, porque depende de uma espécie de convenção e que é estabelecida ou, pelo menos, autorizada pelo consentimento dos homens. (ROUSSEAU, 1988, p. 39)
  3. À vida cotidiana é um conjunto de atividades que caracteriza a reprodução dos homens singulares que, por seu turno criam à possibilidade da reprodução social. Isso significa que, na vida cotidiana, o indivíduo se reproduz indiretamente à totalidade social. (CARVALHO, 1999, p. 26)
  4. Engels (2002) cita uma variação de composição familiar, que é família patriarcal. Ela tem sua origem intrínseca ao surgimento da escravidão, e tem sua organização baseada na formação de um grupo composto por homens livres e não livres, sob o poder de um chefe, um senhor. É neste contexto que surge o termo famulus, que posteriormente dá origem a denominação de família. Observa-se, pois, que o termo famulus diverge em grande parte do que se entende hoje por família.


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GÊNERO: PAPEL E IDENTIDADE
Neste texto destacaremos o masculino e o feminino como papéis de gênero. Ou seja, sem prescindir de sua natureza anatômica, será privilegiada a categoria sexo desbiologizada e integrada às redes de relações institucionais e culturais em que se inserem o sujeito e a família. Entendemos que não existe um conteúdo universal para os papéis de gênero, pois estes são construções históricas, sociais e culturais e através deste prisma desenvolveremos nossas reflexões sobre mudanças de tais papéis ocorridas nos últimos tempos e suas implicações nas famílias das camadas médias dos grandes centros urbanos.
Papel, tal como formulado por Goffman (1975) e Berger (1978), é concebido como um conjunto de prescrições e proscrições para determinada inserção no meio social. Tal noção compreende direitos e deveres, com as respectivas sanções, numa determinada condição. Os papéis masculino e feminino configurariam tipificações do que seria pertinente ao homem e a mulher num dado contexto. Englobam aprovações, restrições e proibições que seriam apreendidas e transmitidas ao longo de gerações e durante o percurso da vida, do bebê ao idoso
Algumas abordagens tradicionais da psicologia social e da psicologia do desenvolvimento, desde há muito, focalizam a socialização dos papéis, como a teoria da aprendizagem social de Bandura (1971) e a teoria do desenvolvimento cognitivo de Kohlberg (1966). Esses autores, em suas inúmeras pesquisas, estudaram aspectos variados quanto à aprendizagem de papéis masculino e feminino, mas ambos postularam que as diferenças psicossociais entre meninos e meninas são de certo modo absorvidas, desde tenra idade, porque os agentes socializadores influenciam, através de expectativas, reforços, disposições, atitudes e comportamentos típicos para cada sexo, uma noção do que é ser homem ou ser mulher, e do que é esperado, permitido, consentido e excluído para tal. Além do mais, essas noções são mantidas, porque meninos e meninas inclinam-se mais a imitarem os seus iguais do que os do outro sexo, baseando-se tanto na observação direta, como na interpretação do que percebem como “masculino” e “feminino”.
A dicotomia sexual homem-mulher com características e peculiaridades próprias e mutuamente exclusivas - assumida por pais, familiares, escola, meios de comunicação e sociedade em geral, é incorporada como uma forte formação, através do desenvolvimento humano. Assim, como assinalou Biaggio (1976), os desempenhos esperados culturalmente - que os meninos sejam, “fortes, independentes, agressivos, competentes e dominantes”, e as meninas “dependentes, sensíveis, afetuosas e que suprimam seus impulsos agressivos e sexuais”, de algum modo, formam conjuntos de disposições diferenciais a serem seguidos. E, conforme a clássica hipótese de Parsons (1964), orientam-se os meninos de uma forma instrumental, com ênfase na competência e capacidade para a ação - respostas impessoais - e as meninas para uma dimensão expressiva, com foco na ternura e no bem-estar dos outros - respostas pessoais.
Kohlberg já registrara, porém, há várias décadas, a importância da interação contínua, isto é, apesar de as atitudes dos adultos emergirem de uma aprendizagem infantil inicial, elas configuram, a cada momento, uma reestruturação das concepções e dos valores anteriores. Trata-se, pois, de uma avaliação cognitiva gradativa e permanente do que é, ou não, adequado como pauta de conduta, feminina ou masculina a ser seguida e não de um modelo rígido a ser imitado através do ensinamento direto, de prêmio-castigo, pelo acerto-erro da resposta ou da mera observação das referências de cada gênero. A experiência com o meio social estimularia, assim, uma reorganização das concepções, conforme oportunidades e recompensas acompanhem atitudes e comportamentos adotados como masculinos ou femininos.
No entanto, em investigação contemporânea sobre crenças e valores de adolescentes das camadas médias urbanas acerca da família, do casamento, da separação e de projetos de vida, foram evidenciadas diferenças relevantes entre meninos e meninas (WAGNER, FALCKE E MEZA, 1997). Entre os jovens estudados, a crença de que as pessoas se casam por amor e de que se separam quando o amor acaba tornou-se consenso. Contudo, observa-se que essa crença é predominante entre as meninas, realçando as diferenças entre os gêneros. Os resultados obtidos, pois, nos permitiram concluir que os aspectos relacionados aos sentimentos e à subjetividade ainda se encontram mais associados ao sexo feminino, enquanto a praticidade e a objetividade predominam nos padrões de relacionamento do sexo masculino.
Também em pesquisas sobre a construção da identidade conjugal no casamento contemporâneo (FÉRES-CARNEIRO, 2001), encontramos diferenças semelhantes entre homens e mulheres adultos. As mulheres descreveram a escolha amorosa como “apaixonada” e como “amor à primeira vista” e definiram casamento como “relação amorosa”, realçando uma perspectiva romântica e subjetiva. Por outro lado, os homens ressaltaram a “atração física” na escolha amorosa e definiram o casamento como “constituição de família”, enfatizando aspectos objetivos e práticos. Resultados similares foram também observados em pesquisas anteriores (MAGALHÃES, 1993; FÉRES-CARNEIRO, 1997).
Em relação à identidade, consideramos a contribuição psicanalítica um campo fértil para a compreensão de sua formação e desenvolvimento, através da noção de identificação. Por isso dela partimos para desenvolvermos a temática, pois concordando com Tucker & Money (1981), entendemos que a identidade e o papel sexual não são dois conceitos distintos, mas aspectos diferentes - verso e reverso - da mesma questão. O papel expressaria publicamente a identidade sexual e esta seria a experiência particular daquele.
Identificação, por sua vez, compreende o processo através do qual se assimila um aspecto, um atributo, uma característica, uma imagem, um traço do outro e, segundo esta referência, se transforma. A identidade se produz e se refaz através deste processo, ao longo da vida de cada ser humano. Trata-se de um modo de constituição psicológica segundo um outro.
Na perspectiva psicanalítica freudiana, identificação foi apresentada como “a mais remota expressão de um laço emocional com outra pessoa” (FREUD, 1921, p.133). A fase fálica estaria ligada à identificação das crianças aos pais do mesmo sexo. O menino nutriria desejos de possuir a mãe, sendo detido pela figura do pai - rival que o ameaçaria com a castração e com o qual se identificaria para, em sendo como ele, um dia poder realizar seu desejo em relação ao objeto amoroso.
A resolução do conflito edipiano, na menina, passou por reformulações (FREUD, 1905, 1923, 1924, 1925). No texto “Algumas conseqüências psíquicas da distinção anatômica entre os sexos”, o autor consolida a idéia de que, após a ligação inicial com a mãe, comum aos dois sexos, será a própria constatação de ser castrada como a mãe, e a conseqüente “inveja do pênis”, que levará a menina a uma identificação com ela. Ou seja, abandona-a como objeto sexual, por não lhe ter proporcionado um pênis e volta-se para o pai que lhe poderá dar, como o fez com a mãe, um filho-pênis, caso se identifique com ela. E as figuras parentais introjetadas a partir do Édipo abririam caminho para outros modelos culturais a serem absorvidos, durante a vida.
De qualquer forma, Freud (1921, p. 133) adverte: “a identificação, na verdade, é ambivalente desde o início; pode tornar-se expressão de ternura com tanta facilidade quanto um desejo do afastamento de alguém”. E, dentre as várias revisões apresentadas por seguidores da psicanálise a respeito do processo de identificação, destacamos as colocações de Bleichmar (1988) e de Chodorow (1990).
A primeira propõe que este se opera por múltiplas vias pautadas pelos ideais de masculinidade e feminilidade preponderantes na família e na cultura em que se está inserido.
...desde as origens míticas, a identificação acontece pela tomada do valor do modelo. A sintaxe, sobre a qual se articula 'eu desejo ser como tu', deriva do fato que o tu é avaliado, ainda no registro mais elementar, como possuindo uma qualidade superior (BLEICHMAR, 1988, p. 47).
Porém, para esta autora, no desenvolvimento psicossexual da menina, tal como sugerido por Freud, este modelo já estaria, em princípio, comprometido com algum tipo de desqualificação, pois o abandono do primeiro objeto amoroso teria se efetuado a partir de uma desvalorização e não de uma proibição-interdição, como no caso masculino. Em suas formulações, contudo, ela enfatiza a identidade de gênero anterior ao reconhecimento e aceitação da diferença anatômica entre os sexos, ou seja, com a mãe toda poderosa da primeira infância e que corresponde ao seu ego ideal feminino primário.
Nessa mesma linha de argumentação, Chodorow (1990) afirmara também que o período de simbiose entre mãe e filha é mais intenso e demorado do que entre mãe e filho, além de constituir-se a mãe, em nossa cultura, num modelo mais presente durante a infância, enquanto o pai seria um modelo ausente. Esta condição conduziria a processos de identificação distintos entre os dois gêneros, isto é, a menina se encaminharia para uma reprodução mais fiel de pautas de conduta materna, posto que a distância e a ausência paterna favoreceriam uma identificação mais diferenciada. Ou seja, o menino aprenderia a ser homem sozinho, identificado com um “pai-herói”. Assim, as mulheres teriam suas identidades marcadas pela condição de serem mães (gerar e cuidar) e os homens pela condição de não-pais.
De qualquer modo, como sinaliza Laplanche & Pontalis (1983, p. 229): "O ideal de ego é constituído por identificações com ideais culturais não necessariamente harmonizados entre si". E, tanto homens como mulheres, da infância ao envelhecimento, tomam modelos de identificação variados e têm que lidar com múltiplos papéis.
Consideramos que, na série identificatória intrínseca ao processo de constituição e de diferenciação da personalidade, que principia na relação mãe-bebê e se prolonga por toda a vida, cada membro significativo da estrutura familiar, e mesmo da esfera social mais próxima, pode representar um elemento importante. Em estudos sobre as influências da conjugalidade sobre a subjetividade, analisamos como a experiência amorosa participa nesse movimento de construção do “eu”, e como os parceiros representam elementos significativos no processo de identificação, realçando a idéia de que o sujeito não somente repete padrões assimilados, mas também os recria. Dessa forma, entendemos que modelos de identificação variados estendem-se para além dos pais, transformando a subjetividade a partir da possibilidade de recriar padrões introjetados (FÉRES-CARNEIRO & MAGALHÃES, 2001; MAGALHÃES & FÉRES-CARNEIRO, 2003).

DINÂMICA FAMILIAR ATUAL: MODELO ANTIGO X MODELO NOVO
Desde duas décadas, um considerável número de estudos psicossociais em nosso país dentre eles Figueira (1981, 1987, 1991), Magalhães (1993), Nolasco( 1993, 1995), Negreiros (1996), Féres-Carneiro (1998) e Jablonski (1998), ao abordarem temas como visão de mundo, representações sociais, apreensão de valores, relações familiares, casamento, separação, maternidade, e outros, inseridos nos segmentos médios urbanos, atestam um fenômeno comum: a convivência de representações tradicionais e modernas, a despeito da aparência de substituição de modelos antigos por novos. A partir desses estudos, destacamos o conceito de “desmapeamento”, desenvolvido por Figueira (1981). Como o termo equivocadamente pode sugerir, não se trata de ausência de mapas, mas da convivência conflituosa de dois modelos: um tradicional e outro igualitário. Ou seja, o novo e o antigo convivem na subjetividade, sem que o primeiro tenha substituído o segundo, como aparentemente pode-se supor. No "modelo antigo" os dois sexos são concebidos como "naturalmente" diferentes, tanto bio-psíquica como socialmente. As identidades masculinas e femininas configuram-se demarcadas com precisão - o que cabe a um exclui o outro, quer em comportamentos, atitudes, sentimentos, inclinações ou interesses.
O casamento é considerado indissolúvel, monogâmico e ligado à reprodução. Abriga duas ordens de responsabilidades morais. A masculina é fundada na relação com o trabalho e na virilidade - manutenção econômica da família e atitude protetora para com os seus membros. A feminina está calcada na preservação da sexualidade e no exercício da maternidade - virgindade pré-nupcial, fidelidade conjugal e dedicação ao lar e filhos. Na organização familiar, verifica-se uma clara e explícita assimetria entre homem-mulher e adulto-criança, os primeiros sendo porta vozes da autoridade, detentores de saber e poder. A dimensão pública-masculina é mais valorizada que a privada–feminina, e a participação do homem ou da mulher na área pertencente ao outro é eventual e descontínua. O ponto de equilíbrio se dá na aceitação - acordo tácito - de que cada um deve fazer o melhor possível em seus domínios excludentes.
O “modelo novo" é marcado pelo fenômeno do individualismo, peculiar dos grandes centros urbanos brasileiros e absorvido principalmente pelos segmentos médios, onde o processo de modernização se expandiu intensa e rapidamente, conforme afirma, entre outros, Velho (1981, 1985, 1989). Duarte (1995) ao discutir esta questão, destaca o conceito de ideologia familialista e pontua diferenças em relação aos diversos segmentos sociais. Ressalta que a maior parte das afirmações de senso comum relativas à família no mundo ocidental moderno estão relacionadas às camadas médias que muitas vezes se apresentam como vanguarda da individualização, enquanto as camadas populares, que apresentam uma individualização independente da ideologia familialista, ficam subordinadas às necessidades da unidade doméstica, na qual destacam-se, sobretudo, as estratégias de sobrevivência.
0 "modelo novo” de família, as fronteiras de identidades entre os dois sexos são fluidas e permeáveis, com possibilidades plurais de representação: mulher oficial de forças armadas, homem dono-de-casa, mãe e pai solteiros, mulher chefe de família, casais homossexuais masculinos ou femininos, parceiros masculinos mais jovens, casal sem filhos por opção, produção independente, bebê de proveta e demais possibilidades que a evolução científica permite ou está em vias de possibilitar, tal como a discutida clonagem humana.
A instituição casamento já traz, em si, o embrião da dissolução - desde a ligação informal e descomprometida até o divórcio, crescentemente observado. A sexualidade dos parceiros é desvinculada da reprodução ou de uma resposta feminina ao desejo masculino. No interior da relação é esperado que o homem seja, ao menos, um coadjuvante na criação dos filhos e nas lidas domésticas, e que a mulher exerça, no mínimo, um papel auxiliar quanto à economia da família. As peculiaridades de cada membro do casal - companheiros nas obrigações e prazeres - e as necessidades emergentes substituem a hierarquia por sexo ou faixa etária. Ou seja, deveres e privilégios são compartilhados, bem como é enfatizada a atenção e pretendido o apreço aos desejos, às idéias e aos projetos dos filhos - crianças ou adolescentes.
Verificamos que os ideais e as expectativas veiculadas pelo “modelo novo” de casamento e de família foram evidenciados em estudos sobre ruptura e manutenção do casamento (FÉRES-CARNEIRO, 1995) e sobre a construção da identidade conjugal (FÉRES-CARNEIRO, 2001), apresentando diferenças entre homens e mulheres. Esses ideais parecem ter sido mais absorvidos pelas mulheres, que manifestaram freqüentemente expectativas igualitárias, enquanto os homens mostraram-se mais apegados aos valores tradicionais. As mulheres apresentaram ainda maior possibilidade de realizarem mudanças e também de romperem o casamento do que os homens. Esses resultados podem sugerir que as diferenças entre os gêneros, ainda hierarquizadas, sobrecarregam as mulheres que expressam almejar renovações e rupturas com as desigualdades de condições experimentadas.
A partir dos estudos mencionados, podemos destacar alguns fatores que, em seu conjunto, contribuíram para a expansão do "modelo novo" de família, nas camadas médias urbanas brasileiras, nas últimas décadas: o crescimento da economia, possibilitando uma mobilidade social ascendente dos setores médios; a inserção da mulher no mercado de trabalho, modificando o cotidiano familiar; o poder do homem, baseado na relação econômica, como único provedor, caindo em contradição; a escolaridade crescente da mulher, ampliando o seu nível de compreensão; os avanços da medicina, permitindo um controle efetivo da função reprodutora; a rapidez da transmissão de informações através da informatização e dos meios de comunicação de massa, permitindo uma constante exposição aos novos acontecimentos; mudanças jurídicas, garantindo direitos à mulher; progressos científicos e tecnológicos, abrindo espaços diversos.
A mulher, ao ingressar no mundo do trabalho extra-doméstico, munida de escolaridade superior - ora conseguida por abdicar do casamento, ora obtida a custa de sua ruptura, ora perseverada dentro de sua manutenção - filtrou valores herdados e reafirmou suas conquistas - direito à cidadania, à sexualidade, à visibilidade científica, literária e histórica. Mas qual o peso dos valores plantados em suas raízes, nesta fase de sua existência? Se a mulher alcançou um lugar no mundo masculino, garantiu também seu espaço no que idealizou, em diferentes etapas de sua existência, como feminino?
Em investigação por nós desenvolvida com mulheres de meia idade com escolaridade superior dos extratos médios urbanos (NEGREIROS, 1996), captamos tensão entre esses registros identificatórios da "nova” mulher, condizentes com a noção de “desmapeamento”, formulada por Figueira (1981). Trata-se da consolidação de uma identidade profissional, acoplada a papéis masculinos, em contraposição a uma nostalgia narcísica da grande mãe sábia, generosa, transmissora do afeto e do poder, tal como uma imagem mítica, representante da segurança e do equilíbrio, uma fonte inesgotavelmente procurada. Os discursos da “nova” mulher expressaram, além de sentimentos de culpa pela dificuldade de conciliação de interesses extra-domésticos e realizações na dimensão pública com os papéis femininos internalizados, uma aspiração de volta, algo mágica, ao mundo privado, de resgate de um “reinado” no lar, para obter paz, aconchego e plenitude.
Supomos, pois, que ligações com raízes tradicionais, ainda presentes, abalem os novos alicerces e façam com que experiências da vida adulta, tanto de homens como de mulheres, tornem-se passíveis de serem sentidas como insatisfatórias, contendo esforços vãos, incertezas, desconfortos, relacionamentos efêmeros e frustrantes, separações, competição e solidão. Nem a mulher encontra o seu “príncipe encantado”, na forma de pai protetor, nem o homem conquista a sensual parceira, que também seria mãe acolhedora.
Olhando para trás, no entanto, diante do testemunho feminino das gerações anteriores - via observação direta nas próprias famílias, ou indireta por meio da literatura, cinema, televisão, etc - o "antigo" não se apresenta como uma perspectiva atraente. Não é difícil constatar que a assimetria de direitos e deveres foi uma “cruz” que as antepassadas tiveram que carregar. Retroagir ao modelo anterior, assim, seria inconcebível. O destino da mãe precisa, antes de tudo, ser evitado.
É como se a "nova” mulher vivesse o paradoxo de uma terceira opção idealizada e inacessível. Os dois modelos - antigo e novo - configuram-se testados e desaprovados, muito embora nem o primeiro jamais tenha sido por ela vivido em seu formato original (face às transformações ocorridas), nem o segundo sequer tenha conseguido se instalar mais efetivamente (novos papéis da mulher como geradora de renda substantiva não foram, por exemplo, acompanhados por novas atribuições domésticas e paternas dos homens, no cotidiano). O incômodo resulta provavelmente da ambivalência em relação aos dois - há uma percepção de inadequação das tradicionais pautas de conduta quanto às requisições do presente, mas, por outro lado, os padrões que as substituíram parecem não trazerem a almejada sensação de gratificação, isto é, antes são percebidos como pesados, frustrantes, incompletos.
Quanto ao “novo” homem, em seus estudos sobre a masculinidade, Nolasco (1993, 1995, 2001) refere-se à banalização das representações sociais masculinas, como opostas às novas representações femininas (assim como também de negros e de homossexuais). Essas representações teriam passado a ocupar o lugar de “inimigo”, impedindo a dialética do esclarecimento. Como alternativas para este impasse, o autor ressalta a desconstrução da virilidade truculenta (interpretada como possível dúvida sobre a identidade sexual do homem, comprometido em provar e prover) e a construção da paternidade. Esta última não apenas no sentido clássico de proteção material e moral - incumbência masculina do pai - mas com uma “possibilidade de ampliação de suas dimensões internas e de renovação de sua relação com a vida” (NOLASCO, 1993, p.170)

FIM DA FAMÍLIA?
Vários autores sinalizam que, na sociedade atual, fomenta-se o sujeito auto-absorvido, competitivo, eterno produtor-consumidor, que acaba por adotar uma forma hedonista e materialista, na qual viver significa procurar sensações prazerosas e imediatas, sem medir os meios e as conseqüências. Lasch denuncia esta cultura predatória em dois momentos de sua obra. No primeiro denominando-a "cultura de sobrevivência", pelo desamparo e impotência típicos do que chamou de "mínimo eu" (Lasch, 1984). No segundo, apontando a precariedade da estrutura e dinâmica da família, ou, nas suas próprias palavras:
A situação da família espelha assim a situação da sociedade como um todo que criou uma sensação sempre presente de ameaça e reduziu a vida social a um estado de guerra, freqüentemente empreendido sob a aparência de uma cooperação amistosa. (LASCH, 1991, p. 204).
Viver numa cultura orientada para o lucro, para o novo e para o belo significa também alimentar a insegurança e o temor, isto é, a realidade externa traz à tona os fantasmas da realidade psíquica. Paira, neste cenário, uma ameaça de ruptura, de efemeridade, com empobrecimento das relações humanas. A família extensa – avós, pais, filhos, tios, sobrinhos e demais parentes e agregados - transformou-se em um pequeno núcleo – pais e filhos e daí para lares de mãe e filhos ou para o casal sem filhos, ou ainda, para os crescentes lares unipessoais. Quanto ao universo afetivo e sexual, as dificuldades se ampliam, pois sensações prazerosas e imediatas elevaram-se, nesta sociedade narcisista e neófila, à categoria de valor máximo. Todos os amores são descartáveis e renováveis - amigos, companheiros, parentes.
Os adultos vêem sua geração premida por valores assumidos pela anterior, a de seus pais, que se ampara nos "direitos adquiridos" frente aos filhos e pela posterior, a de seus filhos, criados num contexto de relações familiares mais igualitárias. O que antes era validado como direito inquestionável, hoje se inverte, sendo até passível de ser rotulado como neurose e/ou imaturidade de pais exacerbadamente reinvindicadores ou excessivamente possessivos, a exemplo de difundidos clichés de mãe “simbiótica”, pai “castrador”, etc. Assim, ao cumprir papéis paradoxais, a “nova” mulher e o “novo” homem precisariam se comportar à antiga, disponíveis e atentos para seus pais e avós, e mostrarem-se atualizados e desprendidos diante de seus filhos. Assim sendo, se por um lado estão presos a uma crença na autonomia econômica e psicológica do adulto, por outro vivenciam a dependência típica da relação intergeracional, quando há pais mais velhos e frágeis, filhos pequenos ou enfermos na família. E se os adultos arcam com despesas e providências dos dependentes, certamente cuidados mais intensos pesarão mais sobre o grupo feminino, que fica mais exposto às dificuldades domésticas cotidianas.
Em estudo recente (NEGREIROS, 2002), discutimos como num panorama sócio-cultural de mudanças aceleradas, já não há um lugar social definido para os mais velhos. E o mais incrível não é a construção desta etapa por uma geração, mas as redefinições dos espaços públicos e privados que isto envolve. Se antigamente a tradição e a continuidade de papéis sociais calcavam-se em modelos das gerações precedentes, hoje em dia, em nossa sociedade descontínua, são as novas gerações que tendem a ser imitadas pelos mais velhos, em vestuário, exercícios físicos, locais da moda, eventos socioculturais, etc... E, ainda, desfaz-se a rede de apoios solidários e estáveis que assegurava aos mais velhos um novo status - o de avós - após a aposentadoria pública (do trabalho) ou doméstica (saída dos filhos de casa). O potencial poder familiar dos idosos estará, senão nulo, diminuído, diante de outros agentes educacionais, médicos e psicológicos aos quais será confiado o neto. Os que estão envelhecendo, conseqüentemente, procuram manter um “apogeu idealizado”, deixam a desqualificada posição de avós para a geração dos bisavós, tentam viver uma “eterna meia-idade”, até que, com o passar dos anos, uma temida enfermidade física ou psíquica inviabilize a pretendida autonomia.
Os adultos, ocupados em produzir e consumir, não têm disponibilidade para o cuidado e atenção com os idosos, os doentes, tampouco com as crianças. Ainda que estas funções estejam localizadas na esfera feminina, as mulheres, ao se deslocarem para o mundo masculino, subtraem esses encargos da forma que lhes é possível. Portanto, creches, hospitais, asilos acolhem os “fardos” insuportáveis à dinâmica familiar. Assim, o lar como unidade de afeto e abrigo, espaço de amor, solidariedade e segurança, parece que está dissolvendo-se. Mas não se pode concluir daí, como nos diz Castells (1999), que chegamos ao fim da família. O que se dissolveu foi a família idealizada. A regra é a diversidade e a solicitação é a criatividade de pautas de conduta, sem um referencial de apoio ou um modelo a seguir. Ou seja, o adulto tem que inventar sua maturidade, como o jovem sua juventude, a criança sua infância e o idoso seu envelhecimento, através de fragmentos de modelos identificatórios renováveis, sem um roteiro a seguir.
Muitas vezes esta família idealizada é atualmente procurada em grupos religiosos ou grupos de mútua ajuda, tais como os alcoólicos anônimos e demais inspirados neste, os quais proliferam nos centros urbanos. Através deles, busca-se uma estrutura de apoio e de laços afetivos que promovam uma identificação entre os participantes e que funcione como um espaço coletivo (família imaginária) de proteção e afirmação, para recodificar representações e redimensionar valores. Outras vezes é através de várias modalidades de psicoterapia (incluindo a familiar), que se tenta o resgate dessa idealização.
De qualquer modo, o fato é que novas configurações familiares estão sendo vivenciadas e ainda é cedo para avaliar os resultados. Há várias crianças e adolescentes criados em famílias há pouco concebidas como marginais ou mesmo inconcebíveis – a exemplo de casais homossexuais que adotam ou inseminam artificialmente um filho. Ou de mães tardias, que evitaram a maternidade na idade fértil, quando estavam por demais ocupadas com sua inserção e ascensão profissional. Ou ainda, de adultos que voltam aos lares paternos após casamentos dissolvidos, com ou sem filhos, por razões econômicas, e mais um sem número de arranjos complexos, para além de um grupo estável constituído por esposos e filhos, ordenados por obrigações legais e orientados para scripts previsíveis. Os grupos familiares atuais convivem com uma flexibilidade de papéis masculinos e femininos e traduzem arranjos mais ou menos improvisados para dar conta da multiplicidade de tarefas e de afetos a elas subjacentes – amor, ódio, medo, esperança, raiva, inveja, respeito, culpa e todo um arco-íris de sentimentos advindos de um convívio próximo e potencialmente dissolúvel.
O que presenciamos hoje é a mudança no próprio conceito de família e a transformação do “masculino” e do “feminino”. A divisão de papéis constituinte do “modelo antigo” onde o homem é o provedor e a mulher é a responsável pela casa e pelo cuidado dos filhos não perdura no modelo atual de família. Em pesquisas anteriores realizadas com segmentos médios da população (FÉRES-CARNEIRO, 1987, 1995) encontramos em diversas famílias mulheres com ganhos financeiros superiores aos dos homens. E, no entanto, consideramos que em alguns casos nem sempre se confirma o dito popular “quem traz a grana manda na choupana”, pois quando é a mulher a principal provedora, a culpa pelo exercício de “papéis masculinos” pode ser um fator de manutenção do status-quo.
De qualquer modo, na transformação do conceito de família, vários mitos da família organizada, próspera e feliz estão se desfazendo. Mas ainda é cedo para avaliarmos os resultados de tantas e tão diversificadas relações familiares num mundo plural e complexo como o atual. Neste trabalho, calcado em pesquisas contemporâneas realizadas com sujeitos oriundos dos segmentos médios de grandes centros urbanos, especialmente da cidade do Rio de Janeiro, e com o apoio de abordagens teóricas da Psicologia clássica e de suas revisões, não pretendemos tecer generalizações ou conclusões apressadas e equivocadas. Apenas tentamos chamar atenção para mudanças na relação homem-mulher na atualidade e suas implicações nos contextos familiares estudados.
E, principalmente, entendendo gênero como expressão cultural de diferenças entre os sexos, constituindo-se pois num produto social, aprendido, representado e transmitido ao longo de gerações, buscamos ressaltar dois pontos básicos: o primeiro diz respeito à aparência moderna que muitas vezes encobre emoções antigas e posturas conservadoras; o segundo assinala que não precisamos ter uma visão catastrófica nem utópica sobre a família de hoje. É importante manter uma postura crítico-reflexiva e não preconceituosa sobre as novas configurações familiares, na medida em que as novas famílias estão abrindo mão de uma dimensão maniqueísta, que opõe masculino e feminino, o que sem dúvida pode contribuir para o estabelecimento de uma nova ótica e de uma nova ética das relações entre homens e mulheres no contexto sócio-familiar contemporâneo.

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Recebido em: 02/09/03 Aceito para publicação em: 04/08/04


NOTAS
* Professora Assistente – Doutora em Psicologia Clínica.
** Professora Titular – Doutora em Psicologia Clínica.
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