Stephen Barrett**, M.D.
Muitos produtos à base de "antioxidantes" são comercializados com alegações que, por bloquearem a ação dos radicais livres, podem ajudar a prevenir doenças cardíacas, câncer e várias outras condições associadas com o envelhecimento.
Os radicais livres são átomos ou grupos de átomos que tem ao menos um elétron desemparelhado, o que os tornam altamente reativos. Os radicais livres promovem uma oxidação benéfica que produz energia e mata invasores bacterianos. Em excesso, entretanto, produzam uma oxidação prejudicial que podem danificar membranas e conteúdos celulares. É sabido que as pessoas que ingerem quantidades adequadas de frutas e vegetais ricos em antioxidantes tem uma incidência menor de doenças cardiovascular, certos cânceres e catarata. Frutas e vegetais são ricos em antioxidantes, mas não se sabe quais fatores dietéticos são responsáveis pelos efeitos benéficos. Cada planta contêm centenas de fitoquímicos (substâncias químicas vegetais) cuja presença é imposta por fatores hereditários. Somente pesquisa à longo prazo bem conduzida pode determinar se alguma destas substâncias químicas, tomadas em um comprimido, seriam úteis para prevenir qualquer doença.
Os mais divulgados fitoquímicos com propriedades antioxidantes tem sido a vitamina C, a vitamina E e o beta-caroteno (o qual o corpo converte em vitamina A). Existe evidência de que a vitamina E pode ajudar a prevenir a aterosclerose por interferir com a oxidação das lipoproteínas de baixa-densidade (LDL), um fator associado com o aumento do risco de doenças cardíacas. Entretanto, a vitamina E também tem um efeito anticoagulante que pode promover sangramento excessivo. Em 1993, The New England Journal of Medicine publicou dois estudos epidemiológicos os quais trouxeram como resultado que as pessoas que usaram suplementos de vitamina E tiveram menores taxas de morte por doenças cardíacas [1,2]. Estes estudos não provaram que o uso de vitamina E seja útil porque não levaram em conta os efeitos de outros fatores no estilo de vida ou não consideram a mortalidade por outras doenças. Além disso, outros estudos tem mostrado resultados conflitantes. A única maneira de lidar com a questão cientificamente é conduzir estudos clínicos duplo-cego à longo prazo comparando usuários de vitaminas com não usuários e checando a mortalidade por todas causas.
Ao menos sete estudos clínicos grandes foram relatados. O primeiro estudo comparou os efeitos da vitamina E (alfa-tocoferol), beta-caroteno e um placebo entre fumantes pesados. Os pesquisadores não encontraram qualquer benefício da vitamina E e 18% mais câncer de pulmão entre aqueles que receberam beta-caroteno. Além disso, a mortalidade total dos que receberam beta-caroteno foi 8% maior, e aqueles que usaram a vitamina E tiveram uma freqüência maior de derrame hemorrágico [3]. Em 1997, os pesquisadores relataram sobre o efeito da vitamina E ou beta-caroteno na incidência de ataques cardíacos ou morte entre as pessoas que haviam tido um ataque cardíaco prévio (infarto do miocárdio). O trabalho envolveu 1.862 homens entre 50 e 69 anos que foram acompanhados por uma média de 5,3 anos. Os homens receberam suplementos dietéticos de alfa-tocoferol (50mg/dia), beta-caroteno (20 mg/dia), ambos, ou um placebo. Houve significativamente mais mortes por doenças coronarianas entre aqueles que usaram suplementos de beta-caroteno, e uma tendência de mais mortes (mas não o suficiente para ser estatisticamente significativo) no grupo da vitamina E [4].
O segundo estudo não encontrou nenhuma evidência de que suplementação com vitamina C, vitamina E ou beta-caroteno previnam o câncer colorretal [5]. O terceiro estudo, o qual acompanhou 22.000 médicos por 12 anos, não encontrou nenhuma diferença nas taxas de câncer ou doenças cardiovascular entre os usuários e não usuários de beta-caroteno [6]. A quarta pesquisa, que testou uma combinação de beta-caroteno e vitamina A, foi encerrada após quatro anos porque parecia que os usuários de suplementos que fumavam tinham uma incidência 28% maior de câncer de pulmão e uma mortalidade 17% maior [7].
Mais recentemente, um estudo clínico duplo-cego mostrou que tomar altas doses de vitaminas C e E e beta-caroteno não reduziram as probabilidades de reoclusão das artérias após a angioplastia coronariana por balão. Os pacientes tomaram ou probucol (uma droga redutora de colesterol), probucol mais os três antioxidantes, os antioxidantes isolados ou um placebo. Mais de 200 pacientes completaram o estudo sem violações do protocolo. Pacientes nos grupos antioxidante receberam 30.000 UI de beta-caroteno, 500 mg de vitamina C e 700 UI de vitamina E duas vezes ao dia. Todos os pacientes receberam aspirina, a qual é sabidamente redutora da incidência de reoclusão. Após seis meses, as taxas de repetição da angioplastia foram de 11% no grupo do probucol, 16,2% no grupo de tratamento combinado, 24,4% no grupo de multivitamina e 26,6% no grupo placebo [8].
Outro estudo envolveu 2.545 mulheres e 6.996 homens com mais de 55 anos de idade que estavam em alto risco de desenvolver eventos cardiovasculares porque tinham doenças cardiovasculares ou diabetes em conjunto com um outro fator de risco. Estes pacientes foram aleatoriamente designados a receber ou 400 UI de vitamina E natural ou um placebo semelhante por uma média de 4,5 anos. Não houve nenhuma diferença significativa em ataques cardíacos, derrames ou mortes entre os grupos vitamina E e placebo. Os pesquisadores concluíram que "Em pacientes com alto risco de desenvolver eventos cardiovasculares, tratamentos com vitamina E por uma média de 4,5 anos não tem nenhum efeito aparente sobre resultados cardiovasculares." [9]
Já outro estudo testou aspirina, vitamina E e beta-caroteno na prevenção do câncer e doenças cardiovasculares entre 39.876 mulheres com mais de 45 anos. Entre estas aleatoriamente designadas para receber 50 mg de beta-caroteno ou um placebo em dias alternados, não houve nenhuma diferença estatisticamente significativa na incidência do câncer, doença cardiovascular ou mortalidade global após uma média de dois anos de tratamento e dois anos de seguimento [10].
Charles Hennekens, M.D., que participou em dois dos estudos acima, assinalou que mesmo se os antioxidantes pudessem proporcionar os benefícios sugeridos pelos estudos epidemiológicos, parar de fumar e outros fatores ligados ao estilo de vida teriam uma efeito muito maior nas taxas de câncer de pulmão e doença coronariana [11]. The Medical Letter concluiu:
Os benefícios de tomar altas doses de vitamina E permanece por ser estabelecido.
Não há nenhuma evidência convincente que usar suplementos de vitamina C previnam qualquer doença.
Ninguém deveria tomar suplementos de beta-caroteno [12].
O comitê de nutrição da American Heart Association lançou uma junta consultiva científica para discutir as relações entre antioxidantes e doenças cardíacas. A declaração concluiu:
Evidência considerável agora sugerem que substâncias oxidantes estão envolvidas no desenvolvimento e expressão clínica de doenças coronarianas e que antioxidantes podem contribuir para a resistência à doença. A evidência epidemiológica é consistente com este ponto de vista indicando que a ingestão maior de antioxidantes está associada com riscos menores da doença. Ainda que este aumento da ingestão de antioxidantes geralmente tem envolvido o aumento no consumo de alimentos ricos em antioxidantes, alguns estudos recentes tem sugerido que a ingestão de níveis ideais de vitamina E são atingidos apenas pela suplementação. Atualmente não há nenhuma evidência de estudos de prevenção primária, mas os resultados de estudos de prevenção secundária tem mostrado efeitos benéficos dos suplementos de vitamina E em algumas doenças específicas. Em contraste, estudos diretamente endereçados aos efeitos dos suplementos de beta-caroteno não mostraram efeitos benéficos e alguns tem sugerido efeitos deletérios, particularmente em subgrupos populacionais de alto risco.
Em vista destes achados, a recomendação mais prudente e sustentável cientificamente para a população geral é consumir uma dieta balanceada com ênfase em frutas e vegetais ricos em antioxidantes e grãos integrais. Este conselho, que é consistente com as diretrizes dietéticas atuais da American Heart Association, considera o papel da dieta total em influenciar o risco às doenças. Ainda que a dieta apenas não possa proporcionar os níveis de vitamina E que tem sido associados com a diminuição do risco em alguns estudos, a ausência de dados sobre eficácia e segurança de ensaios randomizados impossibilita o estabelecimento de recomendações amplas para a população em relação a suplementação com vitamina E. No caso da prevenção secundária [proteção de pessoas que já tem doenças das artérias coronárias], os resultados de ensaios clínicos de vitamina E tem sido encorajadores e se estudos posteriores confirmarem estes achados, consideração dos méritos da suplementação com vitamina E em indivíduos com doenças cardiovasculares estaria garantida [13].
Também estão sendo feitas pesquisas para determinar se o uso de suplementos ou a ingestão de alimentos ricos em antioxidantes podem proteger contra degeneração macular relacionada com a idade (AMD), uma doença em que a porção central da retina deteriora de modo que permanece somente a visão periférica. Uma equipe de pesquisadores australianos que acompanhou 3.654 pessoas com mais 49 anos de idade não encontrou nenhuma associação estatisticamente significativa entre AMD e ingestão de caroteno, zinco ou vitaminas A ou C, seja pela dieta, suplementos, ou ambos [14]. Outros estudos publicados tem tido resultados conflitantes, com alguns encontrando correlações e outros não [14].
A questão chave é se a suplementação com antioxidantes (ou outros fitoquímicos) provou que traz mais benefício que malefício. A resposta é não, é por isso que o FDA não irá permitir que quaisquer destas substâncias sejam rotuladas ou comercializadas com alegações que podem prevenir doenças.
A publicidades negativa não impediu os fabricantes de continuarem a vender antioxidantes como se fossem comprovadamente benéficos. Muitos também reagiram promovendo novas misturas de beta-caroteno e outros carotenóides, os quais, eles sugerem, podem oferecer os mesmo benefícios de frutas e vegetais.
Muitos tipos de cápsulas descritas como "concentrados" de frutas e/ou vegetais estão sendo comercializados. Entretanto, não é possível condensar grandes quantidades de produto em uma cápsula sem perder fibras, nutrientes e muitos outros fitoquímicos [15]. Apesar de alguns produtos conterem quantidades significativas de nutrientes, estes nutrientes são prontamente obteníveis por um custo menor a partir dos alimentos.
Pesquisadores do Jean Mayer USDA Human Nutrition Research Center da Tufts University recentemente completaram um estudo que pode explicar o motivo pelo qual as altas doses de beta-caroteno parecem aumentar as taxas de câncer de pulmão entre fumantes nos estudos de 1994 e 1996 apontados acima. O estudo foi conduzido em furões, que metabolizam o beta-caroteno de uma maneira muito semelhante aos humanos. Os pesquisadores encontraram que quantidades excessivas acumuladas nos pulmões oxidaram-se em substâncias que diminuíram um supressor tumoral e aumentaram um promotor tumoral nos pulmões dos animais. Os furões foram divididos em quatro grupos. Um recebeu beta-caroteno e foi exposto a fumaça de cigarro equivalente a um humano fumando 1,5 carteira por dia. Outros dois grupos receberam ou suplementos ou exposição ao fumo, e um grupo controle não recebeu nada. O primeiro grupo teve as maiores mudanças pré-cancerosas [16].
Referências:
Stampfer MJ and others. Vitamin consumption and the risk of coronary disease in women. New England Journal of Medicine 328:1444-1449, 1993.
Rimm EB and others. Vitamin consumption and the risk of coronary disease in men. New England Journal of Medicine 328:1450-1456, 1993.
Alpha-Tocopherol, Beta Carotene Cancer Prevention Study Group. The effect of vitamin E and beta carotene on the incidence of lung cancer and other cancers in male smokers. New England Journal of Medicine 330:1029-1035, 1994.
Rapola JM and others. Randomised trial of alpha-tocopherol and beta-carotene supplements on incidence of major coronary events in men with previous myocardial infraction. Lancet 349:1715-1720, 1997.
Greenberg ER and others. A clinical trial of antioxidant vitamins to prevent colorectal cancer. New England Journal of Medicine 331:141-147, 1994.
Hennekens CH and others. Lack of effect of long-term supplementation with beta carotene on the incidence of malignant neoplasms and cardiovascular disease. New England Journal of Medicine 334:1145-1149, 1996.
Omenn GS and others. Effects of a combination of beta carotene and vitamin A on lung cancer and cardiovascular disease. New England Journal of Medicine 334:1150-1155, 1996.
Tardif J-C. Probucol and multivitamins in the prevention of restenosis after coronary angioplasty. New England Journal of Medicine 337:365-372, 1997.
The Heart Outcomes Prevention Evaluation Study Investigators. Vitamin E supplementation and cardiovascular events in high-risk patients. New England Journal of Medicine 342:145-153, 2000.
Hennekens CH and others. Antioxidant vitamins: Benefits not yet proved. New England Journal of Medicine 330:1080-1081, 1994.
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Vitamin supplements. The Medical Letter on Drugs and Therapeutics 40:75-77, 1998.
Tribble DL and others. Antioxidant consumption and risk of coronary heart disease: Emphasis on vitamin C, vitamin E, and beta-carotene. American Heart Association Science Advisory. Circulation 99:591-595, 1999.
Smith W and others. Dietary oxidants and age-related maculopathy: The Blue Mountains Study. Ophthalmology 106:761-767, 1999.
Phytochemicals. Drugstore in a salad? Consumer Reports on Health 7:133-135, 1995.
Why megadoses of beta carotene may promote lung cancer. USDA Agricultural Research Service Food & Nutrition Research Briefs, Jan 1999, p. 1.
**Stephen Barrett, M.D.
Stephen Barrett, M.D., a retired psychiatrist who resides in Allentown, Pennsylvania, has achieved national renown as an author, editor, and consumer advocate. In addition to heading Quackwatch, he is vice-president and of the National Council Against Health Fraud, a scientific advisor to the American Council on Science and Health, and a Fellow of the Committee for the Scientific Investigation of Claims of the Paranormal (CSICOP). In 1984, he received an FDA Commissioner's Special Citation Award for Public Service in fighting nutrition quackery. In 1986, he was awarded honorary membership in the American Dietetic Association. From 1987 through 1989, he taught health education at The Pennsylvania State University. He is listed in Marquis Who's Who in America and received the 2001 Distinguished Service to Health Education Award from the American Association for Health Education.
An expert in medical communications, Dr. Barrett operates nine Web sites; edits Consumer Health Digest (a weekly electronic newsletter); is medical editor of Prometheus Books; and is a peer-review panelist for several top medical journals. His 49 books include The Health Robbers: A Close Look at Quackery in America and six editions of the college textbook Consumer Health: A Guide to Intelligent Decisions. One book he edited, Vitamins and Minerals: Help or Harm?, by Charles Marshall, Ph.D., won the American Medical Writers Association award for best book of 1983 for the general public and became a special publication of Consumer Reports Books. His other classics include Dubious Cancer Treatment, published by the Florida Division of the American Cancer Society; Health Schemes, Scams, and Frauds, published by Consumer Reports Books; The Vitamin Pushers: How the "Health Food" Industry Is Selling America a Bill of Goods, published by Prometheus Books; and Reader's Guide to "Alternative" Health Methods, published by the American Medical Association.
Fonte: http://www.cafeesaude.com.br/alerta/antioxidantes.htm
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