O que você viu nesse cara?
Para falar a língua zás-trás desses tempos de Twitter, vou tentar dar meu recado em quatro palavras: bom humor é tudo. Consegui fazer isso em apenas 17 caracteres? Se me concedem mais 103, sigo em frente. Até meu espaço (ou minha inspiração) acabar. Quem me inspira hoje é a criatividade bem-humorada que me surpreendeu no shopping há dois dias.
Estava tomando um café depois do almoço no piso inferior, onde ficam as lojinhas mais simples e as pequenas lanchonetes. Uma delas é tão pequena que o dono inventou um jeito diferente de acomodar seus clientes. Em vez de providenciar mesinhas, ergueu uma pequena arquibancada de cimento. Os garotos compram seus sanduíches e se acomodam nos degraus como se fosse dia de jogo no Pacaembu.
O lugar é tão descontraído, que o rapaz subverteu a tradição de pendurar na parede o retrato do funcionário exemplar do mês. No lugar daquela foto protocolar, mandou fazer uma caricatura dele e do ajudante, e colocou a inscrição: “os piores funcionários do mês”.
Quando vi aquela ilustração, comecei a rir. Quem passou por mim deve ter se perguntado quem era aquela maluca que ria sozinha, aparentemente sem motivo algum. Devo ser muito besta mesmo, mas adoro essas pequenas demonstrações de humor e leveza.
É muito bom encontrar gente que não se leva a sério, que sabe rir de sua pequenez, da nossa pequenez. O pequeno (pequeníssimo) empreendedor da lanchonete sabe rir de seu despojamento. Aposto que o bom humor e a sinceridade o ajudam a atrair clientes. O meu olhar ele fisgou.
Se o bom humor é fundamental nas relações sociais, na vida a dois ele não pode ser um opcional. Deveria ser um item de série, daqueles que acompanham os casais desde sempre – assim como os carros populares que já saem da fábrica “equipados” com volante, rodas e freio. O padre, na hora do casório, deveria dizer: “Se alguém sabe que esse fulano é mal-humorado, diga agora ou cale-se para sempre”. O mesmo vale para a noiva porque mulher mal-humorada é o diabo, que às vezes veste Prada.
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Ninguém merece conviver com um parceiro que não tem senso de humor. Para mim, esse é o pior dos castigos. As pessoas se preocupam tanto com atributos como fidelidade, riqueza, beleza e se esquecem de checar se o parceiro tem o básico do básico. Se ele é capaz de rir de si mesmo e de fazer rir.
Casamento é feito de coisas deliciosas. E também de grandes chatices. Quem agüenta – durantes anos a fio -- fazer supermercado, compartilhar o banheiro, botar o lixo pra fora, trocar lâmpada, abrir vidro de palmito, se não souber rir dessa porcariada toda? O lado B da vida a dois exige bom humor. O lado A também.
Quer um exemplo? Que tal uma cena do filme Uma cilada para Roger Rabbit, que fez um grande sucesso em 1988? Para quem não se lembra, é uma história inusitada contada por atores de carne e osso que contracenam com personagens de desenho animado. A sexy Jessica Rabbit tem um corpaço de mulher e é disputada pelos homens. Mas prefere o marido, o coelho Roger. Quando perguntam “o que você viu nesse coelho?”, a lânguida Jessica responde:
--- Ele me faz rirrrrrrr.
Jessica disse tudo. E só precisou de quatro palavras. Quem escolhe o bom humor lucra de várias formas. Uma delas diz respeito à saúde. Vários estudos sugerem que o riso traz benefícios. Alguns deles seriam:
- Redução dos níveis dos hormônios do stress
- Fortalecimento dos músculos do diafragma (o que ajudaria a construir aquele abdome dos sonhos)
- Mudança de foco mental (uma boa risada ajudaria a pessoa a se livrar de emoções negativas como raiva e culpa)
- Interação social (o humor nos aproxima das outras pessoas e nos ajuda a criar conexões. O riso é contagioso, não é mesmo?)
A maior parte desses estudos, porém, foi feita com poucas pessoas ou trouxe resultados inconclusivos. Não representam evidências inequívocas, embora o senso comum nos ensine que uma boa risada só pode fazer bem.
A pesquisadora Mary Payne Bennet, da Escola de Enfermagem da Universidade de Indiana, nos Estados Unidos, decidiu pesquisar a literatura científica disponível sobre os efeitos do humor sobre a saúde. Segundo ela, nos últimos anos muitos estudos procuraram documentar as mudanças fisiológicas relacionadas ao riso. Mas os cientistas esbarram num problema comum.
“A maioria observa que é difícil conseguir financiamento para estudos sobre humor, principalmente para aqueles que envolvem testes caros de medidas fisiológicas”, escreveu Mary num artigo publicado no periódico científico Evidence-based Complementary and Alternative Medicine. Você pode acessá-lo aqui. A ciência não leva o humor a sério, mas deveria.
No campo dos relacionamentos, os estudos sobre humor parecem ser mais consistentes. A pesquisadora Elizabeth McGee, da Universidade da Califórnia, avaliou de que forma o humor é um fator a ser considerado no momento da escolha dos parceiros. Concluiu que várias características tornam uma pessoa mais interessante aos olhos do outro (juventude, beleza, status etc). Mas o humor, sozinho, é capaz de tornar uma pessoa atrativa. Acesse o resumo do artigo.)
“Se a felicidade ou a diversão são um objetivo para determinada pessoa e se o bom humor do parceiro cria essa situação, o senso de humor diretamente contribui para a realização de um objetivo maior”, diz Elizabeth.
Ou seja: o que você viu naquele cara ou naquela menina pode ser muito simples. Também pode ser tudo e caber em quatro palavras.
E você? Como escolhe seu parceiro ou parceira? O bom humor faz diferença? Como é conviver com uma pessoa bem ou mal-humorada? Conte pra gente. Queremos ouvir a sua história.
Cristiane Segatto
Revista Época
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