Ministros trocam acusações no plenário do Supremo Tribunal Federal
BRASÍLIA — Os ministros Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), protagonizaram um bate-boca no plenário da Corte nesta quinta-feira, com trocas de acusações. Incomodado com uma ironia de Gilmar sobre o Rio, Barroso reagiu e afirmou que o colega "não trabalha com a verdade", "muda de jurisprudência de acordo com o réu" e tem parceria com "a leniência em relação à criminalidade do colarinho branco". Gilmar acusou Barroso de ter advogado para "bandidos internacionais".— Não transfira para mim esta parceria que Vossa Excelência tem com a leniência em relação à criminalidade do colarinho branco — disse Barroso, em meio à discussão.
O julgamento analisava uma emenda à Constituição que extinguiu o Tribunal de Contas dos Municípios do Ceará. A sessão foi encerrada pela presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, pouco após a discussão. No último dia 28 de dezembro de 2016, Cármen suspendeu a extinção do TCM-CE.
A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, tentou apaziguar os ânimos, mas poucos minutos depois Gilmar retrucou, dizendo que tem compromisso com os direitos fundamentais e, por isso, liderou mutirões carcerários que soltaram 22 mil presos quando foi presidente do CNJ.
— Era gente que não tinha sequer advogado. Não sou advogado de bandidos internacionais — disse Gilmar, referindo-se ao fato de Barroso ter advogado para o italiano Cesare Battisti antes de ser ministro.
— Vossa Excelência muda a jurisprudência de acordo com o réu. Isso não é Estado de Direito, isso é estado de compadrio. Juiz não pode ter correligionário— rebateu Barroso.
DECLARAÇÃO SOBRE O RIO NO CENTRO DA POLÊMICA
— Gente, citar o Rio de Janeiro como exemplo... — disse Gilmar.
— Eles devem achar que é Mato Grosso, onde está todo mundo preso — rebateu Barroso, mencionando o estado de origem de Gilmar.
— No Rio, não estão (presos)? — questionou Gilmar.
— Aliás, nós prendemos, tem gente que solta — prosseguiu Barroso.
— Solto cumprindo a Constituição. Vossa Excelência, quando chegou, aqui soltou José Dirceu — afirmou Gilmar.
— É mentira. Aliás, Vossa Excelência normalmente não trabalha com a verdade. Gostaria de dizer que José Dirceu foi solto por indulto da presidente da República. Vossa Excelência está fazendo um comício que não tem nada que ver com o Tribunal de Contas do Ceará. Vossa Excelência está queixoso porque perdeu o caso dos precatórios e está ocupando tempo do plenário com um assunto que não é pertinente para destilar esse ódio constante que Vossa Excelência tem e agora o dirige contra o Rio. Vossa Excelência deveria ouvir a última música do Chico Buarque. "A raiva é filha do medo e mãe da covardia". Vossa Excelência fica destilando ódio o tempo inteiro. Não julga, não fala coisas racionais, articuladas. Sempre fala coisas contra alguém, sempre com ódio de alguém, com raiva de alguém — declarou Barroso.
— Só queria lembrar que o caso dos embargos infringentes de José Dirceu foram decididos aqui — afirmou Gilmar, sendo interrompido por Cármen Lúcia, que pediu aos ministros para retornarem ao julgamento.
Mas Barroso retrucou, afirmando que foi o Supremo, com seus 11 ministros, que concedeu o indulto a José Dirceu no caso do mensalão e, que no entanto, o petista continuou preso pela Lava-Jato, e só foi solto por decisão da Segunda Turma do STF, da qual Gilmar faz parte.
— Agora (Dirceu) só está solto porque a Segunda Turma determinou que ele fosse solto — disse o Barroso, emendando com a declaração sobre a ligação de Mendes com "criminalidade do colarinho branco".
Durante a discussão, à exceção de Cármen Lúcia, nenhum ministro interferiu na briga. Depois da sessão, em caráter reservado, ministros falaram que a resposta de Barroso representou boa parte da Corte, que já estaria cansada de ouvir de Gilmar Mendes críticas contundentes contra decisões dos próprios colegas.
— Alguém precisava fazer isso, né? — ponderou um ministro.
CLIMA TENSO EM JUNHO
Barroso não costuma discutir com os colegas em sessões no plenário. Gilmar, por sua vez, já se desentendeu em algumas ocasiões com outros ministros. Em junho, durante o julgamento da delação da JBS, o clima também azedou entre os dois ministros, que têm posições diferentes sobre as regras das delações premiadas. Gilmar chegou a deixar o tribunal após a discussão com Barroso e antes de a sessão terminar.
Barroso, que votou com a maioria pela manutenção da forma como as colaborações são feitas, reagiu irritado quando Gilmar o acusou de não respeitar posições divergentes.
— Essa é a opinião de Vossa Excelência. Deixe os outros votarem — exaltou-se Gilmar.
— Sim, mas tá todo mundo vontando — respondeu Barroso.
— Claro. E respeite o voto dos outros — reagiu Gilmar.
— Claro, vou plenamente respeitar os votos dos outros. Estou ouvindo Vossa Excelência. Inclusive foi Vossa Excelência que ontem suscitou: a questão não é só essa, temos outras considerações. E em consideração à de Vossa Excelência, eu trouxe a minha. Agora não pode: acho que vou perder e vou embora. Não! Estamos discutindo — devolveu Barroso.
GILMAR TAMBÉM DISCUTIU COM JOAQUIM BARBOSA
Gilmar é um costumeiro protagonista de bate-bocas no plenário do STF. O ápice foi em 2009, quando, em calorosa discussão, ouviu do então ministro Joaquim Barbosa a acusação de manter “capangas” no Mato Grosso.
— Vossa excelência, quando se dirige a mim, não está falando com os seus capangas do Mato Grosso, ministro Gilmar. O senhor respeite _ disse Joaquim.
Pouco antes, Gilmar tinha dito a Joaquim:
— Vossa excelência não tem condições de dar lição a ninguém.
— Vossa excelência fez coisa mais heterodoxa. Basta ver o que vossa excelência fez no Senado — disse Gilmar, acrescentando que eram “absurdos”.
— Absurdos não. Vossa excelência retire o que disse, por que isso não existe. Vossa excelência está faltando com o decoro não é de hoje. E eu repilo qualquer... Vossa excelência, por favor, me esqueça! — reagiu, nervoso, Lewandowski.
Nenhum comentário:
Postar um comentário